Evento: Palavras Cruzadas #7
Título: Mariana Aydar - Nuno Ramos
Artista: Mariana Aydar (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Teatro do Oi Futuro Ipanema (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 1º de agosto de 2014
Cotação: * * * *
♪ "Qual o sol deposto for expulso do olho / Terei meu rosto novo escrito dentro das rosas", poetiza Mariana Aydar, em tom seco, ao fim do show em que dá voz a um cancioneiro majoritariamente inédito do compositor e artista plástico paulista Nuno Ramos. A cantora paulistana - que vem de dois álbuns arrojados, Peixes pássaros pessoas (Universal Music, 2009) e Cavaleiro selvagem aqui te sigo (Universal Music, 2011) - desbrava e encontra um outro (belo) caminho na aridez do samba de Nuno. Porque, em essência, é samba o que se ouve no show da sétima edição do Palavras cruzadas, projeto multimídia idealizado e dirigido por Marcio Debellian com a intenção de cruzar diversas formas de arte. Um samba torto, eventualmente ambientado em clima roqueiro - construído pela guitarra noise de Guilherme Held em músicas como Mamãe papai (Clima e Nuno Ramos, 2014) - mas que pode também ser envolvido numa aura joãogilbertiana, caso do cool Samba triste (Clima, 2014), única das 14 músicas do roteiro não assinada por Nuno Ramos. Essas músicas - belas em sua contundência, na maior parte - formam o repertório do quarto álbum de Aydar, que vai entrar em estúdio na segunda quinzena deste mês de agosto de 2014 sob a direção musical de Duani Martins. No show que teve sua primeira apresentação em 1º de agosto de 2014, no teatro do Oi Futuro Ipanema, no Rio de Janeiro (RJ), Duani sobressai, comandando a percussão com Marcelo Miranda e Maurício Badê. Na cena povoada por um saci pererê e um soldadinho de chumbo, a força dos tambores do trio dá vigor a sambas como Dedo duro (Clima e Nuno Ramos, 2014) sem ofuscar a voz de Aydar, que, aliás, está cantando muito bem. É até impressionante sua segurança na exposição de um cancioneiro que se recusa a trilhar os caminhos poéticos e melódicos mais óbvios. "Outro samba existe / Mas eu não sei onde está / Procuro / No escuro / Outro samba", sinalizam versos do já mencionado Samba triste, levado por Aydar somente ao violão. Alguns versos - como o de Vem na voz (Mariana Aydar e Nuno Ramos, 2014), música cantada a capella por Aydar - são poesia em estado puro. Mas a musicalidade jamais fica encoberta pela poesia. O ronco choroso e pungente da cuíca em Pedaço duma asa (Nuno Ramos, 2104) exemplifica a riqueza da musicalidade, contribuindo para que o número sobressaia no roteiro. Seco, o cancioneiro de Nuno Ramos - assinado com parceiros como Clima (também artista plástico), Romulo Fróes e a própria Mariana Aydar - parece expor berros, choros e silêncios na veia da noite. Música que batiza o ainda inédito quinto disco solo do cantor e compositor paulista Romulo Fróes, Barulho feio (2014) - parceria de Romulo com Nuno - desbrava beleza no caos urbano e afetivo no toque solitário da guitarra de Aydar. Já Isso pode (Nuno Ramos, 2014) se embrenha firme e roqueira - na pegada de Held - pelo seco sertão nordestino, culminando com apropriada citação de Carcará (João do Vale e José Cândido, 1964), música que alçou seu voo pelo Brasil há 50 anos. No roteiro coeso, sem espaço para falas convencionais, Saiba ficar quieto (Nuno Ramos, 2009) prepara o tom de Manhã azul (Duani Martins e Nuno Ramos, 2009), única música já gravada por Aydar - no belo segundo álbum, Peixes pássaros pessoas - e valorizada no show pelo toque do bandolim de Duani. No bloco final, a imperativa Caia na risada (Clima e Nuno Ramos, 2009) reitera a forte personalidade do cancioneiro de Nuno Ramos e Clima. Como os compositores, Mariana Aydar vem se recusando a seguir os caminhos fáceis - o que acabou provocando a ruptura do laço com a Universal Music, gravadora que editou os três primeiros álbuns da artista - mas é justamente ao trilhar a estranheza, o inusitado, que a voz de Aydar tem se feito ouvir entre ouvidos antenados da cena contemporânea brasileira. É por aí!
