quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Poesia de Cazuza lateja entre as experimentações e ousadias de 'Agenor'

Resenha de CD
Título: Agenor - Canções de Cazuza
Artistas: vários
Gravadora: Joia Moderna
Cotação: * * *
Disco disponível para download gratuito a partir desta quarta-feira, 7 de agosto de 2013, em http://www.projetoagenor.com.br

A poesia de Agenor de Miranda Araújo Neto (4 de abril de 1958 - 7 de julho de 1990), o Cazuza, foi a mosca que em 1982 pousou no açaí dos meninos do Rio de Janeiro (RJ) - garotos dourados que se impuseram na então emergente cena carioca com rock tão pop e descolado quanto o tal espírito carioca. Roqueiro mais por atitude do que por vocação musical, o carioca Cazuza engrossou o açaí com poesia descarada que escancarava vícios e virtudes de uma juventude que, beneficiada pelos ventos da abertura, começava a se mostrar nas ruas e nas músicas. Projeto idealizado pelo DJ Zé Pedro para sua gravadora Joia Moderna e produzido sob a curadoria da jornalista Lorena Calábria, Agenor - Canções de Cazuza conecta nomes da cena carioca contemporânea - com algumas licenças geográficas - àquele Cazuza da primeira metade dos anos 80, poeta e cantor do Barão Vermelho, grupo carioca no qual encontrou sua cara-metade musical, Frejat, entre riffs de rocks stonianos, baladas e blues. Um Cazuza urgente, direto, sincero, dono de versos latejantes. E essa poesia lateja viva entre as experimentações e ousadias estilísticas ouvidas na maioria das 17 gravações feitas por cada artista, com liberdade artística, para este disco que tem capa assinada por Omar Salomão. Mesmo que os cantores sejam falsos, não importa: são bonitos os versos que esquadrinham sentimentos menos nobres que o poeta arremessa como tapas na capa. Aliás, Tapas na cara (Cazuza, 1987) é o título da rumba que o Exagerado deu para Ângela Maria e que o cantor paraense Felipe Cordeiro revive em Agenor com frescor e com levadas de lambada e carimbó. Mesmo miseráveis algumas melodias, os seus versos serão sempre bons pela poesia urbana que salta de cada um deles. É por isso que Gatinha de rua (Frejat e Cazuza, 1985) - música que Cazuza gravou com Marcelo em Estrela do meu clip (1985), álbum do cantor carioca - sintetiza o espírito de Agenor no registro do quarteto carioca Do Amor. Entre climas, efeitos e ruídos urbanos, a gravação deixa a impressão, em determinado momento, de que Gabriel Bubu, Gustavo Benjão, Marcelo Callado e Ricardo Dias Gomes estão cantarolando a música descontraidamente na mesa de um bar do Baixo Leblon, notório habitat do poeta que insiste em viver nas 17 gravações do CD disponibilizado para download gratuito a partir desta quarta-feira, 7 de agosto de 2013. Música da trilha sonora do filme Bete Balanço, lançada no lado B de compacto de 1984 na voz da atriz Débora Bloch (intérprete da personagem-título), Amor, amor (Frejat, George Israel e Cazuza, 1984) é tirada da geografia carioca pelo grupo (carioca) Tono em registro que evoca a batida baiana do samba-reggae, mas que é prejudicado pelo canto esmaecido de Ana Cláudia Tomelino. Ainda fora da rota carioca, o