sábado, 3 de novembro de 2012

Do samba ao funk, Olimpo Carioca traça a beleza, o caos e os sons do Rio

Resenha de musical
Título: A Revista do Ano - O Olimpo Carioca
Texto: Tânia Brandão
Direção: Sérgio Módena
Direção musical: Marco Pereira
Elenco: Alcemar Vieira, Ana Carbatti, Ana Velloso, Celso Andre, Cilene Guedes,
           Édio Nunes, Helga Nemecyzk, Marcelo Capobiango, Mona Vilardo, Marta
           Metzler, Milton Filho, Rogério Freitas, Stela Maria Rodrigues, Thiago Pach
           e Vera Novello
Músicos: Carlos Cesar Motta (bateria), Firmino (percussão), Humberto Araújo (sax
           e flauta), Itamar Assiere (teclados), Nando Duarte (violão e guitarra), Pedro
           Mann (baixo) e Ricardo Rente (sax e flauta)
Foto: Guga Melgar
Cotação: * * * 
Em cartaz no Teatro Clara Nunes, no Rio de Janeiro (RJ), de quinta-feira a domingo

Ao revitalizar no espetáculo musical Olimpo Carioca o teatro de revista, mais especificamente a Revista de Ano, gênero entronizado na cena carioca ainda no século XIX pelo seminal dramaturgo brasileiro Artur Azevedo (1855 - 1908), a dramaturga e historiadora Tânia Brandão se vale da principal arma da revista - o humor cáustico - para mapear a beleza, o caos e os sons do Rio de Janeiro (RJ). Sob a direção musical do violonista Marco Pereira, Olimpo Carioca expõe a diversidade da trilha sonora de uma cidade partida em  facções musicais. Do samba-canção Copacabana (obra-prima de João de Barro - o Braguinha - com Alberto Ribeiro, erroneamente creditada a Tom Jobim  no programa da peça) ao Funk do Bueiro (MC Cezinha da Lapa), passando pelo empolgante samba-enredo Peguei Um Ita no Norte (Demá Chagas, Arizão, Bala, Guaracy e Celso Trindade), a revista musical traça painel vivaz da sonoridade carioca em  números costurados com a crítica mordaz da autora ao caos da saúde carioca e a controvertidas decisões políticas que envolvem o cotidiano da cidade, casos da Lei Seca (personificada por Vera Novello) e da intenção ainda não concretizada de extinguir a Perimetral (avenida encarnada em cena por Ana Carbatti num dos momentos em que o humor e a crítica resultam mais eficientes). Sob a direção de Sérgio Módena, hábil ao ressaltar na encenação o tom popular e ácido do texto, Olimpo Carioca brinca com signos da mitologia grega em enredo estruturado a partir da vinda dos deuses Hefaísto (Rogério Freitas), Dionísio (Alcemar Vieira) e Mulher Labareda (Helga Nemeczyk) para o Rio de Janeiro (RJ). O início do espetáculo ainda precisa ter seu ritmo ajustado, pois a breve apresentação da trama dá a impressão de ser mais longa do que realmente é. Contudo, a revista engrena a partir da chegada dos deuses à cidade maravilha descrita com precisão por Fernanda Abreu, Fausto Fawcett e Carlos Laufer na letra do samba-funk Rio 40º, clássico contemporâneo entrelaçado no apoteótico pot-pourri final com temas emblemáticos do espírito e da geografia da cidade como o samba Aquele Abraço (Gilberto Gil) e o funk Do Leme ao Pontal (Tim Maia). Perdido na cidade, o trio purga pecados entre a beleza e o caos do Rio. É da perplexidade dos deuses gregos com os códigos particulares da cidade que Tânia Brandão extrai o humor e faz suas críticas incisivas. Diplomado na escola informal dos musicais brasileiros, o elenco entra no espírito da revista e garante o riso em vários momentos. Ana Velloso está especialmente impagável como a colombiana incapaz de absorver as regras de coleta do lixo. Milton Filho se comunica de imediato com a plateia pela composição escrachada de Escândalo, símbolo da imprensa marrom que mancha o jornalismo carioca. Já Édio Nunes mostra toda sua ginga ao interpretar Malandro Não Vacila (Julinho), samba propagado na voz de Bezerra da Silva (1927 - 2005). Do terreiro (Benguelê, de Pixinguinha e Gastão Vianna) ao Carnaval (representado por pot-pourri de marchinhas turbinadas com paródias inéditas de tom corrosivo), Olimpo Carioca alfineta e simultaneamente exalta o Rio ao passar em revista o mapa sócio-musical da cidade. Com o auxílio de bons instrumentistas, os números musicais resultam sedutores em sua maior parte. O samba Eu Vou pra Lapa (Serginho Meriti e Claudinho Guimarães) merece menção especial por resultar mais bonito do que na gravação de Alcione. Já o afro-samba Labareda (Baden Powell e Vinicius de Moraes) pode arder em chama mais alta. No todo, o saldo teatral e musical é positivo. O canto crítico da cidade ressoa com força suficiente para dar novo fôlego a um gênero que já parecia confinado a uma cena do passado, mas que ainda pode soar atual.

