Mauro Ferreira no G1

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sábado, 9 de abril de 2011

Rita Gullo debuta em disco com classe, graves, agudos e Chico Buarque

Resenha de CD
Título: Rita Gullo
Artista: Rita Gullo
Gravadora: Tratore
Cotação: * * * * 1/2

Com rara classe nas interpretações e na escolha do repertório, a paulista Rita Gullo debuta bem em disco no populoso país das cantoras. Intérprete que estudou canto lírico, Gullo se associa ao universo da MPB - com eventuais conexões com sons e compositores da América Latina - neste belo álbum que tem como chamariz a participação de Chico Buarque na regravação de A Mulher de Cada Porto, tema criado pelo compositor com Edu Lobo para a trilha sonora do espetáculo O Corsário do Rei (1985), gravado originalmente com Gal Costa e ora revivido pelo autor em registro que conta com intervenções do acordeom de Toninho Ferragutti. Articulado pelo escritor Ignácio de Loyola Brandão, pai da cantora, o dueto de Gullo com Chico chama atenção para o CD. Mas é detalhe luxuoso em disco que impressiona pelo canto afinado da intérprete, que vai do grave ao agudo com habilidade em temas com Xote (Gilberto Gil e Rodolfo Stroeter) - que aborda com graça o misticismo religioso em voga na Nação Nordestina - e  Sentinela (Milton Nascimento). Rita Gullo, o disco, transcorre coeso ao longo de suas 13 faixas. O mérito é também da produção e da direção musical de Mário Gil, autor dos arranjos, criados em parceria com o pianista Hanilton Messias. A exceção é o belo arranjo suave de O Cantador (Dori Caymmi e Nelson Motta), assinado por Jonas Tatit. Pode ser coincidência, mas O Cantador é justamente a faixa que Gullo apresenta menor rendimento (apesar da evidente elegância da gravação). Em contrapartida, a cantora oferece registros extremamente expressivos do samba-canção Nunca (Lupicínio Rodrigues) - entoado com emoção contida - e de Cruzada (Tavinho Moura e Márcio Borges), tema em que sobressai a flauta de Teco Cardoso. Das conexões com os sons da América Latina, Gullo impressiona em Sueño com Serpientes por evocar o registro vocal de Mercedes Sosa (1935 - 2009) - a cantora argentina que propagou o tema do poeta e trovador cubano Silvio Rodríguez (grafado erroneamente no encarte como Silvio Rodrigues) - e em Era de Amar por realçar a beleza da canção do uruguaio Jorge Drexler em gravação que supera a do autor. A formação lírica da intérprete transparece nas passagens mais agudas de Pedra e Areia (Lenine e Dudu Falcão). Mas não há em Rita Gullo, o disco, qualquer tentativa de ficar mostrando os dotes vocais da intérprete. O virtuosimo versátil da cantora aparece naturalmente, seja na densa abordagem jazzy de Each and Everyone - música do grupo-duo inglês Everything But the Girl - seja na introdução a capella de Espelho (Xande Mello e Eduardo Pitta), tema que evoca a tradição dos cantadores nordestinos enquanto cita na letra o assum preto, pássaro recorrente no universo e no repertório da região. Já a valsa María Del Carmen (Elson Fernandes e Consuelo de Paula) - que tem algo da emoção do fado e algo da passionalidade do tango (evocada pelo acordeom de Toninho Ferragutti) - mostra que Rita Gullo acerta também quando sai da esfera dos clássicos da MPB. Quando abre com abordagem elegante de Oração ao Tempo (Caetano Veloso), o disco dá a impressão de apresentar mais uma voz sem identidade própria no país das cantoras. Ao terminar, Rita Gullo - o disco - já desfez a rápida impressão inicial, deixando a certeza de que Rita Gullo, a cantora, tem belo futuro se quiser e souber enfrentar as adversidades de um mercado fonográfico cada vez mais insano e injusto. Seu disco revela uma cantora de verdade. 

