Mauro Ferreira no G1

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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Com 'falhas naturais', Ângela e Cauby reiteram a realeza em show no Rio

Resenha de show
Título: Reencontro
Artista: Ângela Maria e Cauby Peixoto (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Theatro Net Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 10 de dezembro de 2013
Cotação: * * * 1/2
Show em cartaz no Theatro Net Rio, no Rio de Janeiro (RJ), até 11 de dezembro de 2013
Show em cartaz no Theatro São Pedro, em São Paulo (SP), em 18 de dezembro de 2013

"Um rei não perde a majestade", gritou para Cauby Peixoto, da segunda fila do Theatro Net Rio, exaltada espectadora da estreia nacional de Reencontro, show baseado no homônimo disco que chega às lojas em janeiro de 2014. Terceiro projeto fonográfico gravado por Cauby em duo com Ângela Maria, o CD Reencontro (Nova Estação / Eldorado) é o pretexto para reunir em cena - mais uma vez - os dois cantores fluminenses, ícones sobreviventes da fase pré-Bossa Nova, época dominada por sambas-canção e boleros de tom folhetinesco. Mesmo com "falhas naturais", como a própria Sapoti reconheceu ao se dirigir ao público após o segundo dos 20 números do roteiro costurado pelo diretor Thiago Marques Luiz, Como é grande o meu amor por você (Roberto Carlos, 1967), o show Reencontro reiterou a majestade destes dois intérpretes que reinaram na era do rádio. Aos 84 anos, Ângela já não atinge as notas altas de tempos idos, mas continua sendo senhora cantora e mantém o porte de rainha. Aos 82 anos, Cauby já parece meio disperso e aéreo no palco ("Cauby não fala nada, ele só ri", sublinhou Ângela em cena). Vieram dele, que precisou ler a maioria das letras e nem sempre se mostrou atento às entradas e andamentos das músicas, as tais falhas que - como disse a cantora - são mesmo naturais para quem já está em atividade há seis décadas. Mesmo assim, Cauby foi rei - mais uma vez - na noite de 10 de dezembro de 2013. E ele soube disso desde o ínicio, como sinalizou ao levar o polegar direito em meio à interpretação de Orgulho (Waldir Rocha e Nelson Wederking, 1953) - samba-canção do medley inicial em que os cantores trocaram de repertório - para agradecer os aplausos calorosos do (seu) público. O roteiro alocou alguns duetos dos cantores - em músicas como Alguém como tu (Jair Amorim e José Maria de Abreu, 1952) e Somos iguais (Jair Amorim e Evaldo Gouveia, 1964) - mas também abriu espaço para que cada intérprete brilhasse sozinho, embora ambos tenham permanecido juntos no palco durante todo o show. Para provar que não perdeu a majestade, Ângela sustentou e alongou notas ao cantar Babalu (Margarita Lecuona, 1939), mambo cubano que, desde 1958, é um dos carros-chefes do repertório da Sapoti, ao qual já está definitivamente associado. Embora inadequado para o atual momento da cantora, o exibicionismo vocal surtiu efeito entre o público idoso e saudoso de tempos idos. Estrela da canção brasileira, Ângela Maria nem precisava ter se exibido. A propriedade com que interpretou o samba-canção Noite chuvosa (João Leal Brito - Britinho - e Fernando César, 1960) - linkado no roteiro com Chove lá fora (1957), tema do modernista Tito Madi ouvido na voz de Cauby - bastou por si só para atestar sua perene realeza. Por isso mesmo, não teve a menor importância o fato de ela ter interrompido Eu vou ter sempre você (Harry Warren e Mack Gordon em versão de Antonio Marcos, 1980) por ter esquecido a letra da música, cantada antes por Cauby no original idioma inglês. A precisão com que a Sapoti entoa e entende as letras melodramáticas de sambas-canção como Vida de bailarina (Américo Seixas e Chocolate, 1953) e Fósforo queimado (Roberto Lamego, Milton Legey e Paulo Menezes, 1953) - música em que a cantora deu show de interpretação - foi suficiente para arrebatar o público. Escorado no timbre aveludado de sua personalíssima voz de barítono, o afinado Cauby obteve seus melhores momentos no show Reencontro quando solou músicas que já domina - como Bastidores (Chico Buarque, 1980), número em que o artista deixou a impressão de jamais ter cantado tão lindo assim, e sua eterna Conceição (Jair Amorim e Valdemar de Abreu - Dunga, 1956) - e quando mostrou fôlego ao entoar em espanhol Granada (Agustín Lara, 1932), número valorizado pela pulsação da percussão e das cordas da banda orquestrada pelo pianista Daniel Bondaczuk. Granada preparou o clima solene para o tom épico imprimido ao samba Na Baixa do Sapateiro (Ary Barroso, 1938), número final de show arrematado com ternura no bis  ao som de Carinhoso (Pixinguinha e João de Barro, 1937). Enfim, Ângela Maria e Cauby Peixoto são reis de seu tempo. Não precisam provar mais nada para ninguém. Mesmo com as falhas e as tensões naturais de toda estreia, o bom show Reencontro - vale ressaltar de novo - reiterou a realeza e a afinidade de dois grandes cantores que se afinaram em cena sem perder suas majestades.

