quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Livro 'Pavões misteriosos' refaz voo da MPB rumo ao pop dos anos 1980

Resenha de livro
Título: Pavões misteriosos 1974 - 1983: a explosão da música pop no Brasil
Autor: André Barcinski
Editora: Três Estrelas
Cotação: * * * 1/2

O grande mérito do livro Pavões misteriosos é enfocar um período pouco analisado da evolução da música brasileira. De 1974 a 1983, a MPB surgida na era dos festivais dos anos 1960 - e até então cristalizada e consolidada no mercado fonográfico brasileiro, em que pesem as modestas vendas dos discos de seus ícones - foi ganhando progressivo sotaque pop. Big bang que detonou essa explosão pop, o aparecimento do trio Secos & Molhados em 1973 - com imediato sucesso nacional - é o ponto de partida desse livro-reportagem escrito por André Barcinski, um dos melhores jornalistas musicais do Brasil. Com texto envolvente e cheio de estilo, Barcinski mapeia os principais acontecimentos do período 1974 - 1983, parando no surgimento da geração pop roqueira dos anos 1980 que deu uma blitz na MPB e a empurrou progressivamente para os guetos e nichos do mercado fonográfico nacional. A divisão dos capítulos e temas por ano resulta por vezes incerta - porque o estouro de um artista ou movimento geralmente tem ramificações em anos anteriores e gera consequências em anos futuros - mas ajuda a ordenar a linha evolutiva traçada pelo autor no livro recém-lançado pela editora Três Estrelas. A profusão de nomes e assuntos envolvidos em Pavões misteriosos impede um maior aprofundamento dos temas, mas o que conta é a maneira como Barcinski organiza os fatos e os movimentos para mostrar a progressiva imersão da música brasileira no universo pop com consequências artísticas que ainda hoje gera debates calorosos. No fim de Pavões misteriosos, o autor exemplifica a guinada pop da MPB ao lembrar como cantores do gênero, como Gal Costa, aderiram a um repertório mais popular em discos de tom mais comercial. Por seu valor documental, um dos capítulos mais interessantes do livro - situado pelo autor no ano de 1975 - é o que historia a onda de cantores brasileiros que adotaram nomes estrangeiros e repertório em inglês e, se passando por gringos, gravaram canções que escalaram rapidamente as paradas, algumas com a ajuda providencial de sua inclusão em trilhas de novelas da TV Globo. Uma das mais famosas, Feelings, foi gravada em 1974 pelo carioca Maurício Alberto Kaiserman, mais conhecido na época como Morris Albert. No mesmo capítulo, o livro aborda o sucesso comercial feito pelo legítimo roqueiro baiano Raul Seixas (1945 - 1989), fazendo breve análise da trajetória do Maluco Beleza. Na sequência, Barcinski historia a explosão do cantor e compositor paulista Guilherme Arantes - cuja gravação da balada Meu mundo e nada mais em 1976 é marco do pop nacional - e mostra de relance as regras do jogo entre artistas prestigiados e artistas considerados cafonas pela popularidade de sua música pop. Estigma sofrido por Arantes, a quem Elis Regina (1945 - 1982) recorreria em busca de um hit que oxigenasse sua carreira do ponto de vista comercial.  "A Elis me ligou, ela queria um sucesso de qualquer jeito", lembra Arantes, que forneceu o hit Aprendendo a jogar (1980) para a Pimentinha. Sucesso não faltou para cantores populares como o goiano Odair José e o carioca Sidney Magalhães, transformado pelo produtor, compositor e empresário argentino Roberto Livi no cigano Sidney Magal em 1976. Assunto principal do capítulo situado por Barcinski em 1978, Magal reinou em pleno apogeu da disco music, tema iniciado no capítulo de 1977 e desenvolvido ao longo do livro porque o estouro mundial das discotecas mudaram momentaneamente os rumos da indústria fonográfica, afetando a MPB. Aliás, no capítulo intitulado Quanto mais purpurina melhor, Pavões misteriosos mostra como ícones da MPB - como Fagner, a já mencionada Gal Costa, Gilberto Gil e Rita Lee, entre outros - foram se rendendo às exigências do mercado a partir de 1979. E vieram então os anos 1980 com a produção de teclados, jabás, grupos infantis e hitmakers em escala industrial. A propósito, o livro termina sintomaticamente em 1983, ano do primeiro sucesso - Me dê motivo, hit nacional no vozeirão soul de Tim Maia (1942 - 1998) - da dupla de hitmakers formada por Michael Sullivan com Paulo Massadas. Começava a era Sullivan & Massadas, dupla à qual gigantes da MPB recorreram para não serem abafados pela explosão comercial do rock brasileiro dos anos 1980. Com narrativa ágil e bem estruturada, típica mais das grandes reportagens do que das teses acadêmicas, o livro Pavões misteriosos merece atenção por mostrar que o voo pop da música brasileira - que alcançaria altitudes impensáveis ao longo dos implacáveis anos 1980 - foi progressivamente arquitetado entre corujas, pirilampos e a purpurina da década de 1970.

