Mauro Ferreira no G1

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quinta-feira, 31 de julho de 2014

Clichês e contradições esvaziam 'Viva a revolução', o raso EP do Capital

Resenha de CD
Título: Viva a revolução
Artista: Capital Inicial
Gravadora: Sony Music
Cotação: * *

Questões sociais e políticas - se abordadas em disco com consistência e consciência - podem render álbuns relevantes que, com o passar dos anos, se tornam clássicos e viram a radiografia dos anseios de um tempo e lugar. Exemplo é O concreto já rachou (EMI- Odeon, 1986), sólido disco de estreia da banda brasiliense Plebe Rude. Pulsava ali, naquele disco rotulado à época como mini-LP, um genuíno sentimento popular de indignação contra o estado natural das coisas na República de Sarney e dos bananas. Toda a solidez do disco da Plebe Rude rói em Viva a revolução, EP do Capital Inicial, grupo originário do mesmo ambiente punk de Brasília (DF) que gerou a Plebe Rude. Com seis músicas inéditas alocadas em sete faixas (a panfletária composição-título Viva a revolução aparece em duas versões), o disco - produzido por Liminha - versa sobre as manifestações sociais que agitaram o Brasil a partir de junho de 2013. Embora o assunto ainda seja pertinente, pois consequências dos protestos ainda ecoam no país, o disco chega ao mercado fonográfico com a impressão de estar atrasado em um ano. Mesmo assim, a perda do timing seria detalhe irrelevante se o EP não soasse raso, esvaziado entre clichês e contradições. "Não baixaremos a cabeça para ninguém", avisa o grupo carioca Cone Crew Diretoria no rap posto na música-título Viva a revolução (Dinho Ouro Preto, Alvin L., Ari, Batoré, Cert, Maomé, Rany Money e Papatinho), também apresentada ao fim do disco em gravação feita pelo Capital Inicial sem o rap da banda, como a música foi criada por Alvin L. com Dinho. "Em tempos assim, é melhor baixar a cabeça e deixar a tempestade passar", pondera o vocalista Dinho Ouro Preto em versos no rock Bom dia, mundo cruel (Dinho Ouro Preto e Alvin L.), sinalizando a falta de ideologia e diretriz que pauta o repertório inédito. Entre versos-clichês como "A violência da televisão explode em mentira no ar", do pop rock Tarde demais (Dinho Ouro Preto e Alvin L.), o Capital Inicial recorre às tradicionais baladas para manter por perto o pacífico público conquistado a partir de seu milionário Acústico MTV (Abril Music, 2000), divisor de águas na irregular discografia do grupo. Na seara das baladas, Coração vazio (Dinho Ouro Preto, Alvin L. e Thiago Castanho) - canção levada ao violão, em clima folk - tem a participação de Thiago Castanho, guitarrista egresso do desativado grupo paulista Charlie Brown Jr. Já Melhor do que ontem (Dinho Ouro Preto, Alvin L. e Thiago Castanho) - balada já lançada como single do EP - é bem menos explícita na abordagem do tema central do disco, servindo bem para promover Viva a revolução. Talvez seja melhor mesmo ignorar toda a questão política, pois, quando decide ir direto ao assunto, como no rock Não tenho nome (Dinho Ouro Preto e Alvin L.), o Capital Inicial deixa uma sensação incômoda de ter feito disco artificial que passará despercebido para a plebe rude. Seu concreto já rachou.

2 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Questões sociais e políticas - se abordadas em disco com consistência e consciência - podem render álbuns relevantes que, com o passar dos anos, se tornam clássicos e viram a radiografia dos anseios de um tempo e lugar. Exemplo é O concreto já rachou (EMI- Odeon, 1986), sólido disco de estreia da banda brasiliense Plebe Rude. Pulsava ali, naquele disco rotulado à época como mini-LP, um genuíno sentimento popular de indignação contra o estado natural das coisas na República de Sarney e dos bananas. Toda a solidez do disco da Plebe Rude rói em Viva a revolução, EP do Capital Inicial, grupo originário do mesmo ambiente punk de Brasília (DF) que gerou a Plebe Rude. Com seis músicas inéditas alocadas em sete faixas (a panfletária composição-título Viva a revolução aparece em duas versões), o disco - produzido por Liminha - versa sobre as manifestações sociais que agitaram o Brasil a partir de junho de 2013. Embora o assunto ainda seja pertinente, pois consequências dos protestos ainda ecoam no país, o disco chega ao mercado fonográfico com a impressão de estar atrasado em um ano. Mesmo assim, a perda do timing seria detalhe irrelevante se o EP não soasse raso, esvaziado entre clichês e contradições. "Não baixaremos a cabeça para ninguém", avisa o grupo carioca Cone Crew Diretoria no rap posto na música-título Viva a revolução (também apresentada ao fim do disco em gravação feita pelo Capital Inicial sem o rap da banda). "Em tempos assim, é melhor baixar a cabeça e deixar a tempestade passar", pondera o vocalista Dinho Ouro Preto em versos no rock Bom dia, mundo cruel, sinalizando a falta de ideologia e diretriz que pauta o repertório inédito. Entre versos-clichês como "A violência da televisão explode em mentira no ar", do pop rock Tarde demais, o Capital Inicial recorre às tradicionais baladas para manter por perto o pacífico público conquistado a partir de seu milionário Acústico MTV (Abril Music, 2000), divisor de águas na irregular discografia do grupo. Na seara das baladas, Coração vazio - canção levada ao violão, em clima folk - tem a participação de Thiago Castanho, guitarrista egresso do desativado grupo paulista Charlie Brown Jr. Já Melhor do que ontem - balada já lançada como single do EP - é bem menos explícita na abordagem do tema central do disco, servindo bem para promover Viva a revolução. Talvez seja melhor mesmo, pois, quando vai direto ao assunto, como no rock Não tenho nome, o Capital Inicial deixa a sensação incômoda de ter feito disco artificial que passará despercebido para a plebe rude. Seu concreto já rachou.

Felipe dos Santos disse...

A impressão que eu tenho é que o Capital anda lançando discos sem muito critério. Anda desovando muita coisa, sem aquela pausa necessária para separar o joio do trigo antes de lançar coisa inédita.

Felipe dos Santos Souza