Título: Amigo Cyro, muito te admiro!
Texto: Rodrigo Alzuguir
Direção: André Paes Leme
Direção musical e arranjos: Luis Barcelos
Elenco: Alexandre Dantas, Claudia Ventura, Milton Filho e Rodrigo Alzuguir
Foto: Silvana Marques
Cotação: * * *
Musical em cartaz no Teatro II do CCBB do Rio de Janeiro (RJ) até 9 de fevereiro de 2014
Uma mesa de sinuca de botequim ocupa o centro do palco na encenação de Amigo Cyro, muito te admiro!, musical que estreou no Rio de Janeiro (RJ) em 3 de janeiro de 2014 para festejar, já com atraso, o centenário de nascimento do cantor carioca Cyro Monteiro (28 de maio de 1913 - 13 de julho de 1973). Na cena erguida com graça pelo diretor André Paes Leme, os tacos dessa sinuca simulam em determinado momento as janelas da casa do artista. Em outro instante, duas bolas dessa mesma sinuca são os peitos de mulher alvo do interesse de Cyro. Somadas à harmonia e afinação dos quatro atores (Alexandre Dantas, Claudia Ventura, Milton Filho e Rodrigo Alzuguir) que interagem para contar as passagens mais importantes da vida e obra do cantor, as soluções cênicas de Paes Leme valorizam o texto essencialmente narrativo do musical. Escrito por Rodrigo Alzuguir com base em duas extensas entrevistas retrospectivas concedidas por Cyro em 1970, três anos antes de sua saída de cena, o texto do musical é seu ponto fraco por abdicar da ação teatral. Sem construir uma dramaturgia propriamente dita, o texto se limita a expor - na primeira pessoa - preferências, causos e acontecimentos da vida e obra do artista entre breves (e leves) teatralizações de momentos emblemáticos da trajetória do cantor que lançou em 1938 o samba Se acaso você chegasse (Lupicínio Rodrigues). Contudo, diretor e elenco driblam as limitações de texto narrativo e estabelecem boa comunicação com a plateia, especialmente na segunda metade do musical, quando o jogo cênico já está estabelecido e se desenrola com mais fluência. O musical abole também a figura do protagonista. Todos os quatro atores encarnam Cyro em cena e se revezam nas interpretações das 30 músicas do roteiro. Em sua grande maioria, são sambas, gênero musical predileto do imortal Rei do Telecoteco. Sem grandes vozes e interpretações individuais, o espetáculo se escora - do ponto de vista musical - na combinação sempre harmoniosa do canto dos quatro atores, embora seja justo destacar o solo de Claudia Ventura na melancólica Testamento (Cyro Monteiro e Dias da Cruz). Para o público que pouco ou nada ouviu falar de Cyro Monteiro, o espetáculo cumpre com certo didatismo a função de informar sobre quem foi esse artista que caiu com suingue no samba carioca. São relatados em cena o medo de avião (com piada repetida à exaustão), a briga com Ary Barroso (1903 - 1964) por conta da recusa de samba do compositor mineiro e a perseguição pessoal do diretor artístico da gravadora na qual o cantor atuava no coro antes do sucesso, entre outros fatos mais ou menos relevantes. Cyro Monteiro viveu seu auge artístico nos anos 1940 e 1950. Sua voz manemolente propagou sambas como Beija-me (Roberto Martins e Mário Rossi, 1943), Escurinho (Geraldo Pereira, 1955), Oh, seu Oscar (Wilson Baptista e Ataulfo Alves, 1939) - alocado no roteiro para expor a presença forte da voz de Cyro nos Carnavais de sua época áurea - e Formosa (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1963), sucesso da segunda fase da longa carreira do artista, que tirou um pulmão, por conta de complicações decorrentes de tuberculose, mas se manteve em cena como cantor, dando continuidade a uma carreira na qual nem o próprio Cyro acreditava mais após a operação. Enfim, Amigo Cyro, muito te admiro! - musical cujo título vem do samba Ilmo Sr. Ciro Monteiro ou receita para virar casaca de neném (1969), composto por Chico Buarque ao recusar a camisa rubro-negra com a qual Cyro, doente flamenguista, presenteara sua filha recém-nascida - tem lá sua graça e seu telecoteco, mesmo abdicando da forma essencial da ação teatral. Mérito dos atores e direção.
