sábado, 31 de dezembro de 2011

Retrô 2011: Dez discos brasileiros que merecem menção no fim do ano

Cada vez mais segmentado, o mercado fonográfico brasileiro manteve ritmo intenso de lançamentos ao longo de 2011. A maioria dos discos editados no Brasil teve tiragens reduzidas, retratos da anemia de uma indústria corroída pelas piratarias física e virtual - ainda que a paradoxal vendagem de 1,4 milhão de cópias do CD, DVD e blu-ray Paula Fernandes ao Vivo tenha sinalizado que, sim, ainda há muita gente disposta a ir na loja comprar um CD ou um DVD. Dentro da ampla oferta de títulos disponibilizados no mercado ao longo do ano, alguns se destacaram pela qualidade artística e excelência do repertório. Eis dez belos e interessantes discos brasileiros que merecem figurar nas sempre subjetivas listas de melhores álbuns de 2011:

1. Recanto, Gal Costa (Universal Music)
- Mergulho profundo nos recantos escuros da existência humana em disco eletrônico e sombrio que se agiganta a cada audição

2. A Dama Indigna, Cida Moreira (Joia Moderna)
- Com a voz operística no fio da navalha, a cantora se reconecta ao piano e ao estilo teatral de seu memorável começo de carreira

3. Cavaleiro Selvagem Aqui te Sigo, Mariana Aydar (Universal Music)
- Com a adesão do maestro Letieres Leite na produção e nos arranjos, a cantora chega na dianteira com CD arrojado e moderno

4. Ame ou se Mande, Jussara Silveira (Joia Moderna)
- Uma senhora intérprete em estado de graça em álbum de canções produzido com precisão por Marcelo Costa e Sacha Amback

5. Nó na Orelha, Criolo (sem indicação de gravadora)
- Ao extrapolar o gueto do hip hop, sem perder a atitude de rapper, Criolo retrata o Brasil periférico com discurso humanista

6. Todo Dia É o Fim do Mundo, Lula Queiroga (sem indicação de gravadora)
- Entre as sombras do apocalipse cotidiano, brilha o talento de um compositor iluminado em seu melhor disco e momento

7. Serenade of a Sailor, MoMo (Pimba / Dubas)
- A bordo com seu violão e com belíssimas melodias, o cantor e compositor carioca cruza o mar da solidão em disco tristonho

8. O Oposto de Dizer Adeus, Dan Nakagawa (YB Music)
-  Em seu segundo álbum, o compositor paulista apresenta instigante e inquieto repertório autoral situado entre a MPB e o pop

9. Nosso Samba Tá na Rua, Beth Carvalho (Andança / EMI Music)
- Em disco feliz, seu primeiro de inéditas em 15 anos, a sambista reiterou a habilidade de pescar pérolas nos quintais cariocas

10. Indivisível, Zé Miguel Wisnik (Circus)
- Regido pela sofisticação, o compositor jogou pérolas autorais de alto quilate aos poucos que compraram seu belo disco duplo

Retrô 2011: Quatro CDs estrangeiros que se destacaram ao longo do ano

Já houve anos (muito) mais inspirados do que 2011 no que diz respeito à produção fonográfica internacional. Ainda assim, quatro álbuns se destacaram ao longo do ano. Lançado em janeiro, 21 de Adele consagrou merecidamente a cantora e compositora inglesa. Em tempos de pop fabricado em linha de montagem, 21 mostrou que uma voz em chamas e um punhado de canções dilaceradas sobre o fim de uma paixão ainda são capazes de inflamar multidões. Lançado em agosto, Watch the Throne - álbum desde sempre histórico por ser o primeiro que juntou os egocêntricos rappers Jay-Z e Kanye West - fugiu da mesmice do hip hop norte-americano com batidas épicas, belos samples e rimas nusitadas. Em outubro, foi a vez de a artista britânica Florence Welch mostra que sua máquina continua azeitada com Ceremonials. Segundo álbum de estúdio de Florence + The Machine, Ceremonials mostrou que, no idioma pop, grandiosidade nem sempre rima com superficialidade. Por fim, completando o naipe dos melhores CDs estrangeiros de 2011, El Camino saiu em dezembro e fez o duo norte-americano The Black Keys seguir a rota da diversão para reavivar o espírito eternamente juvenil do rock.

Retrô 2011: Aparece - enfim... - um cantor de fôlego no país das cantoras

Para cada cantor inexpressivo que tenta a sorte no mundo do disco, surgem dez cantoras. Mas em 2011 - enfim... - cresceu e apareceu no mercado fonográfico brasileiro um cantor de fôlego, estilo e personalidade. Aos 23 anos, o gaúcho Filipe Catto despontou na cena nacional em 2011 com seu primeiro álbum, Fôlego, lançado em setembro pela Universal Music. Fôlego dá continuidade a uma carreira passional iniciada por Catto em 2009, ano em que ele editou por vias independentes o seminal EP Saga. A bela voz de contratenor é posta pelo cantor e compositor - visto em foto de Caroline Bittencourt - a serviço de seu estilo inflamado e do tom teatral de suas interpretações. Qualidades confirmadas no excelente show inspirado em Fôlego. O único deslize do cantor neste ano decisivo para sua carreira foi ter alardeado na mídia - antes da TV Globo - que tinha regravado Recado (Gonzaguinha, 1978) para a trilha sonora nacional da novela Fina Estampa, o que fez com que a inédita gravação de Catto fosse substituída pelo registro original da música feito por Gonzaguinha (1945 - 1991). O cara é bom.

Retrô 2011: Marina chega ao 'Clímax' com novos parceiros e um show teatral

 Marina Lima chegou ao Clímax em 2011 sem perder a pose e o estilo. Disco que merece ser citado nas retrospectivas musicais do ano, Clímax - o 19º álbum da artista - foi lançado em junho e se revelou a mais perfeita tradução das angústias da cantora e compositora piauiense (de alma carioca) sob as luzes e sombras de São Paulo (SP), cidade cosmopolita como o CD produzido pelo baterista Alex Fonseca e o tecladista Edu Martins. Embora Clímax tenha se revelado íntimo e pessoal, Marina - vista em foto de Robert Astley Sparke - abriu parcerias com Adriana Calcanhotto (na febril Não me Venha Mais com o Amor), Karina Buhr (na belíssima canção Desencantados, composta com as adesões de Edgard Scandurra e Alex Fonseca) e Samuel Rosa (na radiofônica Pra Sempre, música ainda à espera de promoção para cumprir sua vocação de hit) em safra de inéditas que destacou ainda A Parte que me Cabe. Ainda em junho, a artista estreou em São Paulo (SP), o show Clímax, idealizado pelo diretor Isay Weinfield com estética teatral abortada pela cantora nas apresentações posteriores da turnê. Mesmo abandonando esse show, Marina brilhou em 2011!!!

