Mauro Ferreira no G1

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domingo, 26 de agosto de 2012

Rodrigo Bittencourt expõe no álbum 'Casa Vazia' um refinado espaço interior

 Enquanto aguarda a estreia nos cinemas do primeiro longa-metragem que dirigiu, Totalmente inocentes, o cantor, compositor e cineasta carioca Rodrigo Bittencourt promove o terceiro álbum solo, Casa vazia, lançado neste mês de agosto de 2012. A convite do artista, o editor de Notas Musicais, Mauro Ferreira, escreveu um dos textos de apresentação - release, no jargão jornalístico - do disco produzido pelo guitarrista Pedro Sá. Eis - na íntegra - o release do álbum de Bittencourt:

O refinado espaço interior do artista

Rodrigo Bittencourt lança o terceiro  álbum solo, Casa vazia, gravado artesanalmente com produção de Pedro Sá

Se não tivesse virado clichê entre críticos caracterizar um disco ou filme como ‘íntimo e pessoal’, tais adjetivos seriam perfeitos para dar a pista de Casa vazia, quarto álbum - o terceiro solo - do cantor, compositor, cineasta e escritor carioca Rodrigo Bittencourt. Disponível para venda no iTunes a partir de setembro, em edição digital independente, Casa vazia é disco repleto de sentimentos e sons recolhidos no espaço interior do artista. Mas há um traço concreto e determinante na arquitetura artesanal de Casa vazia. Ao terminar um casamento de oito anos e meio, Rodrigo Bittencourt se viu a sós em todos os sentidos. Morar sozinho proporcionou um natural e inevitável mergulho interior que gerou o repertório inédito e autoral decorado em Casa vazia de forma despojada, sincera, verdadeira. No entanto, em seu bloco do eu sozinho, o artista se deixou acompanhar rotineiramente de dois músicos fundamentais na arrumação das onze músicas: Domenico Lancellotti e Pedro Sá, grifes da moderna música brasileira. Essa dupla deu um trato na cozinha de Casa vazia. Domenico entrou com os pratos (de personalíssima bateria) e com os sons de seu MPC. Celebrado pelo toque da guitarra, Sá tocou os baixos e assumiu a produção propriamente dita. Já o dono da casa se encarregou dos violões e do canto. Rubinho Jacobina cuidou das eventuais cordas enquanto Marcos Kuzka contribuiu com alguns objetos (piano, viola e wurlitzer) que fazem a diferença na decoração final. Já o toque feminino ficou por conta das participações da cantora e compositora Alexia Bomtempo (convidada em Agora e em Casa vazia, além de parceira do anfitrião em Till the end) e da atriz e cantora Mariana Rios (convidada de Pra não me machucar).

Na discografia solo de Rodrigo Bittencourt, Casa vazia sucede Mordida (2008). Se o disco anterior exteriorizou uma veia pop, já mostrando para quem quisesse ouvir que estamos diante de um dos grandes compositores de sua geração, Casa vazia esboça um movimento para dentro. É um (grande) disco interiorizado, confessional. E que, em direção própria, reitera a alta qualidade do repertório de Rodrigo Bittencourt, compositor que deu os primeiros passos no mercado fonográfico em 2003 com o lançamento de seu álbum de estreia Canção para ninar adulto e que começou a ser efetivamente notado, comentado e (mais) gravado quando Maria Rita abriu e batizou o terceiro álbum de estúdio, Samba meu (2007), com nome de composição de Bittencourt. A mesma música que reaparece cinco anos depois em Casa vazia no registro pessoal do autor.

Artista multimídia, Rodrigo Bittencourt construiu o repertório de Casa vazia com conexões com outras formas de arte. O próprio projeto gráfico de Flávio Soares dialoga de forma primorosa com o universo particular do disco. Pelas fotos do cantor e pelas imagens de objetos e cômodos dispostas ao longo do encarte, já é possível ter clara noção do espaço interior do artista na concepção das músicas e do disco propriamente dito. Rodrigo Bittencourt – para quem não sabe – também transita por outros caminhos artísticos. Cineasta em ascensão, Bittencourt já lançou quarto curtas de ficção e apresenta o primeiro longa-metragem, Totalmente inocentes, neste mesmo segundo semestre de 2012 em que Casa vazia chega ao mercado nas prateleiras virtuais das melhores casas do ramo digital. Como escritor, o múltiplo artista já contabiliza um romance adulto (Esmalte, de 2008) e um livro infantil (Ópera Brasil de embolada, 2010).

Casa vazia atesta a versatilidade de Rodrigo Bittencourt não somente por conta das conexões com outras formas de arte (várias imagens poéticas das letras, perdoem o clichê, são cinematográficas ou são poesia pura mesmo). O compositor revela facetas e influências novas. Afinal, Casa vazia habita um mundo musical totalmente diferente do último projeto fonográfico do artista, Quero ser cool, o irônico disco gravado e assinado por Bittencourt com o trio carioca Les Pops, projeto paralelo do artista. Aliás, um dos integrantes do Les Pops, Thiago Antunes, é o parceiro de Santinho, música que mostra que Rodrigo Bittencourt agora reza por outras cartilhas. Mas o único milagre em Casa vazia é o da inspiração do compositor. Todo o processo de gravação do disco foi feito de forma transparente, sem uso de autotunes e sem truques de estúdio. Eventuais sujeiras não foram empurradas para debaixo do tapete de Casa vazia. É por isso que tudo soa absolutamente limpo e aconchegante no disco, pequena obra-prima da cena indie nativa. Sim, Casa vazia é um disco íntimo e pessoal – ó santinho, me livra dos clichês – mas Rodrigo Bittencourt abre as janelas de seu mundo interior para os ouvintes. Entre sem bater. De certa forma, pelo tom universal das emoções e sentimentos expostos no cancioneiro confessional, Casa vazia é sua também.