5 comentários:

  1. Ao revitalizar no espetáculo musical Olimpo Carioca o teatro de revista, mais especificamente a Revista de Ano, gênero entronizado na cena carioca ainda no século XIX pelo seminal dramaturgo brasileiro Artur Azevedo (1855 - 1908), a dramaturga e historiadora Tânia Brandão se vale da principal arma da revista - o humor cáustico - para mapear a beleza, o caos e os sons do Rio de Janeiro (RJ). Sob a direção musical do violonista Marco Pereira, Olimpo Carioca expõe a diversidade da trilha sonora de uma cidade partida em facções musicais. Do samba-canção Copacabana (obra-prima de João de Barro - o Braguinha - com Alberto Ribeiro, erroneamente creditada a Tom Jobim no programa da peça) ao Funk do Bueiro (MC Cezinha da Lapa), passando pelo empolgante samba-enredo Peguei Um Ita no Norte (Demá Chagas, Arizão, Bala, Guaracy e Celso Trindade), a revista musical traça painel vivaz da sonoridade carioca em números costurados com a crítica mordaz da autora ao caos da saúde carioca e a controvertidas decisões políticas que envolvem o cotidiano da cidade, casos da Lei Seca (personificada por Vera Novello) e da intenção ainda não concretizada de extinguir a Perimetral (avenida encarnada em cena por Ana Carbatti num dos momentos em que o humor e a crítica resultam mais eficientes). Sob a direção de Sérgio Módena, hábil ao ressaltar na encenação o tom popular e ácido do texto, Olimpo Carioca brinca com signos da mitologia grega em enredo estruturado a partir da vinda dos deuses Hefaísto (Rogério Freitas), Dionísio (Alcemar Vieira) e Mulher Labareda (Helga Nemeczyk) para o Rio de Janeiro (RJ). O início do espetáculo ainda precisa ter seu ritmo ajustado, pois a breve apresentação da trama dá a impressão de ser mais longa do que realmente é. Contudo, a revista engrena a partir da chegada dos deuses à cidade maravilha descrita com precisão por Fernanda Abreu, Fausto Fawcett e Carlos Laufer na letra do samba-funk Rio 40º, clássico contemporâneo entrelaçado no apoteótico pot-pourri final com temas emblemáticos do espírito e da geografia da cidade como o samba Aquele Abraço (Gilberto Gil) e o funk Do Leme ao Pontal (Tim Maia). Perdido na cidade, o trio purga pecados entre a beleza e o caos do Rio. É da perplexidade dos deuses gregos com os códigos particulares da cidade que Tânia Brandão extrai o humor e faz suas críticas incisivas. Diplomado na escola informal dos musicais brasileiros, o elenco entra no espírito da revista e garante o riso em vários momentos. Ana Velloso está especialmente impagável como a colombiana incapaz de absorver as regras de coleta do lixo. Milton Filho se comunica de imediato com a plateia pela composição escrachada de Escândalo, símbolo da imprensa marrom que mancha o jornalismo carioca. Já Édio Nunes mostra toda sua ginga ao interpretar Malandro Não Vacila (Julinho), samba propagado na voz de Bezerra da Silva (1927 - 2005). Do terreiro (Benguelê, de Pixinguinha e Gastão Vianna) ao Carnaval (representado por pot-pourri de marchinhas turbinadas com paródias inéditas de tom corrosivo), Olimpo Carioca alfineta e simultaneamente exalta o Rio ao passar em revista o mapa sócio-musical da cidade. Com o auxílio de bons instrumentistas, os números musicais resultam sedutores em sua maior parte. O samba Eu Vou pra Lapa (Serginho Meriti e Claudinho Guimarães) merece menção especial por resultar mais bonito do que na gravação de Alcione. Já o afro-samba Labareda (Baden Powell e Vinicius de Moraes) pode arder em chama mais alta. No todo, o saldo teatral e musical é positivo. O canto crítico da cidade ressoa com força suficiente para dar novo fôlego a um gênero que já parecia confinado a uma cena do passado, mas que ainda pode soar atual.

    ResponderExcluir
  2. Oi Mauro, obrigada pela critica!
    Fazemos parte do elenco também ok?
    Mona Vilardo, Cilene Guedes e Thiago Pache!
    Obrigada e um abraço!

    ResponderExcluir
  3. Tem razão, Mona. Os nomes de vocês três já estão devidamente incluídos no cabeçalho da resenha. Abs, MauroF

    ResponderExcluir
  4. sendo tão carioca assim é capaz desse musical não chegar aqui em sp

    ResponderExcluir
  5. Bem que esse musical poderia vir para BH. Iria adorar vê-lo!

    ResponderExcluir

Este é um espaço democrático para a emissão de opiniões, sobretudo as divergentes. Contudo, qualquer comentário feito com agressividade ou ofensas - dirigidas a mim, aos artistas ou aos leitores do blog - será recusado. Grato pela participação, Mauro Ferreira

P.S.: Para comentar, é preciso ter um gmail ou qualquer outra conta do google.

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.