domingo, 8 de dezembro de 2013

Documentário verbaliza efervescência musical da Lira Paulistana nos 80

Resenha de documentário musical
Título: Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista
Direção: Riba de Castro
Produção: Pirata Creative / Busca Vida Filmes / TV Cultura
Cotação: * * * 1/2

Enquanto o rock brasileiro preparava (inconscientemente) a invasão da praia da MPB, efetivada no Rio de Janeiro (RJ) a partir de 1982 com o estouro da banda carioca Blitz, uma fervilhante movimentação vanguardista - encabeçada por Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção (1949 - 2003) - revolucionava a música brasileira nos porões da cidade de São Paulo (SP). De tom underground nunca absorvido de fato pelo mainstream, embora tenha obtido prestígio imediato na mídia impressa, essa movimentação teve sintomaticamente um porão como ponto aglutinador da turma. Trata-se do Lira Paulistana. Mais do que um teatro, inaugurado em outubro de 1979 em porão situado no bairro de Pinheiros, o Lira Paulistana foi um centro de efervescência cultural que movimentou e norteou a cena musical da cidade de São Paulo na primeira metade dos anos 80. Ao sair de cena em 1986, o Lira Paulistana já tinha entrado na história da música de Sampa. É essa (bela) história que o documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista - em cartaz desde novembro de 2013 em alguns cinemas do Brasil - verbaliza através de depoimentos de quase todos os participantes daquela movimentação que não se constituiu num movimento propriamente dito porque, como enfatizado ao longo dos 97 minutos do bom filme dirigido por Riba de Castro, a Vanguarda Paulista dos anos 80 aglutinou músicos de diversas estéticas, desenvolvidas paralelamente, sem a imposição de uma diretriz dominante. Não há polêmicas ou controvérsias no documentário. Os depoimentos de todos os entrevistados - Alice Ruiz, Alzira Espíndola, Arrigo Barnabé, Cida Moreira, Fernando Meirelles, Lanny Gordin, Luiz Tatit, Maurício Krubusly, Ná Ozzetti, Paulo LePetit, Roger Moreira, Suzana Salles e Vânia Bastos, entre vários outros nomes que ajudaram a compor cena de arquitetura plural - se afinam ao enfatizar o Lira Paulistana como o ponto de encontro da turma. Sem amarras estéticas, a programação do teatro - logo desdobrado em selo fonográfico que ajudou a viabilizar as edições dos primeiros álbuns de artistas como Cida Moreira e Itamar Assumpção - promoveu desde o som vanguardista do Grupo Rumo até o rock do grupo punk paulista Inocentes, passando pela música caipira do Grupo Parangá. "O Lira abarcava todas as linguagens musicais", sintetiza Cida Moreira em seu depoimento. "Era um lugar desagradável do ponto de vista arquitetônico, mas tinha o espírito da época", contemporiza, com doses equivalentes de realismo e idealismo, o cineasta Fernando Meirelles, que, então em início de carreira, dirigiu o clipe (exibido no filme) de Vida besta, música do irreverente grupo paulista Premeditando o Breque. "Era uma espécie de catacumba onde aconteciam coisas que não aconteciam na superfície", arremata Luiz Tatit, principal compositor do criativo Grupo Rumo. Entremeado com tantos depoimentos afins, o documentário escapa da redundância quando exibe preciosas imagens de arquivo. O filme exibe o Grupo Rumo em cena no Lira, em 1983, com Ná Ozzetti à frente dos vocais. Vê-se também Itamar Assumpção cantando sua seminal composição Nego Dito (1980) em programa exibido pela TV Bandeirantes em 1982 - a soberania do talento de Itamar vira assunto dominante no filme em determinado momento - e ainda o grupo Inocentes, visto em ação em janeiro 1985, no evento São Paulo também tem rock, criado (romanticamente) para não deixar todas as atenções musicais daquela época concentradas na primeira edição do festival Rock in Rio. Enfim, entre discussões como a essência e a importância da movimentação rotulada como Vanguarda Paulista, o documentário eterniza a importância de um porão que recolocou São Paulo no mapa da música brasileira com a promoção de sons revolucionários que ecoam até hoje na cena pop contemporânea da cidade.