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Uma mesa de sinuca de botequim ocupa o centro do palco na encenação de Amigo Cyro, muito te admiro!, musical que estreou no Rio de Janeiro (RJ) em 3 de janeiro de 2014 para festejar, já com atraso, o centenário de nascimento do cantor carioca Cyro Monteiro (28 de maio de 2013 - 13 de julho de 1973). Na cena erguida com graça pelo diretor André Paes Leme, os tacos dessa sinuca simulam em determinado momento as janelas da casa do artista. Em outro instante, duas bolas dessa mesma sinuca são os peitos de mulher alvo do interesse de Cyro. Somadas à harmonia e afinação dos quatro atores (Alexandre Dantas, Claudia Ventura, Milton Filho e Rodrigo Alzuguir) que interagem para contar as passagens mais importantes da vida e obra do cantor, as soluções cênicas de Paes Leme valorizam o texto essencialmente narrativo do musical. Escrito por Rodrigo Alzuguir com base em duas extensas entrevistas retrospectivas concedidas por Cyro em 1970, três anos antes de sua saída de cena, o texto do musical é seu ponto fraco por abdicar da ação teatral. Sem construir uma dramaturgia propriamente dita, o texto se limita a expor, na primeira pessoa, preferências, causos e acontecimentos da vida e obra do artista entre breves teatralizações de momentos emblemáticos da trajetória do cantor que lançou em 1938 o samba Se acaso você chegasse (Lupicínio Rodrigues). Contudo, diretor e elenco driblam as limitações de texto narrativo e estabelecem boa comunicação com a plateia, sobretudo na segunda metade do musical, quando o jogo cênico já está estabelecido e se desenrola com mais fluência. O musical abole também a figura do protagonista. Todos os quatro atores encarnam Cyro em cena e se revezam nas interpretações das 30 músicas do roteiro. Em sua grande maioria, são sambas, gênero musical predileto do imortal Rei do Telecoteco. Sem grandes vozes e interpretações individuais, o espetáculo se escora - do ponto de vista musical - na combinação sempre harmoniosa do canto dos quatro atores, embora seja justo destacar o solo de Claudia Ventura na melancólica Testamento (Cyro Monteiro e Dias da Cruz). Para o público que pouco ou nada ouviu falar de Cyro Monteiro, o espetáculo cumpre com certo didatismo a função de informar sobre quem foi esse artista que caiu com suingue no samba carioca. São relatados em cena o medo de avião (com piada repetida à exaustão), a briga com Ary Barroso (1903 - 1964) por conta da recusa de samba do compositor mineiro e a perseguição pessoal do diretor artístico da gravadora na qual o cantor atuava no coro antes do sucesso, entre outros fatos mais ou menos relevantes. Cyro Monteiro viveu seu auge artístico nos anos 1940 e 1950. Sua voz manemolente propagou sambas como Beija-me (Roberto Martins e Mário Rossi, 1943), Escurinho (Geraldo Pereira, 1955), Oh, seu Oscar (Wilson Baptista e Ataulfo Alves, 1939) - alocado no roteiro para expor a presença forte da voz de Cyro nos Carnavais de sua época áurea - e Formosa (Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1963), sucesso da segunda fase da longa carreira do artista, que tirou um pulmão, por conta de complicações decorrentes de tuberculose, mas se manteve em cena como cantor, dando continuidade a uma carreira na qual nem o próprio Cyro acreditava mais após a operação. Enfim, Amigo Cyro, muito te admiro! - musical cujo título vem do samba Ilmo Sr. Ciro Monteiro ou receita para virar casaca de neném (1969), composto por Chico Buarque ao recusar a camisa rubro-negra com a qual Cyro, doente flamenguista, presenteara sua filha recém-nascida - tem lá sua graça e seu telecoteco, mesmo abdicando da forma essencial da ação teatral. Mérito dos atores e direção!
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