quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Elegante, Takai embaralha conceitos pop no show 'Na medida do impossível'

Resenha de show
Título: Na medida do impossível
Artista: Fernanda Takai (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Auditório Ibirapuera (São Paulo, SP)
Data: 2 de agosto de 2014
Cotação: * * * *

♪ Na exata medida de própria possibilidade pop, Fernanda Takai apresenta um segundo show solo pautado pela elegância, pelo refinamento, sem grandes ousadias cênicas, mas nem por isso menos sedutor. Como o disco que o gerou, Na medida do impossível (Deck, 2014), o show apresenta no roteiro um leque de músicas melodiosas que, na voz hábil da cantora de alma mineira e origem amapaense, ganham vida inteligente. A maior novidade do show reside na ausência em cena de John Ulhoa, parceiro de vida e de música que produziu e arranjou o segundo álbum solo gravado em estúdio pela vocalista do grupo mineiro Pato Fu. Takai toca seu violão e divide o palco com os músicos Lulu Camargo (teclados, acordeom e gaita), Larissa Horta (baixo e vocais), Lenis Rino (bateria) e Tiago Borba (guitarra). Por mais que álbum soe eventualmente como um disco do Pato Fu sem guitarras e por mais que o espírito do disco esteja no show (cujo roteiro inclui 12 das 13 músicas selecionadas por Takai para o CD), Na medida do impossível se desvincula em cena do som do Pato Fu - mesmo que paire uma atmosfera pop roqueira nos arranjos de músicas como o samba Como dizia o mestre (1975), sucesso autoral do cantor, compositor e pianista fluminense Benito Di Paula. A beleza da cena - que evoca a capa do disco, embora não na medida idealizada pela artista - salta aos olhos já na música que dá o start no show, Partida (Fernanda Takai, 2014), balada melodiosa entoada por Takai enquanto a neve cai. A lembrança de três músicas do álbum de 2007 em que a cantora abordou o repertório da antecessora Nara Leão (1942 - 1989) - o samba Diz que fui por aí (Zé Kétti e Hortênsio Rocha, 1964), a doída canção Insensatez (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1966) e Com açúcar, com afeto (Chico Buarque, 1966), esta já no bis - também cai bem no show. Takai tem o dom de irmanar músicas de origens, estilos e tempos distintos. É como se tudo soasse pop popular contemporâneo na sua voz delicada. Por isso mesmo, reviver com a letra original a sensível balada Nada pra mim (John Ulhoa, 1999) - definitivamente associada à voz passional da cantora mineira Ana Carolina, intérprete original da canção - foi bela sacada de Takai. Sucesso do padre Zezinho há 40 anos, Amar como Jesus amou (José Fernandes de Oliveira, 1974) reaparece em cena com barulhinhos bons e sem a voz de outro padre cantor, Fábio de Mello, convidado da faixa mais controvertida do disco. De onde vens (1967) - parceria de Nelson Motta com Dori Caymmi (e não com Danilo Caymmi, como informou equivocadamente Takai na estreia nacional do show, no paulistano Auditório Ibirapuera, em 2 de agosto de 2104) - é a grande surpresa do roteiro juntamente com a abordagem, no encerramento do bis, de I don't want to talk about it (Danny Whitten, 1971), balada lançada em disco pela banda norte-americana Crazy Horse, mas associada a Rod Stewart desde que o cantor escocês a regravou em 1975. São músicas que se harmonizam no canto suave da artista, cuja veia popular salta novamente no revival de sucesso da Jovem Guarda, O ritmo da chuva (1964), versão em português de Demétrius para (Rhythm of the rain) (John Claude Gummoe, 1962), pontuada em cena pelo acordeom de Lulu Camargo. Sagaz, Takai aloca O ritmo da chuva ao lado de outro hit das jovens tardes dominicais dos anos 1960, A pobreza (Paixão proibida) (Renato Barros, 1968), levada na gaita pelo mesmo polivalente Lulu Camargo. Em cena, Fernanda Takai tem a capacidade de diluir naturalmente prévios conceitos - já em si tênues - de brega e chique. Parece fácil, mas não é. Em vozes e mentes menos sutis, o repertório miscigenado do show Na medida do impossível poderia soar como samba da mineira doida. Mas, com Fernanda Takai, tudo se afina na medida do (im)possível sem perda da elegância.