Um comentário:

  1. Enquanto o rock brasileiro preparava (inconscientemente) a invasão da praia da MPB, efetivada no Rio de Janeiro (RJ) a partir de 1982 com o estouro da banda carioca Blitz, uma fervilhante movimentação vanguardista - encabeçada por Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção (1949 - 2003) - revolucionava a música brasileira nos porões da cidade de São Paulo (SP). De tom underground nunca absorvido de fato pelo mainstream, embora tenha obtido prestígio imediato na mídia impressa, essa movimentação teve sintomaticamente um porão como ponto aglutinador da turma. Trata-se do Lira Paulistana. Mais do que um teatro, inaugurado em outubro de 1979 em porão situado no bairro de Pinheiros, o Lira Paulistana foi um centro de efervescência cultural que movimentou e norteou a cena musical da cidade de São Paulo na primeira metade dos anos 80. Ao sair de cena em 1986, o Lira Paulistana já tinha entrado na história da música de Sampa. É essa (bela) história que o documentário Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista - em cartaz desde novembro de 2013 em alguns cinemas do Brasil - verbaliza através de depoimentos de quase todos os participantes daquela movimentação que não se constituiu num movimento propriamente dito porque, como enfatizado ao longo dos 97 minutos do bom filme dirigido por Riba de Castro, a Vanguarda Paulista dos anos 80 aglutinou músicos de diversas estéticas, desenvolvidas paralelamente, sem a imposição de uma diretriz dominante. Não há polêmicas ou controvérsias no documentário. Os depoimentos de todos os entrevistados - Alice Ruiz, Alzira Espíndola, Arrigo Barnabé, Cida Moreira, Fernando Meirelles, Lanny Gordin, Luiz Tatit, Maurício Krubusly, Ná Ozzetti, Paulo LePetit, Roger Moreira, Suzana Salles e Vânia Bastos, entre vários outros nomes que ajudaram a compor cena de arquitetura plural - se afinam ao enfatizar o Lira Paulistana como o ponto de encontro da turma. Sem amarras estéticas, a programação do teatro - logo desdobrado em selo fonográfico que ajudou a viabilizar as edições dos primeiros álbuns de artistas como Cida Moreira e Itamar Assumpção - promoveu desde o som vanguardista do Grupo Rumo até o rock do grupo punk paulista Inocentes, passando pela música caipira do Grupo Parangá. "O Lira abarcava todas as linguagens musicais", sintetiza Cida Moreira em seu depoimento. "Era um lugar desagradável do ponto de vista arquitetônico, mas tinha o espírito da época", contemporiza, com doses equivalentes de realismo e idealismo, o cineasta Fernando Meirelles, que, então em início de carreira, dirigiu o clipe (exibido no filme) de Vida besta, música do irreverente grupo paulista Premeditando o Breque. "Era uma espécie de catacumba onde aconteciam coisas que não aconteciam na superfície", arremata Luiz Tatit, principal compositor do criativo Grupo Rumo. Entremeado com tantos depoimentos afins, o documentário escapa da redundância quando exibe preciosas imagens de arquivo. O filme exibe o Grupo Rumo em cena no Lira, em 1983, com Ná Ozzetti à frente dos vocais. Vê-se também Itamar Assumpção cantando sua seminal composição Nego Dito (1980) em programa exibido pela TV Bandeirantes em 1982 - a soberania do talento de Itamar vira assunto dominante no filme em determinado momento - e ainda o grupo Inocentes, visto em ação em janeiro 1985, no evento São Paulo também tem rock, criado (romanticamente) para não deixar todas as atenções musicais daquela época concentradas na primeira edição do festival Rock in Rio. Enfim, entre discussões como a essência e a importância da movimentação rotulada como Vanguarda Paulista, o documentário eterniza a importância de um porão que recolocou São Paulo no mapa da música brasileira com a promoção de sons revolucionários que ecoam até hoje na cena pop contemporânea da cidade.

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