pernambucano China expia Culpa de estimação (Frejat e Cazuza, 1987) com leveza pop, em gravação de tom caseiro. Bem mais ousado, Domenico Lancellotti tenta dar grandeza com climas, ruídos e sintetizadores a uma canção menor do poeta, Vingança boba (Sérgio Serra e Cazuza, 1993), lançada por Fafá de Belém no álbum Do fundo do meu coração (1993). Música que ganha status de hit em repertório que prioriza lados B do cancioneiro de Cazuza, Down em mim (Cazuza, 1982) tem seu tom depressivo evocado pelo catarinense Wado. Se a vida é tão desconhecida e mágica, como sentencia o poeta em Ritual (Cazuza e Frejat, 1987), Botika - vocalista e baixista do grupo carioca Os Outros - poderia ter soado menos comportado na gravação desta música lançada por Cazuza em seu segundo álbum solo, Só se for a dois (1987). Kassin também nada faz por Doralinda (Cazuza e João Donato, 1997), pérola de romantismo gauche já lustrada em gravações de João Donato - parceiro do poeta no tema - e Nana Caymmi. É preciso correr riscos, abrir o peito e ir mais fundo ao cantar Cazuza, poeta que se desnudou ao longo de seus produtivos anos 80. Por isso, a faixa do duo carioca Letuce, Não amo ninguém (Frejat, Ezequiel Neves e Cazuza, 1984), é um grande momento de Agenor.  Com teatralidade e real entrega, Letícia Novaes (voz) e Lucas Vasconcellos (piano wurlitzer, sintetizadores e guitarras portuguesas) transmitem todo o desconforto existencial impresso nos versos do tema em registro tenso, sofrido, à beira do abismo. Escorado nas guitarras de JR Tostoi, o cantor carioca Brunno Monteiro também dá peso, em tom roqueiro, a Nunca sofri por amor (Joanna e Cazuza, 1989), música em que a melodia de Joanna jamais acompanha a intensidade dos versos de Cazuza - o que aumenta muito o mérito de Monteiro, destaque do elenco indie de Agenor. Mais leve, Silva reafirma sua vocação tecnopop ao reviver Mais feliz (Dé Palmeira, Bebel Gilberto e Cazuza, 1986), música sem a fúria santa que animava os versos do poeta. Já o grupo pernambucano Mombojó segue Vem comigo (Dé Palmeira, Guto Goffi e Cazuza, 1983) no compasso do rock enquanto Mariano Marovatto diz ao pé do ouvido os versos suplicantes (mas desaforados) de Incapacidade de amar (Leoni e Cazuza, 1987). O poeta não esmorecia nem na iminência de um pé na bunda... Qinho transforma em rock a balada Sorte e azar (Cazuza e Frejat, 1982 / 2012), sobra do primeiro LP do Barão Vermelho que veio à tona em 2012 na edição comemorativa de 30 anos do álbum Barão Vermelho (1982). Cantora e DJ de Recife (PE) que transita pelo universo do hip hop, Catarina Dee Jah poderia ter se soltado mais em Largado no mundo (Frejat e Cazuza, 1983). Por fim, Blues do iniciante (Frejat, Dé Palmeira, Guto Goffi, Maurício Barros e Cazuza, 1983) ganha a voz, o violão, a cara, a introspecção e o tom folk do carioca Marcelo Frota, o MoMo. Enfim, com maior ou menor grau de loucuras tão sóbrias, as gravações de Agenor - Canções de Cazuza jogam luz sobre versos menos batidos de Cazuza, escritos com a contundência de um poeta que sempre deu sua cara a tapa ao expor as fraturas da alma humana. Viva Cazuza!

