Título: The Moon 1111
Artista: Otto
Gravadora: Deck
Cotação: * * * 1/2
"A gente pode ser feliz / Viver a vida sem sofrer...", conclui Otto através de verso de Donizete, autor de A Noite Mais Linda do Mundo, sucesso de Odair José em 1974, regravado pelo cantor e compositor pernambucano em seu sexto disco solo, The Moon 1111, cujo lançamento está agendado para 11 de novembro de 2012 - exatamente um ano após a previsão inicial - em edição da gravadora Deck. Sim, sob a luz pop de seu quinto álbum de estúdio, Otto já se permite momentos felizes. Disco produzido por Pupillo, The Moon 1111 ilumina o lado menos escuro da obra do artista, diluindo as sombras que dominaram o kafkiano Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009), o aclamado álbum anterior de Otto. A reverência com que o artista aborda o hit de Odair José - respeitando a arquitetura pop da melodia de Donizete - expõe o apego do artista ao cancioneiro popular nacional de aura kitsch, traço perceptível já na introdução do arranjo da primeira (ótima) música do CD, intitulada sintomaticamente Dia Claro (Otto, Pupillo e Dengue). Peça-chave de disco mais solar, Dia Claro mostra a capacidade de Otto de dialogar habilidosamente com o universo pop - qualidade reiterada em Ela Falava (Otto, Pupillo e Rogério Coelho), faixa já posta em circulação na rede pelo Natura Musical, projeto que viabilizou com patrocínio a realização do disco gravado entre Olinda (PE), Recife (PE) e São Paulo (SP) com músicos de ponta como Donatinho (nos teclados), Fernando Catatau (nas guitarras presentes em oito das dez músicas), Kassin (no baixo) e Lincoln Olivetti (em múltiplos teclados). Gravada com a adesão da voz discreta de Tainá Muller, Ela Falava faz ressoar ecos do tecnopop dos anos 80, sinalizando que The Moon 1111 é disco que soa mais palatável na prática do que na teoria. Em tese influenciado por Guy Montag, personagem do filme Farenheit 451 (1966), do cineasta francês François Truffaut (1932 - 1984), o CD propõe a interação da música brasileira com a psicodelia arquitetada pelo grupo inglês Pink Floyd na sua obra-prima The Dark Side of Moon (1973). A rigor, tal convívio se concretiza com inspiração somente na faixa-título The Moon 1111 (Otto, Pupillo, Fernando Catatau e Dengue), de tom afro-progressivo. É quando aparecem ecos do som do compositor e músico nigeriano Fela Kuti (1938 - 1997), referência explicitada por Otto ao anunciar o conceito do disco há quase dois anos. HDeus (Otto, Pupillo, Kassin e Fernando Catatau) também bebe na fonte psicodélica, mas é a típica faixa em que a sonoridade parece mais interessante do que a música em si. Conceitos à parte, os momentos felizes dominam o álbum. Em clima de tecnomacumba, Exu Parade (Otto, Fernando Catatau e Pupillo) propõe a festa afro-brasileira em sincretismo musical que une o sagrado com o profano. A citação recorrente do verso "Chupa que É de Uva" - menção a um hit vulgar da axé music - está em sintonia erótica com o tom de DP (Otto, Kassin, Fernando Catatau e Pupillo), faixa menos sedutora que alude no título à dupla penetração. Mais convidativa, a trama de tambores que sustenta Selvagens Olhos, Nego! (Otto e Pupillo) - tema composto em tributo ao rapper paulista Sabotage (1973 - 2003) e gravado com a participação da cantora Luê Soares - desencava a raiz afro-percussiva da obra de Otto. Traço ainda mais iluminado por The Moon 1111 na faixa Miss Apple e Zé Pilantra (Otto, Fernando Catatau e Pupillo), cuja percussão é urdida pelas batidas dos pés dos integrantes do Balé Afro Magê Molê no chão, captadas na periferia de Olinda (PE). Balada encorpada com cordas, O Que Dirá o Mundo (Otto, Lirinha e Pupillo) deixa entrever que as nuvens negras de Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009) não se dissiparam de todo. "Eu divido contigo minha angústia e o meu pão", propõe Otto em verso da letra escrita com Lirinha. As sombras persistem, mas The Moon 1111 dribla o lado escuro da lua/vida e deixa explícito que Otto já se permite viver dias mais claros e acordar de sonhos mais tranquilos, certo de que - como sentencia ao recordar o irresistível sucesso popular do cantor Odair José - "o que existe na vida são momentos felizes".