4 comentários:
"Qual o sol deposto for expulso do olho / Terei meu rosto novo escrito dentro das rosas", poetiza Mariana Aydar, em tom seco, ao fim do show em que dá voz a um cancioneiro majoritariamente inédito do compositor e artista plástico paulista Nuno Ramos. A cantora paulistana - que vem de dois álbuns arrojados, Peixes pássaros pessoas (Universal Music, 2009) e Cavaleiro selvagem aqui te sigo (Universal Music, 2011) - desbrava e encontra um outro (belo) caminho na aridez do samba de Nuno. Porque, em essência, é samba o que se ouve no show da sétima edição do Palavras cruzadas, projeto multimídia idealizado e dirigido por Marcio Debellian com a intenção de cruzar diversas formas de arte. Um samba torto, eventualmente ambientado em clima roqueiro - construído pela guitarra noise de Guilherme Held em músicas como Mamãe papai (Clima e Nuno Ramos, 2014) - mas que pode também ser envolvido numa aura joãogilbertiana, caso do cool Samba triste (Clima, 2014), única das 14 músicas do roteiro não assinada por Nuno Ramos. Essas músicas - belas em sua contundência, na maior parte - formam o repertório do quarto álbum de Aydar, que vai entrar em estúdio na segunda quinzena deste mês de agosto de 2014 sob a direção musical de Duani Martins. No show que teve sua primeira apresentação em 1º de agosto de 2014, no teatro do Oi Futuro Ipanema, no Rio de Janeiro (RJ), Duani sobressai, comandando a percussão com Marcelo Miranda e Maurício Badê. Na cena povoada por um saci pererê e um soldadinho de chumbo, a força dos tambores do trio dá vigor a sambas como Dedo duro (Clima e Nuno Ramos, 2014) sem ofuscar a voz de Aydar, que, aliás, está cantando muito bem. É até impressionante sua segurança na exposição de um cancioneiro que se recusa a trilhar os caminhos poéticos e melódicos mais óbvios. "Outro samba existe / Mas eu não sei onde está / Procuro / No escuro / Outro samba", sinalizam versos do já mencionado Samba triste, levado por Aydar somente ao violão. Alguns versos - como o de Vem na voz (Mariana Aydar e Nuno Ramos, 2014), música cantada a capella por Aydar - são poesia em estado puro. Mas a musicalidade jamais fica encoberta pela poesia. O ronco choroso e pungente da cuíca em Pedaço de uma asa (Nuno Ramos, 2104) exemplifica a riqueza da musicalidade, contribuindo para que o número sobressaia no roteiro. Seco, o cancioneiro de Nuno Ramos - assinado com parceiros como Clima (também artista plástico), Romulo Fróes e a própria Mariana Aydar - parece expor berros, choros e silêncios na veia da noite. Música que batiza o ainda inédito quinto disco solo do cantor e compositor paulista Romulo Fróes, Barulho feio (2014) - parceria de Romulo com Nuno - desbrava beleza no caos urbano e afetivo no toque solitário da guitarra de Aydar. Já Isso pode (Nuno Ramos, 2014) se embrenha firme e roqueira - na pegada de Held - pelo seco sertão nordestino, culminando com apropriada citação de Carcará (João do Vale e José Cândido, 1964), música que alçou seu voo pelo Brasil há 50 anos. No roteiro coeso, sem espaço para falas convencionais, Saiba ficar quieto (Nuno Ramos, 2014) prepara o tom de Manhã azul (Duani Martins e Nuno Ramos, 2009), única música já gravada por Aydar - no seu segundo álbum, Peixes pássaros pessoas - e valorizada no show pelo toque do bandolim de Duani. Nesse bloco final, a imperativa Caia na risada (Clima e Nuno Ramos, 2014) reitera a forte personalidade do cancioneiro de Nuno Ramos, Clima e cia. Como os compositores, Mariana Aydar vem se recusando a seguir os caminhos mais fáceis - o que acabou provocando a ruptura de seu laço com a Universal Music, gravadora que editou os três primeiros álbuns da cantora - mas é justamente ao trilhar a estranheza, o inusitado, que sua voz tem se levantado e se feito escutar entre ouvidos mais antenados da farta cena contemporânea brasileira. É por aí mesmo!
Já tô apaixonado,antes mesmo de seu nascimento...
Tudo que a Mariana Aydar faz é lindo e bem cuidado. Só fiquei preocupado em saber que ela rompeu com a Universal. Espero que nao atrapalhe em nada o lançamento do disco, que já estou esperando ansioso.
Ola Mauro! Acho que Caia na risada ja fazia parte de "O Chao sem o chao" (2009)de Romulo Froes, abs!
Postar um comentário