domingo, 11 de março de 2012

Salmaso borda pontos de delicadeza em cena com alma, lirismo e técnica

Resenha de show
Título: Alma Lírica Brasileira
Artista: Mônica Salmaso (em foto de Rodrigo Amaral)
Músicos: Nelson Ayres (piano) e Teco Cardoso (sopros)
Local: Espaço Cultural Eletrobras Furnas (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 10 de março de 2012
Cotação: * * * * *
Show em cartaz no Espaço Cultural Eletrobras Furnas (RJ) até 11 de março de 2012

Antes de cantar Lábios que Beijei (J. Cascata e Leonel Azevedo), valsa popularizada em 1937 na voz emblemática de Orlando Silva (1915 - 1978), Mônica Salmaso contou ao público que assistia ao show Alma Lírica Brasileira no Espaço Cultural Eletrobras Furnas que imaginava um bordado ao cantar a música. A bela arquitetura da valsa pareceu mesmo um bordado na interpretação dessa cantora que concilia alma e lirismo com técnica exuberante. O canto de Salmaso transita nas esferas da perfeição e - por sua própria natureza - se ajusta ao tom camerístico do recital que a intérprete vem apresentando pelo Brasil na companhia do pianista Nelson Ayres e do flautista e saxofonista Teco Cardoso. O registro de estúdio do show já rendeu CD que beira o sublime. Contudo, o show consegue superar o disco - como vai poder ser visto quando a gravadora Biscoito Fino lançar o DVD filmado em apresentação de Alma Lírica Brasileira em São Paulo (SP). Inclusive pelo fato de Salmaso se revelar habilidosa contadora de ótimos causos. O humor contido naturalmente nas falas da cantora é preciso contraponto para a atmosfera clássica do recital, diluindo a solenidade que permeia o disco e descontraindo um ambiente que poderia parecer excessivamente formal. Como bordadeira de músicas de gerações e estilos diversos, Salmaso tece pontos luminosos em temas que pedem cantora de amplos recursos vocais. Como já perceptível no disco, Mortal Loucura - música posta por José Miguel Wisnik sobre poema de Gregório de Matos (1636 - 1695) - é ambientado pelo trio em clima sacro. Com o mesmo rigor estilístico, o trio transforma Derradeira Primavera (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes) quase numa peça de câmara no momento mais denso - e talvez mais bonito - da apresentação feita em 10 de março de 2012 na volta do show à cidade do Rio de Janeiro (RJ). Alocada no bis, Valsinha (Chico Buarque e Vinicius de Moraes) faz o recital alcançar outro pico de beleza. A imagem do bordado é ideal para sugerir o requinte das interpretações. Até porque o trio jamais sai do tempo da delicadeza. O entrosamento de Ayres com Cardoso - reiterado sobretudo no tema instrumental Veranico de Maio (Nelson Ayres) - contribui para reforçar a impressão de que tudo está no seu devido lugar no show Alma Lírica Brasileira. Seja o suave tamborim tocado por Salmaso no Samba Erudito (Paulo Vanzolini), seja o preciso tom caipira que evoca a gênese sertaneja de Promessa de Violeiro (Raul Torres e Celino). Ou ainda os acordes delicados que sugerem sons de caixinha de música em fina sintonia com o clima lúdico da Ciranda da Bailarina (Edu Lobo e Chico Buarque), tema ausente do CD. Quando fica sozinha no palco, batucando em caixa de fósforo para se acompanhar no tristonho samba Véspera de Natal (Adoniran Barbosa), Salmaso mostra que pode se bastar em cena. Cantora de refinada musicalidade, a artista se porta em cena como um músico que completa o trio com sua percussão e com sua voz privilegiada. Enfim, Alma Lírica Brasileira é recital de beleza atemporal - ainda que o canto de Mônica Salmaso evoque outras eras. Irretocável, o bordado é feito com pontos de luz.