14 comentários:
"A gente pode ser feliz / Viver a vida sem sofrer...", conclui Otto através de verso de Donizete, autor de A Noite Mais Linda do Mundo, sucesso de Odair José em 1974, regravado pelo cantor e compositor pernambucano em seu sexto disco solo, The Moon 1111, cujo lançamento está agendado para 11 de novembro de 2012 - exatamente um ano após a previsão inicial - em edição da gravadora Deck. Sim, sob a luz pop de seu quinto álbum de estúdio, Otto já se permite momentos felizes. Disco produzido por Pupillo, The Moon 1111 ilumina o lado menos escuro da obra do artista, diluindo as sombras que dominaram o kafkiano Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009), o aclamado álbum anterior de Otto. A reverência com que o artista aborda o hit de Odair José - respeitando a arquitetura pop da melodia de Donizete - expõe o apego do artista ao cancioneiro popular nacional de aura kitsch, traço perceptível já na introdução do arranjo da primeira (ótima) música do CD, intitulada sintomaticamente Dia Claro (Otto, Pupillo e Dengue). Peça-chave de disco mais solar, Dia Claro mostra a capacidade de Otto de dialogar habilidosamente com o universo pop - qualidade reiterada em Ela Falava (Otto, Pupillo e Rogério Coelho), faixa já posta em circulação na rede pelo Natura Musical, projeto que viabilizou com patrocínio a realização do disco gravado entre Olinda (PE), Recife (PE) e São Paulo (SP) com músicos de ponta como Donatinho (nos teclados), Fernando Catatau (nas guitarras presentes em oito das dez músicas), Kassin (no baixo) e Lincoln Olivetti (em múltiplos teclados). Gravada com a adesão da voz discreta de Tainá Muller, Ela Falava faz ressoar ecos do tecnopop dos anos 80, sinalizando que The Moon 1111 é disco que soa mais palatável na prática do que na teoria. Em tese influenciado por Guy Montag, personagem do filme Farenheit 451 (1966), do cineasta francês François Truffaut (1932 - 1984), o CD propõe a interação da música brasileira com a psicodelia arquitetada pelo grupo inglês Pink Floyd na sua obra-prima The Dark Side of Moon (1973). A rigor, tal convívio se concretiza com inspiração somente na faixa-título The Moon 1111 (Otto, Pupillo, Fernando Catatau e Dengue), de tom afro-progressivo. É quando aparecem ecos do som do compositor e músico nigeriano Fela Kuti (1938 - 1997), referência explicitada por Otto ao anunciar o conceito do disco há quase dois anos. HDeus (Otto, Pupillo, Kassin e Fernando Catatau) também bebe na fonte psicodélica, mas é a típica faixa em que a sonoridade parece mais interessante do que a música em si.
Conceitos à parte, os momentos felizes dominam o álbum. Em clima de tecnomacumba, Exu Parade (Otto, Fernando Catatau e Pupillo) propõe a festa afro-brasileira em sincretismo musical que une o sagrado com o profano. A citação recorrente do verso "Chupa que É de Uva" - menção a um hit vulgar da axé music - está em sintonia erótica com o tom de DP (Otto, Kassin, Fernando Catatau e Pupillo), faixa menos sedutora que alude no título à dupla penetração. Mais convidativa, a trama de tambores que sustenta Selvagens Olhos, Nego! (Otto e Pupillo) - tema composto em tributo ao rapper paulista Sabotage (1973 - 2003) e gravado com a participação da cantora Luê Soares - desencava a raiz afro-percussiva da obra de Otto. Traço ainda mais iluminado por The Moon 1111 na faixa Miss Apple e Zé Pilantra (Otto, Fernando Catatau e Pupillo), cuja percussão é urdida pelas batidas dos pés dos integrantes do Balé Afro Magê Molê no chão, captadas na periferia de Olinda (PE). Balada encorpada com cordas, O Que Dirá o Mundo (Otto, Lirinha e Pupillo) deixa entrever que as nuvens negras de Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009) não se dissiparam de todo. "Eu divido contigo minha angústia e o meu pão", propõe Otto em verso da letra escrita com Lirinha. As sombras persistem, mas The Moon 1111 dribla o lado escuro da lua/vida e deixa explícito que Otto já se permite viver dias mais claros e acordar de sonhos mais tranquilos, certo de que - como sentencia ao recordar o irresistível sucesso popular do cantor Odair José - "o que existe na vida são momentos felizes".
