Título: Zerima
Artista: Luiz Melodia
Gravadora: Som Livre
Cotação: * * * *
♪ Primeiro disco de inéditas de Luiz Melodia desde Retrato do artista quando coisa (Indie Records, 2001), Zerima é álbum que sintoniza a antenada Estação Melodia, fiel à ideologia e aos sons deste cantor e compositor carioca de assinatura pessoal e intransferível na música brasileira. Neste 15º título da discografia oficial de Melodia, o samba domina o repertório, mas sem clichês melódicos ou poéticos. Entre amores, dores e dengos, Zerima molda o retrato deste artista de 63 anos no tempo sereno da maturidade. Seja no dengo expressado entre as síncopes de Cheia de graça, samba de Melodia com o parceiro Ricardo Augusto que abre o álbum com metais e balanço, seja na obstinação que move outro samba que cai no suingue, Vou com você (Luiz Melodia), o Negro Gato delineia sua assinatura única em apaixonados temas autorais como Caindo de bêbado (Luiz Melodia e Rúbia Matos), levado com leveza no assovio e na resignação pela perda do amor no qual investiu até dinheiro. Dentre as novidades autorais, Dor de Carnaval (Luiz Melodia) - samba melancólico gravado por Melodia com a adesão da cantora e compositora paulistana Céu - é uma das maravilhas contemporâneas que tornam Zerima um dos álbuns mais inspirados do artista projetado em 1971 no cristal de Gal Costa. Dor de Carnaval expia o fracasso da escola que não ganhou e do samba que não saiu, deixando a cabrocha e a favela na fossa. Flashback nostálgico da vida de uma estrela que já brilha no céu, a delicada Zerima (Luiz Melodia) também exala fina melancolia, reiterando a iluminação do artista no disco. Voz incomum do morro que nunca se deixou enquadrar no rótulo de sambista, embora sempre tenha reafirmado a força da raça e do ritmo a cada disco, o veludo de Melodia resplandece em ótima forma neste disco em que, fora da seara autoral, o cantor revisita - no toque de uma harmônica - samba pouco ouvido da parceria de Ivone Lara com Délcio Carvalho (1939 - 2013), Nova era. Lançado por Ivone Lara no álbum Sempre a cantar (MZA Music / Universal Music, 2004), Nova era expõe o otimismo recorrente na obra poética da dupla de compositores. Mas Zerima também exprime urgências. "Tenho pressa porque sei que o tempo voa", admite Melodia em verso da apaixonada valsa-canção Do coração de um homem bom (Ricardo Augusto), faixa de aura vintage. Sim, em essência, Zerima é disco de amor em tempos maduros, como mostra o samba-canção Cura (Luiz Melodia e Renato Piau), de versos lupicinianos que retratam a restauração de um amor do passado a partir de reencontro casual numa esquina da vida. Com sabor de mel, Sonho real (Luiz Melodia e Renato Piau) também derrama amor em cadência suave. "Faça amor sem pudor", receita Papai do Céu (Luiz Melodia), apontando em mix de samba, blues e folk o antídoto que pode amenizar as dores de mundo atrapalhado por "miséria, armadilhas e arpões". Compositor recorrente nas fichas técnicas de álbuns de Melodia, o capixaba Sergio Sampaio (1947 - 1994) está presente em Zerima com melodiosa abordagem de Leros e leros e boleros, música de 1973 que também fala de Papai do Céu ("Vou me fazer de eterno no meu encontro com Deus") ao encarar a finitude. Ponto dissonante do disco, a trivial regravação do samba Maracangalha (Dorival Caymmi, 1956) cai como um elemento alienígena na atmosfera de Zerima - e não é por causa do rap posto por Mahal Reis, filho de Melodia, com base na letra precisa do centenário compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008). E por falar na velha Bahia, Moça bonita (de autoria de Jane Reis, mulher de Melodia) também desloca o suingue sedutor de Zerima para o Nordeste, ecoando na faixa dançante a batida do Recôncavo em rota que soa surpreendente para disco que fecha com o groove do tema instrumental A música do Nicholas (Luiz Melodia). Descontado o fim inusitado, Zerima flagra Melodia (ainda) cheio de graça e inspiração.