Mauro Ferreira, Agosto de 2012

Casa vazia – Um olhar sobre cada cômodo

1. Agora (Rodrigo Bittencourt)
Invertendo posições na guerra dos sexos, é a fêmea que caça o macho desiludido e em fuga nos versos poéticos deste samba cool que expõe a maestria de Rodrigo Bittencourt como compositor. Alexia Bomtempo junta sua voz suave à do anfitrião de Casa vazia neste tema adornado com as cordas do quarteto orquestrado por Rubinho Jacobina.

2. Casa vazia (Rodrigo Bittencourt)
A faixa-título de Casa vazia exibe arquitetura sofisticada na construção do arranjo. Que reitera o significado da letra com pausas e silêncios, como os que interrompem a bela canção de ecos ruralistas após o verso ‘Pego um cigarro mentolado pra esperar’. Em contrapartida, o arranjo fica encorpado, com os vocais de Alexia Bomtempo, após o verso ‘Deixa a vida barulhar’. As cordas também pontuam os movimentos em que o personagem acorda para a vida.
3. From yourself (Rodrigo Bittencourt)
Música bilíngue, em português e em inglês, que sinaliza certa influência benéfica da arquitetura da obra de Caetano Veloso na construção do tema. Piano de clima bossa-novista, carioca, se faz ouvir na faixa que cita o Rio de Janeiro, cidade vazia de sentido sem a musa amada. Mas a praia é quase a do reggae em canção cuja fonte é a saudade.
4. Pra não me machucar (Rodrigo Bittencourt e Liah Soares)
A cantora e compositora Liah Soares é a partner autoral de Bittencourt nesta música gravada pelo cantor em dueto com a atriz e cantora Mariana Rios. A letra junta os cacos emocionais de um amor que chegou ao fim. É a faixa em que mais saltam aos ouvidos os barulhinhos bons do MPC e da bateria de Domenico Lancellotti. Pra não me machucar é canção que evolui para a levada do xote. Doídos pela separação, os amantes endurecem sem perder a ternura.
5. Macunaíma (Rodrigo Bittencourt)
Nosso herói solitário tritura antropofagicamente referências da brasilidade tupiniquim. Com as cordas dispostas de forma inventiva, a música reprocessa a cadência bonita do samba e outros toques da terra do axé, de Pelé, do apresentador Chacrinha (1917 – 1988) e do café. Uma música de espírito tropicalista, coerente com a obra de um compositor brasileiro, herói poeta que ri e que chora. E que prefere nossos sambistas....
6. Espresso (Rodrigo Bittencourt)
Espresso é a expressão italianada que designa o café nosso de cada dia corrido. A levada do violão de Rodrigo Bittencourt conduz esta faixa bilíngue que dialoga com o universo do folk rock. A letra é poesia pura, resistindo bem sem a música. O poeta bebe a vida como quer, sorvendo o mundo sem açúcar que foca com suas retinas cheias de sonhos.
7. Santinho (Rodrigo Bittencourt e Thiago Antunes)
A parceria de Bittencourt com Thiago Antunes – seu colega no carioca trio Les Pop – realça o canto em feitio de oração na exposição de letra em feitio de poesia. No caso, versos que remetem a um universo interiorano impregnado de religiosidade. Um mundo barroco se descortina enquanto o fiel apaixonado roga aos santos a volta da amada.
8. Morro bom (Rodrigo Bittencourt)
Neste dengo moderno, o anfitrião está com a casa e o coração abertos para a entrada da mulher amada. Faixa de tom aconchegante, Morro bom ressalta as linhas bem marcadas do baixo de Pedro Sá, condutor do tema.
9. Samba meu (Rodrigo Bittencourt)
Trata-se da única música de Casa vazia que já tinha registro em disco. No caso, um registro feito em 2007 por Maria Rita, que recorreu ao tema de Bittencourt para pedir a benção para passar para o lado do samba em seu terceiro CD. Na letra, o poeta pede ao samba a benção para passar a dor de amor. “Meu samba não despreza o esquisito / ... / Meu samba é de bossa e não de grito”, dão a pista certeira alguns versos do samba cool.
10. The river (Rodrigo Bittencourt)
Essa balada classuda, composta e gravada em inglês, é exemplo perfeito do caráter confessional que pauta o repertório de Casa vazia. O heroico poeta macunaímico se encontra à procura de sua garota, de Deus e, sobretudo, de si mesmo. Conduzida pelo violão de Bittencourt, a canção ganha denso registro de intensidade crescente.
11. Till the end (Rodrigo Bittencourt e Alexia Bomtempo)
No fim de um disco de concepção solitária, o anfitrião convida para um mergulho a dois, sem rede, nos sonhos e na vida. O instrumental sujo, indie, da música composta por Bittencourt com Alexia Bomtempo ganha pressão à medida em que Casa vazia se fecha, abrindo novas possibilidades de amar. (M.F.)

2 comentários:

Rafael disse...

Bem que ele poderia no mínimo vender no formato MP3 na net o primeiro disco dele, o "Canção Pra Ninar Adulto". Não consigo encontrar nenhuma informação sobre esse primeiro disco dele na net, muito menos um link para a compra do mesmo. Uma pena!!!

Rafael disse...

Não sei porque o dono do blog insiste em ficar postando release de disco com letra do tamanho de rodapé de comercial. Que porre isso!!!