Título: Tabaroinha
Artista: Mariene de Castro (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Teatro Rival (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 2 de maio de 2012
Cotação: * * * *
Forte, o santo de Mariene de Castro baixou no terreiro carioca e fez milagre. A cantora baiana saiu consagrada de cena em seu primeiro show numa casa do Rio de Janeiro (RJ) - no caso, o acolhedor Teatro Rival., palco da estreia nacional do show Tabaroinha na noite de 2 de maio de 2012. O santo baixou em todos os sentidos. A cantora baiana louvou seus orixás através de repertório vivaz. Atenuado no recém-lançado CD Tabaroinha pelo produtor Alê Siqueira, o sotaque afro-brasileiro do repertório da artista aparece com força no show, geralmente na levada do samba de roda. Por mais que Mariene busque um sincretismo musical e religioso ao longo do roteiro de 31 músicas, a fé da intérprete nos santos e no samba de sua terra dá o tom caloroso do show, de forte sotaque percussivo. E, se o baticum contagia, é sobretudo porque a cantora tem luminosa presença cênica. Basta Mariene surgir no palco para concentrar todas as atenções. Quente como o colo da preta velha retratada por Dorival Caymmi (1914 - 2008) em Tia Anastácia (Cantiga pro Sinhozinho), um dos temas revisitados por Mariene no disco e show Tabaroinha, a voz da artista parece naturalmente talhada para o repertório fervoroso que rebobina. O show, no todo, é vibrante, contagiante. No entanto, ainda precisa de uns ajustes de direção. As falas de Mariene estão longas demais e podem ser editadas sem prejuízo da espontaneidade da artista. Os solos dos convidados da estreia nacional de Tabaroinha também eram dispensáveis - uma vez que, desde o primeiro número, Mariene já botou o público carioca na (palma da) mão. A propósito, o bloco inicial - com A Pureza da Flor (Arlindo Cruz, Jr. Dom e Babi, 2006), A Filha do Mar (Flávia Wenceslau, 2010), Ilha de Maré (Walmir Lupa e Lima, 1977) e Falsa Baiana (Geraldo Pereira, 1944) - resultou irresistível, radiante. Mariene rodopiando em Ilha de Maré - com a barriga já proeminente da quarta gravidez - ao som da sanfona de Cícero Assis é cena memorável. Aliás, a cantora acerta ao recorrer volta e meia ao melhor repertório de Alcione. Roda Ciranda (Martinho da Vila, 1984), Na Paz de Deus (Arlindo Cruz, Beto Sem Braço e Sombrinha, 1986) e Não Deixe o Samba Morrer (Edson Conceição e Aluísio, 1975) são sambas que caem bem na voz vivaz dessa verdadeira baiana que sabe comandar a roda. Por isso mesmo, a presença opaca de Nelson Rufino em Amuleto da Sorte - o grande samba romântico que o compositor baiano forneceu para o CD Tabaroinha - acabou atrapalhando a interpretação de Mariene. Que pareceu mais à vontade, sozinha, em Guerreira (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1978), samba-título do álbum lançado por Clara Nunes (1942 - 1983) em 1978. Sim, a luminosidade da saudosa Clara ecoa no canto de Mariene. Inclusive pelo apego de ambas as cantoras às tradições musicais afro-brasileiras. Seja como for, Clara é única, imortal, e Mariene de Castro tem sua própria identidade, construída na batida do samba do Recôncavo Baiano. É por isso que ela consegue pôr na mesma roda o ijexá Ponto de Nanã (Roque Ferreira, 2007) - com a apropriada citação do Cordeiro de Nanã (Tincoãs) - e um samba cheio de dengo como Não Vou Pra Casa (Antonio Almeida e Roberto Riberti, 1941), já revisitado com a habitual maestria por ninguém menos do que João Gilberto. Ninguém quer que a cantora vá para casa. Até porque, na parte final do roteiro, Mariene abre caminho para o repertório que já canta há anos em Salvador (BA) no projeto Santo de Casa. É a hora do pot-pourri de sambas de roda e de louvações aos orixás. E não é que Ogum (Claudemir e Marquinhos PQD, 2008), samba do repertório de Zeca Pagodinho, caiu muito bem no colo da verdadeira baiana? No bis, a belíssima e poética Prece de Pescador (Roque Ferreira e J. Velloso, 2004) reitera que Roque Ferreira reza pela cartilha musical de Caymmi. Já a evocação do refrão do politizado samba-rock Brasil (Cazuza, George Israel e Nilo Romero, 1987) soa deslocada e fora do tom. Mas não a ponto de diluir a impressão de que Mariene de Castro se consagrou em sua estreia nos palcos do Rio de Janeiro. O santo baixou forte no terreiro carioca como se o Rival fosse a sua casa...
10 comentários:
O show foi perfeito. Só acho deselegante recorrer tanto ao repertório da alcione e não citá-la.
