Resenha de livro
Título: O voo da palavra cantada
Autor: Carlos Rennó
Editora: Dash
Cotação: * * *
Por conciliar os ofícios de compositor e jornalista especializado em música, Carlos Rennó sempre teve que buscar o equilíbrio delicado no exercício dessas duas profissões, já que a função de analista de discos e obras musicais requer - idealmente... - distanciamento entre crítico e artistas para que a avaliação não seja contaminada por simpatias e conveniências. A leitura de O voo das palavras cantadas - livro que compila textos escritos sobre a letra e a poesia na música popular, publicados por Rennó em jornais e revistas ao longo das três últimas décadas - evidencia que o jornalista decola com maior dificuldade na medida em que sua escrita fina e elegante expressa maior devoção ao compositor alvo de sua análise. Por mais que Rennó tenha a capacidade de diagnosticar com precisão os voos poéticos dos letristas, seus textos por vezes deixam transparecer a necessidade de incensar determinados compositores. Traço notado sobretudo nos textos dedicados à análise da produção musical de ícones da MPB como Caetano Veloso e Gilberto Gil. Quando mais está distanciado do compositor sobre o qual escreve, mais Rennó atinge o céu neste livro recomendado para quem se interessa pelo voo das letras de música. São exemplares, por exemplo, os artigos escritos sobre as obras dos seminais compositores Orestes Barbosa (1893 - 1966), Noel Rosa (1910 - 1937) e Lamartine Babo (1904 - 1963). O texto sobre Orestes, sobretudo, se revela fundamental porque aprofunda visão sobre cancioneiro poético pouco ouvido e abordado na mídia. Outro ponto positivo do livro é a capacidade de Rennó de ir além do universo da MPB, reconhecendo a importância das letras cantadas por grupos como o carioca O Rappa e o paulista Racionais MC's - grupos que, mesmo fazendo um som decalcado de ritmos estrangeiros, refletem com profundidade sobre questões da sociedade brasileira com linguagem contemporânea, acessível ao público-alvo de seus respectivos repertórios. Sem amarras estéticas, Rennó também alça voo quando ignora preconceitos de seu próprio público leitor - situado nas classes A e B - e analisa as dez músicas que considera melhores no universo sertanejo, admitindo, por exemplo, a beleza popular que, sim, há em É o amor (Zezé Di Camargo, 1991). Em contrapartida, por compilar eventualmente vários textos sobre determinado compositor (há quatro artigos sobre a obra de Gilberto Gil, por exemplo), O voo das palavras cantadas esbarra em certa redundância, já que, em geral, Rennó aponta qualidades similares nesse compositor com palavras ligeiramente distintas. Mais desnecessárias são as reproduções de releases de discos. Há dois sobre álbuns do compositor paulista Peninha e, nesses casos, fica evidente que o analista se vê quase obrigado a criar motivos para elogiar o artista. Descontadas as ressalvas, o livro resulta sedutor por conta da capacidade e da seriedade com que o autor trata a letra de música. É nítida a paixão de Rennó pelo objeto de sua análise. E é justo ressaltar que, embora às vezes denote certa devoção a um ou outro compositor, essa paixão pela palavra cantada - natural por ser o autor também letrista e criador de versões em português de músicas de compositores como o norte-americano Cole Porter (1891 - 1964) - também é o combustível que faz seu texto levantar voo.
Por conciliar os ofícios de compositor e jornalista especializado em música, Carlos Rennó sempre teve que buscar o equilíbrio delicado no exercício dessas duas profissões, já que a função de analista de discos e obras musicais requer - idealmente... - distanciamento entre crítico e artistas para que a avaliação não seja contaminada por simpatias e conveniências. A leitura de O voo das palavras cantadas - livro que compila textos escritos sobre a letra e a poesia na música popular, publicados por Rennó em jornais e revistas ao longo das três últimas décadas - evidencia que o jornalista decola com maior dificuldade na medida em que sua escrita fina e elegante expressa maior devoção ao compositor alvo de sua análise. Por mais que Rennó tenha a capacidade de diagnosticar com precisão os voos poéticos dos letristas, seus textos por vezes deixam transparecer a necessidade de incensar determinados compositores. Traço notado sobretudo nos textos dedicados à análise da produção musical de ícones da MPB como Caetano Veloso e Gilberto Gil. Quando mais está distanciado do compositor sobre o qual escreve, mais Rennó atinge o céu neste livro recomendado para quem se interessa pelo voo das letras de música. São exemplares, por exemplo, os artigos escritos sobre as obras dos seminais compositores Orestes Barbosa (1893 - 1966), Noel Rosa (1910 - 1937) e Lamartine Babo (1904 - 1963). O texto sobre Orestes, sobretudo, se revela fundamental porque aprofunda visão sobre cancioneiro poético pouco ouvido e abordado na mídia. Outro ponto positivo do livro é a capacidade de Rennó de ir além do universo da MPB, reconhecendo a importância das letras cantadas por grupos como o carioca O Rappa e o paulista Racionais MC's - grupos que, mesmo fazendo um som decalcado de ritmos estrangeiros, refletem com profundidade sobre questões da sociedade brasileira com linguagem contemporânea, acessível ao público-alvo de seus respectivos repertórios. Sem amarras estéticas, Rennó também alça voo quando ignora preconceitos de seu próprio público leitor - situado nas classes A e B - e analisa as dez músicas que considera melhores no universo sertanejo, admitindo, por exemplo, a beleza popular que, sim, há em É o amor (Zezé Di Camargo, 1991). Em contrapartida, por compilar eventualmente vários textos sobre determinado compositor (há quatro artigos sobre a obra de Gilberto Gil, por exemplo), O voo das palavras cantadas esbarra em certa redundância, já que, em geral, Rennó aponta qualidades similares nesse compositor com palavras ligeiramente distintas. Mais desnecessárias são as reproduções de releases de discos. Há dois sobre álbuns do compositor paulista Peninha e, nesses casos, fica evidente que o analista se vê quase obrigado a criar motivos para elogiar o artista. Descontadas as ressalvas, o livro resulta sedutor por conta da capacidade e da seriedade com que o autor trata a letra de música. É nítida a paixão de Rennó pelo objeto de sua análise. E é justo ressaltar que, embora às vezes denote certa devoção a um ou outro compositor, essa paixão pela palavra cantada - natural por ser o autor também letrista e criador de versões em português de músicas de compositores como o norte-americano Cole Porter (1891 - 1964) - também é o combustível que faz seu texto levantar voo.
ResponderExcluirMisturar Caetano Veloso e Zezé Di Camargo no mesmo balaio,só pode ser provocação.No mais,as classes A e B do interiorzão do Brasil,é bem diferente das que o editor do blog conhece.
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