Título: Barulho feio
Artista: Romulo Fróes
Gravadora: YB Music
Cotação: * * * 1/2
Disco disponível para download gratuito e legalizado no site oficial do artista
♪ Quinto álbum solo de Romulo Fróes, Barulho feio é outro passo torto de Romulo Fróes em sua caminhada experimental. Trilha pavimentada à margem do mercado fonográfico desde 2001, ano do lançamento do primeiro disco do cantor, compositor e músico paulistano - um EP que abriu caminho para a edição, três anos mais tarde, do primeiro álbum de Fróes, Calado (Bizarre Music, 2004), apresentado já há uma década. De lá para cá, o artista solidificou sua parceria com os compositores e artistas plásticos paulistanos Eduardo Climachauska (o Clima) e Nuno Ramos, nomes recorrentes na ficha técnica de Barulho feio, hábeis na construção de letras embebidas em poesia contemporânea, cujos versos saltam aos ouvidos entre os ruídos sonoros e humanos que pautam Barulho feio, disco em que Fróes experimenta (des)caminhos para a canção popular brasileira. Não por acaso, a primeira das 15 músicas do disco - Não há, mas derruba (Romulo Fróes e Nuno Ramos) - é introduzida com o sopro torto do saxofone de Thiago França, músico fundamental na arquitetura de Barulho feio ao lado de Guilherme Held (na guitarra) e de Marcelo Cabral (no baixo acústico). O caminho seguido é o mais difícil. Firme nessa rota sem atalhos, Fróes impede o salto da veia de um samba-canção que circula embutida nessa faixa de abertura. O que salta aos ouvidos já de cara e sempre são os ruídos, as interferências, os barulhos feios inseridos nas músicas - como se o álbum quisesse captar a (des)organização urbana de uma metrópole. No caso, o caos e a poesia da cidade de São Paulo (SP), matérias-primas do bom disco. Os ruídos e a poesia estão por toda parte, aclimatando músicas como Na minha boca (Romulo Fróes e Alice Coutinho), Pra comer (Romulo Fróes e Clima) - visão poética do voo de um urubu à espreita aérea da carniça? - e a composição-título Barulho feio (Romulo Fróes e Nuno Ramos) em ambiente dissonante, distante do formato convencional da canção. Mas a canção está lá, ecoando citações e influências do samba e da bossa entranhada na levada básica que nortei a faixa O que era meu (Romulo Fróes e Alice Coutinho). "Dizem por aí que eu não sou nada / A pessoa mais errada / Que eu perdi a direção / Dizem que eu deixei no violão / O que em mim tinha de bom", rumina Fróes, a sós com seu violão, em versos de Como um raio (Romulo Fróes e Nuno Ramos) que evocam a morbeza romântica do cancioneiro do compositor carioca Nelson Cavaquinho (1911 - 1986) - cuja obra, a propósito, vai ser abordada por Fróes em disco previsto para ser lançado em 2015. Entoada a capella pelo cantautor de voz grave (e extremamente bem colocada neste disco produzido por Fróes com Cacá Lima), Poeira - parceria de Mariana Aydar com Nuno Ramos - espalha a poesia urbana que sobressai no disco entre melodias de moderado poder de sedução. Em Peixinho triste (Lanny Gordin, Guilherme Held e Nuno Ramos), a guitarra cria o clima dessa canção que anuncia o sol, já desaparecido na música seguinte, Cadê (Marcelo Cabral e Clima), cuja letra cita Assum preto (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, 1950). Cadê explicita a importância paradoxal do silêncio neste disco ruidoso. Entre silêncios e atonalidades, Fróes faz dueto com a cantora paulistana Juçara Marçal em Espera (Rodrigo Campos, Romulo Fróes e Alice Coutinho) e faz barulho ao amplificar a guitarra noise de Guilherme Held em Se você me quiser (Romulo Fróes e Clima) e em Noite morta (Romulo Fróes e Nuno Ramos). Já A luz dói (Clima e Nuno Ramos) clareia somente a voz de Fróes neste tema cantado a capella que encerra o disco na penumbra, mas já com a certeza de que a luz voltará. Possível metáfora para adiantar o próximo passo torto de Fróes, caminhante noturno de trilha experimental que espalha poesia no chão, sem chão. Até que o barulho não é tão feio assim.