Retrô 2011: Sem pudor, 'Sexo' de Erasmo expôs a melhor capa do ano

O disco, Sexo, é bom. Mas a capa do 27º álbum de inéditas de Erasmo Carlos é melhor ainda. Lançado em agosto pela Coqueiro Verde Records, Sexo expôs sem pudores a melhor capa de disco de 2011. Mérito do designer Ricardo Leite, que traduziu em expressiva imagem o conceito do disco. O coração urdido com a junção de duas digitais sugeria - na fenda aberta ao meio - a imagem de uma vagina. A capa sintetiza a ideia do Tremendão de falar de sexo com amor e envolvimento romântico. Detalhe estético: a capa da embalagem em digipack de Sexo vem mesmo aberta, valorizando a ideia genial de Ricardo Leite. É digna de qualquer antologia!

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Retrô 2011: DJ cria gravadora para dar voz a cantoras que têm o que dizer

Além de artista das carrapetas, o DJ Zé Pedro sempre exerceu com paixão o ofício de fã de cantoras. E foi para dar voz a cantoras que têm o que dizer que o artista - uma vivaz enciclopédia ambulante da música brasileira - virou dono de gravadora em 2011. Lançada em janeiro, a Joia Moderna disse a que veio logo no primeiro lote de lançamentos, posto efetivamente nas lojas em fevereiro. Lá havia um álbum de Zezé Motta - Negra Melodia, o primeiro disco da atriz e cantora em onze anos - e um CD de Cida Moreira, A Dama Indigna, digno de figurar em qualquer lista de melhores discos do ano. Gravadora de esquema artesanal, a Joia Moderna manteve o nível ao longo de 2011. Além de trazer para o formato de CDs álbuns raros de Leny Andrade (Alvoroço, 1973) Marília Barbosa (Filme Nacional, 1978), Marília Pêra (Feiticeira, 1975) e Vanusa (Vanusa 30 Anos, 1977), todos os quatro injustamente esquecidos nos baús de suas respectivas gravadoras, Zé Pedro - visto em foto de Lailson Santos - trouxe de volta para os estúdios cantoras como Amelinha (Janelas do Brasil, disco de tom lírico e interiorano), Célia (Outros Românticos, reunião de canções gravadas por Roberto Carlos nos anos 70 que não são de autoria do Rei), Cláudia (Senhor do Tempo, interessante abordagem do cancioneiro de Caetano Veloso, feita sem os costumeiros exageros vocais cometidos pela artista em shows), Jussara Silveira (Ame ou se Mande, o melhor trabalho de Jussara, outro disco digno de figurar entre os melhores de 2011) e a desconhecida Silvia Maria (cansativa, mas com rigor técnico, em Ave Rara). Com tiragens limitadas de mil exemplares por título (uma vez esgotada essa tiragem inicial, o disco passa a ser da cantora), dirigidas a um público antenado, os CDs da Joia Moderna moldaram em 2011 o perfil de uma gravadora amada pelo público gay. Nem alguns percalços - como o veto da edição do disco que registrava o show de Alaíde Costa com Fátima Guedes quando o CD já estava sendo encaminhado às lojas - tiraram o brilho da Joia. Que esbanjou modernidade ao reunir cantoras da nova geração para celebrar a obra de Marina Lima no tributo Literalmente Loucas ao mesmo tempo em que teve sensibilidade para lembrar a beleza da música de Taiguara (1945 - 1996) em tributo, A Voz da Mulher na Obra de Taiguara, que trouxe gravações belíssimas de Célia (Mudou) e Verônica Ferriani (Manhã de Londres). Fechando seu primeiro ano de vida, a Joia reeditou - numa licença poética e sexual - o único disco solo do cantor e transformista Edy Star, ...Sweet Edy... (1974). Que venham outras joias em 2012!!!

Vozes ressaltam a diversidade rítmica da obra autoral de Rubens Lisboa

Resenha de caixa de CDs
Título: Rubens Lisboa por Tantas Vozes
Artista: Rubens Lisboa
Gravadora: Discobertas
Cotação: * * * 1/2

Em seu mais ambicioso projeto fonográfico, o cantor e compositor Rubens Lisboa apresenta 45 músicas inéditas de sua autoria em três CDs embalados no box Rubens Lisboa por Tantas Vozes, recém-lançado pelo selo Discobertas. As vozes do título são os cantores convidados pelo compositor para dar voz à safra de inéditas pautada pela diversidade rítmica. Afoxé, baião, blues, choro, ciranda, coco, fado, frevo, samba e xote são alguns ritmos do cancioneiro de Lisboa, natural de Aracaju (SE), ainda longe demais das capitais e do reconhecimento nacional a que faz jus pela qualidade dessa obra. No primeiro volume, por exemplo, a carnavalesca Não me Leva a Mal - sedutora marcha (bem) cantada e (bem) arranjada por Edu Krieger - está lado a lado com valsa de arquitetura e alma antigas (Poema, na voz de Eliana Printes) e com baião festivo (Eu no Mundo) defendido por Amelinha. Se Leila Pinheiro entra na bela Ciranda do Amor, Ana Costa faz Greve de Samba na cadência do ritmo com o qual está identificada. Ainda neste volume 1, Wado reitera sua inquietude pop indie em Sem Malandragem enquanto Fênix põe sua voz andrógina em A Cobra, faixa de toque árabe. No volume 2, Ná Ozzetti ressalta a vivacidade do alegre Meu Choro enquanto Fabiana Cozza se mostra a intérprete ideal para realçar o toque afro do samba Drummondiana, destaque do repertório. Cantiga que evoca o universo folclórico nacional, Sete Ondas é valorizada pelo canto perfeito de Zé Renato. Já o samba Carrapato gruda no ouvinte pelo suingue singular de Elza Soares. Cantora ainda não valorizada na medida de seu talento, Mariana Baltar se joga com segurança no balanço caloroso e nordestino de IncendiadoQuase Brega - faixa gravada somente com a voz e o piano de Cida Moreira - é incursão de Lisboa pela canção romântica brasileira que ganha nobreza no registro da cantora. Quase no mesmo bom nível dos dois discos iniciais, o volume 3 de Rubens Lisboa por Tantas Vozes abre no compasso do xote com Amor de Dois, tema entoado com propriedade por Chico César. Faixa de tom camerístico, O Meu Amor se ajusta bem ao tom intenso do canto de Selma Reis. Mas a música em si não cativa tanto quanto Atrevido e Curioso, tema de tom nordestino que remete ao repertório dos cantadores da região. Sem negar a raça e a origem, Daniel Gonzaga produziu, arranjou e cantou a música. Com elegante produção de Eugenio Dale e Rodrigo Vidal, Anna Ratto estiliza o baião Replay. Dentro deste painel de ritmos nacionais construído com brasilidade, Rodrigo Bittencourt injeta eletrônica em Conectado, faixa de versos críticos, formatada no mesmo tom contemporâneo de O Negócio É Sério, música espivitada valorizada pela voz de Marcia Castro. Enfim, são tantas vozes e tantas canções que o songbook não deixa dúvidas sobre o talento de Rubens Lisboa como compositor. É fato que, se fossem dois CDs em vez de três, o resultado seria mais homogêneo. É fato também que a ideia de confiar a cada intérprete a produção da respectiva faixa impediu a criação de um conceito sonoro em torno da obra autoral de Lisboa. Mas o que conta é que, acima de tudo, paira o valor artístico do diversificado cancioneiro do compositor. 

