Título: Carta de amor
Artista: Maria Bethânia (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Vivo Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 13 de abril de 2013
Cotação: * * * 1/2
Por ter tido sua temporada interrompida ainda no início por conta da morte da mãe de Maria Bethânia, Claudionor Vianna Telles Velloso (16 de setembro 1907 - 25 de dezembro de 2012), a popular Dona Canô, o show Carta de amor está sendo registrado ao vivo, para edição de CD e/ou DVD, com pouco tempo de estrada. Por isso mesmo, o show está sendo captado - em apresentações agendadas para 13 e 14 de abril de 2013 na mesma casa carioca, Vivo Rio, em que o espetáculo estreou em 18 de novembro de 2012 - com poucas modificações no roteiro orquestrado pelo maestro mineiro Wagner Tiso com devoção à personalidade e ao universo de Bethânia. As únicas mudanças foram no segundo bis. Saíram ...E o mundo não se acabou (Assis Valente, 1938) e Ela desatinou (Chico Buarque, 1968) - músicas que até tinham certo frescor na voz da cantora, embora ambas já tivessem sido interpretadas pela artista em shows dos anos 70 - para dar lugar às batidas Explode coração (Gonzaguinha, 1978) e O que é o que é (Gonzaguinha, 1982). Cantada a capella, em número de 1990 já refeito no show Amor, festa, devoção (2009), Explode coração gerou momento de ovação, fazendo com que a intérprete fosse entusiasticamente aplaudidas por súditos abduzidos pela força magnética da artista. Entronizada instantaneamente no posto de uma das maiores cantoras brasileiras de todos os tempos, tão logo deu seu grito de guerra (Pega, mata, come!) no palco do espetáculo Opinião em fevereiro de 1965, Maria Bethânia já está acima do bem e do mal para fãs passionais que se alimentam de seu mel. Contudo, no primeiro dos dois dias de sua gravação ao vivo, Carta de amor reiterou os vícios e as virtudes do show e da cantora. Desta vez, o conceito que amalgama as músicas do roteiro é mais fluido, sobretudo no primeiro ato. Em Carta de amor, Bethânia por vezes apenas reescreve canções e momentos de sua longa trajetória sem toda a carga dramática de tempos idos. Os (profícuos) tempos atuais são mais serenos, mais sertanejos, mais leves. A propósito, a canção ruralista Estado de poesia, do compositor paraibano Chico César, se confirmou linda, inebriante. Dora (Dorival Caymmi, 1945) também continua majestosa na pisada percussiva do maracatu, marcada com vigor pelos músicos Marcelo Costa (percussão) e Pantico Rocha (bateria). No fim do primeiro ato, Quem me leva os meus fantasmas (Pedro Abrunhosa, 2007) - música inédita na voz de Bethânia - ainda evoca o espírito sagrado da cantora mais enigmática, mais intensa e mais dramática de outrora. A cantora que às vezes sai do tom e do ritmo sem perder a pose e o rebolado, ao qual recorreu no esfuziante medley de sambas-de-roda que agita o segundo ato. A cantora que se atrapalhou com a letra de Fogueira (Ângela Ro Ro, 1983), mas que, em contrapartida, já pareceu mais à vontade com os versos e a métrica de Não enche (Caetano Veloso, 1997) - até então o número mais problemático do show - na apresentação de 13 de abril de 2013. A cantora-divindade que se sabe senhora da cena e, por isso, se deu ao luxo de soltar um sonoro Eparrei! para Iansã ao fim de Dona do raio e do vento (Paulo César Pinheiro, 2006). Prejudicado e ao mesmo tempo favorecido pelos vícios e virtudes da intérprete, que repete ênfases e gestos teatrais recorrentes em seu sempre coerente percurso cênico, Carta de amor é bom show movido pela energia (con)sagrada de Maria Bethânia. Não vai figurar, no decorrer do tempo-rei, entre os shows mais emblemáticos ou inesquecíveis da Abelha Rainha, mas nem por isso deixa de ser um espetáculo sedutor e envolvente em sua fluidez conceitual.
18 comentários:
O show foi muito bonito. Achei a bethania um pouco contida no 1º ato. Espero que fique mais solta neste 2º dia de gravação. Soube que haveria show extra por conta da procura. De qq forma ,um show de bethania é sempre encantador.
Nossa, se eu fosse ela teria cansado desse bis. Pq eu, outrora fã, não consigo mais... Do que vi no show, o registro vale apenas por Quem me leva dos meus fantasmas. No mais, a mim não acrescenta nada, é um roteiro previsível, com todos os vícios, com todos os sons esperados, e atestam a necessidade de Maria Bethânia tentar buscar outras formas. A grande forma de Bethânia nos últimos tempos foi mesmo Imitação da vida, quiçá um dia ela o imite.
Mauro, acho que a questão dos vícios foi pouco elaborada...
Concordo, Marco. Por isso mesmo, seu comentário me inspirou a explicitar isso no texto com o acréscimo de uma frase. Vícios, no caso, são ênfases e gestos teatrais já recorrentes no universo cênico de Bethânia. Abs, grato pelo toque. Abs, MauroF
Mauro, a morte de D. Canô foi 25 de dezembro...
Abraço
Grato, Evangelina. Abs, MauroF
O Que é O Que é pela milésima vez é demais pra mim... Quanta mesmice...
Bom dia, Mauro.