2 comentários:

  1. Na exata medida de sua possibilidade pop, Fernanda Takai apresenta um segundo show solo pautado pela elegância, pelo refinamento, sem grandes ousadias cênicas, mas nem por isso menos sedutor. Como o disco que o gerou, Na medida do impossível (Deck, 2014), o show apresenta no roteiro um leque de músicas melodiosas que, na voz hábil da cantora de alma mineira e origem amapaense, ganham vida inteligente. A maior novidade do show reside na ausência em cena de John Ulhoa, parceiro de vida e de música que produziu e arranjou o segundo álbum solo gravado em estúdio pela vocalista do grupo mineiro Pato Fu. Takai toca seu violão e divide o palco com os músicos Lulu Camargo (teclados, acordeom e gaita), Larissa Horta (baixo e vocais), Lenis Rino (bateria) e Tiago Borba (guitarra). Por mais que álbum soe eventualmente como um disco do Pato Fu sem guitarras e por mais que o espírito do disco esteja no show (cujo roteiro inclui 12 das 13 músicas selecionadas por Takai para o CD), Na medida do impossível se desvincula em cena do som do Pato Fu - mesmo que paire uma atmosfera pop roqueira nos arranjos de músicas como o samba Como dizia o mestre (1975), sucesso autoral do cantor, compositor e pianista fluminense Benito Di Paula. A beleza da cena - que evoca a capa do disco, embora não na medida idealizada pela artista - salta aos olhos já na música que dá o start no show, Partida (Fernanda Takai, 2014), balada melodiosa entoada por Takai enquanto a neve cai. A lembrança de três músicas do álbum de 2007 em que a cantora abordou o repertório da antecessora Nara Leão (1942 - 1989) - o samba Diz que fui por aí (Zé Kétti e Hortênsio Rocha, 1964), a doída canção Insensatez (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1966) e Com açúcar, com afeto (Chico Buarque, 1966), esta já no bis - também cai bem no show. Takai tem o dom de irmanar músicas de origens, estilos e tempos distintos. É como se tudo soasse pop popular contemporâneo na sua voz delicada. Por isso mesmo, reviver com a letra original a balada Nada pra mim (John Ulhoa, 1999) - definitivamente associada à voz passional da cantora mineira Ana Carolina, intérprete original da canção - foi bela sacada de Takai. Sucesso do padre Zezinho há 40 anos, Amar como Jesus amou (José Fernandes de Oliveira, 1974) reaparece em cena com barulhinhos bons e sem a voz de outro padre cantor, Fábio de Mello, convidado da faixa mais controvertida do disco. De onde vens (1967) - parceria de Nelson Motta com Dori Caymmi (e não com Danilo Caymmi, como informou equivocadamente Takai na estreia nacional do show, no paulistano Auditório Ibirapuera, em 2 de agosto de 2104) - é a grande surpresa do roteiro juntamente com a abordagem, no encerramento do bis, de I don't want to talk about it (Danny Whitten, 1971), balada lançada em disco pela banda norte-americana Crazy Horse, mas associada a Rod Stewart desde que o cantor escocês a regravou em 1975. São músicas que se harmonizam no canto suave da artista, cuja veia popular salta novamente no revival de sucesso da Jovem Guarda, O ritmo da chuva (1964), versão em português de Demétrius para (Rhythm of the rain) (John Claude Gummoe, 1962), pontuada em cena pelo acordeom de Lulu Camargo. Sagaz, Takai aloca O ritmo da chuva ao lado de outro hit das jovens tardes dominicais dos anos 1960, A pobreza (Paixão proibida) (Renato Barros, 1968), levada na gaita pelo mesmo polivalente Lulu Camargo. Em cena, Fernanda Takai tem a capacidade de diluir naturalmente prévios conceitos - já em si tênues - de brega e chique. Parece fácil, mas não é. Em vozes e mentes menos sutis, o repertório miscigenado do show Na medida do impossível poderia soar como samba da mineira doida. Com Fernanda Takai, tudo se afina na medida do (im)possível.

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