Edição de DVD e CD ao vivo traz o blues cantado por Cyndi em Memphis

Em dezembro de 2010, Cyndi Lauper subiu ao palco da casa The Warehouse, em Memphis (Tennesee, EUA), e gravou ao vivo o show inspirado em seu álbum Memphis Blues (2010) com a presença de convidados como o pianista Allen Toussaint e o guitarrista Jonny Lang. Lançado pela gravadora indie norte-americana Megaforce Records, To Memphis With Love está sendo editado no Brasil, via selo Lab 344, nos formatos de DVD (com extras que incluem takes de estúdio de Wild Women Don't Have the Blues e Crossroads) e de combo duplo que inclui DVD e CD ao vivo. O repertório perpetuado no registro do show insere três sucessos da cantora - Girls Just Wanna Have Fun, She Bop e Change of the Heart - entre músicas do repertório do disco em que a cantora emerge com vigor vocal das águas lamacentas do blues. Clique aqui para ler a resenha do show da turnê - que passou pelo Brasil em fevereiro de 2011 - no Rio de Janeiro.

Bônus expandem 'Some Girls' com country, blues e rock à moda dos 50

Resenha de CD
Título: Some Girls (Deluxe Edition)
Artista: The Rolling Stones
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * 1/2

Some Girls entrou para a História como o álbum de 1978 que conectou os Rolling Stones à onda de disco music que varreu o universo pop na segunda metade dos anos 70. Miss You estourou no mundo inteiro e tal sucesso avalizou a incursão de Jagger e Cia. pelos embalos de sábado à noite. Mas a onda passou e a Deluxe Edition de Some Girls chegou às lojas neste fim de 2011 com um segundo disco adicional com 12 faixas-bônus. O CD-bônus expande o repertório do álbum com fidelidade ao som dos Stones. Ouve-se blues (When You're Gone), rock à moda dos anos 50 com toque de country (Claudine), um country-rock propriamente dito (Do You Think I Really Care?), rock embebido em blues (So Young) e balada (No Spare Parts, já alvo de clipe promocional da Deluxe Edition), entre outros fonogramas oriundos das profícuas sessões de gravação de Some Girls. A rigor, tais bônus são sobras. Mas sobras que - no caso das cinco faixas supra-citadas - roçam o padrão de qualidade dos Stones. Se não entraram no disco, é porque a safra de inéditas era farta na época (outras músicas das mesmas sessões seriam reaproveitadas em álbuns posteriores). As demais - caso da balada We Had It All (cover do tema de Troy Seal e Donnie Fritts, cantado por Keith Richards), You Win Again (cover do repertório do compositor de country e blues Hank Williams) e de faixas como Don't Be a Stranger, I Love You Too Much e Petrol Blues - transitam pelo mesmo universo musical, mas soam menos sedutoras nos registros reunidos na Deluxe Edition de Some Girls.

Terceiro álbum de estúdio de Lovato, 'Unbroken' ganha edição brasileira

Lançado em setembro de 2011 nos Estados Unidos, precedido em julho pelo single Skyscraper, o terceiro álbum de estúdio de Demi Lovato, Unbroken, ganhou edição brasileira neste mês de dezembro via Universal Music. Formatado com a fusão industrializada de pop, r & b e rap que impera na música dos EUA, o sucessor de Here We Go Again (2009) alinha participações de Missy Elliott (em All Night Long), Timbaland (também em All Night Long), Dev (em Who's That Boy), Lyaz (em You're My Only Short) e Jason Derulo (em Together). O segundo single do álbum Unbroken, Give Your Heart a Break, tem edição programada para janeiro de 2012.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Retrô 2011: 10 canções internacionais que vão passar na prova do tempo

Não, 2011 não foi um dos anos mais férteis do universo pop. Ainda assim, algumas canções se destacaram ao longo dos últimos 12 meses e seguramente vão continuar sendo lembradas nos próximos anos em shows e discos ao vivo. Paradise - destaque do quinto irregular álbum de estúdio do Coldplay (foto), Mylo  Xyloto - foi uma delas com sua arquitetura épica, moldada para shows em estádios. Eis dez canções internacionais que certamente vão sobreviver a 2011:

1. Best Thing I Never Head (Beyoncé Knowles, Babyface, Shea Taylor, S1 e Caleb)
    * Gravação original do álbum 4, de Beyoncé
2. Between the Cheats (Amy Winehouse e Salaam Remi
   * Gravação original do álbum Amy Winehouse Lioness: Hidden Treasures
3. Lonely Boy (Dan Auerbach, Patrick Carney e Brian Burton)
    * Gravação original do álbum El Camino, do duo The Black Keys
4. Niggas in Paris (Kanye West, M. Dean, Chauncey Hollis, W.A. Donaldson e M. Dean)
    * Gravação original do álbum Watch The Throne, de Jay-Z e Kanye West
5. Paradise (Chris Martin, Guy Berryman, Jonny Buckland e Will Champion)
    * Gravação original do álbum Mylo Xyloto, do Coldplay
6. Rolling in the Deep (Adele Adkins e Paul Epworth)
    * Gravação original do álbum 21, de Adele
7. Shake It Out (Florence Welch e Paul Epworth)
    * Gravação original do álbum Ceremonials, de Florence + The Machine
8. Someone Like You (Adele Adkins e Dan Wilson)
    * Gravação original do álbum 21, de Adele
9. The Death of You and Me (Noel Gallagher)
    * Gravação original do álbum Noel Gallagher's High Flying Birds, de Noel Gallagher
10. Till the World Ends (Ke$ha)
     * Gravação original do álbum Femme Fatale, de Britney Spears

Gadú vira página, refina seu som e passa sem colar na prova do segundo CD

Resenha de CD
Título: Mais Uma Página
Artista: Maria Gadú
Gravadora: Slap / Som Livre
Cotação: * * * 

