Resenha de show
Evento: 51º Festival Villa-Lobos
Título: Caymmi 100 anos
Artistas: Danilo Caymmi, Dori Caymmi e Nana Caymmi (em foto de Rodrigo Amaral)
Local: Theatro Municipal do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 10 de novembro de 2013
Cotação: * * * * 1/2
Os olhares cúmplices dirigidos por Nana Caymmi a Dori Caymmi - com direito a gestos que expressavam seu contentamento com os arranjos do irmão maestro - foram a mais perfeita tradução da afinidade entre os três irmãos no sublime show que abriu no Rio de Janeiro (RJ) as comemorações pelo centenário de nascimento do compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008). Ao lado do irmão caçula Danilo Caymmi, Dori e Nana celebraram a beleza atemporal do cancioneiro do patriarca da família, lustrando pérolas raras retiradas das profundezas do mar do compositor - registradas no álbum Caymmi (Som Livre), já garantido na lista de melhores discos de 2013 - e dando voz também aos sambas, canções praieiras e sambas-canção que atravessaram gerações e imortalizaram a obra de Dorival. Depois de passar por São Paulo (SP) em junho, o show de lançamento do CD Caymmi chegou à cidade que acolheu o artista (em abril de 1938) e lhe deu fama nacional. Foi na noite de ontem, 10 de novembro de 2013, em apresentação única que embeveceu o público que lotou o Theatro Municipal do Rio de Janeiro, apesar dos problemas no som (baixo) do microfone de Danilo Caymmi no início do espetáculo. Programado dentro da 51ª edição do Festival Villa-Lobos, o show roçou a perfeição do disco. "É inacreditável! Fico às vezes viajando nas canções do meu pai. São muito bonitas", enfatizou Nana, se permitindo ainda se surpreender com a arquitetura irretocável das letras e melodias de Dorival. Aos 72 anos, firme no posto de umas maiores cantoras do Brasil de todos os tempos, Nana somente entrou em cena na 16ª música do roteiro - o que fez com que a belíssima Sereia (Dorival Caymmi) fosse ouvida sem sua voz marcante (no disco, essa até então desconhecida canção praieira é entoada pelos três irmãos) no medley que juntou Sereia com Rainha do mar (Dorival Caymmi, 1939) pela afinidade temática. Na primeira parte do show, Dori - presente em cena do início ao fim, na condição de violonista, maestro e (eventual) cantor do espetáculo - dividiu o palco com Danilo, que abriu o show solando Caminhos do mar (Dorival Caymmi, Danilo Caymmi e Dudu Falcão, 2001) com Dori nos vocais. Na sequência, Dori solou Itapoã (Dorival Caymmi, 1972) - com aquela voz que evoca toda a profundeza do canto doce de Dorival - e puxou o cordão de Roda pião (Dorival Caymmi, 1939), sendo seguido por Danilo neste samba que alterna tons lúdicos e melancólicos ao abordar os efeitos do giro inexorável do tempo. Ao solar Fiz uma viagem (Dorival Caymmi, 1957), Danilo caiu com jeito no samba de Dorival. E, cada um a seu jeito, Danilo e Dori seguraram bem a atenção da plateia nesta primeira parte do show. Ao cantar O bem do mar (Dorival Caymmi, 1954) e Sargaço mar (Dorival Caymmi, 1985), Dori pareceu encarnar o velho pescador tão bem decantado no cancioneiro de Dorival. Como arranjador, Dori confirmou sua maestria ao remodelar o samba O que é que a baiana tem? (Dorival Caymmi,1939) com sutis alterações no andamento, no que o próprio Dori caracterizou como "uma versão mais contemporânea". Já Danilo brilhou ao esboçar registro mais emotivo para Nem eu (Dorival Caymmi, 1954), dentro do tom do samba-canção, e ao reger palmas e coro do público em Retirantes (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1975), após trazer à tona a Toada à toa (2009), menos inspirada parceria feita com seu pai (a partir de letra encontrada no baú de Dorival). Afinados entre si, os dois irmãos ainda uniram vozes no medley que agrega os sambas Quando eu durmo - outro título até então desconhecido do cancioneiro de Caymmi - e Balaio grande (Dorival Caymmi e Oswaldo Santiago, 1941). Foi após esse medley que entrou no palco Nana Caymmi, senhora da cena desde que abriu o vozeirão inigualável para entoar Cantiga de cego (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1981) - gravada por Dorival para a trilha sonora da novela Terras do sem fim (TV Globo, 1981/1982) - e, na