Resenha de show
Projeto: Ouve.Aí
Título: Placebo
Artista: João Cavalcanti (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Oi Futuro Ipanema (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 20 de novembro de 2012
Cotação: * * * 1/2
Ao fechar o bis da segunda apresentação de seu show solo Placebo no Rio de Janeiro (RJ), feita dentro do projeto Ouve.Ai do Oi Futuro Ipanema, João Cavalcanti avisou ao público que iria tocar música de artista que o influencia desde o início de sua formação musical, "desde a mais tenra idade". Na sequência, a banda esboçou riff de música de Lenine, pai do cantor e compositor carioca, mas era pegadinha. Cavalcanti encerrou então o show com o rock Smells Like Teen Spirit (Kurt Cobain, Dave Grohl e Krist Novoselic, 1991), o hino do Nirvana, pedra fundamental da era grunge. Enfim com disco solo, efeito de seu crescente destaque como compositor no grupo carioca de samba Casuarina, Cavalcanti concilia referências e influências no tom indie do show Placebo. O samba está presente no roteiro, evocado no ritmo da música-título Placebo (João Cavalcanti, 2012), na abordagem nervosa d'O Ronco da Cuíca (João Bosco e Aldir Blanc, 1976) e na negritude de Mulato (João Cavalcanti, 2012). Mas não está no centro da roda. Tal como o disco Placebo, recém-lançado pela Warner Music, o show homônimo extrapola ritmos ao firmar a assinatura de Cavalcanti como compositor. Em cena, Cavalcanti processa a (ótima) influência natural de Lenine - perceptível tanto no pancadão funkeado Inemurchecível (João Cavalcanti, 2012) como no batuque da inédita Valsa do Baque Virado, parceria de Cavalcanti com Mario Adnet - sem se prender a ela. A rigor, o mais forte traço familiar do show é o do hypado mano Bruno Giorgi, piloto do P.A. e dos samplers que turbinam o repertório com efeitos eletrônicos, mote da cibernética Binário (João Cavalcanti e Diego Zangado, 2012). Fora da roda do samba, o artista surpreende ao se revelar mais seguro como cantor e ao se permitir ousadias estilísticas como diluir a aura roqueira de Me Adora (Pitty, 2009) para deixar (ainda mais) evidente a irresistível melodia pop de Pitty que rendeu à roqueira baiana o seu maior sucesso popular. A afiada banda - formada por Diego Zangado (bateria e percussão), Nelson Freitas (acordeom e - arrasadores - teclados), Pedro Costa (viola, violões e guitarra) e Yuri Pimentel (baixo) - executa bem os arranjos que valorizam músicas como o tango Demônios (João Cavalcanti e Marcelo Caldi, 2012) e o rock Síndrome (João Cavalcanti, 2012). Climática, Luna (João Cavalcanti, 2012) - a canção em tese mais pop do repertório autoral do artista, não por acaso repetida no início do bis - alinha versos poliglotas que expõem a poesia contemporânea que também ilumina a valsa Em Tempo (João Cavalcanti, 2012). Se Morena (Tom Zé, 1978) tem tempero nordestino que se afina com o Frevo do Contra-Êxodo (João Cavalcanti, 2012), reminiscência da vivência do artista no Recife (PE), Eco (Jorge Drexler, 2004) ressoa com algo de latin jazz no toque dos teclados de Nelson Freitas. Enfim, o show Placebo firma João Cavalcanti como artista solo. No centro do palco e da cena, o cantor ainda deixa entrever nas falas e nos gestos certa insegurança típica de quem ainda não está acostumado a ficar sozinho sob os holofotes. Contudo, musicalmente, o show já se mostra azeitado. Aliadas ao bom repertório autoral do CD Placebo, as complementações poéticas - termo usado por Cavalcanti em cena - do roteiro ajudam a montar painel de múltiplas referências que clareia a identidade do artista e o ajuda a pavimentar seu caminho individual fora do samba, mas (também) com o samba. O efeito vai ser sentido a médio prazo.