Maria Gadú virou a página. Revelação de 2009, a artista paulista passa sem colar na prova do segundo disco. Sim, por mais que já tenha lançado dois registros ao vivo de show (um dividido com ninguém menos do que Caetano Veloso) após o consagrador álbum de estreia Maria Gadú (2009), é com Mais Uma Página - seu segundo trabalho de estúdio, posto nas lojas neste mês de dezembro de 2011 - que a cantora e compositora se defronta de fato com a sempre temida prova do segundo disco. Pois Gadú abriu parcerias, refinou seu som - mérito do produtor Rodrigo Vidal - e adensou boa parte das letras de seu repertório. "Cantando eu vivo em movimento / E sem ser mais do mesmo / Ainda sou quem era", avisa nos versos finais de No Pé do Vento, parceria com Edu Krieger, faixa que abre o CD com sopros que denotam certa influência do som cunhado por Los Hermanos e Cia. ao longo dos anos 2000. Na sequência, ao regravar Anjo de Guarda Noturno (Miltinho Ediberto), a cantora mostra - no toque sutil do baião - que não descartou de todo a leveza pop radiofônica de seu primeiro disco. Contudo, Mais Uma Página se desvia da fórmula do sucesso fácil ao incorporar urgências na inflamada Quem? (Maria Gadú) - faixa cantada com Lenine - e tensões expostas na batida seca, mas suingante, de Axé Acappella (Luisa Maita e Dani Black), faixa deslumbrante jogada na rede antes da chegada do disco nas lojas. Compositor em merecida ascensão na cena pop brasileira, Black é também o autor da funkeada Linha Tênue, tema em que as inquietações existenciais são abordadas sob prisma romântico. Gadú, aliás, fez bem a recorrer a músicas alheias. Talvez pela falta de tempo para burilar as próprias criações, a compositora já dá precoce sinal de cansaço em Taregué (Maria Gadú), rascunho de melodia perto das canções redondas do álbum de estreia. Em compensação, Estranho Natural (Maria Gadú) - canção já propagada na trilha sonora do filme Teus Olhos Meus (Caio Soh, 2011) - se revela bela e repleta de sensibilidade poética. Mais até do que a melodiosa Like a Rose, uma das duas parcerias de Gadú com Jesse Harris, o compositor norte-americano que ganhou projeção ao figurar nas fichas técnicas dos discos da cantora de pop jazz Norah Jones. Letrada e gravada em inglês, Like a Rose soa mais bem inspirada do que Long Long Time, a outra parceria de Gadú com Harris (finalizada com a adesão de Maycon Ananias). No balanço, o saldo autoral é positivo. Ora febril (como em Reis, parceria com Ana Carolina e Chiara Civello), ora lírico (como em A Valsa, pungente tema revestido com a alma de fado pelas presenças da voz lusitana do cantor Marco Rodrigues e da guitarra portuguesa de José Manuel Neto), Mais Uma Página, aliás, deixa bem claro a intenção de globalizar a voz de Gadú, cantora que já tem certa entrada no mercado internacional de língua latina. O que explica faixa em espanhol, Extranjero (Cassyano Correr e Maycon Ananias), canção envolvente pontuada pelo acordeom de Alessandro Kramer. Raro caso de disco que vai ficando mais sedutor à medida que avançam suas faixas, Mais Uma Página termina em clima etéreo com a releitura de Amor de Índio (Beto Guedes e Ronaldo Bastos). Gadú cria aura sagrada ao reavivar o espírito zen do sucesso de Guedes. Amor de Índio vira quase um mantra no registro da cantora, em fina sintonia com os vocais etéreos que adornam Beleza (Maria Gadú), a faixa escondida ao fim do álbum. Página virada, Maria Gadú provavelmente não vai manter com este segundo álbum de estúdio as vendas e a popularidade angariadas com o primeiro, mas a artista faz a sua parte, descartando fórmulas e ensaiando movimento firme para sedimentar seu nome e seu som na MPB.

Disco 'Passo Torto' situa Campos, Fróes, Dinucci e Cabral em rumo certo

Resenha de CD
Título: Passo Torto
Artista: Passo Torto (Kiko Dinucci, Marcelo Cabral, Rodrigo Campos e Romulo Fróes)
Gravadora: YB Music / Phonobase
Cotação: * * * 1/2

Lançado inicialmente em formato digital, mas já disponível para venda em formato físico a partir deste mês de dezembro de 2011, Passo Torto é o projeto coletivo que junta Kiko Dinucci, Marcelo Cabral, Rodrigo Campos e Romulo Fróes. Quatro nomes em intensa atividade na cena indie de São Paulo (SP) ao longo dos últimos anos, eles já faziam colaborações recíprocas em seus respectivos discos e shows. Passo Torto amplia o raio dessas colaborações ao mesmo tempo em que realça suas afinidades musicais e estilísticas. O álbum gira em torno do samba e gravita em torno do cotidiano paulista, cenário de personagens periféricos como o esquizofrênico retratado em Cidadão (Rodrigo Campos e Romulo Fróes). Esse universo bem específico já está exposto nos títulos de algumas músicas, como Da Vila Guilherme Até o Imirim (Rodrigo Campos e Romulo Fróes). Baixista, Marcelo Cabral atua como arranjador das 11 músicas inéditas da lavra do trio de compositores. Além de ser parceiro de Dinucci e/ou Campos em oito das 11 composições, Fróes dá voz à maioria dos temas com seu estilo sóbrio, nem sempre hábil na exposição clara de versos que montam painel denso do cotidiano urbano de São Paulo (SP). A pegada do disco - urdida pela harmonização do cavaquinho de Dinucci e do violão de Campos com o baixo de Cabral - é original, ainda que a pulsação de Faria Lima pra Cá (Kiko Dinucci e Rodrigo Campos) remeta aos sambas da fase áurea da parceria de João Bosco com Aldir Blanc. A paisagem cinzenta de Sampa é bem captada pelo tom nublado de temas como A Música da Mulher Morta (Kiko Dinucci e Romulo Fróes). Saindo da cadência do samba, mote de Três Canções Segunda Feira (Rodrigo Campos e Romulo Fróes), Cavalieri (Kiko Dinucci e Rodrigo Campos) marcha em direção à batida dos hinos oficiais. Por ser uma espécie de mix de discos anteriores de Romulo Fróes e Rodrigo Campos, o CD Passo Torto soa eventualmente déjà vu, mas põe os quatro amigos músicos e colaboradores no caminho certo.

'Caixa Eller' acentua a crescente falta que Cássia, morta há dez anos, faz

Resenha de caixa de CDs
Título: Caixa Eller - O Mundo Completo de Cássia Eller
Artista: Cássia Eller
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * *

Faz dez anos nesta quinta-feira, 29 de dezembro de 2011, que Cássia Rejane Eller (1962 - 2001) saiu precocemente de cena quando contabilizava apenas 39 anos de vida e 11 de carreira fonográfica. Posta este mês nas lojas pela gravadora Universal, a Caixa Eller acentua a falta que Cássia faz ao permitir a audição, sob a perspectiva do tempo, de seus oito álbuns oficiais e do póstumo 10 de Dezembro (2002) - todos devidamente analisados nos textos escritos pelo jornalista carioca Silvio Essinger para o libreto embalado na caixa. Decorridos dez anos de sua morte, a cantora continua única, insubstituível, singular em sua postura. A voz de trovão ressoava com atitude, cantasse um rock de raiz punk - como Não Sei o que Quero da Vida (Hermelino Neder e Arrigo Barnabé), destaque de seu primeiro álbum, o indomado Cássia Eller (1990) - ou uma canção romântica de Nando Reis como as incluídas no CD Com Você... Meu Mundo Ficaria Completo (1999), retrato de uma Cássia mais pop, de imagem mais feminina, moldada por sua gravadora. Sim, a indústria do disco nunca aceitou realmente a artista como ela era - livre, espontânea, marginal no melhor sentido do termo. A propósito, não é à toa que o segundo (e menos ouvido) álbum da cantora se chamou O Marginal (1992). Cássia gostava de transitar à margem do convencional, por vias alternativas da música e da vida. Mas tal postura é - salvo casos excepcionais - normalmente menos vendável. E foi por isso que, para sobreviver no mercado, a Leoa fingiu que se deixava domar a partir do terceiro álbum, Cássia Eller (1994), de pegada pop radiofônica. Ali surgiram as gravações originais de Malandragem (Frejat e Cazuza) e E.C.T. (Carlinhos Brown, Marisa Monte e Nando Reis), músicas que seriam rebobinadas no Acústico MTV (2001) que amplificou o sucesso da cantora. Entre um e outro, houve um registro de show - Cássia Eller ao Vivo (1996), gravado na turnê do show Violões, captado no DVD inserido na caixa - e encomendado tributo a Cazuza (1958 - 1990), Veneno Antimonotonia (1997), que ganhou peso no palco e gerou o imponente Veneno Vivo (1998), prova de que, no palco, ninguém domava a fera. Por reunir toda a discografia da intérprete, Caixa Eller expõe os vários tons da cantora. E todos são fortes, mesmo quando brandos. O que aumenta a saudade que o Brasil sente, e vai continuar sentindo, de Cássia Eller.

