Título: Bossa negra
Artistas: Diogo Nogueira e Hamilton de Holanda
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * * *
"Toca o tambor, meu bandolim / Com esse canto na avenida / É bossa negra até o fim", brada Diogo Nogueira, com convicção, no refrão de Bossa negra (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira), magnetizante samba que dá título ao projeto que une o cantor e compositor carioca ao bandolinista também carioca (de criação brasiliense) em disco que injeta sangue novo no samba ao se voltar sem saudosismo para o passado do gênero, formado pela miscigenação do povo brasileiro. No mercado fonográfico a partir de hoje, 19 de agosto de 2014, o CD Bossa negra dá upgrade na discografia de Diogo Nogueira, cantor que vinha desperdiçando sua evolução vocal ao pisar no pantanoso terreno do pagode populista de tom romântico-sensual. O sangue novo vem da interação do toque percussivo do bandolim magistral de Hamilton com a percussão de Thiago da Serrinha e o baixo de André Vasconcellos. O bandolim se mete na cozinha para dar forma a um repertório valorizado pelo ineditismo e pela inspiração das sete músicas compostas por Hamilton com Diogo e/ou com eventuais parceiros como Marcos Portinari, um dos idealizadores - ao lado da dupla e do empresário Afonso Carvalho - deste projeto nascido da afinidade que brotou instantaneamente entre Hamilton e Diogo em show feito de improviso em Miami (EUA) em 2009. Parceria de Hamilton com Thiago da Serrinha que confirma a alta qualidade do repertório inédito, Tá é embasada pela percuteria - nome dado ao arsenal de percussões manuseadas por Thiago - mas é o bandolim de Hamilton que cria a centelha da renovação, como mostra a abordagem de Desde que o samba é samba (Caetano Veloso, 1993), tema adequado a disco que evoca a ancestralidade do samba com inspiração primordial nos afro-sambas compostos por Baden Powell (1937 - 2000) com Vinicius de Moraes (1913 - 1980). Os clássicos desse gênero formatado nos anos 1960 guiaram João Nogueira (1941 - 2000) e Paulo César Pinheiro na composição de Salamandra, inédita da dupla que valoriza Bossa negra, reconectando Diogo às suas origens familiares e musicais. Bossa negra é um disco que revolve raízes com olhar contemporâneo. Se Bicho da terra (Diogo Nogueira, Bruno Barreto, Wallace Perez e Hamilton de Holanda) faz ecoar o lamento do povo de lá, evidenciando a crescente segurança de Diogo como cantor, o samba Brasil de hoje (Hamilton de Holanda, Arlindo Cruz, Marcos Portinari e Diogo Nogueira) exalta país em que o lixo e o luxo andam juntos e misturados em terra à eterna espera de um amanhã que não chega. O coro infantil que entra no fim da faixa é o símbolo dessa esperança. Faixa que anunciou o disco Bossa negra em novembro de 2013 ao ser disponibilizada para audição no site oficial do projeto, O que é amor (Arlindo Cruz, Maurição e Fred Camacho) - samba lançado em 2007 por Arlindo Cruz e Maria Rita nos respectivos álbuns Sambista perfeito (Deck) e Samba meu (Warner Music) - exemplifica a sintonia que rege o encontro de Diogo com Hamilton. A química é tão boa que faz com que um samba menos arrebatador como Mais um dia (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha) soe mais sedutor do que realmente seria se gravado de forma mais convencional. Já Doce flor (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha) desabrocha no disco com suavidade - evidenciando a base segura dos tambores de Thiago da Serrinha - e prepara o clima íntimo para abordagem do magoado samba-canção Risque (Ary Barroso, 1952). Ainda na seara das regravações, Mineira (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1975) reabre o pano do passado - evidenciando o suingue do toque do bandolim de Hamilton, solista de parte da melodia - em conexão com momento mais recente do samba, representado pela lembrança do Samba de Arerê (Arlindo Cruz, Xande de Pilares e Mauro Jr., 1999). Na sequência, Mundo melhor (1962) é sagaz reminiscência da bissexta parceria do seminal Pixinguinha (1897 - 1973) - pioneiro mestre que evidenciou a partir da década de 1910 a bossa negra naturalmente entranhada no samba de tom afro - com Vinicius, o poeta arquiteto dos afro-sambas dos anos 1960. No fim, inédita e moderna canção de tom praieiro, Até a volta (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira), logo remete ao universo do centenário Dorival Caymmi (1914 - 2008), ampliando as conexões de Bossa negra, grande álbum que faz Diogo Nogueira honrar seu sobrenome enquanto reitera a maestria renovadora de Hamilton de Holanda, mestre na expansão dessa (exuberante) bossa negra.