4 comentários:

  1. O grande mérito do livro Pavões misteriosos é enfocar um período pouco analisado da evolução da música brasileira. De 1974 a 1983, a MPB surgida na era dos festivais dos anos 1960 - e até então cristalizada e consolidada no mercado fonográfico brasileiro, em que pesem as modestas vendas dos discos de seus ícones - foi ganhando progressivo sotaque pop. Big bang que detonou essa explosão pop, o aparecimento do trio Secos & Molhados em 1973 - com imediato sucesso nacional - é o ponto de partida desse livro-reportagem escrito por André Barcinski, um dos melhores jornalistas musicais do Brasil. Com texto envolvente e cheio de estilo, Barcinski mapeia os principais acontecimentos do período 1974 - 1983, parando no surgimento da geração pop roqueira dos anos 1980 que deu uma blitz na MPB e a empurrou progressivamente para os guetos e nichos do mercado fonográfico nacional. A divisão dos capítulos e temas por ano resulta por vezes incerta - porque o estouro de um artista ou movimento geralmente tem ramificações em anos anteriores e gera consequências em anos futuros - mas ajuda a ordenar a linha evolutiva traçada pelo autor no livro recém-lançado pela editora Três Estrelas. A profusão de nomes e assuntos envolvidos em Pavões misteriosos impede um maior aprofundamento dos temas, mas o que conta é a maneira como Barcinski organiza os fatos e os movimentos para mostrar a progressiva imersão da música brasileira no universo pop com consequências artísticas que ainda hoje gera debates calorosos. No fim de Pavões misteriosos, o autor exemplifica a guinada pop da MPB ao lembrar como cantores do gênero, como Gal Costa, aderiram a um repertório mais popular em discos de tom mais comercial. Por seu valor documental, um dos capítulos mais interessantes do livro - situado pelo autor no ano de 1975 - é o que historia a onda de cantores brasileiros que adotaram nomes estrangeiros e repertório em inglês e, se passando por gringos, gravaram canções que escalaram rapidamente as paradas, algumas com a ajuda providencial de sua inclusão em trilhas de novelas da TV Globo. Uma das mais famosas, Feelings, foi gravada em 1974 pelo carioca Maurício Alberto Kaiserman, mais conhecido na época como Morris Albert. No mesmo capítulo, o livro aborda o sucesso comercial feito pelo legítimo roqueiro baiano Raul Seixas (1945 - 1989), fazendo breve análise da trajetória do Maluco Beleza. Na sequência, Barcinski historia a explosão do cantor e compositor paulista Guilherme Arantes - cuja gravação da balada Meu mundo e nada mais em 1976 é marco do pop nacional - e mostra de relance as regras do jogo entre artistas prestigiados e artistas considerados cafonas pela popularidade de sua música pop. Estigma sofrido por Arantes, a quem Elis Regina (1945 - 1982) recorreria em busca de um hit que oxigenasse sua carreira do ponto de vista comercial. "A Elis me ligou, ela queria um sucesso de qualquer jeito", lembra Arantes, que forneceu o hit Aprendendo a jogar (1980) para a Pimentinha.

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  2. Sucesso não faltou para cantores populares como o goiano Odair José e o carioca Sidney Magalhães, transformado pelo produtor, compositor e empresário argentino Roberto Livi no cigano Sidney Magal em 1976. Assunto principal do capítulo situado por Barcinski em 1978, Magal reinou em pleno apogeu da disco music, tema iniciado no capítulo de 1977 e desenvolvido ao longo do livro porque o estouro mundial das discotecas mudaram momentaneamente os rumos da indústria fonográfica, afetando a MPB. Aliás, no capítulo intitulado Quanto mais purpurina melhor, Pavões misteriosos mostra como ícones da MPB - como Fagner, a já mencionada Gal Costa, Gilberto Gil e Rita Lee, entre outros - foram se rendendo às exigências do mercado a partir de 1979. E vieram então os anos 1980 com a produção de teclados, jabás, grupos infantis e hitmakers em escala industrial. A propósito, o livro termina sintomaticamente em 1983, ano do primeiro sucesso - Me dê motivo, hit nacional no vozeirão soul de Tim Maia (1942 - 1998) - da dupla de hitmakers formada por Michael Sullivan com Paulo Massadas. Começava a era Sullivan & Massadas, dupla à qual gigantes da MPB recorreram para não serem abafados pela explosão comercial do rock brasileiro dos anos 1980. Com narrativa ágil e bem estruturada, típica mais das grandes reportagens do que das teses acadêmicas, o livro Pavões misteriosos merece atenção por mostrar que o voo pop da música brasileira - que alcançaria altitudes impensáveis ao longo dos implacáveis anos 1980 - foi progressivamente arquitetado entre corujas, pirilampos e a purpurina da década de 1970.

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  3. sempre falam de Gal nessa questão, mas esquecem que Bethânia também aderiu quando gravou aquela música da Marina no Dezembros, cheia de teclados.

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  4. Se o ponto de partida do livro foi a explosão do Secos e Molhados, com o lançamento do seu LP homônimo em 1973, o título do livro não estaria então errado? Não deveria ser 1973-1983 ao invés de 1974-1983? Afinal, como foi dito aqui, o sucesso e as vendagens do disco de estréia do grupo Secos e Molhados foram imediatos, não?

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