Quarto álbum de Sharon com Dap-Kings ganha atrasada edição brasileira

Quarto álbum de Sharon Jones com o grupo The Dap-Kings, I Learned The Hard Way (2010) ganha atrasada edição brasileira, produzida pelo selo Oi Música com distribuição da Universal Music. Sensação nos palcos cariocas e paulistas neste ano de 2011, a cantora norte-americana já está promovendo Soul Time!, recém-lançada coletânea de gravações avulsas que inclui faixa inédita, New Shoes. Contudo, para fãs de última hora, I Learned The Hard Way é apropriada porta de entrada para conhecer o soul e funk à moda dos anos 60 e 70, cantados por Sharon com os Dap-Kings. A turma debutou no mercado fonográfico em 2002 e seu som retrô seduziu ninguém menos do que Amy Winehouse (1983 - 2011), que recrutou os Dap-Kings para a gravação de sua obra-prima Back to Black (2006). Com I Learned The Hard Way, álbum lançado originalmente em abril de 2010 pela Daptone Records, Sharon ampliou seu público. O disco é irretocável. Por isso, mesmo atrasada, essa edição no mercado brasileiro é bem-vinda.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Retrô 2011: Brasil permanece inserido na rota dos shows internacionais

Favorecido por sua estabilidade econômica e pela baixa cotação do dólar, o Brasil permaneceu incluído na rota das turnês internacionais ao longo de 2011. Amy Winehouse - vista em foto de Rodrigo Amaral na primeira de suas duas apresentações no Rio de Janeiro (RJ) - foi o primeiro grande nome estrangeiro a pisar em palcos brasileiros neste ano, abrindo em janeiro agenda turbinada com shows de Aerosmith, Alice Cooper, Avril Lavigne, Ben Harper, Black Eyed Peas, Britney Spears, Coldplay (uma festa de luzes e cores na quarta edição carioca do festival Rock in Rio), Cyndi Lauper, Duran Duran, Elton John, Erasure, Eric Clapton, Iron Maiden, Jack Johnson, Joss Stone, Justin Bieber, Katy Perry, Ke$ha, Limp Bizkit, Maroon 5, Motörhead, Ozzy Osbourne, Paul McCartney, Paramore, Pearl Jam, Red Hot Chili Peppers, Ricky Martin, Rihanna, Ringo Starr, Sade, Shakira, Slash, Snow Patrol, Stevie Wonder (em apresentação memorável no Rock in Rio), The Strokes e U2. Prince ficou de vir, mas deu bolo.

Ivor Lancellotti rejuvenesce aos 66 e renova repertório em boas companhias

Resenha de CD
Título: Em boas e mais Companhias
Artista: Ivor Lancellotti
Gravadora: Dubas / Universal Music
Cotação: * * * *

♪ Compositor carioca, Ivor Lancellotti vai entrar em 2012 em clima de festa pelos 40 anos de carreira, iniciada em 1972 com a defesa da canção autoral Estrada por Marisa Gata Mansa (1933 - 2003) no Festival universitário da TV Tupi. Aos 66 anos, Ivor Lancellotti é ainda hoje identificado como o autor de Abandono, canção romântica gravada por Roberto Carlos em álbum de 1979. Só que transita como compositor sobretudo no universo do samba, ritmo predominante no quarto disco solo do artista, Em boas e mais companhias, lançado via Dubas neste último trimestre de 2011. Neste primeiro álnum em 13 anos, Lancellotti renova repertório autoral, apresentando inéditas como Vou fugir (Ivor Lancellotti e Délcio Carvalho) - o belíssimo samba que abre o trabalho - e Água-mãe (Ivor Lancellotti e Roque Ferreira), tema situado na roda do samba baiano e cantado pelo compositor com Moyseis Marques. Como o título já sugere, Em boas e mais companhias é disco repleto de convidados. Se Pedro Miranda ressalta o leve clima seresteiro de Alma aventureira (Ivor Lancellotti e Paulo César Pinheiro), Soraya Ravenle solta a voz afinadíssima no magoado (mas resignado) samba Contradizendo (Ivor Lancellotti e Roque Ferreira). O fato de o baterista Domenico Lancellotti (filho de Ivor) ter arregimentado hype turma de músicos amigos para tocar no disco - nomes como Stéphane San Juan (percussão) e Alberto Continentino (baixo) - não impede o disco de se encaixar na moldura mais tradicional do samba. Continentino, a propósito, pilota o baixo do xote Pelos ventos - parceria de Ivor com Domenico, solista da faixa -  e da regravação pálida de Sem companhia (Ivor Lancellotti e Paulo César Pinheiro), feita pelo compositor com Teresa Cristina sem sequer roçar o brilho do registro original feito em 1980 por Clara Nunes (1942 - 1983). A leveza dos arranjos impede que Sete e meia (Ivor Lancellotti e Alvinho Lancellotti) fique com ranço folclórico ao mesmo tempo em que respeita a arquitetura de melodias sublimes como a de Escudo (Ivor Lancellotti e Wanderlei Monteiro), samba em que a convidada Áurea Martins reitera a alta classe vocal em gravação que rivaliza com o registro feito por Fabiana Cozza no recém-lançado terceiro disco de Cozza. No mais, Em boas e mais companhias perpetua o canto grave de Mariana Bernardes, toque luxuoso de Bela cigana (Ivor Lancellotti e João Nogueira), faixa adornada pelo cavaquinho de João Callado e pelo violão de sete cordas de Bernardo Dantas, ambos igualmente luxuosos. Enfim, rejuvenescido pela presença de companhias de vários estilos e idades, Ivor Lancellotti lança disco à altura do histórico que ergueu como compositor desde que Marisa Gata Mansa abriu a estrada dele, há quase 40 anos.

