Mauro Ferreira no G1

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domingo, 10 de agosto de 2014

Rito de passagem, o show 'Influências' faz brilhar canto iluminado de Rita

Resenha de show
Título: Influências
Artista: Rita Benneditto (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Teatro de arena da Caixa Cultural Rio de Janeiro (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 9 de agosto de 2014
Cotação: * * * *

Rito de passagem na trajetória de Rita Benneditto, o show Influências aponta caminhos seguidos pela cantora maranhense em seu sexto álbum solo - Encanto, já finalizado e com lançamento previsto para este segundo semestre de 2014 - ao mesmo tempo em que repisa trilhas seguidas pela artista desde os anos 1980, década em que integrou o maranhense grupo vocal Vira Canto. A apresentação da inédita Sete Marias (2014) - composta por Rita em parceria com o guitarrista Felipe Pinaud, um dos produtores do CD Encanto - sinaliza que os sons afro-eletrônicos do vitorioso projeto Tecnomacumba (2003) vão continuar presentes na obra da cantora. Aliás, a inclusão de Domingo 23 (Jorge Ben Jor, 1972) no roteiro de Influências indica que Benneditto jamais vai cantar para subir, mantendo em cena o ponto mais forte de sua carreira. Contudo, Influências reabre o leque estilístico da cantora. O início do show - com o tema popular religioso O meu mestre rei dos mestres nas vozes das cantadeiras do grupo maranhense Caixeiras do Divino da Casa Fanti Ashanti - indica a origem da cantora, que faz seu autorretrato ao cantar o tambor De mina (2014), composição do maranhense Josias Sobrinho gravada por Rita no disco Encanto. Sob a ótica imperialista de cariocas e paulistas, Benneditto vem mesmo "das bandas de lá". Nesse sentido, o show Influências é jorro oportuno de cultura brasileira - em especial, da cultura do Maranhão - na cara urbana do público do eixo Rio-SP. Dentro da pegada contemporânea do som atual de Rita, efeito da direção musical de Felipe Pinaud, as rajadas fortes de Vento bravo (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro, 1973) levam a cantora a incorporar ponto de umbanda no número enquanto Lamento sertanejo (Dominguinhos e Gilberto Gil, 1974) demarca território ruralista na cadência de xote eletrônico, com evocação ligeira dos Pífanos de Caruaru na flauta soprada por Pinaud. Música revitalizada em 2012 por libertadora interpretação da cantora brasiliense Ellen Oléria, Zumbi (Jorge Ben Jor, 1974) reitera a intimidade de Benneditto com o repertório afro-brasileiro sem causar a surpresa provocada pela bela lembrança de Traduzir-se (Raimundo Fagner sobre poema de Ferreira Gullar, 1981). Neste número, o canto límpido da intérprete fica em primeiro plano para evidenciar os versos lapidares do poema maranhense Ferreira Gullar. Na sequência, a cantora - eventual compositora - apresenta inédita de sua lavra bissexta, Melodia em sol, tema que dialoga de forma inteligente com o universo da canção sentimental brasileira, seguindo a trilha dos bares e cabarés. Melodia em sol prepara o clima para a moderna abordagem de Garçom (1987), música emblemática do repertório autoral do cantor e compositor pernambucano Reginaldo Rossi (1944 - 2013). Sagaz, Benneditto mixa Garçom com A volta do boêmio (Adelino Moreira, 1957), prefixo do cantor gaúcho Nelson Gonçalves (1919 - 1998). Garçom é ponto luminoso do roteiro ao lado da segunda entrada das Caixeiras do Divino da Casa Fanti Ashanti. As quatro cantadeiras - três irmãs (Maria da Anunciação, Maria da Graça e Maria José Menezes) e uma sobrinha (Bartira Helena) da mesma família - do grupo maranhense fazem Influências transitar por terreno sagrado quando batem seus tambores e entoam Canto de luz, primeiro tema de medley religioso completado com Nossa Senhora da Guia e Caixeiras no Céu. Nesse número, as ritualísticas Caixeiras embutem improvisações de versos, tal como fazem - em cadências diversas - os partideiros do samba carioca e os cantadores nordestinos. Na sequência, Rita Benneditto retoma Nhém nhém nhém (2001) - música do grupo Totonho e os Cabra que a artista já cantava antes de a composição ser gravada por Maria Alcina no antenado álbum De normal bastam os outros (Nova Estação, 2014) - e, já no fim, reprocessa o mambo cubano Babalu (Margarita Lecuona, 1939) em tom eletrônico. No bis, Oração ao tempo (Caetano Veloso, 1979) reabre espaço para a suavidade, indicando que o canto resplandescente de Rita Benneditto se ilumina ainda mais na diversidade.