Esperava algo + pinkfloydiano do que a música posta em circulação de tom tecnopop oitentista (que vem sendo a tônica desse surto estranho de alegria que a música está tomando de Goldfrapp a Keren Ann e Cat Power...)
Gostei muito das reflexões existenciais do "Certa manhã..." se for um disco muito 'pop-alegrezinho' acho que não vou gostar tanto...
Finalmente esse disco está sendo lançado!!! Depois de mais de 1 ano de espera, ufa!!! Pensei que Otto já havia desistido de ser cantor.
Ancioso!!!
Sou grande fã do Otto.
Acho-o um artista - na acepção da palavra.
Esperava, e espero, muito desse disco, mas confesso que achei "Ela Falava" pra lá de broxante.
Bem, ouvi duas vezes e com som de laptop... Vai que em um som decente se revela outra coisa.
Enfim, tomara que o resto do disco seja bem melhor.
Concordo plenamento com Lurian e Zé Henrique. Otto disse tanto das influências de Pink Floyd, Fela, John Coltrane... Não esp-erava nunca uma "Ela Falava" no repertório de disco novo. Bem broxante...
Pela crítica acima, me parece o disco mais comercial de Otto...
Esperava um Condon Black + Pink Floyd e etc...
Estava ansioso por alguma critica que me fizesse querer ouvir o disco depois da decepção de 'Ela Falava'. Tenho certeza que a entrada da Natura no patrocínio fez muita coisa mudar no disco, que era anunciado antes como psicodélico e de "raiz". "Ela falava" soa interessante nos 2 primeiros minutos mas fica cansativa e fraca nos demais. Otto não é pop. Ele caminha bem entre o conservador e o ousado. Voltou a minha curiosidade em ouvir o esperado The Moon 1111.
Zé, Silvan, Victor: "Ela Falava" não dá o tom exato do disco. O CD é mais pop e solar, sim, mas vai muito além do som dessa música escolhida por ser uma das faixas com maior potencial comercial do álbum (embora "Dia Claro" na minha visão seja melhor nesse sentido).
abs, MauroF
Com esse lançamento de Otto, chega-se a marca de 135 CDs lançados por artista pernambucano em 2012.
Pois é, Mauro, tomara que esse "vai muito além dessa música" salve o disco.
Realmente, Silvan, quando se fala em influências como Fela Kuti, Pink Floyd e Coltrane se espera, no mínimo, alguma tentativa de algo bem mais instigante.
Talvez o Victor esteja certo, a Natura meteu o dedinho cheio de creminho no disco.
Acho uma bobeira sem fim essa ânsia de querer ser pop a custo de diluir o som.
Ainda mais o Otto que tinha se reerguido na carreira sem apelar para o pop.
Nada contra o pop, tem seu valor, claro. Mas sempre acho um desperdício artistas que podem ir bem além dele se renderem ao fácil.
Ahh, essa música do Odair é lindinha, foi um acerto tal escolha. Embora esteja virando fórmula para o Otto pegar um breguinha pra gravar em seus discos.
Esse Caetano é de lascar, tá em todas.
PS: Quantidade quase nunca anda junto de qualidade. Nem em Pernambuco. Pasmem. :-)
Ahh, a capa deu uma chupadinha nessa daqui, ó:
http://www.allmusic.com/album/le-voyage-dans-la-lune-a-trip-to-the-moon-mw0002278193
Obrigado, Mauro. Com certeza terei esse disco - ainda que 'alegre' e 'solar' (inverso do 'certas manhãs').
Tem a lista de faixas?
Abraço
Também gostaria de saber a relação de faixas desse disco. Em nenhum site da net encontrei tal informação. E o que é mais estranho é que nenhuma loja virtual está vendendo desde já esse disco.
Postar um comentário