1. Um ser de luz
2. Na paz de Deus
3. Ilha de maré
4. Ciranda de roda
5. Não deixe o samba morrer.
Forte, o santo de Mariene de Castro baixou no terreiro carioca e fez milagre. A cantora baiana saiu consagrada de cena em seu primeiro show numa casa do Rio de Janeiro (RJ) - no caso, o acolhedor Teatro Rival., palco da estreia nacional do show Tabaroinha na noite de 2 de maio de 2012. O santo baixou em todos os sentidos. A cantora baiana louvou seus orixás através de repertório vivaz. Atenuado no recém-lançado CD Tabaroinha pelo produtor Alê Siqueira, o sotaque afro-brasileiro do repertório da artista aparece com força no show, geralmente na levada do samba de roda. Por mais que Mariene busque um sincretismo musical e religioso ao longo do roteiro de 31 músicas, a fé da intérprete nos santos e no samba de sua terra dá o tom caloroso do show, de forte sotaque percussivo. E, se o baticum contagia, é sobretudo porque a cantora tem luminosa presença cênica. Basta Mariene surgir no palco para concentrar todas as atenções. Quente como o colo da preta velha retratada por Dorival Caymmi (1914 - 2008) em Tia Anastácia (Cantiga pro Sinhozinho), um dos temas revisitados por Mariene no disco e show Tabaroinha, a voz da artista parece naturalmente talhada para o repertório fervoroso que rebobina. O show, no todo, é vibrante, contagiante. No entanto, ainda precisa de uns ajustes de direção. As falas de Mariene estão longas demais e podem ser editadas sem prejuízo da espontaneidade da artista. Os solos dos convidados da estreia nacional de Tabaroinha também eram dispensáveis - uma vez que, desde o primeiro número, Mariene já botou o público carioca na (palma da) mão. A propósito, o bloco inicial - com A Pureza da Flor (Arlindo Cruz, Jr. Dom e Babi, 2006), A Filha do Mar (Flávia Wenceslau, 2010), Ilha de Maré (Walmir Lupa e Lima, 1977) e Falsa Baiana (Geraldo Pereira, 1944) - resultou irresistível, radiante. Mariene rodopiando em Ilha de Maré - com a barriga já proeminente da quarta gravidez - ao som da sanfona de Cícero Assis é cena memorável. Aliás, a cantora acerta ao recorrer volta e meia ao melhor repertório de Alcione. Roda Ciranda (Martinho da Vila, 1984), Na Paz de Deus (Arlindo Cruz, Beto Sem Braço e Sombrinha, 1986) e Não Deixe o Samba Morrer (Edson Conceição e Aluísio, 1975) são sambas que caem bem na voz vivaz dessa verdadeira baiana que sabe comandar a roda. Por isso mesmo, a presença opaca de Nelson Rufino em Amuleto da Sorte - o grande samba romântico que o compositor baiano forneceu para o CD Tabaroinha - acabou atrapalhando a interpretação de Mariene. Que pareceu mais à vontade, sozinha, em Guerreira (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1978), samba-título do álbum lançado por Clara Nunes (1942 - 1983) em 1978.
Sim, a luminosidade da saudosa Clara ecoa no canto de Mariene. Inclusive pelo apego de ambas as cantoras às tradições musicais afro-brasileiras. Seja como for, Clara é única, imortal, e Mariene de Castro tem sua própria identidade, construída na batida do samba do Recôncavo Baiano. É por isso que ela consegue pôr na mesma roda o ijexá Ponto de Nanã (Roque Ferreira, 2007) - com a apropriada citação do Cordeiro de Nanã (Tincoãs) - e um samba cheio de dengo como Não Vou Pra Casa (Antonio Almeida e Roberto Riberti, 1941), já revisitado com a habitual maestria por ninguém menos do que João Gilberto. Ninguém quer que a cantora vá para casa. Até porque, na parte final do roteiro, Mariene abre caminho para o repertório que já canta há anos em Salvador (BA) no projeto Santo de Casa. É a hora do pot-pourri de sambas de roda e de louvações aos orixás. E não é que Ogum (Claudemir e Marquinhos PQD, 2008), samba do repertório de Zeca Pagodinho, caiu muito bem no colo da verdadeira baiana? No bis, a belíssima e poética Prece de Pescador (Roque Ferreira e J. Velloso, 2004) reitera que Roque Ferreira reza pela cartilha musical de Caymmi. Já a evocação do refrão do politizado samba-rock (Cazuza, George Israel e Nilo Romero, 1987) soa deslocada e até despropositada. Mas não a ponto de diluir a impressão de que Mariene de Castro se consagrou em sua estreia nos palcos do Rio de Janeiro. O santo baixou forte no terreiro carioca como se o Rival fosse a sua casa...
Overdose de Mariene.
Eu tô quase virando um tabaroinho! :-)
"Já a evocação do refrão do politizado samba-rock (Cazuza, George Israel e Nilo Romero, 1987)".
Mauro, faltou o nome do samba-rock. Seria "Brasil"?
abraço,
Denilson
Será que esse show vem pra São Paulo? Há anos quero ver Mariene no palco e não tenho oportunidade... Vamos torcer. Valeu pela resenha, Mauro!
Grato, Denilson, por me alertar que tinha esquecido de escrever o título do samba-rock. Era o Brasil mesmo. Ju, não sei se o show chega em SP por ora. Abs, MauroF
Acho muito interessante essa necessidade de se visitar músicas já conhecidas do público. Praticamente todos os artistas da atualidade estão usando, espontaneamente ou não, esse recurso.
Parece-me que se trata mais de uma demanda do público, do que propriamente do artista.
Há pouco tempo assisti a uma entrevista do Ivan Lins, em que ele dizia que, na década de 70, se ele fizesse um show somente com músicas antigas, a plateia começava a vaiar ou a ir embora.
Eu, particularmente, não acho que cantar "Não Deixe o Samba Morrer", "Falsa Baiana", "O Que É O Que É" e "Brasil", músicas mais do que batidas, seja artisticamente interessante.
Sinal dos tempos? Não sei... Cada um tem seu gosto e interesse.
abração,
Denilson
Falou e disse, Carlos Eduardo!! A letra mais desprezada do tal ABC também tem seu valor e merecia essa deferência.
Quarta gravidez ? wow eita menina rápida heim ! Espertinha já ta criando seu backing vocal, daqui uns anos, o palco vai estar cheio de tabaroinhos ! hehe. Parabéns Mariene ! Saúde a todos eles !
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