18 comentários:

  1. A poesia de Agenor de Miranda Araújo Neto (4 de abril de 1958 - 7 de julho de 1990), o Cazuza, foi a mosca que em 1982 pousou no açaí dos meninos do Rio de Janeiro (RJ) - garotos dourados que se impuseram na então emergente cena carioca com rock tão pop e descolado quanto o tal espírito carioca. Roqueiro mais por atitude do que por vocação musical, o carioca Cazuza engrossou o açaí com poesia descarada que escancarava vícios e virtudes de uma juventude que, beneficiada pelos ventos da abertura, começava a se mostrar nas ruas e nas músicas. Projeto idealizado pelo DJ Zé Pedro para sua gravadora Joia Moderna e produzido sob a curadoria da jornalista Lorena Calábria, Agenor - Canções de Cazuza conecta nomes da cena carioca contemporânea - com algumas licenças geográficas - àquele Cazuza da primeira metade dos anos 80, poeta e cantor do Barão Vermelho, grupo carioca no qual encontrou sua cara-metade musical, Frejat, entre riffs de rocks stonianos, baladas e blues. Um Cazuza urgente, direto, sincero, dono de versos latejantes. E essa poesia lateja viva entre as experimentações e ousadias estilísticas ouvidas na maioria das 17 gravações feitas por cada artista, com liberdade artística, para este disco que tem capa assinada por Omar Salomão. Mesmo que os cantores sejam falsos, não importa: são bonitos os versos que esquadrinham sentimentos menos nobres que o poeta arremessa como tapas na capa. Aliás, Tapas na cara (Cazuza, 1987) é o título da rumba que o Exagerado deu para Ângela Maria e que o cantor paraense Felipe Cordeiro revive em Agenor com frescor e com levadas de lambada e carimbó. Mesmo miseráveis algumas melodias, os seus versos serão sempre bons pela poesia urbana que salta de cada um deles. É por isso que Gatinha de rua (Frejat e Cazuza, 1985) - música que Cazuza gravou com Marcelo em Estrela do meu clip (1985), álbum do cantor carioca - sintetiza o espírito de Agenor no registro do quarteto carioca Do Amor. Entre climas, efeitos e ruídos urbanos, a gravação deixa a impressão, em determinado momento, de que Gabriel Bubu, Gustavo Benjão, Marcelo Callado e Ricardo Dias Gomes estão cantando a música descontraidamente na mesa de um bar do Baixo Leblon, notório habitat do poeta que insiste em viver nas 17 gravações do CD disponibilizado para download gratuito a partir desta quarta-feira, 7 de agosto de 2013. Música lançada em compacto, desgarrada da discografia oficial do Barão Vermelho, Amor, amor (Frejat, George Israel e Cazuza, 1984) é tirada da geografia carioca pelo grupo (carioca) Tono em registro que evoca a batida baiana do samba-reggae, mas que é prejudicado pelo canto esmaecido de Ana Cláudia Tomelino. Ainda fora da rota carioca, o pernambucano China expia Culpa de estimação (Frejat e Cazuza, 1987) com leveza pop, em gravação de tom caseiro. Mais ousado, Domenico Lancellotti tenta dar grandeza com climas, ruídos e sintetizadores a uma canção menor do poeta, Vingança boba (Sérgio Serra e Cazuza, 1993), lançada por Fafá de Belém no álbum Do fundo do meu coração (1993). Música que ganha status de hit em repertório que prioriza lados B do cancioneiro de Cazuza, Down em mim (Cazuza, 1982) tem seu tom depressivo evocado pelo catarinense Wado.

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  2. Se a vida é tão desconhecida e mágica, como sentencia o poeta em Ritual (Cazuza e Frejat, 1987), Botika - vocalista e baixista do grupo carioca Os Outros - poderia ter soado menos comportado na gravação desta música lançada por Cazuza em seu segundo álbum solo, Só se for a dois (1987). Kassin também nada faz por Doralinda (Cazuza e João Donato, 1997), pérola de romantismo gauche já lustrada em gravações de João Donato - parceiro do poeta no tema - e Nana Caymmi. É preciso correr riscos, abrir o peito e ir mais fundo ao cantar Cazuza, poeta que se desnudou ao longo de seus produtivos anos 80. Por isso, a faixa do duo carioca Letuce, Não amo ninguém (Frejat, Ezequiel Neves e Cazuza, 1984), é o grande momento de Agenor. Com teatralidade e entrega, Letícia Novaes (voz) e Lucas Vasconcellos (piano wurlitzer, sintetizadores e guitarras portuguesas) transmitem todo o desconforto existencial impresso nos versos do tema em registro tenso, sofrido, à beira do abismo. Escorado nas guitarras de JR Tostoi, o cantor carioca Brunno Monteiro também dá peso, em tom roqueiro, a Nunca sofri por amor (Joanna e Cazuza, 1989), música em que a melodia de Joanna jamais acompanha a intensidade dos versos de Cazuza - o que aumenta muito o mérito de Monteiro, destaque do elenco indie de Agenor. Mais leve, Silva reafirma sua vocação tecnopop ao reviver Mais feliz (Dé Palmeira, Bebel Gilberto e Cazuza, 1986), música sem a fúria santa que animava os versos do poeta. Já o grupo pernambucano Mombojó segue Vem comigo (Dé Palmeira, Guto Goffi e Cazuza, 1983) no compasso do rock enquanto Mariano Marovatto diz ao pé do ouvido os versos suplicantes (mas desaforados) de Incapacidade de amar (Leoni e Cazuza, 1987). O poeta não esmorecia nem na iminência de um pé na bunda... Qinho transforma em rock a balada Sorte e azar (Cazuza e Frejat, 1982 / 2012), sobra do primeiro LP do Barão Vermelho que veio à tona em 2012 na edição comemorativa de 30 anos do álbum Barão Vermelho (1982). Cantora e DJ de Recife (PE) que transita pelo universo do hip hop, Catarina Dee Jah poderia ter se soltado mais em Largado no mundo (Frejat e Cazuza, 1983). Por fim, Blues do iniciante (Frejat, Dé Palmeira, Guto Goffi, Maurício Barros e Cazuza, 1983) ganha a voz, o violão, a cara, a introspecção e o tom folk do carioca Marcelo Frota, o MoMo. Enfim, com maior ou menor grau de loucuras tão sóbrias, as gravações de Agenor - Canções de Cazuza jogam luz sobre versos menos batidos de Cazuza, escritos com a contundência de um poeta que sempre deu sua cara a tapa ao expor as fraturas da alma humana. Viva Cazuza!

