Mauro Ferreira no G1

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quinta-feira, 5 de junho de 2014

Tania, Lucinha e Virgínia dramatizam palavra feminina de Chico em cena

Resenha de musical
Título: Palavra de mulher
Direção: Fernando Cardoso
Direção musical: Ogair Junior
Elenco: Tania Alves, Lucinha Lins e Virgínia Rosa 
Foto: João Caldas
Cotação: * * 1/2
Em cartaz no Teatro Maison de France, no Rio de Janeiro (RJ), até 8 de junho de 2014

Espetáculo centrado na obra teatral de Chico Buarque que vem percorrendo o Brasil em turnê nacional desde 2013, Palavra de mulher está em cartaz no Rio de Janeiro (RJ) - cidade natal do compositor - neste mês de junho de 2014 em que o artista completa 70 anos de vida. Embora propagado como um musical, Palavra de mulher se enquadra mais na moldura de um show teatralizado. Pouco texto é dito. As letras das canções é que criam o clima teatral. Em cena, três cantoras - Tania Alves, Lucinha Lins e Virgínia Rosa - se alternam e se unem na abordagem do irretocável cancioneiro escrito por Chico sob ótica geralmente feminina. Ambientado em clima de cabaré, o espetáculo prioriza os solos em detrimento dos duetos e números coletivos. A harmoniosa combinação das vozes das três cantoras em Fora de hora (Dori Caymmi e Chico Buarque, 2002) sugere, já no arremate do espetáculo, que as interpretações em trio deveriam ter sido mais exploradas pelo diretor Fernando Cardoso. Do jeito que o roteiro foi concebido, é quase como se Palavra de mulher enfileirasse sets individuais das três intérpretes. A primeira a dominar a cena é a paulistana Virgínia Rosa. Embora seja a cantora menos conhecida das três e a menos identificada com a obra teatral de Chico, Rosa é a que desabrocha de forma mais sedutora em cena. Seus vocais na introdução de O que será (À flor da pele) (Chico Buarque, 1976) exemplificam o frescor com que a cantora dá voz a Chico. A opção de cantar Terezinha (Chico Buarque, 1977) em três modos distintos - numa escala de tons que vai do infantil ao sensual, delineando a abordagem de cada um dos três pretendentes na vida da personagem-título - é outro acerto. O belo fraseado de Rosa em Meu namorado (Edu Lobo e Chico Buarque, 1983) reitera a luminosidade da presença da cantora no espetáculo. Segunda a dominar a cena, Tania Alves - atriz e cantora carioca, embora associada à cultura nordestina - peca pelo excesso, dramatizando músicas já em si teatrais, como Bem querer (Chico Buarque, 1975), no limite do exagero. Em Sob medida (Chico Buarque, 1979), Tania aproveita o tom oferecido dos versos do bolero para fazer número de plateia, personificando a prostituta da canção que, na sequência, disputa um homem - um espectador escolhido por Tânia durante a intervenção na plateia em Sob medida - com outra prostituta, encarnada por Virgínia Rosa. O texto das duas é o diálogo de O meu amor (Chico Buarque, 1977), canção que se presta com naturalidade ao número teatral. Por fim, é Lucinha Lins - no papel da cafetina do cabaré - quem domina a cena com set calcado na nostalgia e no orgulho de ter feito parte do elenco de musicais como Ópera do malandro (1978), Os Saltimbancos (1981) e O corsário do rei (1985), de cuja trilha sonora canta o Tango de Nancy (Chico Buarque e Edu Lobo, 1985), tema de sua personagem Nancy. Lucinha tem contra si o fato de encarar músicas que já ganharam interpretações irretocáveis e ainda frescas nas memórias da geração que consumiu a MPB dos anos 1970. Afinal, como dissociar Atrás da porta (Francis Hime e Chico Buarque, 1972) da voz soberana de Elis Regina (1945 - 1982)? E como ouvir Olhos nos olhos (Chico Buarque, 1976) sem pensar instantaneamente na gravação original feita em 1976 por Maria Bethânia, intérprete  vocacionada para cantar as palavras teatrais e femininas de Chico Buarque por ser dona de canto naturalmente dramático? Confrontos inevitáveis à parte, Palavra de mulher é espetáculo que reitera a grandeza da obra do compositor entre a reverência e a liberdade de criar clima jazzy em determinadas passagens instrumentais de músicas que resistem ao tempo por sua arquitetura bonita e sólida.

