Título: Stevie Wonder
Artista: Stevie Wonder
Local: Cidade do Rock (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 30 de setembro de 2011
Foto: Rock in Rio 2011 / Daniel Terrentini
Cotação: * * * * *
É fato que o Red Hot Chili Peppers fez apresentação memorável na segunda noite do Rock in Rio 2011, em roteiro que incluiu Higher Ground, uma das pérolas negras do repertório autoral de Stevie Wonder. Mas o show que entra para a história da quarta edição carioca do festival é o feito por Wonder na madrugada desta sexta-feira, 30 de setembro. Em apresentação de quase duas horas, que culminou com a participação inesperada de Janelle Monáe no funk roqueiro Superstition e em Another Star, o mestre do groove mostrou na Cidade do Rock toda a força atemporal de obra que é uma das pedras fundamentais do pop norte-americano. Wonder já contabiliza 61 anos, mas - contrariando o que já sentenciou Mick Jagger em Time Waits for No One (1974) - o tempo parece excepcionalmente esperar pelo cantor, compositor e músico, ele também de caráter excepcional. A voz continua potente, viçosa, atingindo os tons altos dos anos 70, década em que a carreira de Wonder alcançou pico de criatividade e popularidade. A maestria na criação dos grooves, aliada à força do cancioneiro do artista, resultou em show perfeito, arrasador, histórico. O balanço do mestre já ficou evidente no início quando, pilotando um keytar (misto de teclado e guitarra), Wonder reviveu How Sweet It Is (To Be Loved by You) - tema de 1964 lançado por Marvin Gaye (1939-1984) e regravado por James Taylor - e My Eyes Don't Cry (número performático em que o artista até se deitou para tocar o keytar). Na sequência, ele assumiu os teclados sem deixar volta e meia de recorrer à inconfundível gaita, ouvida durante a simpática inclusão de Garota de Ipanema (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes), cantada em inglês por Aisha Morris - filha de Wonder e vocalista de sua banda - e acompanhada em coro pelo público em português, num daqueles momentos que ficam na memória. Sim, Wonder tem toda a bossa do mundo. Não fez feio nem ao cair no samba em Você Abusou (Antônio Carlos e Jocafi), mas brilhou mesmo é quando lapidou em cena o suingue funky de temas como Higher Ground, destaque entre os muitos destaques do roteiro. Higher Ground é clássico lançado por Wonder em Innervisions, álbum politizado de 1973 do qual ele extraiu também Living for the City e Visions para montar o roteiro de seu belo show no Rock in Rio 2011. Sucesso de 1970 que sobreviveu ao tempo, Signed, Sealed, Delivered I'm Yours enfatizou o peso dos sopros na arquitetura sonora do show. Interagindo o tempo todo com a plateia embevecida (embora o fato de a apresentação transcorrer em alta madrugada tenha feito parte do público debandar ao longo do show), Wonder queria agradar. E agradou. Até porque poucos compositores no mundo podem enfileirar no roteiro músicas que atingiram a perfeição pop como Overjoyed, You Are the Sunshine of my Love, I Just Called to Say I Love You, Isn't She Lovely? e My Cherie Amour. Todas marcaram presença em show que banhou a Cidade do Rock com ondas de energia positiva, inclusive na homenagem a outro rei negro do pop, Michael Jackson (1958 - 2009), prestada de forma sensível (e nada óbvia) com a balada The Way You Make me Feel. Stevie Wonder mostrou no Rock in Rio 2011 que a música criada com alma, identidade e inspiração (soberana, no caso dele) é capaz de desafiar a ditadura do tempo e se tornar eterna. A música e o balanço de Stevie Wonder já são eternos.