7 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Com rara classe nas interpretações e na escolha do repertório, a paulista Rita Gullo debuta bem em disco no populoso país das cantoras. Intérprete que estudou canto lírico, Gullo se associa ao universo da MPB - com eventuais conexões com sons e compositores da América Latina - neste belo álbum que tem como chamariz a participação de Chico Buarque na regravação de A Mulher de Cada Porto, tema criado pelo compositor com Edu Lobo para a trilha sonora do espetáculo O Corsário do Rei (1985), gravado originalmente com Gal Costa e ora revivido pelo autor em registro que conta com intervenções do acordeom de Toninho Ferragutti. Articulado pelo escritor Ignácio de Loyola Brandão, pai da cantora, o dueto de Gullo com Chico chama atenção para o CD. Mas é detalhe luxuoso em disco que impressiona pelo canto afinado da intérprete, que vai do grave ao agudo com habilidade em temas com Xote (Gilberto Gil e Rodolfo Stroeter) - que aborda com graça o misticismo religioso em voga na Nação Nordestina - e Sentinela (Milton Nascimento). Rita Gullo, o disco, transcorre coeso ao longo de suas 13 faixas. O mérito é também da produção e da direção musical de Mário Gil, autor dos arranjos, criados em parceria com o pianista Hanilton Messias. A exceção é o belo arranjo suave de O Cantador (Dori Caymmi e Nelson Motta), assinado por Jonas Tatit. Pode ser coincidência, mas O Cantador é justamente a faixa que Gullo apresenta menor rendimento (apesar da evidente elegância da gravação). Em contrapartida, a cantora oferece registros extremamente expressivos do samba-canção Nunca (Lupicínio Rodrigues) - entoado com emoção contida - e de Cruzada (Tavinho Moura e Márcio Borges), tema em que sobressai a flauta de Teco Cardoso. Das conexões com os sons da América Latina, Gullo impressiona em Sueño com Serpientes por evocar o registro vocal de Mercedes Sosa (1935 - 2009) - a cantora argentina que propagou o tema do poeta e trovador cubano Silvio Rodríguez (grafado erroneamente no encarte como Silvio Rodrigues) - e em Era de Amar por realçar a beleza da canção do uruguaio Jorge Drexler em gravação que supera a do autor. A formação lírica da intérprete transparece nas passagens mais agudas de Pedra e Areia (Lenine e Dudu Falcão). Mas não há em Rita Gullo, o disco, qualquer tentativa de ficar mostrando os dotes vocais da intérprete. O virtuosimo versátil da cantora aparece naturalmente, seja na densa abordagem jazzy de Each and Everyone - música do grupo-duo inglês Everything But the Girl - seja na introdução a capella de Espelho (Xande Mello e Eduardo Pitta), tema que evoca a tradição dos cantadores nordestinos enquanto cita na letra o assum preto, pássaro recorrente no universo e no repertório da região. Já a valsa María Del Carmen (Elson Fernandes e Consuelo de Paula) - que tem algo da emoção do fado e algo da passionalidade do tango (evocada pelo acordeom de Toninho Ferragutti) - mostra que Rita Gullo acerta também quando sai da esfera dos clássicos da MPB. Quando abre com abordagem elegante de Oração ao Tempo (Caetano Veloso), o disco dá a impressão de apresentar mais uma voz sem identidade própria no país das cantoras. Ao terminar, Rita Gullo - o disco - já desfez a rápida impressão inicial, deixando a certeza de que Rita Gullo, a cantora, tem belo futuro se quiser e souber enfrentar as adversidades de um mercado fonográfico cada vez mais insano e injusto. Seu disco revela uma cantora de verdade.

lurian disse...

Mauro, ainda que a cantora seja excelente, me aprece um disco cheio de medalhões...não acho isso tão positivo para uma iniciante. Leia-se: A mulher de cada porto = Chico + Gal; Sentinela = Milton + Nana; Sueño con sierpentes = Milton + Mercedes Sosa. Ainda não ouvi o disco para opinar com maior precisão, mas a não ser que ela consiga lapidar um clássico como O Cantador com personalidade como o fez Joyce Moreno... no lugar dela teria optado por gravar mais composições do próprio Mário Gil que merece ser mais conhecido e outros em igual situação!

Anônimo disse...

Lurian sempre esperta.

PS: Tem muita cantora nesse país.
Dá vertigem.

Vitor disse...

Achei interessante, mas nao vou ouvir pq to cansado dessas cantoras todas. Podiam surgir uns cantores novos

william disse...

Belas escolhas: Cruzada, Pedra e Areia, A Mulher de Cada Porto, Oração ao Tempo, Sentinela, O Cantador, ainda tem Gilberto Gil e outras, o disco parece mesmo muito bom.

sonhadoramente disse...

já chega muito bem acompanhada! mas concordo com a Lurian, podia trazer novos compositores pra variar um pouco! eu vou ouvir o CD.

Unknown disse...

Maria del carmem de Consuelo de Paula vale o cd