6 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Espetáculo centrado na obra teatral de Chico Buarque que vem percorrendo o Brasil em turnê nacional desde 2013, Palavra de mulher está em cartaz no Rio de Janeiro (RJ) - cidade natal do compositor - neste mês de junho de 2014 em que o artista completa 70 anos de vida. Embora propagado como um musical, Palavra de mulher se enquadra mais na moldura de um show teatralizado. Pouco texto é dito. As letras das canções é que criam o clima teatral. Em cena, três cantoras - Tania Alves, Lucinha Lins e Virgínia Rosa - se alternam e se unem na abordagem do irretocável cancioneiro escrito por Chico sob ótica geralmente feminina. Ambientado em clima de cabaré, o espetáculo prioriza os solos em detrimento dos duetos e números coletivos. A harmoniosa combinação das vozes das três cantoras em Fora de hora (Dori Caymmi e Chico Buarque, 2002) sugere, já no arremate do espetáculo, que as interpretações em trio deveriam ter sido mais exploradas pelo diretor Fernando Cardoso. Do jeito que o roteiro foi concebido, é quase como se Palavra de mulher enfileirasse sets individuais das três intérpretes. A primeira a dominar a cena é a paulistana Virgínia Rosa. Embora seja a cantora menos conhecida das três e a menos identificada com a obra teatral de Chico, Rosa é a que desabrocha de forma mais sedutora em cena. Seus vocais na introdução de O que será (À flor da pele) (Chico Buarque, 1976) exemplificam o frescor com que a cantora dá voz a Chico. A opção de cantar Terezinha (Chico Buarque, 1977) em três modos distintos - numa escala de tons que vai do infantil ao sensual, delineando a abordagem de cada um dos três pretendentes na vida da personagem-título - é outro acerto. O belo fraseado de Rosa em Meu namorado (Edu Lobo e Chico Buarque, 1983) reitera a luminosidade da presença da cantora no espetáculo. Segunda a dominar a cena, Tania Alves - atriz e cantora carioca, embora associada à cultura nordestina - peca pelo excesso, dramatizando músicas já em si teatrais, como Bem querer (Chico Buarque, 1975), no limite do exagero. Em Sob medida (Chico Buarque, 1979), Tania aproveita o tom oferecido dos versos do bolero para fazer número de plateia, personificando a prostituta da canção que, na sequência, disputa um homem - um espectador escolhido por Tânia durante a intervenção na plateia em Sob medida - com outra prostituta, encarnada por Virgínia Rosa. O texto das duas é o diálogo de O meu amor (Chico Buarque, 1977), canção que se presta com naturalidade ao número teatral. Por fim, é Lucinha Lins - no papel da cafetina do cabaré - quem domina a cena com set calcado na nostalgia e no orgulho de ter feito parte do elenco de musicais como Ópera do malandro (1978), Os Saltimbancos (1977) e O corsário do rei (1985), de cuja trilha sonora canta o Tango de Nancy (Chico Buarque e Edu Lobo, 1985), tema de sua personagem Nancy. Lucinha tem contra si o fato de encarar músicas que já ganharam interpretações irretocáveis e ainda frescas nas memórias da geração que consumiu a MPB dos anos 1970. Afinal, como dissociar Atrás da porta (Francis Hime e Chico Buarque, 1972) da voz soberana de Elis Regina (1945 - 1982)? E como ouvir Olhos nos olhos (Chico Buarque, 1976) sem pensar instantaneamente na gravação original feita em 1976 por Maria Bethânia, intérprete vocacionada para cantar as palavras teatrais e femininas de Chico Buarque por ser dona de canto naturalmente dramático? Confrontos inevitáveis à parte, Palavra de mulher é espetáculo que reitera a grandeza da obra do compositor entre a reverência e a liberdade de criar clima jazzy em determinadas passagens instrumentais de músicas que resistem ao tempo por sua arquitetura bonita e sólida.

Unknown disse...

Assisti em Santos no Teatro Coliseu e adorei, podiam voltar. Ideal seria gravar em cd e dvd.

Douglas Carvalho disse...

Virgínia Rosa é mesmo a menos conhecida das três (aliás, excetuando-se São Paulo e mais duas ou três capitais, ela é DESCONHECIDA). Mas é a melhor e mais cantora entre as três.

Lucinha sempre foi cantora bissexta. E Tânia Alves sempre foi exagerada quando não desagradável de escutar. E ambas são muito mais atrizes que cantoras.

O país precisa conhecer mais suas ótimas cantoras pouco valorizadas, como é o caso de Virgínia Rosa.

Fábio disse...

Lucinha Lins fez Ópera do Malandro no teatro, mas na montagem de 2003. E estrelou Os Saltimbancos Trapalhões no cinema, em 1981.

Marcelo disse...

Esse show foi maravilhoso e merecia um cd e dvd sim.

Unknown disse...

Assisti e achei MARAVILHOSO! Tania, Virginia e Lucinha dão um show. Assistiris de novo, de novo e de novo.
(quanto a comparar Elis no seu texto, foi jogar baixo, SORRY! tem coisas q sao incomparáveis e vc, como critico deveria saber disso)