BiD harmoniza sons da Jamaica e ritmos do Nordeste em 'Bambas Dois'

Resenha de CD
Título: Bambas Dois - Brasil # Jamaica
Artista: BiD e convidados
Gravadora: Soulcity Produssas / Universal Music
Cotação: * * * *

Em 2006, o produtor Eduardo Bidlovski - conhecido simplesmente como BiD - promoveu alquimia rítmica nacional em seu álbum Bambas & Biritas Vol. 1. Decorridos cinco anos, BiD apresenta nova alquimia musical, desta vez extrapolando as fronteiras brasileiras, no CD Bambas Dois - Brasil # Jamaica. Como o título já antecipa, BiD mistura sons da Jamaica - país onde o disco foi gravado com convidados arregimentados na Nação do reggae - com ritmos do Brasil, mais especificamente do Nordeste, e a adesão de artistas oriundos da região, casos de Chico César (participante de Little Johnny) e Siba (presença ilustre com sua rabeca em We Put the "M" Inna Music). A já conhecida afinidade rítmica entre xote e reggae, por exemplo, é realçada em Brasil (Little Sunday), faixa que une a sanfona de Dominguinhos à voz de Ky-Mani Marley, um dos (muitos) descendentes da dinastia do rei  do reggae Bob Marley (1945 - 1981). Embebido em suingue, Bambas Dois propõe várias outras fusões inusitadas. Music For All, faixa em que figura o trio jamaicano The Heptones, transfunde células rítmicas de baião e reggae. Já Only Jah Love (Raggatu) é raggamuffin' sustentado por base percussiva típica de maracatu em faixa que junta Bi Ribeiro (baixista do trio carioca Paralamas do Sucesso) com o cantor jamaicano Sizzla Kalonji. De modo geral, Bambas Dois é álbum pautado pelo balanço do reggae, ritmo predominante até mesmo em faixas gravadas com convidados brasileiros, caso de Chiquinha Hey, tema que junta Luiz Melodia (um dos primeiros brasileiros a mergulhar nessa praia) e Anelis Assumpção. Contudo, de uma forma ou de outra, a pegada nordestina se insinua tanto em Chiquinha Hey como nas demais 13 músicas do disco. Se o cantor jamaicano U-Roy (um pioneiro do toasting) dispara seu falatório no compasso do xote, a pernambucana Karina Buhr marca dupla presença no repertório, soltando a voz em Lehá Dodi (em dueto dub com Oku Onuora, mestre do gênero) e em World Cry (Al Fayah Mix), esta com Jesse Royal. Formatado por BiD com o auxílio imprescindível de Gustah, conhecedor dos sons jamaicanos, Bambas Dois resulta interessante porque as misturas rítmicas são azeitadas.

Sururu dilui as mágoas e dores de Cavaquinho ao pôr compositor na roda

Resenha de CD
Título: Se Você me Ouvisse - 100 Anos de Nelson Cavaquinho
Artista: Sururu na Roda
Gravadora: Rob Digital
Cotação: * * 1/2

Urdida com certo grau de amargura, a obra de Nelson Cavaquinho (1911 - 1986) foi alvo de tributos ao longo de 2011 por conta do centenário de nascimento do compositor carioca. Terceiro CD do grupo Sururu na Roda, Se Você me Ouvisse - 100 Anos de Nelson Cavaquinho chega a tempo de festejar a efeméride. Quarteto carioca que neste disco incorpora a vocalista e violonista Juliana Zanardi (substituta de Camila Costa), o Sururu dilui as mágoas e dores contidas no fino repertório de Cavaquinho ao pôr 20 músicas na sua roda de samba. A pegada leve dos vocais e dos (bonitos) arranjos do disco está em sintonia com o som do Sururu, embora não se ajuste ao tom denso de versos de sambas como Quando Eu me Chamar Saudade (Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito) e A Flor e o Espinho (Nelson Cavaquinho, Alcides Caminha e Guilherme de Brito). Quando aborda os clássicos de Cavaquinho, o grupo soa trivial porque é inevitável comparar o registro de Minha Festa (Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito) - para citar somente um exemplo - com a gravação irretocável feita em 1973 por Clara Nunes (1942 - 1983). Em contrapartida, o disco cresce quando envereda por temas pouco ouvidos do compositor. A Vida (Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito) é bela surpresa do CD com sua pegada de baião. História de um Valente (Nelson Cavaquinho e José Ribeiro de Souza) também se impõe no repertório, inclusive pelos sopros orquestrados pelo saxofonista Alexandre Caldi. Vale destacar ainda a participação de Cristiano Ricardo, que legitima Degraus da Vida (Nelson Cavaquinho, Antônio Braga e César Brasil) com seus vocais cansados. No todo, o disco transcorre simpático, mas sem jamais arrebatar. Do ótimo início (Se Você me Ouvisse, excelente samba popularizado por Beth Carvalho em 1976) ao fim (pot-pourri de temática carnavalesca que junta Pranto de um Poeta, Quero Alegria, Vou Partir e Sempre Mangueira), passando no meio do caminho por veloz choro instrumental (Caminhando, parceria de Nelson com Nourival Bahia), a abordagem do Sururu na Roda reitera a grandeza da obra de Nelson Cavaquinho - visto na bela capa do CD em graciosa miniatura criada pelo artista plástico Zé Andrade - entre sucessos imortais e pérolas ainda escondidas no baú centenário do compositor.

'Noel Gallagher's High Flying Birds' evoca Oasis com baladas sinfônicas

Resenha de CD
Título: Noel Gallagher's High Flying Birds
Artista: Noel Gallagher
Gravadora: Mercury Records / Universal Music
Cotação: * * * *

Sim, o primeiro álbum solo de Noel Gallagher - Noel Gallagher's High Flying Birds, recém-lançado no Brasil com distribuição da Universal Music - tem muito de Oasis. E não somente pelo fato de o nome de uma das dez músicas do disco, Stop the Clocks, ser o mesmo de uma compilação do grupo - com o detalhe de que a música, que encerra o CD de Noel em clima polifônico, é inédita e, portanto, nunca foi registrada em disco pelo Oasis. Sim, talvez seja impossível dissociar o som de Noel em sua empreitada solo do som de sua banda, da qual ele era alma e um dos cérebros (o outro era o de seu irmão Liam Gallagher, com quem sempre viveu entre mais tapas do que beijos). No todo, Noel Gallagher's High Flying Birds é álbum composto de baladas, algumas de tom sinfônico (caso da envolvente Everybody's on the Run), outras de tom mais íntimo (como If I Had a Gun...). Como as músicas são boas em sua maioria, o disco resulta igualmente bom, com uns instantes sublimes como o já conhecido single The Death of You and me, uma das melhores composições de Noel, orquestrada com sopros e inventividade. Se AKA... What a Life! soa épica, ressaltando um dos traços marcantes do disco, AKA… Broken Arrow é puro BritPop à moda do Oasis. Com letras geralmente fortes, que disparam petardos contra temas espinhosos (como o fanatismo religioso, alvo de Soldier Boys and Jesus Freaks), Noel Gallagher's High Flying Birds é um disco de certa forma fiel ao egocentrismo de seu mentor. Não chega a ser a obra-prima de 2011, porém é sedutor e coeso.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Retrô 2011: A indústria do disco recicla a música e os álbuns do passado

