Mauro Ferreira no G1

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domingo, 22 de janeiro de 2012

Enquanto Fischer procura João, leitor de 'Ho-ba-la-lá' acha boas histórias

Resenha de livro
Título: Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto
Autor: Marc Fischer
Editora: Companhia das Letras
Cotação: * * * * *

Apaixonado pela voz e pelo violão de João Gilberto, ou "contaminado" como ele prefere dizer ao longo das 184 páginas de seu primoroso livro Ho-ba-la-lá, o jornalista e escritor alemão Marc Fischer (1970 - 2011) veio de Berlim ao Rio de Janeiro (RJ) à procura do mito. Enquanto seguia os rastros deixados por João na busca incansável pelo astro regente de sua vida, Fischer encontrou histórias saborosas que alimentam o mito e a aura de estranheza que cerca o criador da revolucionária batida da Bossa Nova. E o fato é que, enquanto Fischer tenta achar o cantor, o leitor de Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto se depara com narrativa quase tão sedutora quanto o mito e, até certo ponto, reveladora. Em texto que evoca as sagas do fictício detetive inglês Sherlock Holmes, o jornalista alemão expõe cada passo percorrido em direção a João e reproduz com aparante fidelidade as conversas com seus entrevistados. Não somente gente conhecida - como Marcos Valle, João Donato, Roberto Menescal e Miúcha - mas também pessoas que o Brasil não conhece, mas que João conhece. Caso do garçom Garrincha, outrora interlocutor frequente de João por atender rotineiramente os telefonemas do artista no restaurante para o qual cantor ligava todo fim de noite para encomendar seu jantar - invariavelmente um steak, apesar de Garrincha sugerir vários outros pratos. Talvez por ter sido escrito com paixão cega, Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto foge dos clichês sobre o mito e acaba indo mais fundo na investigação sobre o caráter do canto, revelando uma pouco comentada faceta vampiresca de João. Nesse sentido, a entrevista de Roberto Menescal é a mais reveladora do livro. O compositor de O Barquinho defende para Fischer a tese de que João tem capacidade de mudar as pessoas - para pior - quando elas se deixam enredar por seu amaldiçoado  jogo de sedução. Menescal exemplifica sua tese com casos verídicos, inclusive o de um produtor japonês que teve um enfarte e virou alcóolotra logo após contratar João para um concerto e ser atazanado pelo detalhista cantor. Joyce, de certa forma, corrobora a tese de Menescal ao relatar a Rachael - a astuta colaboradora do autor na investigação sobre o paradeiro e a personalidade de João - sua experiência assustadora com João em quarto de hotel de Nova York (EUA). É revelador também o encontro de Fischer com Cláudia Faissol, mãe da filha caçula de João e empresária do cantor. A paixão por João levou o jornalista do Rio de Janeiro até Diamantina, a cidade de Minas Gerais onde o artista formatou a batida da Bossa Nova, burilando o toque de seu violão de forma obsessiva no banheiro da casa em que se hospedava. Pois Fischer - um investigador também obsessivo - encontra o tal banheiro e exercita o toque de seu próprio violão com Ho-ba-la-lá, a música de João que despertou no autor uma atração fatal. Pois não deve ser coincidência o fato de que, às vésperas da publicação deste livro escrito com maestria e poesia, Marc Fischer se suicidou em Berlim. Teria o Sherlock alemão sido uma vítima - no caso, à distância - da maldição de João?

