sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Além do gênero, Érika Martins revitaliza modinhas à sua moda pop 'indie'

Resenha de CD
Título: Modinhas
Artista: Érika Martins
Gravadora: Coqueiro Verde Records
Cotação: * * * * 

Mais do que um gênero de origem portuguesa de tonalidade romântica,  a modinha é encarada como um estado de espírito por Érika Martins em seu segundo álbum solo, Modinhas. Isso explica porque uma bela balada melancólica como Garota, interrompida - parceria de Érika com Luisão Pereira, colega da cantora na desativada banda baiana Penélope - não destoa do espírito do CD que vai ser efetivamente posto à venda no mercado fonográfico pela Coqueiro Verde Records a partir deste mês de janeiro de 2014. Afinal, a tristeza embutida em Garota, interrompida - e realçada pela pegada do trio paranaense Nevilton - é de certa forma derivada do chororô típico das modinhas que aportaram no Brasil no século 18 e se consolidaram no país ainda imperial e culturalmente colonizado do século posterior. Érika Martins canta modinhas à sua moda pop indie. É esse desapego ao passado que impede Modinhas de soar mofado, antigo. Produzido por Felipe Rodarte sob a direção artística de Constança Scofield, o CD entrelaça presente e passado sem ar nostálgico. Isso faz com que, no diálogo musical de Modinhas, um aderente pop rock como Rolo compressor (Pedro Veríssimo e Fernando Aranha) - que poderia ser hit se o rock ainda fosse moda no Brasil - se afine com a releitura de Casinha pequenina (autor desconhecido), erguida harmoniosamente por Érika na praia do reggae e na onda do som dos Balcãs (região do Sudeste europeu). Casinha pequenina - que já abrigou vozes de cantores como o carioca Silvio Caldas (1908 - 1998) e a capixaba Nara Leão (1942 - 1989) - ressurge remodelada no registro de Érika, mas com a arquitetura melódica original. O respeito às melodias - novas ou antigas - legitima a incursão da cantora por duas modinhas. Uma é a Modinha do compositor carioca Sérgio Bittencourt (1941 - 1979), lançada em 1968 na voz consciente do cantor uruguaio brasileiro Taiguara (1945 - 1996) e repaginada pela artista em clima noise. A outra é a Modinha de outro compositor carioca, Heitor Villa-Lobos (1887 - 1959), que ganhou versos solenes do poeta pernambucano Manuel Bandeira (1886-1968). Peça 5 da obra Serestas (1925), a Modinha de Villa-Lobos é - na gravação feita por Érika com o cantor pernambucano Otto - o ponto de contato mais próximo do disco com a forma tradicional do gênero musical que o inspirou. Mesmo assim, Villa-Lobos é inserido em universo indie. Em outro lugar do passado, a regravação de Dar-te-ei (Marcelo Jeneci, Helder Lopes, José Miguel Wisnik e Verônica Pessoa) - música do primeiro álbum do paulista Marcelo Jeneci, Feito pra acabar (Slap, 2010) - enfatiza a influência benéfica que a Jovem Guarda exerce no som de Jeneci. Dar-te-ei é cantada por Érika com a necessária leveza e com o toque do grupo carioca Autoramas. Entre a levada roqueira de Fundidos (tema da lavra de Botika Botikay, vocalista do grupo carioca Os Outros) e a respeitosa abordagem de Prelúdio pra ninar gente grande (Menino passarinho) (Luiz Vieira), feita com o duo chileno Perrosky, Modinhas apresenta inédita de Tom Zé, A curi, criada pelo compositor baiano - no tom lúdico que caracteriza parte de sua obra - para Érika, em agradecimento ao fato de a cantora ter dado voz à sua música Namorinho de portão (1968) em disco da banda Penélope. Bonita - balada do compositor carioca Marcelo Frota (o MoMo) que faz jus ao título - contribui para alargar o eixo estético de disco que se equilibra com graça entre passado e presente. Por mais que música ligeiramente menos envolvente como Memorabília (de autoria da própria Érika, com bom refrão) atenue por instantes o poder de sedução de Modinhas, o disco resulta coeso e mais interessante do que o primeiro CD solo da artista, Érika Martins (2009). À moda pop indie, Modinhas é álbum com cacife para impulsionar a carreira fonográfica de Érika Martins. 