Em 2011, a indústria do disco investiu cada vez mais na reciclagem de músicas e álbuns do passado. Edições comemorativas de efemérides de álbuns emblemáticos - como a Super Deluxe Edition que celebrou os 20 anos de Ten (foto acima), o primeiro álbum do grupo Pearl Jam, lançado originalmente em 1991 - deram o tom do mercado fonográfico ao longo do ano. A reciclagem aconteceu em escala mundial. Se a Universal Music reeditou os álbuns do grupo Queen, a EMI Music produziu primorosas reedições dos álbuns de estúdio do Pink Floyd. No Brasil, foram lançadas caixas com álbuns de Marcos Valle (Marcos Valle Tudo), Maria Bethânia (Maria e Bethânia, dispensáveis para quem já tem as reedições de 2006), Ney Matogrosso (Metamorfoses), Inezita Barroso (O Brasil de Inezita Barroso), Cássia Eller (Caixa Eller - O Mundo Completo de Cássia Eller), Ed Lincoln (O Rei do Bailes), Celly Campello (Estúpido Cupido) e Zimbo Trio (Zimbo Trio). O som do passado ajuda a pagar as contas do presente...

Mouse conduz Black Keys por rota garageira no excelente CD 'El Camino'

Resenha de CD
Título: El Camino
Artista: The Black Keys
Gravadora: Nonesuch
Cotação: * * * * *

Sétimo álbum da dupla norte-americana The Black Keys, El Camino oferece 38 minutos e 25 segundos de diversão, distribuída entre onze faixas. Coube a Danger Mouse - produtor do disco, em função dividida com os integrantes do Black Keys, Dan Auerbach (voz e guitarra) e Patrick Carney (bateria) - conduzir o duo por rota retrô que direciona o ouvinte para um tempo em que o rock não se levava tão a sério, embora fosse feito com seriedade e espontaneidade juvenis. Lonely BoyDead and Gone já abrem El Camino  mostrando que o som do Black Keys reanima o espírito do bom e velho rock'n'roll. Aliás, Lonely Boy - o maior destaque do repertório autoral - pode bem ser a trilha sonora da vida de qualquer adolescente solitário decidido a não ser mais um na multidão. Se Little Black Submarines é folk que ganha peso roqueiro à medida que avança, em pegada clonada do som do Led Zeppelin, Gold on the Ceiling combina elementos de blues (na guitarra) e gospel (nos vocais grandiloquentes). A propósito, Money Maker reitera a dose farta de blues em que está embebido o rock do Black Keys. Com seu espírito de rock de garagem, El Camino reverencia o som dos anos 70, mas com uma clareza e um brilho que o torna o melhor álbum da dupla. E um dos melhores discos de 2011 - proeza que deve ser creditada tanto ao talento de Auerbach e Carney quanto à produção certeira de Danger Mouse, hábil ao fazer o duo crescer e aparecer no universo pop.

DVD 'A Dama Indigna' perpetua Cida Moreira em memorável cena teatral

Resenha de DVD
Título: A Dama Indigna
Artista: Cida Moreira
Gravadora: Lua Music
Cotação: * * * * *

Emocionada, Cida Moreira chega às lágrimas ao agradecer no palco do Teatro Fecap - após cantar Palavras (Gonzaguinha) - todos os que lhe ajudaram na criação e condução do show A Dama Indigna. Naquela noite, 6 de agosto de 2011, a apresentação do recital estava sendo gravada ao vivo, naquele conceituado palco de São Paulo (SP), para gerar o primeiro DVD da cantora. Nas lojas a partir de janeiro de 2012, em edição da Lua Music, o DVD é o primeiro de Cida Moreira. Um DVD fundamental para que novas e futuras gerações vejam em cena - em momento memorável de uma carreira fonográfica que completou 30 anos em 2011 - essa intérprete de veia teatral que ganha, enfim, um registro audiovisual de show quando celebra 60 anos de vida, a maior parte deles dedicados à música. Como Cida ressalta na entrevista exibida nos extras do DVD, o ofício de cantar passa necessariamente por um conceito e pela busca de um significado na junção de músicas. Nada é ou parece aleatório no repertório de A Dama Indigna, show cujo roteiro foi criado por Humberto Vieira, diretor deste recital já em rotação por algumas capitais do Brasil desde 2009. A gravação ao vivo perpetua A Dama Indigna em noite feliz, com a voz operística da artista em forma, desfiando rosas e emoções no fio da navalha. Alguns textos - O Ofício de Viver (Cesare Pavese, 1949), A Divina Comédia - Inferno (Dante Alighieri, 1321) e Indignação (Philip Roth, 2008) - costuram as canções do show e reiteram os significados das letras entoadas em cena pela digníssima dama. Senhora cantora, Cida Moreira irmana versos de Amy Winehouse (1983 - 2011), Bertolt Brecht (1898 - 1956), Caetano Veloso (O Ciúme e Mãe, sendo que Mãe ganha registro pungente, o mais belo desta canção do compositor), Chico Buarque, David Bowie, Kurt Weill (1900 - 1950) e Tom Waits, entre outros compositores do mesmo alto quilate. São canções para cortar os pulsos, irmanadas em clima mundano de cabaré. Por expor Cida a sós em cena, com seu piano, A Dama Indigna reconecta a intérprete ao seu começo de carreira - mas sem qualquer ranço saudosista. Este preciso registro ao vivo abre a cortina do futuro para Cida Moreira - e este futuro já vai se descortinar em 2012 na forma de um segundo álbum pela Joia Moderna (a gravadora que editou o registro de estúdio do show em CD posto nas lojas em fevereiro de 2011). Seja como for, o presente - por ora - é bastante especial para a cantora. Poucas intérpretes podem simular um mergulho profundo no lixo para entoar uma luxuosa canção como Me Acalmo Danando (Ângela RoRo). Cida Moreira pode. E a artista se basta em cena. Por isso, resulta acertada a opção de alocar nos extras a participação do jovem cantor paulista Thiago Pethit em Surabaya Johnny (Bertolt Brecht e Kurt Weill) e em Youkali-Tango (Roger Fernay e Kurt Weill). Pethit também faz suas incursões pelo mundo do cabaré, mas sequer roçar a carga emocional de uma intérprete genuinamente teatral como Cida Moreira. A Dama Indigna é, enfim, momento luminoso na trajetória dessa artista que merecia um DVD que perpetuasse sua teatralidade, suas escolhas coerentes e a sua dignidade como intérprete.  