Estive no primeiro dia de gravação e me lembro bem que houve um outro momento de ovação e êxtase total, com boa parte da plateia aplaudindo de pé o medley de sambas-de-roda com "Reconvexo"! Isso no meio do espetáculo, coisa rara de se ver! Achei que valia a pena mencionar isso. De resto, apesar dos "vícios" e dos já comuns deslizes nas letras (ela conseguiu até se atrapalhar com a letra de "O Que É, O Que É", dá pra acreditar?), considero "Carta De Amor" um belíssimo espetáculo! De fato talvez não à altura de outros inesquecíveis shows de Bethânia, mas não menos encantador!
Todas as cantoras apresentam certas músicas em todas as suas apresentações. Não vejo nada de errado nisso, muito menos naquilo( gestos, etc) que são característicos de um artista. São o seu estilo. Bethania tem inovado sim, mas sem deixar de ser ela mesma. Falhas técnicas acontecem a qq show. Carta de Amor ( que considero muito belo), pode não ser o melhor , mas ,certamente, tá longe de ser um show fraco,um erro. Ao contrário. É outro acerto da Bethania. Ovacionadíssima, várias vezes,por um ViviRio lotado! Em vez de enfatizar pequenos problemas (acontecem a todos), as pessoas deveriam enaltecer essa grande,ùnica artista da nossa música.Não é ficar cego ou não ter um olhar crítico. Não, Não é isso. Mas percebo uma cobrança maior qd se trata de Bethania. Claro, tb sei, q está de acordo com a grandeza dela.
Nossa!! Vocês são muito exigentes!!!
Primeiro, tratava-se do registro em DVD, só por isso um dia tenso.
Segundo, em via de completar 67 anos vocês queriam o quê? Ver o corre corre e as estripulias de 73, 74, 82?
Fala sério!!!
Arrumando as malas para Recife!!
Quem não vai... fica!!!!
Caetano, Gil, Milton com seus 70 anos. Gal e Bethania já passaram dos 60 e tantos. Chico Buarque, Rita Lee e mais alguns. Temos de vaorizar essa MPB porque depois deles a tal MPB já era.
Vale dizer: Bethania aplaudida de pé em cena aberta, por vários minutos.De pé, por toda a platéia ( com muitos vips presentes). Isso, definitivamente,não é pra qualquer um
É algo raro. Só vejo acontecer com ela,,e olha q vou ao show de muitos.
Aconteceu dia 13 de abril. Quem estava lá viveu esse momento arrepiante.
Maricotinha e Brasileirinho foram grandes shows, Inexplicavelmente Imitação da vida que era o mais bonito deles ficou fora do projeto dvd e se lança Noite Luzidia com aquele festival de erros. Depois disso, É preciso ser fã fervoroso pra tolerar um repertório pra lá repetido que ela vem fazendo a partir dai. Maria Bethânia se dar ao luxo de receber uma inédita de Djavan e retirar do roteiro do show, é demais pra mim... Salpica-se umas 4 inéditas na voz e faz um 'novo show', 'novo dvd' (Novo em q?). E os fãs fazerem adoração pra ouvir o que ela está cantando de 20 a 5 anos anos sem parar... Realmente fã é fã...
De tudo que li, acima, uma coisa me chamou muito a atenção, o grande ERRO de carta de amor, foi não ter a música VIVE, de Djavan, uma das mais belas de Oásis, que com certeza seria um momento mágico no show. Ainda mais num momento infeliz do Brasil com os Felicianos da vida soltos por ai...era o momento certo de alguém cantar : Tudo seu é muita dor ... Vive !
Mauro, o que você chama de vício é um estilo. As corridinhas, o dedo em riste, o agradecimento com uma mão no chão, marcações no palco, gestos, enfim, tudo isso faz parte da personalidade da cantora. Ou você também cansou dos pés descalços (em Carta de Amor estao adornados), do cabelo e das pulseiras ? Isso faz parte da figura única que ela é. Bethânia é a cantora mais produtiva da história desse país. Quantos artistas após 30 anos de carreira fez um disco por ano, em alguns deles 2 de uma vez, com parcerias inesperadas (Omara) e um novo caminho profissional paralelo (Bethânia e as Palavras)?
Claro que sou fã de Bethânia, você não? Também teria considerações a fazer ao show, mas não vem ao caso, não sou cego por ela, mas a admiração é enorme e legítima. Há de se respeitar a longevidade criativa e, sem dúvidas, o estilo tão particular de Bethânia.
Carta de Amor resistirá sim ao tempo-rei porque Bethânia é sempre moderna e atual.
Acho que analisar o show pelo viés dos vícios é um crime contra a arte. Bethânia nunca se preocupou com as tendências nem com as convenções. Ela canta o que ela quer cantar e o que sua alma artística pede para determinado show. Isso faz dela única e sem definições. O que bethânia faz é, como uma sereia, enfeitiçar seus fãs de um modo que a emoção toma conta todo o show. Tenha a mais absoluta certeza que todas as pessoas que foram para o show para sentirem a música e não para analisarem intelectualmente se emocionaram com O que é o que é, explode coração (cada vez mais linda na sua voz) e todas outras. No dia em que a arte precisar ser analisada com o intelecto é melhor acabar. Que o diga Nietzsche. Além do mais, poucos artistas inovaram tanto quanto BethÂnia, que apesar de sua reverÊNCIA AO PASADO SEMPRE TRÁS COISAS NOVAS, NEM QUE SEJA CONCEITOS E RELEITURAS DE VELHAS OBRAS! Só posso agradecer à Bethânia por esse show!! Vamos sentir mais e pensar menos quando ouvirmos música!
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