6 comentários:

  1. Mais do que um gênero de origem portuguesa de tonalidade romântica, a modinha é encarada como um estado de espírito por Érika Martins em seu segundo disco solo, Modinhas. Isso explica porque uma bela balada melancólica como Garota, interrompida - parceria de Érika com Luisão Pereira, colega da cantora na desativada banda baiana Penélope - não destoa do espírito do CD que vai ser efetivamente posto à venda no mercado fonográfico pela Coqueiro Verde Records a partir deste mês de janeiro de 2014. Afinal, a tristeza embutida em Garota, interrompida - e realçada pela pegada do trio paranaense Nevilton - é de certa forma derivada do chororô típico das modinhas que aportaram no Brasil no século 18 e se consolidaram no país ainda imperial e culturalmente colonizado do século posterior. Érika Martins canta modinhas à sua moda pop indie. É esse desapego ao passado que impede Modinhas de soar mofado, antigo. Produzido por Felipe Rodarte sob a direção artística de Constança Scofield, o CD entrelaça presente e passado sem ar nostálgico. Isso faz com que, no diálogo musical de Modinhas, um aderente pop rock como Rolo compressor (Pedro Veríssimo e Fernando Aranha) - que poderia ser hit se o rock ainda fosse moda no Brasil - se afine com a releitura de Casinha pequenina (autor desconhecido), erguida harmoniosamente por Érika na praia do reggae e na onda do som dos Balcãs (região do Sudeste europeu). Casinha pequenina - que já abrigou vozes de cantores como o carioca Silvio Caldas (1908 - 1998) e a capixaba Nara Leão (1942 - 1989) - ressurge remodelada no registro de Érika, mas com a arquitetura melódica original. O respeito às melodias - novas ou antigas - legitima a incursão da cantora por duas modinhas. Uma é a Modinha do compositor carioca Sérgio Bittencourt (1941 - 1979), lançada em 1968 na voz consciente do cantor uruguaio brasileiro Taiguara (1945 - 1996) e repaginada pela artista em clima noise. A outra é a Modinha de outro compositor carioca, Heitor Villa-Lobos (1887 - 1959), que ganhou versos solenes do poeta pernambucano Manuel Bandeira (1886 - 1968). Peça 5 da obra Serestas, a Modinha de Villa-Lobos é - na gravação feita por Érika com o cantor pernambucano Otto - o ponto de contato mais próximo do disco com a forma tradicional do gênero musical que o inspirou. Mesmo assim, Villa-Lobos é inserido em universo indie. Em outro lugar do passado, a regravação de Dar-te-ei (Marcelo Jeneci, Helder Lopes, José Miguel Wisnik e Verônica Pessoa) - música do primeiro álbum do paulista Marcelo Jeneci, Feito pra acabar (Slap, 2010) - enfatiza a influência benéfica que a Jovem Guarda exerce no som de Jeneci. Dar-te-ei é cantada por Érika com a necessária leveza e com o toque do grupo carioca Autoramas. Entre a levada roqueira de Fundidos (tema da lavra de Botika Botikay, vocalista do grupo carioca Os Outros) e a respeitosa abordagem de Prelúdio para ninar gente grande (Menino passarinho) (Luis Vieira), feita com o duo chileno Perrosky, Modinhas apresenta inédita de Tom Zé, A curi, criada pelo compositor baiano - no tom lúdico que caracteriza parte de sua obra - para Érika, em agradecimento ao fato de a cantora ter dado voz à sua música Namorinho de portão (1968) em disco da banda Penélope. Bonita - balada do compositor carioca Marcelo Frota (o MoMo) que faz jus ao título - contribui para alargar o eixo estético de disco que se equilibra com graça entre passado e presente. Por mais que música ligeiramente menos envolvente como Memorabília (de autoria da própria Érika, com bom refrão) atenue por instantes o poder de sedução de Modinhas, o disco resulta coeso e mais interessante do que o primeiro CD solo da artista, Érika Martins (2009). À moda pop indie, Modinhas é álbum com cacife para impulsionar a carreira fonográfica de Érika Martins.

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  2. Taí: vou ouvir.

    Érika Martins parece passar por um período de evolução artística. Deixou de lado aquele tom "menininha fofinha" dos tempos de Penélope - tudo bem, era opção artística válida, tinha uma intenção, mas aquela vozinha de "Holiday", o grande "quase sucesso" da banda... papagaio! Que coisa insuportável! Estragava até coisas irretocáveis como o dueto com Herbert Vianna na versão para "Inbetween days", em "O som do sim", terceiro disco solo deste.

    Enfim, ela tinha talento desde a época, mas não concretizava, a meu ver. Agora consegue. Que bom!

    Felipe dos Santos Souza

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  3. Não conheço essa cantora.Eu só queria dizer,que não conheço capixaba mais carioca que Nara Leão.

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  4. Mauro, por favor, poderia responder de quem é a autorias das faixas "Viens Ici" e a versão em espanhol de "Preludiio...", "Ganas de Voltar"? É para me ajudar no meu trabalho de pesquisa musical. Obrigado desde já e abraço!

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