4 comentários:
Primeiro disco de inéditas de Luiz Melodia desde Retrato do artista quando coisa (Indie Records, 2001), Zerima é álbum que sintoniza a antenada Estação Melodia, fiel à ideologia e aos sons deste cantor e compositor carioca de assinatura pessoal e intransferível na música brasileira. Neste 15º título da discografia oficial de Melodia, o samba domina o repertório, mas sem clichês melódicos ou poéticos. Entre amores, dores e dengos, Zerima molda o retrato deste artista de 63 anos no tempo sereno da maturidade. Seja no dengo expressado entre as síncopes de Cheia de graça, samba que abre o álbum com metais e balanço, seja na obstinação que move outro samba que cai no suingue, Vou com você, Melodia delineia sua assinatura única em apaixonados temas autorais como Caindo de bêbado, levado com leveza no assovio e na resignação pela perda do amor no qual investiu até dinheiro. Dentre as novidades autorais, Dor de Carnaval - samba melancólico gravado por Melodia com a adesão da cantora e compositora paulistana Céu - é uma das maravilhas contemporâneas que tornam Zerima um dos álbuns mais inspirados do artista projetado em 1971 no cristal de Gal Costa. Dor de Carnaval expia o fracasso da escola que não ganhou e do samba que não saiu, deixando a cabrocha e a favela na fossa. Flashback nostálgico da vida de uma estrela que já brilha no céu, a delicada Zerima também exala fina melancolia, reiterando a iluminação do artista no disco. Voz incomum do morro que nunca se deixou enquadrar no rótulo de sambista, embora sempre tenha reafirmado a força da raça e do ritmo a cada disco, o veludo de Melodia resplandece em ótima forma neste disco em que, fora da seara autoral, o cantor revisita - no toque de uma harmônica - samba pouco ouvido da parceria de Ivone Lara com Délcio Carvalho (1939 - 2013), Nova era. Lançado por Ivone Lara em seu álbum Sempre a cantar (MZA Music / Universal Music, 2004), Nova era expõe o otimismo recorrente na obra poética da dupla de compositores. Mas Zerima também exprime urgências. "Tenho pressa porque sei que o tempo voa", admite Melodia em verso da apaixonada valsa-canção Do coração de um homem bom, faixa de aura vintage. Sim, em essência, Zerima é disco de amor em tempos maduros, como mostra o samba-canção A cura, de versos lupicinianos que retratam a restauração de um amor do passado a partir de reencontro casual numa esquina da vida. Com sabor de mel, Sonho real também derrama amor em cadência suave. "Faça amor sem pudor", receita Papai do Céu, apontando em mix de samba, blues e folk o antídoto que pode amenizar as dores de mundo atrapalhado por "miséria, armadilhas e arpões". Compositor recorrente nas fichas técnicas de álbuns de Melodia, o capixaba Sergio Sampaio (1947 - 1994) está presente em Zerima com melodiosa abordagem de Leros e leros e boleros, música de 1973 que também fala de Papai do Céu ("Vou me fazer de eterno no meu encontro com Deus") ao encarar a finitude. Ponto dissonante do disco, a trivial regravação do samba Maracangalha (Dorival Caymmi, 1956) parece elemento alienígena na atmosfera de Zerima - e não é por causa do rap posto por Mahal Reis, filho de Melodia, com base na letra do centenário compositor baiano Dorival Caymmi (1914 - 2008). E por falar na velha Bahia, Moça bonita também desloca o suingue de Zerima para o Nordeste, ecoando na sedutora faixa a batida do Recôncavo em rota que soa surpreendente para disco que fecha com o groove do tema instrumental A música do Nicholas. Descontado o fim inusitado, Zerima flagra Luiz Melodia cheio de graça e inspiração.
Gente parece um menino o Melodia com 63 anos,benza Deus! Estou curioso para ouvir este trabalho, certamente vem coisa boa. O último que escutei dele foi o delicioso Estação Melodia de 2007 onde ele regravou "Contrastes" do macalé, tem também " Eu agora sou feliz" e "Recado que Maria mandou" que eu adoro! Não sei se Estação Melodia é o último anterior á este, só sei que é belo, assim como Luiz Melodia que eu Amooo :)
Mauro xará, o anterior a 'Zerima' é o 'Estação Melodia ao vivo', de 2008. Abs, NauroF
Mauro,
Banaca o seu texto sobre O novo CD de Melodia. Maravilhoso é esse álbum. Conheço de cabo a rabo a obra dessa camarada tive oportunidade de assistir a um show dele no ano passado e ele esta a cada melhor.
Saudações
Hever
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