Florence Welch azeita sua máquina épica no grandioso CD 'Ceremonials'

Resenha de CD
Título: Ceremonials
Artista: Florence + The Machine
Gravadora: Island Records / Universal Music
Cotação: * * * * 1/2

Embora ofuscada em escala global pela força emocional do canto de Adele, consagrada em 2011 com o álbum 21, a cantora e compositora britânica Florence Welch também chega endeusada ao fim deste ano por conta de Ceremonials, o segundo (excelente) álbum da banda Florence + The Machine. Ao gravar o sucessor do aclamado Lungs (2009), a artista azeitou ainda mais sua máquina épica. O resultado é um disco grandioso, algo sombrio, mas quase sempre envolvente. Shake It Out (cuja arquitetura é exemplo perfeito da magnitude que cerca cada detalhe de Ceremonials) é simplesmente uma das melhores músicas de 2011. A produção de Paul Epworth combina com maestria toques de música clássica - perceptíveis na moldura orquestral que envolve temas como Breaking Down, Never Let me Go e No Light, No Light - com uma aura pop que facilita a conexão do som complexo de Florence com o ouvinte mais mundano. Ao versar sobre temas sombrios em faixas como What The Water Gave me, música inspirada no afogamento intencional da escritora norte-american Virginia Wolf (1882 - 1941), Florece mergulha profundamente nas trevas da mente humana sem seguir a superficial cartilha pop gótica de nomes como o grupo Evanescence. Há intensidade e emoções reais numa música como Seven Devils. Ceremonials justifica a aura hype construída em torno de Florence Welch.

Amelinha segue, com afeto, a trilha interiorana e lírica de 'Janelas do Brasil'

Resenha de CD
Título: Janelas do Brasil
Artista: Amelinha
Gravadora: Joia Moderna
Cotação: * * * * 1/2

Ai, que saudades de Amelinha! Citando graciosamente o título do clássico samba de Ataulfo Alves (1909 - 1969) e Mário Lago (1911 - 2002), a frase com que o DJ Zé Pedro abre o texto escrito para o encarte do CD de Amelinha ora editado por sua gravadora Joia Moderna - Janelas do Brasil, primeiro disco da cantora desde 2002 - pode bem ser dita por quem seguiu a trilha nordestina do Brasil do fim dos anos 70 e início dos 80, período em que a voz afetuosa da intérprete cearense ecoou com força pelo país, lançando sucessos como Frevo Mulher (Zé Ramalho, 1979) e Foi Deus que Fez Você (Luiz Ramalho, 1980). Símbolo de doçura na corrente migratória que deslocou vozes agrestes de artistas nordestinos para o eixo Rio-São Paulo, em busca de oportunidades fonográficas, o canto de Amelinha conserva seu brilho neste álbum que se alinha com os melhores títulos de discografia que foi ficando progressivamente espaçada a partir da segunda metade dos anos 80 e - pior - voltada para o forró mais populista por exigência tacanha da indústria da música. Por entre as frestas abertas no mercado independente por Janelas do Brasil, disco produzido por Thiago Marques Luiz, a voz singular da intéprete destila lirismo e melancolia em repertório de ótimo nível, adornado por violões, violas e guitarras de Dino Barioni, diretor musical e arranjador do disco. A sonoridade interiorana do disco resulta apropriada para lustrar pérolas como O Silêncio (Zeca Baleiro, 2005), balada do asfalto que Amelinha traz para o universo musical do Brasil rural, longe demais das Capitais. É o Brasil em que resplandece Planície de Prata (Almir Sater e Paulo Solimões, 2005) com sua porteira aberta por onde passam angústias sentimentais (Quando Fugias de Mim, Alceu Valença e Emmanoel Cavalcanti, 2001), dores tão profundas quanto silenciosas (Asa Partida, Fagner e Abel Silva, 1976 - tema bonito com Amelinha, mas que pede intérprete de maior carga emocional) e o orgulho da origem cearense, exposta no terno registro de Terral (Ednardo, 1973), única música já gravada pela cantora. Pontuada pela guitarra de Barioni, a voz de Amelinha eleva os tons para sublinhar as urgências existenciais de Algum Lugar (Marília Medalha e Vinicius de Moraes, 1972), lembrança afetiva do repertório, já que o Poetinha se encantou com a voz de Amelinha antes de o Brasil a ouvir com a devida atenção. Aos 61 anos, essa voz preserva o mesmo frescor dos tempos áureos, com a vantagem de a sonoridade minimalista e íntima de Janelas do Brasil ter tom atemporal, sem perseguir mudernices e maravilhas contemporâneas. É o fato é que o disco se revela à altura do histórico da cantora. Pela doçura natural, a voz da artista esbanja o afeto preciso em É Necessário (Geraldo Espíndola, 1978), revolve reminiscências de tempos mais alegres em Galos, Noites e Quintais (Belchior, 1977), segue com alguma fidelidade a receita pop de Felicidade (Marcelo Jeneci e Chico César, 2010), celebra as belezas naturais de Ponta do Seixas (Cátia de França, 1980) e se embrenha pelas matas atrás das cantorias da paixão que envolvem Olhos Profundos (Renato Teixeira, 1978). Nessa trilha interiorana, a voz da intérprete reitera ao fim do disco a firme disposição de cantar sonhos e esperanças alimentadas nas praças de seu país, itinerário certeiro de Pra Seguir um Violeiro (Amaro Penna, 2011), única música inédita de repertório que se ajusta bem ao canto afetuoso da intérprete. Janelas do Brasil é belo álbum que mata a saudade do canto afetuoso de Amelinha. 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Retrô 2011: 10 canções brasileiras que podem passar na prova do tempo

Como já disse o poeta Sérgio Natureza em versos de Eternamente (Tunai e Sérgio Natureza), música lançada por Gal Costa em 1983, somente o tempo vai poder provar a eternidade das canções. Ao longo de 2011, muitas músicas foram lançadas em discos que obtiveram grande, moderada ou mesmo nenhuma repercussão. Algumas podem almejar a eternidade. Eis, em ordem alfabética, dez belas canções brasileiras de 2011 capazes de passar na prova do tempo:

* Dançando (Pitty e Martin)
   - Gravação original do álbum Agridoce, do duo Agridoce

* Depois (Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte)
   - Gravação original do álbum O Que Você Quer Saber de Verdade, de Marisa Monte

* Dois Olhos Verdes (Paulo Ricardo e Luiz Schiavon)
   - Gravação original do álbum Elektra, do RPM

* Não Existe Amor em SP (Criolo)
   - Gravação original do álbum Nó na Orelha, de Criolo

* O Que se Quer (Marisa Monte e Rodrigo Amarante)
    - Gravação original do álbum O Que Você Quer Saber de Verdade, de Marisa Monte

* Recanto Escuro (Caetano Veloso)
   - Gravação original do álbum Recanto, de Gal Costa

* Se Eu Soubesse (Chico Buarque)
   - Gravação original do álbum ôÔÔôôÔôÔ, de Thaís Gulin (em foto de Jorge Bispo)

* Segunda (Caetano Veloso)
   - Gravação original do álbum Recanto, de Gal Costa

* Sinhá (Chico Buarque e João Bosco)
   - Gravação original do álbum Chico, de Chico Buarque

* Tambor (Almir Guineto, Adalto Magalha e Daniel Oliveira)
    - Gravação original do álbum Nosso Samba Tá na Rua, de Beth Carvalho