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  3. E lá vem mais discos de tributos da Joia Moderna... Discos novos de cantoras, por onde vocês andam? Mas apesar dos pesares, gostei da capa e das canções escolhidas para o projeto. Tentei efetuar o download através do site para conferir o resultado, mas o site não existe. Vamos ver como ficou o resultado final.

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  4. Nada contra a nova música brasileira, nem contra os discos da Joia Moderna, que têm seguido um ótimo padrão. Do Amor, Silva, Domenico já são nomes suficientes pra mostrar que o disco deve ser mesmo interessante.

    Mas, mesmo sem ouvir, não gostei da versão da Letuce para a música de Cazuza: a banda tem boas ideias musicais, mas será que só o meu ouvido se constrange com Letícia Novaes? Pelo visto, até o Mauro, tão exigente com cantoras, se rendeu ao hype e avalizou aquela pose disfarçada de talento.

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  5. De fato, o site não está no ar, Mauro. Consta que o domínio pertence à Locaweb.

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  6. Sim, Fábio e Rafael M., o site ainda não entrou no ar, ao contrário do previsto. Rafael, não gosto de Letuce e já expressei isso em vários textos postados em Notas Musicais. Contudo, neste disco ela funcionou bem. Para mim, é o destaque por ter traduzido a música com personalidade. Como não trabalho com cartas marcadas, eu me rendo somente às minhas opiniões honestas. Abs, MauroF

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  7. Cazuza foi o primeiro letrista a me despertar pra poesia,mesmo considerando que em música o som é mais importante que o texto.Falando assim até parece que a palavra cantada não tem som,mas...

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  8. Esse tipo de projeto tá ficando cansativo... A Joia Moderna começou bem trazendo de volta Zezé Motta, Amelinha, mas pelo jeito lamentavelmente mudou a rota das coisas...

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  9. Mauro, apenas para constar que "Amor, amor" era um dos lados do compacto com "Bete balanço", em 1984.

    Era um compacto com as duas músicas da trilha de "Bete balanço", o filme - e nele, era Débora Bloch quem cantava "Amor, amor".

    O compacto ajudou a catapultar "Maior abandonado", o disco, ao estrelato.

    Felipe dos Santos Souza

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  10. Oi, Felipe, eu sabia. De todo modo, seu comentário me motivou a explicitar no texto a procedência da música. Abs, obrigado, MauroF

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  11. Vingança Boba na gravação da Fafá é linda!!!

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  12. Mauro o link tá errado, o site não existe

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  13. Concordo com o Paulo Fortal. É justamente o que eu quero dizer... A Joia Moderna chegou em 2011 com uma proposta legal, trazendo discos novos de cantoras que amamos, álbuns clássicos remasterizados e com encarte original e agora só lança discos de tributos. Isso já tá ficando repetitivo e enjoativo. Vamos mudar esse disco arranhado, né? Por quê não retomar e manter somente os discos de tributos "A Voz da Mulher Na Obra de..."? Seria muito mais interessante. O que está sendo feito na prática atualmente, de lançar somente discos de tributos não está condizendo com a proposta original do Zé Pedro. Ele está se contradizendo.

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  14. Infelizmente o site ainda não foi lançado. Quando será lançado esse site de fato? Só consegui escutar até agora o Silva cantando "Mais Feliz".

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  15. O Zé Pedro postou no facebook que tiveram problemas com o site, enquanto não se resolve, o CD está disponível para audição no soundcloud:

    https://soundcloud.com/projetoagenor

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  16. Alguém sabe dizer quando o cd estará disponível pra download?

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  17. Já dá pra baixar no Souncloud https://soundcloud.com/projetoagenor

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