7 comentários:

Mauro Ferreira disse...

"Um rei não perde a majestade", gritou para Cauby Peixoto, da segunda fila do Theatro Net Rio, exaltada espectadora da estreia nacional de Reencontro, show baseado no homônimo disco que chega às lojas em janeiro de 2014. Terceiro projeto fonográfico gravado por Cauby em duo com Ângela Maria, o CD Reencontro (Nova Estação / Eldorado) é o pretexto para reunir em cena - mais uma vez - os dois cantores fluminenses, ícones sobreviventes da fase pré-Bossa Nova, época dominada por sambas-canção e boleros de tom folhetinesco. Mesmo com "falhas naturais", como a própria Sapoti reconheceu ao se dirigir ao público após o segundo dos 20 números do roteiro costurado pelo diretor Thiago Marques Luiz, Como é grande o meu amor por você (Roberto Carlos, 1967), o show Reencontro reiterou a majestade destes dois intérpretes que reinaram na era do rádio. Aos 84 anos, Ângela já não atinge as notas altas de tempos idos, mas continua sendo senhora cantora e mantém o porte de rainha. Aos 82 anos, Cauby já parece meio disperso e aéreo no palco ("Cauby não fala nada, ele só ri", sublinhou Ângela em cena). Vieram dele, que precisou ler a maioria das letras e nem sempre se mostrou atento às entradas e andamentos das músicas, as tais falhas que - como disse a cantora - são mesmo naturais para quem já está em atividade há seis décadas. Mesmo assim, Cauby foi rei - mais uma vez - na noite de 10 de dezembro de 2013. E ele soube disso desde o ínicio, como sinalizou ao levar o polegar direito em meio à interpretação de Orgulho (Waldir Rocha e Nelson Wederking, 1953) - samba-canção do medley inicial em que os cantores trocaram de repertório - para agradecer os aplausos calorosos do (seu) público. O roteiro alocou alguns duetos dos cantores - em músicas como Alguém como tu (Jair Amorim e José Maria de Abreu, 1952) e Somos iguais (Jair Amorim e Evaldo Gouveia, 1964) - mas também abriu espaço para que cada intérprete brilhasse sozinho, embora ambos tenham permanecido juntos no palco durante todo o show. Para provar que não perdeu a majestade, Ângela sustentou e alongou notas ao cantar Babalu (Margarita Lecuona, 1939), mambo cubano que, desde 1958, é um dos carros-chefes do repertório da Sapoti, ao qual já está definitivamente associado. Embora inadequado para o atual momento da cantora, o exibicionismo vocal surtiu efeito entre o público idoso e saudoso de tempos idos.

Mauro Ferreira disse...