4 comentários:

  1. Antes de cantar Lábios que Beijei (J. Cascata e Leonel Azevedo), valsa popularizada em 1937 na voz emblemática de Orlando Silva (1915 - 1978), Mônica Salmaso contou ao público que assistia ao show Alma Lírica Brasileira no Espaço Cultural Eletrobras Furnas que imaginava um bordado ao cantar a música. A bela arquitetura da valsa pareceu mesmo um bordado na interpretação dessa cantora que concilia alma e lirismo com técnica exuberante. O canto de Salmaso transita nas esferas da perfeição e - por sua própria natureza - se ajusta ao tom camerístico do recital que a intérprete vem apresentando pelo Brasil na companhia do pianista Nelson Ayres e do flautista e saxofonista Teco Cardoso. O registro de estúdio do show já rendeu CD que beira o sublime. Contudo, o show consegue superar o disco - como vai poder ser visto quando a gravadora Biscoito Fino lançar o DVD filmado em apresentação de Alma Lírica Brasileira em São Paulo (SP). Inclusive pelo fato de Salmaso se revelar habilidosa contadora de ótimos causos. O humor contido naturalmente nas falas da cantora é preciso contraponto para a atmosfera clássica do recital, diluindo a solenidade que permeia o disco e descontraindo um ambiente que poderia parecer excessivamente formal. Como bordadeira de músicas de gerações e estilos diversos, Salmaso tece pontos luminosos em temas que pedem cantora de amplos recursos vocais. Como já perceptível no disco, Mortal Loucura - música posta por José Miguel Wisnik sobre poema de Gregório de Matos (1636 - 1695) - é ambientado pelo trio em clima sacro. Com o mesmo rigor estilístico, o trio transforma Derradeira Primavera (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes) quase numa peça de câmara no momento mais denso - e talvez mais bonito - da apresentação feita em 10 de março de 2012 na volta do show à cidade do Rio de Janeiro (RJ). Alocada no bis, Valsinha (Chico Buarque e Vinicius de Moraes) faz o recital alcançar outro pico de beleza. A imagem do bordado é ideal para sugerir o requinte das interpretações. Até porque o trio jamais sai do tempo da delicadeza. O entrosamento de Ayres com Cardoso - reiterado sobretudo no tema instrumental Veranico de Maio (Nelson Ayres) - contribui para reforçar a impressão de que tudo está no seu devido lugar no show Alma Lírica Brasileira. Seja o suave tamborim tocado por Salmaso no Samba Erudito (Paulo Vanzolini), seja o preciso tom caipira que evoca a gênese sertaneja de Promessa de Violeiro (Raul Torres e Celino). Ou ainda os acordes delicados que sugerem sons de caixinha de música em fina sintonia com o clima lúdico da Ciranda da Bailarina (Edu Lobo e Chico Buarque), tema ausente do CD. Quando fica sozinha no palco, batucando em caixa de fósforo para se acompanhar no tristonho samba Véspera de Natal (Adoniran Barbosa), Salmaso mostra que pode se bastar em cena. Cantora de refinada musicalidade, a artista se porta em cena como um músico que completa o trio com sua percussão e com sua voz privilegiada. Enfim, Alma Lírica Brasileira é recital de beleza atemporal - ainda que o canto de Mônica Salmaso evoque outras eras. Irretocável, o bordado é feito com pontos de luz.

    ResponderExcluir
  2. Preciso assistir a esse show. Salmaso é única.

    ResponderExcluir
  3. Mauro ferreira vc escreve tão bem sobre música,que vai acabar me convencendo que a MPB não morreu.

    ResponderExcluir
  4. Emanuel Andrade disse..

    E Mônica Salmaso é estupenda, grande cantora, precisa chegar ao grande público, mas não se acostumar com o povão, pra não incorrer riscos. A Tv precisa expor um show dessa jovem. Antes de alguém fazer qualquer comentário sobre ela devia ouvir de cabo a rabo seus três primeiros discos....

    ResponderExcluir

Este é um espaço democrático para a emissão de opiniões, sobretudo as divergentes. Contudo, qualquer comentário feito com agressividade ou ofensas - dirigidas a mim, aos artistas ou aos leitores do blog - será recusado. Grato pela participação, Mauro Ferreira

P.S.: Para comentar, é preciso ter um gmail ou qualquer outra conta do google.

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.