sequência, solar Modinha para Tereza Batista (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1992), outro tema que linka o cancioneiro de Caymmi à obra literária do escritor baiano Jorge Amado (1912 - 2001), amigo e parceiro de Dorival. A Modinha para Tereza Batista foi a deixa para Danilo Caymmi puxar o samba Vamos falar de Tereza (1992), parceria sua com Dorival, produzida para a trilha sonora da minissérie Tereza Batista (TV Globo, 1992). Então Danilo saiu do palco, que passou a ser ocupado somente por Dori com Nana e com a banda virtuosa formada por Flávio Mendes (violão), Itamar Assiere (piano), Jefferson Lescowich (baixo), Armando Marçal (percussão) e Jurim Moreira (bateria). Foi quando Nana simulou um sotaque português para cantar Francisca Santos das Flores (Dorival Caymmi, 1972) em misto pungente de fado, samba-canção e modinha. Foi um dos momentos culminantes em show de pontos altos. Na sequência, com sua habitual categoria, Nana fez emergir A Mãe d'Água e a menina (Dorival Caymmi, 1985), deu a receita pouco conhecida de Acaçá (Dorival Caymmi, 1997), recontou História pro Sinhozinho (Dorival Caymmi, 1945) e, com o apoio vocal de Dori, elevou os tons para chamar Dora (Dorival Caymmi, 1945) - em momento arrepiante - e perfilou João Valentão (Dorival Caymmi, 1953). Os sambas-canção Só louco (Dorival Caymmi, 1955) e Não tem solução (Dorival Caymmi e Carlos Guinle, 1950) reiteraram o fato de Nana sempre ter sido cantora grande o suficiente para cantar Caymmi à sua moda, num tom que é só seu. Mas que se afinou harmoniosamente com os tons de seus irmãos no samba-canção Marina (Dorival Caymmi, 1947) e no sempre comovente Acalanto (Dorival Caymmi, 1957). No fim, a Canção da partida (Dorival Caymmi, 1957) - parte da Suíte dos pescadores - preparou o clima de despedida da família Caymmi, encerrando show marcado pela emoção de reverenciar o imortal Dorival Caymmi, um dos maiores compositores do mundo.
Os olhares cúmplices dirigidos por Nana Caymmi a Dori Caymmi - com direito a gestos que expressavam seu contentamento com os arranjos do irmão maestro - foram a mais perfeita tradução da afinidade entre os três irmãos no sublime show que abriu no Rio de Janeiro (RJ) as comemorações pelo centenário de nascimento do compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008). Ao lado do irmão caçula Danilo Caymmi, Dori e Nana celebraram a beleza atemporal do cancioneiro do patriarca da família, lustrando pérolas raras retiradas das profundezas do mar do compositor - registradas no álbum Caymmi (Som Livre), já garantido na lista de melhores discos de 2013 - e dando voz também aos sambas, canções praieiras e sambas-canção que atravessaram gerações e imortalizaram a obra de Dorival. Depois de passar por São Paulo (SP) em junho, o show de lançamento do CD Caymmi chegou à cidade que acolheu o artista (em abril de 1938) e lhe deu fama nacional. Foi na noite de ontem, 10 de novembro de 2013, em apresentação única que embeveceu o público que lotou o Theatro Municipal do Rio de Janeiro, apesar dos problemas no som (baixo) do microfone de Danilo Caymmi no início do espetáculo. Programado dentro da 51ª edição do Festival Villa-Lobos, o show roçou a perfeição do disco. "É inacreditável! Fico às vezes viajando nas canções do meu pai. São muito bonitas", enfatizou Nana, se permitindo ainda se surpreender com a arquitetura irretocável das letras e melodias de Dorival. Aos 72 anos, firme no posto de umas maiores cantoras do Brasil de todos os tempos, Nana somente entrou em cena na 16ª música do roteiro - o que fez com que a belíssima Sereia (Dorival Caymmi) fosse ouvida sem sua voz marcante (no disco, essa até então desconhecida canção praieira é entoada pelos três irmãos) no medley que juntou Sereia com Rainha do mar (Dorival Caymmi, 1939) pela afinidade temática. Na primeira parte do show, Dori - presente em cena do início ao fim, na condição de violonista, maestro e (eventual) cantor do espetáculo - dividiu o palco com Danilo, que abriu o show solando Caminhos do mar (Dorival Caymmi, Danilo Caymmi e Dudu Falcão, 2001) com Dori nos vocais. Na sequência, Dori solou Itapoã (Dorival Caymmi, 1972) - com aquela voz que evoca toda a profundeza