Estrela da canção brasileira, Ângela Maria nem precisava ter se exibido. A propriedade com que interpretou o samba-canção Noite chuvosa (João Leal Brito - Britinho - e Fernando César, 1960) - linkado no roteiro com Chove lá fora (1957), tema do modernista Tito Madi ouvido na voz de Cauby - bastou por si só para atestar sua perene realeza. Por isso mesmo, não teve a menor importância o fato de ela ter interrompido Eu vou ter sempre você (Harry Warren e Mack Gordon em versão de Antonio Marcos, 1980) por ter esquecido a letra da música, cantada antes por Cauby no original idioma inglês. A precisão com que a Sapoti entoa e entende as letras melodramáticas de sambas-canção como Vida de bailarina (Américo Seixas e Chocolate, 1953) e Fósforo queimado (Roberto Lamego, Milton Legey e Paulo Menezes, 1953) - música em que a cantora deu show de interpretação - foi suficiente para arrebatar o público. Escorado no timbre aveludado de sua personalíssima voz de barítono, o afinado Cauby obteve seus melhores momentos no show Reencontro quando solou músicas que já domina - como Bastidores (Chico Buarque, 1980), número em que o artista deixou a impressão de jamais ter cantado tão lindo assim, e sua eterna Conceição (Jair Amorim e Valdemar de Abreu - Dunga, 1956) - e quando mostrou fôlego ao entoar em espanhol Granada (Agustín Lara, 1932), número valorizado pela pulsação da percussão e das cordas da banda orquestrada pelo pianista Daniel Bondaczuk. Granada preparou o clima solene para o tom épico imprimido ao samba Na Baixa do Sapateiro (Ary Barroso, 1938), número final de show arrematado com ternura no bis ao som de Carinhoso (Pixinguinha e João de Barro, 1937). Enfim, Ângela Maria e Cauby Peixoto são reis de seu tempo. Não precisam provar mais nada para ninguém. Mesmo com as falhas e as tensões naturais de toda estreia, o bom show Reencontro - vale ressaltar de novo - reiterou a realeza e a afinidade de dois grandes cantores que se afinaram em cena sem perder suas majestades.

Marcelo disse...

Merecem todas as homenagens ! São eternos!!

paulo sergio disse...

Não dá para um simples mortal comentar!

otavio disse...

Pôxa Mauro, "fase pré-Bossa Nova, época dominada por sambas-canção e boleros de tom folhetinesco". ????

Justo você que tanto foge do "lugar comum" ?

Fui dar uma olhada nos discos de Ângela Maria que tenho aqui (justamente os dos anos 50), e fiquei pensando: pôxa vida, "Nem Eu", "Fala Mangueira", "João Valentão", "Rua sem Sol", e tantas outras pérolas gravadas por Ângela Maria....se encaixam nisso aí de "tom folhetinesco" ???

Será que na fase pré Bossa Nova dominava o folhetinesco ???

A fase pré Bossa Nova, se não me engano, foi a de Ary Barroso, Caymmi, Custódio Mesquita, Noel Rosa, Pixinguinha, Radamés Gnatali, Athaulfo Alves,Orestes Barbosa....

"Boleros de tom folhetinesco". É sobre a época deles que você se refere ?

Mauro Ferreira disse...

Otávio, eu me refiro aos anos 50, década em que surgiram Ângela e Cauby. Claro que havia muita música boa, mas havia também esse tom folhetinesco de que falei. E, veja bem, folhetinesco não é necessariamente sinônimo de ruim. Abs, MauroF

ADEMAR AMANCIO disse...

A arte de cantar nunca foi tão bem representada no Brasil,como foi nos anos 50,justamente com Cauby Peixoto e Ângela maria.Por isso mesmo,os dois deviam zelar melhor por suas imagens. É bem melhor viver das glórias do passado,que viver um presente patético.(O próximo show será numa maca?)O Cauby sentado com essa expressão facial,me veio à cabeça o Pelé tentando jogar uma partida de futebol profissional.Sei que você não vai publicar meu comentário,mas é isso que eu penso.