8 comentários:
"Toca o tambor, meu bandolim / Com esse canto na avenida / É bossa negra até o fim", brada Diogo Nogueira, com convicção, no refrão de Bossa negra (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira), magnetizante samba que dá título ao projeto que une o cantor e compositor carioca ao bandolinista também carioca (de criação brasiliense) em disco que injeta sangue novo no samba ao se voltar sem saudosismo para o passado do gênero, formado pela miscigenação do povo brasileiro. No mercado fonográfico a partir de hoje, 19 de agosto de 2014, o CD Bossa negra dá upgrade na discografia de Diogo Nogueira, cantor que vinha desperdiçando sua evolução vocal ao pisar no pantanoso terreno do pagode populista de tom romântico-sensual. O sangue novo vem da interação do toque percussivo do bandolim magistral de Hamilton com a percussão de Thiago da Serrinha e o baixo de André Vasconcellos. O bandolim se mete na cozinha para dar forma a um repertório valorizado pelo ineditismo e pela inspiração das sete músicas compostas por Hamilton com Diogo e/ou com eventuais parceiros como Marcos Portinari, um dos idealizadores - ao lado da dupla e do empresário Afonso Carvalho - deste projeto nascido da afinidade que brotou instantaneamente entre Hamilton e Diogo em show feito de improviso em Miami (EUA) em 2009. Parceria de Hamilton com Thiago da Serrinha que confirma a alta qualidade do repertório inédito, Tá é embasada pela percuteria - nome dado ao arsenal de percussões manuseadas por Thiago - mas é o bandolim de Hamilton que cria a centelha da renovação, como mostra a abordagem de Desde que o samba é samba (Caetano Veloso, 1993), tema adequado a disco que evoca a ancestralidade do samba com inspiração primordial nos afro-sambas compostos por Baden Powell (1937 - 2000) com Vinicius de Moraes (1913 - 1980). Os clássicos desse gênero formatado nos anos 1960 guiaram João Nogueira (1941 - 2000) e Paulo César Pinheiro na composição de Salamandra, inédita da dupla que valoriza Bossa negra, reconectando Diogo às suas origens familiares e musicais. Bossa negra é um disco que revolve raízes com olhar contemporâneo.
Se Bicho da terra (Diogo Nogueira, Bruno Barreto, Wallace Perez e Hamilton de Holanda) faz ecoar o lamento do povo de lá, evidenciando a crescente segurança de Diogo como cantor, o samba Brasil de hoje (Hamilton de Holanda, Arlindo Cruz, Marcos Portinari e Diogo Nogueira) exalta país em que o lixo e o luxo andam juntos e misturados em terra à eterna espera de um amanhã que não chega. O coro infantil que entra no fim da faixa é o símbolo dessa esperança. Faixa que anunciou o disco Bossa negra em novembro de 2013 ao ser disponibilizada para audição no site oficial do projeto, O que é amor (Arlindo Cruz, Maurição e Fred Camacho) - samba lançado em 2007 por Arlindo Cruz e Maria Rita nos respectivos álbuns Sambista perfeito (Deck) e Samba meu (Warner Music) - exemplifica a sintonia que rege o encontro de Diogo com Hamilton. A química é tão boa que faz com que um samba menos arrebatador como Mais um dia (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha) soe mais sedutor do que realmente seria se gravado de forma mais convencional. Já Doce flor (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari, Diogo Nogueira, André Vasconcellos e Thiago da Serrinha) desabrocha no disco com suavidade - evidenciando a base segura dos tambores de Thiago da Serrinha - e prepara o clima íntimo para abordagem do magoado samba-canção Risque (Ary Barroso, 1952). Ainda na seara das regravações, Mineira (João Nogueira e Paulo César Pinheiro, 1975) reabre o pano do passado - evidenciando o suingue do toque do bandolim de Hamilton, solista de parte da melodia - em conexão com momento mais recente do samba carioca, representado pela lembrança do Samba de Arerê (Arlindo Cruz, Xande de Pilares e Mauro Jr.). Na sequência, Mundo melhor (1962) é sagaz reminiscência da bissexta parceria do seminal Pixinguinha (1897 - 1973) - pioneiro mestre que evidenciou a partir da década de 1910 a bossa negra naturalmente entranhada no samba de tom afro - com Vinicius, o poeta arquiteto dos afro-sambas dos anos 1960. No fim, inédita e moderna canção de tom praieiro, Até a volta (Hamilton de Holanda, Marcos Portinari e Diogo Nogueira), logo remete ao universo do centenário Dorival Caymmi (1914 - 2008), ampliando as conexões de Bossa negra, grande CD que faz Diogo Nogueira honrar seu sobrenome enquanto reitera a maestria renovadora de Hamilton de Holanda, mestre na expansão dessa bossa negra.
Que excelente notícia.
Tudo que faltava ao Diogo era uma bom repertório, para coroar sua grande evolução artística.
Abração
Denilson
Deu vontade de ouvir! Bela crítica!
Doido para comprar! E Hamilton de Holanda é o refinamento que o Diogo precisava. Tem que parar de se espelhar nos sambregueiros e cantar samba bom!!!
Aí sim uma boa notícia!!!!!Bom vê o Diogo se reencontrando e o Hamilton arrebenta, sua crítica só me deixou com mais vontade de ouvir Mauro...
Disco muito bom! Fiquei querendo uma versão instrumental. Adorei as músicas, mas Diogo ainda não me convence como cantor.
Vi show dos dois, recentemente, com o repertório do disco, e pareceu bem melhor.
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