12 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Apaixonado pela voz e pelo violão de João Gilberto, ou "contaminado" como ele prefere dizer ao longo das 184 páginas de seu primoroso livro Ho-ba-la-lá, o jornalista e escritor alemão Marc Fischer (1970 - 2011) veio de Berlim ao Rio de Janeiro (RJ) à procura do mito. Enquanto seguia os rastros deixados por João na busca incansável pelo astro regente de sua vida, Fischer encontrou histórias saborosas que alimentam o mito e a aura de estranheza que cerca o criador da revolucionária batida da Bossa Nova. E o fato é que, enquanto Fischer tenta achar o cantor, o leitor de Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto se depara com narrativa quase tão sedutora quanto o mito e, até certo ponto, reveladora. Em texto que evoca as sagas do fictício detetive inglês Sherlock Holmes, o jornalista alemão expõe cada passo percorrido em direção a João e reproduz com aparante fidelidade as conversas com seus entrevistados. Não somente gente conhecida - como Marcos Valle, João Donato, Roberto Menescal e Miúcha - mas também pessoas que o Brasil não conhece, mas que João conhece. Caso do garçom Garrincha, outrora interlocutor frequente de João por atender rotineiramente os telefonemas do artista no restaurante para o qual cantor ligava todo fim de noite para encomendar seu jantar - invariavelmente um steak, apesar de Garrincha sugerir vários outros pratos. Talvez por ter sido escrito com paixão cega, Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto foge dos clichês sobre o mito e acaba indo mais fundo na investigação sobre o caráter do canto, revelando uma pouco comentada faceta vampiresca de João. Nesse sentido, a entrevista de Roberto Menescal é a mais reveladora do livro. O compositor de O Barquinho defende para Fischer a tese de que João tem capacidade de mudar as pessoas - para pior - quando elas se deixam enredar por seu amaldiçoado jogo de sedução. Menescal exemplifica sua tese com casos verídicos, inclusive o de um produtor japonês que teve um enfarte e virou alcóolotra logo após contratar João para um concerto e ser atazanado pelo detalhista cantor. Joyce, de certa forma, corrobora a tese de Menescal ao relatar a Rachael - a astuta colaboradora do autor na investigação sobre o paradeiro e a personalidade de João - sua experiência assustadora com João em quarto de hotel de Nova York (EUA). É revelador também o encontro de Fischer com Cláudia Faissol, mãe da filha caçula de João e empresária do cantor. A paixão por João levou o jornalista do Rio de Janeiro até Diamantina, a cidade de Minas Gerais onde o artista formatou a batida da Bossa Nova, burilando o toque de seu violão de forma obsessiva no banheiro da casa em que se hospedava. Pois Fischer - um investigador também obsessivo - encontra o tal banheiro e exercita o toque de seu próprio violão com Ho-ba-la-lá, a música de João que despertou no autor uma atração fatal. Pois não deve ser coincidência o fato de que, às vésperas da publicação deste livro escrito com maestria e poesia, Marc Fischer se suicidou em Berlim. Teria o Sherlock alemão sido uma vítima - no caso, à distância - da maldição de João?

Maria disse...

João Gilberto, pra mim é um chato fundamental pena que a turnê que ele faria foi cancelada.

noca disse...

O artista mais narcisista do Brasil.No que de pior e mais negativo que o narcisismo pode acometer a um ser humano.Sua ultima,não se permitindo participar do filme do Jobim,não tem perdão.É o cúmulo da egolatria dele e da idolatria de quem parece que não apenas o respeita e aprecia,mas o teme.Na boa eu poria o Chet Baker no filme no lugar dele so para provocar e debochar da babaquice do cara.Tudo tem limite.Mas parece que para as irresponsabilidades do imaturo do João não.

Anônimo disse...

Engraçado, na matéria que li a respeito desse livro achei que o tom era de comédia rasteira.
A fala do Menescal, por exemplo, me pareceu totalmente jocosa.
Mas o suicídio do cara faz vc não duvidar das bruxas, Ou melhor, do Bruxo.

Anônimo disse...

Noca, pois eu adoro as loucuras do João.
É belíssimo personagem.

KL disse...

o Brasil é um país tão contraditório que até mesmo o artista mais importante e influente da segunda metade do século XX parece (ou tem demonstrado) ser, enquanto pessoa, exatamente o oposto. Conclusão jobiniana "O Brasil não é para principiantes."

Márcio disse...

Livro muito bem escrito. Li de um só fôlego. O autor consegue, a partir de informações aparentemente banais e/ou já conhecidas, criar uma obra que cativa mesmo quem não é fã de carteirinha de João Gilberto. Quanto há de realidade e de imaginação ali não é o que realmente importa. Os mistérios dão um tempero especial ao texto. Enquanto não sai a biografia (que já está sendo escrita, mas não deve ser publicada enquanto JG estiver entre nós), o juazeirense - para mim, o maior artista vivo de nossa música - ganha um trabalho à altura de seu talento.

Anônimo disse...

Livro surpreendente em todos os sentidos. Inovador em seu tema, bem escrito, chegou sem grandes barulhos na mídia e já é uma das leituras obrigatórias desse ano.

noca disse...

É Zé,mas a custa do sofrimento dos outros,e claro,principalmente dele.Ta na sua voz toda a tristeza infinita que ele carrega por ter essa índole patológica,esse tipo de temperamento por vezes lamentável.Tudo deve voltar para ele em dobro.Nosso "maior gênio" é humano.

Anônimo disse...

Pois então, Noca, a beleza e graça tá justamente aí - no fator humano.
Nas contradições, nas belezas e nas desgraças inerentes a todo indivíduo.
Ainda mais em um artista genial, inovador.
Sem suas loucuras talvez ele não fosse o criador que foi.
Essas coisas estão completamente interligadas.
Pô, artista funcionário público é BEM mais chato.

"Ou é poeta ou é normal"

Esqueci quem disse. :>)

Gill Sampaio Ominirò disse...

Não vejo a hora de ler. Toda leitura sobre João partindo de um fã é bem interessante, engraçada e uma homenagem, ainda que aquele reclame deste.

Unknown disse...

Noca, com essa sua racionalidade vc jamais vai entender a alma de um artista de verdade. tenha duvidas rapaz, tenha duvidas...