Afastado do mercado fonográfico desde 2007, Nico Rezende volta ao disco com Piano & Voz. A convite do artista, assino o texto de apresentação do CD - release no jargão jornalístico - em que enfatizo a forte presença do cantor e compositor na história do pop da década de 80.
A essência da obra de Nico Rezende
É impossível escrever a história do pop brasileiro dos anos 80 sem
tocar algumas vezes no nome do cantor, compositor, músico e arranjador Nico
Rezende. Em 1987, uma bonita balada intitulada Esquece e Vem liderou por
semanas consecutivas as paradas radiofônicas nacionais. Era a canção que
promovia Nico Rezende, primeiro álbum do artista, que naquele ano de 1987
dava início à sua carreira fonográfica, no rastro do sucesso retumbante de
músicas de sua autoria nas vozes de cantores como Ritchie (Transas,
megahit em 1986) e Zizi Possi (Perigo e Noite, sucessos em 1986 e
1987, respectivamente). Foi quando o Brasil começou a associar o nome de Nico
Rezende à sua música e à sua imagem. Decorridos 25 anos daquela explosão
nacional, o artista – nascido em São Paulo (SP) com o nome de Antonio Martins
Correa Filho – festeja essa data redonda com uma volta à essência dessa obra
fundamental no pop brasileiro. Oitavo título da discografia de Nico, o CD
Piano & Voz - que originou show que já vem sendo feito pelo
cantor Brasil afora no mesmo formato minimalista do disco - reduz
intencionalmente o cancioneiro do compositor à sua bela essência melódica e
harmônica.
Sintomaticamente, a música que promove Piano & Voz
nas rádios e na internet é Esquece e Vem, a mesma canção que impulsionou
o sucesso do álbum de 1987, agora apresentada às novas gerações da forma como
veio ao mundo. É como se Piano & Voz fechasse o ciclo iniciado
com Nico Rezende em 1987 e abrisse outras portas e caminhos para a música
do artista, que iniciou sua carreira tocando nos bailes da vida até migrar para
o Rio de Janeiro (RJ) no início dos anos 80, onde firmou parcerias (com Antônio
Cícero, Jorge Salomão, Marina Lima e Paulinho Lima, entre outros nomes de peso)
e trabalhou como músico e arranjador de uma verdadeira constelação, ajudando a
dar forma a gravações de estrelas como Gal Costa, Lulu Santos e Roberto Carlos,
somente para citar alguns nomes mais reluzentes.
Por ser músico de sólida formação (estudou violão e o piano que dá
base a esse atual disco de caráter retrospectivo), Nico Rezende – vale ressaltar
– nunca limitou sua carreira ao ofício de cantor. Entre um disco e outro (o
último, Paraíso Invisível, foi lançado em 2007), o artista continuou
trabalhando no mercado publicitário, criando jingles e trilhas sonoras
com o conhecimento musical que pauta a arquitetura das 12 canções reunidas em
Piano & Voz. E, nesse tempo em que conquistou prêmios no ramo
da publicidade, não deixou de abrir parcerias que renovaram sua vigorosa obra
autoral. Uma delas foi com Jorge Vercillo, parceiro de Nico em Signo de
Ar, tema que deu título ao álbum lançado por Vercillo em 2005. Se o registro
de Vercillo deu tratamento pop à música, a gravação de Nico expõe de forma mais
clara o desenho melódico da canção. “O que mais admiro na composição e na
música é a simplicidade”, resume Nico no breve texto que escreveu para o
encarte do CD Piano & Voz.
Simplicidade e sensibilidade dão o tom de Presente de Deus,
única das 12 músicas de Piano & Voz assinada somente por Nico
Rezende, sem parceiros. Nem teria como ser diferente, já que a canção trata de
tema íntimo e pessoal, impossível de ser traduzido em versos por qualquer
parceiro: a felicidade do artista com a chegada ao mundo de sua filha Jade,
saudada na música.
Em sua essência, Piano & Voz cumpre a missão de
resumir a obra fonográfica do cantor, compositor e músico paulista. De 1987 para
cá, o artista já lançou os discos Nico Rezende (Warner Music, 1987),
Jogo de Ilusões (Warner Music, 1988), Nico (Warner Music, 1989),
Tudo Ficou pra Trás (Esfinge, 1991), Nico Rezende (Luz da Cidade,
1995), Curta a Vida (Som Livre, 2001) e Paraíso Invisível (Lua
Music, 2007). Nesses álbuns, o artista deu voz a músicas que nada ficam a dever
a seus maiores sucessos. Músicas que não tiveram a devida projeção na época de
seu lançamento, mas que ganham uma segunda chance em Piano &
Voz. São os casos de Movimentos Raros – parceria de Nico com
Sérgio Serra, lançada em 1989 no álbum Nico e revivida com scats
em Piano & Voz – e de Alto Mar, balada composta com
Claudio Rabello, gravada originalmente para o pouco ouvido álbum Nico
Rezende (1995), de onde Piano & Voz também repagina
Noves Fora, parceria de Nico com o poeta Sérgio
Natureza.
Mesmo músicas que tocaram bastante em seus registros originais vão
soar como novas para gerações que vieram ao mundo anos depois. Penso Nisso
Amanhã – a balada que promoveu o segundo álbum de Nico, Jogo de
Ilusões – foi hit em 1988, mas tem tudo para ser sucesso novamente em 2012
ou em 2013 se veiculada nas rádios ou na internet. Penso Nisso Amanhã é
um exemplo claro da habilidade de Nico Rezende para desbravar belos caminhos
melódicos, dialogando com o universo da música romântica sem nunca resvalar para
o sentimentalismo ou para os clichês da música brega.
Foi essa habilidade pop que seduziu até a exigente Marina Lima,
parceira de Nico e do poeta Antonio Cícero (irmão da cantora) em Por
Querer, música que inspirou o título do álbum Todas, lançado por
Marina em 1985, e que por essa razão também é conhecida pelo nome de
Todas. Por Querer figura no repertório de Piano &
Voz ao lado de PseudoBlues, parceria de Nico com outro poeta,
Jorge Salomão, que abriu o álbum Virgem, lançado por Marina em 1987, ano
em que Nico Rezende dominou as paradas como cantor e as fichas técnicas de
discos do pop brasileiro como compositor em reinado que começara, a rigor, em
1986, quando Zizi Possi alcançou grande repercussão com a gravação de
Perigo, balada composta por Nico com Paulinho Lima (o parceiro mais
constante) e propagada em escala nacional na trilha sonora da segunda versão da
novela Selva de Pedra, exibida pela TV Globo naquele ano de 1986 em que o
inglês Ritchie – então tido como carta fora do jogo da indústria fonográfica –
deu a volta por cima, em lance surpreendente, ao dar voz a Transas, outra
parceria de Nico com Paulinho Lima, sensível ao traduzir nos versos uma
insatisfação com a liberação sexual vigente na década.
Enfim, Piano & Voz é o resumo feliz e harmonioso de
obra que resiste ao tempo. Formatado somente com o piano e a voz afinada do
cantor, esse cancioneiro pop e melodioso expõe o talento de um artista que
contribuiu de forma substancial para a construção da identidade da canção pop
nacional.
Mauro Ferreira / Novembro de 2012
Mauro Ferreira / Novembro de 2012
2 comentários:
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Há tanto tempo que não tinha notícias do ótimo cantor e compositor Nico Rezende. Fico feliz em saber que ele está retornando com força total aos discos. Gosto muito das suas canções e um cantor como ele não deveria nunca deixar de tocar nas rádios, tV's e mais diversos meios de comunicação.
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