do canto doce de Dorival - e puxou o cordão de Roda pião (Dorival Caymmi, 1939), sendo seguido por Danilo neste samba que alterna tons lúdicos e melancólicos ao abordar os efeitos do giro inexorável do tempo. Ao solar Fiz uma viagem (Dorival Caymmi, 1957), Danilo caiu com jeito no samba de Dorival. E, cada um a seu jeito, Danilo e Dori seguraram bem a atenção da plateia nesta primeira parte do show. Ao cantar O bem do mar (Dorival Caymmi, 1952) e Sargaço mar (Dorival Caymmi, 1985), Dori pareceu encarnar o velho pescador tão bem decantado no cancioneiro de Dorival. Como arranjador, Dori confirmou sua maestria ao remodelar o samba O que é que a baiana tem? (Dorival Caymmi,1939) com sutis alterações no andamento, no que o próprio Dori caracterizou como "uma versão mais contemporânea". Já Danilo brilhou ao esboçar registro mais emotivo para Nem eu (Dorival Caymmi, 1954), dentro da atmosfera do samba-canção, e ao reger as palmas e o coro do público em Retirantes (Dorival Caymmi, 1975), após trazer à tona a Toada à toa (2009), menos inspirada parceria feita com seu pai (a partir de letra encontrada no baú de Dorival). Afinados entre si, os dois irmãos ainda uniram vozes no medley que agrega os sambas Quando eu durmo - outro título até então desconhecido do cancioneiro de Caymmi - e Balaio grande (Dorival Caymmi e Oswaldo Santiago, 1941).
ResponderExcluirFoi após esse medley que entrou no palco Nana Caymmi, senhora da cena desde que abriu o vozeirão inigualável para entoar Cantiga de cego (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1981) - gravada por Dorival para a trilha sonora da novela Terras do sem fim (TV Globo, 1981 / 1982) - e, na sequência, solar a Modinha para Tereza Batista (Dorival Caymmi e Jorge Amado), outro tema que linka o cancioneiro de Caymmi à obra literária do escritor baiano Jorge Amado (1912 - 2001), amigo e parceiro de Dorival. A Modinha para Tereza Batista foi a deixa para Danilo Caymmi puxar o samba Vamos falar de Tereza (1992), parceria sua com Dorival, produzida para a trilha sonora da minissérie Tereza Batista (TV Globo, 1992). Então Danilo saiu do palco, que passou a ser ocupado somente por Dori com Nana e com a banda virtuosa formada por Flávio Mendes (violão), Itamar Assiere (piano), Jefferson Lescowich (baixo), Armando Marçal (percussão) e Jurim Moreira (bateria). Foi quando Nana simulou um sotaque português para cantar Francisco Santos das Flores (Dorival Caymmi, 1972) em misto pungente de fado, samba-canção e modinha. Foi um dos momentos culminantes em show de pontos altos. Na sequência, com sua habitual categoria, Nana fez emergir A Mãe d'Água e a menina (Dorival Caymmi, 1985), deu a receita pouco conhecida de Acaçá (Dorival Caymmi, 1997), recontou História pro Sinhozinho (Dorival Caymmi, 1945) e, com o apoio vocal de Dori, elevou os tons para chamar Dora (Dorival Caymmi, 1945) - em momento arrepiante - e perfilou João Valentão (Dorival Caymmi, 1953). Os sambas-canção Só louco (Dorival Caymmi, 1955) e Não tem solução (Dorival Caymmi e Carlos Guinle, 1950) reiteraram o fato de Nana sempre ter sido cantora grande o suficiente para cantar Caymmi à sua moda, num tom que é só seu. Mas que se afinou harmoniosamente com os tons de seus irmãos no samba-canção Marina (Dorival Caymmi, 1947) e no sempre comovente Acalanto (Dorival Caymmi, 1957). No fim, a Canção da partida (Dorival Caymmi, 1957) - parte da Suíte dos pescadores - preparou o clima de despedida da família Caymmi, encerrando show marcado pela emoção de reverenciar o imortal Dorival Caymmi, um dos maiores compositores do mundo.
ResponderExcluirLindo! Que relato emocionante, estou louco para ver esse show.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMauro, um detalhe na digitação do texto! Francisca Santos das Flores e não Francisco.
ResponderExcluirObrigado pelo toque do erro de digitação, Sandro. Já corrigi!
ResponderExcluirCaymmi é dos maiores do mundo mesmo.
ResponderExcluirEm matéria de música simplicidade que vira genialidade é pra poucos.
Para a maioria vira banalidade.
PS: Um exemplar de Caymmi e Seu Violão tem que ser mandado para o espaço numa Voyager 2.
Os ets iriam pirar!
Que Beatles que nada!
Bora para Bahia, meu rei! :-)