Mauro Ferreira no G1

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sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Hitmaker dos anos 80, Nico desnuda cancioneiro autoral em 'Piano & Voz'

Afastado do mercado fonográfico desde 2007, Nico Rezende volta ao disco com Piano & Voz. A convite do artista, assino o texto de apresentação do CD - release no jargão jornalístico - em que enfatizo a forte presença do cantor e compositor na história do pop da década de 80.

A essência da obra de Nico Rezende

É impossível escrever a história do pop brasileiro dos anos 80 sem tocar algumas vezes no nome do cantor, compositor, músico e arranjador Nico Rezende. Em 1987, uma bonita balada intitulada Esquece e Vem liderou por semanas consecutivas as paradas radiofônicas nacionais. Era a canção que promovia Nico Rezende, primeiro álbum do artista, que naquele ano de 1987 dava início à sua carreira fonográfica, no rastro do sucesso retumbante de músicas de sua autoria nas vozes de cantores como Ritchie (Transas, megahit em 1986) e Zizi Possi (Perigo e Noite, sucessos em 1986 e 1987, respectivamente). Foi quando o Brasil começou a associar o nome de Nico Rezende à sua música e à sua imagem. Decorridos 25 anos daquela explosão nacional, o artista – nascido em São Paulo (SP) com o nome de Antonio Martins Correa Filho – festeja essa data redonda com uma volta à essência dessa obra fundamental no pop brasileiro. Oitavo título da discografia de Nico, o CD Piano & Voz - que originou show que já vem sendo feito pelo cantor Brasil afora no mesmo formato minimalista do disco - reduz intencionalmente o cancioneiro do compositor à sua bela essência melódica e harmônica.

Sintomaticamente, a música que promove Piano & Voz nas rádios e na internet é Esquece e Vem, a mesma canção que impulsionou o sucesso do álbum de 1987, agora apresentada às novas gerações da forma como veio ao mundo. É como se Piano & Voz fechasse o ciclo iniciado com Nico Rezende em 1987 e abrisse outras portas e caminhos para a música do artista, que iniciou sua carreira tocando nos bailes da vida até migrar para o Rio de Janeiro (RJ) no início dos anos 80, onde firmou parcerias (com Antônio Cícero, Jorge Salomão, Marina Lima e Paulinho Lima, entre outros nomes de peso) e trabalhou como músico e arranjador de uma verdadeira constelação, ajudando a dar forma a gravações de estrelas como Gal Costa, Lulu Santos e Roberto Carlos, somente para citar alguns nomes mais reluzentes.

Por ser músico de sólida formação (estudou violão e o piano que dá base a esse atual disco de caráter retrospectivo), Nico Rezende – vale ressaltar – nunca limitou sua carreira ao ofício de cantor. Entre um disco e outro (o último, Paraíso Invisível, foi lançado em 2007), o artista continuou trabalhando no mercado publicitário, criando jingles e trilhas sonoras com o conhecimento musical que pauta a arquitetura das 12 canções reunidas em Piano & Voz. E, nesse tempo em que conquistou prêmios no ramo da publicidade, não deixou de abrir parcerias que renovaram sua vigorosa obra autoral. Uma delas foi com Jorge Vercillo, parceiro de Nico em Signo de Ar, tema que deu título ao álbum lançado por Vercillo em 2005. Se o registro de Vercillo deu tratamento pop à música, a gravação de Nico expõe de forma mais clara o desenho melódico da canção. “O que mais admiro na composição e na música é a simplicidade”, resume Nico no breve texto que escreveu para o encarte do CD Piano & Voz.

Simplicidade e sensibilidade dão o tom de Presente de Deus, única das 12 músicas de Piano & Voz assinada somente por Nico Rezende, sem parceiros. Nem teria como ser diferente, já que a canção trata de tema íntimo e pessoal, impossível de ser traduzido em versos por qualquer parceiro: a felicidade do artista com a chegada ao mundo de sua filha Jade, saudada na música.

Em sua essência, Piano & Voz cumpre a missão de resumir a obra fonográfica do cantor, compositor e músico paulista. De 1987 para cá, o artista já lançou os discos Nico Rezende (Warner Music, 1987), Jogo de Ilusões (Warner Music, 1988), Nico (Warner Music, 1989), Tudo Ficou pra Trás (Esfinge, 1991), Nico Rezende (Luz da Cidade, 1995), Curta a Vida (Som Livre, 2001) e Paraíso Invisível (Lua Music, 2007). Nesses álbuns, o artista deu voz a músicas que nada ficam a dever a seus maiores sucessos. Músicas que não tiveram a devida projeção na época de seu lançamento, mas que ganham uma segunda chance em Piano & Voz. São os casos de Movimentos Raros – parceria de Nico com Sérgio Serra, lançada em 1989 no álbum Nico e revivida com scats em Piano & Voz – e de Alto Mar, balada composta com Claudio Rabello, gravada originalmente para o pouco ouvido álbum Nico Rezende (1995), de onde Piano & Voz também repagina Noves Fora, parceria de Nico com o poeta Sérgio Natureza.

Mesmo músicas que tocaram bastante em seus registros originais vão soar como novas para gerações que vieram ao mundo anos depois. Penso Nisso Amanhã – a balada que promoveu o segundo álbum de Nico, Jogo de Ilusões – foi hit em 1988, mas tem tudo para ser sucesso novamente em 2012 ou em 2013 se veiculada nas rádios ou na internet. Penso Nisso Amanhã é um exemplo claro da habilidade de Nico Rezende para desbravar belos caminhos melódicos, dialogando com o universo da música romântica sem nunca resvalar para o sentimentalismo ou para os clichês da música brega.

Foi essa habilidade pop que seduziu até a exigente Marina Lima, parceira de Nico e do poeta Antonio Cícero (irmão da cantora) em Por Querer, música que inspirou o título do álbum Todas, lançado por Marina em 1985, e que por essa razão também é conhecida pelo nome de Todas. Por Querer figura no repertório de Piano & Voz ao lado de PseudoBlues, parceria de Nico com outro poeta, Jorge Salomão, que abriu o álbum Virgem, lançado por Marina em 1987, ano em que Nico Rezende dominou as paradas como cantor e as fichas técnicas de discos do pop brasileiro como compositor em reinado que começara, a rigor, em 1986, quando Zizi Possi alcançou grande repercussão com a gravação de Perigo, balada composta por Nico com Paulinho Lima (o parceiro mais constante) e propagada em escala nacional na trilha sonora da segunda versão da novela Selva de Pedra, exibida pela TV Globo naquele ano de 1986 em que o inglês Ritchie – então tido como carta fora do jogo da indústria fonográfica – deu a volta por cima, em lance surpreendente, ao dar voz a Transas, outra parceria de Nico com Paulinho Lima, sensível ao traduzir nos versos uma insatisfação com a liberação sexual vigente na década.

Enfim, Piano & Voz é o resumo feliz e harmonioso de obra que resiste ao tempo. Formatado somente com o piano e a voz afinada do cantor, esse cancioneiro pop e melodioso expõe o talento de um artista que contribuiu de forma substancial para a construção da identidade da canção pop nacional. 
Mauro Ferreira / Novembro de 2012

2 comentários:

Mauro Ferreira disse...

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Rafael disse...

Há tanto tempo que não tinha notícias do ótimo cantor e compositor Nico Rezende. Fico feliz em saber que ele está retornando com força total aos discos. Gosto muito das suas canções e um cantor como ele não deveria nunca deixar de tocar nas rádios, tV's e mais diversos meios de comunicação.