2 comentários:

Mauro Ferreira disse...

Rito de passagem na trajetória de Rita Benneditto, o show Influências aponta caminhos seguidos pela cantora maranhense em seu sexto álbum solo - Encanto, já finalizado e com lançamento previsto para este segundo semestre de 2014 - ao mesmo tempo em que repisa trilhas seguidas pela artista desde os anos 1980, década em que integrou o maranhense grupo vocal Vira Canto. A apresentação da inédita Sete Marias (2014) - composta por Rita em parceria com o guitarrista Felipe Pinaud, um dos produtores do CD Encanto - sinaliza que os sons afro-eletrônicos do vitorioso projeto Tecnomacumba (2003) vão continuar presentes na obra da cantora. Aliás, a inclusão de Domingo 23 (Jorge Ben Jor, 1972) no roteiro de Influências indica que Benneditto jamais vai cantar para subir, mantendo em cena o ponto mais forte de sua carreira. Contudo, Influências reabre o leque estilístico da cantora. O início do show - com o tema popular religioso O meu mestre rei dos mestres nas vozes das cantadeiras do grupo maranhense Caixeiras do Divino da Casa Fanti Ashanti - indica a origem da cantora, que faz seu autorretrato ao cantar o tambor De mina (2014), composição do maranhense Josias Sobrinho gravada por Rita no disco Encanto. Sob a ótica imperialista de cariocas e paulistas, Benneditto vem mesmo "das bandas de lá". Nesse sentido, o show Influências é jorro oportuno de cultura brasileira - em especial, da cultura do Maranhão - na cara urbana do público do eixo Rio-SP. Dentro da pegada contemporânea do som atual de Rita, efeito da direção musical de Felipe Pinaud, as rajadas fortes de Vento bravo (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro, 1973) levam a cantora a incorporar ponto de umbanda no número enquanto Lamento sertanejo (Dominguinhos e Gilberto Gil, 1974) demarca território ruralista na cadência de xote eletrônico, com evocação ligeira dos Pífanos de Caruaru na flauta soprada por Pinaud. Música revitalizada em 2012 por libertadora interpretação da cantora brasiliense Ellen Oléria, Zumbi (Jorge Ben Jor, 1974) reitera a intimidade de Benneditto com o repertório afro-brasileiro sem causar a surpresa provocada pela bela lembrança de Traduzir-se (Raimundo Fagner sobre poema de Ferreira Gullar, 1981). Neste número, o canto límpido da intérprete fica em primeiro plano para evidenciar os versos lapidares do poema maranhense Ferreira Gullar. Na sequência, a cantora - eventual compositora - apresenta inédita de sua lavra bissexta, Melodia em sol, tema que dialoga de forma inteligente com o universo da canção sentimental brasileira, seguindo a trilha dos bares e cabarés. Melodia em sol prepara o clima para a moderna abordagem de Garçom (1987), música emblemática do repertório autoral do cantor e compositor pernambucano Reginaldo Rossi (1944 - 2013). Sagaz, Benneditto mixa Garçom com A volta do boêmio (Adelino Moreira, 1957), prefixo do cantor gaúcho Nelson Gonçalves (1919 - 1998). Garçom é ponto luminoso do roteiro ao lado da segunda entrada das Caixeiras do Divino da Casa Fanti Ashanti. As quatro cantadeiras - três irmãs (Maria da Anunciação, Maria da Graça e Maria José Menezes) e uma sobrinha (Bartira Helena) da mesma família - do grupo maranhense fazem Influências transitar por terreno sagrado quando batem seus tambores e entoam Canto de luz, primeiro tema de medley religioso completado com Nossa Senhora da Guia e Caixeiras no Céu. Nesse número, as ritualísticas Caixeiras embutem improvisações de versos, tal como fazem - em cadências diversas - os partideiros do samba carioca e os cantadores nordestinos. Na sequência, Rita Benneditto retoma Nhém nhém nhém (2001) - música do grupo Totonho e os Cabra que a artista já cantava antes de a composição ser gravada por Maria Alcina no antenado álbum De normal bastam os outros (Nova Estação, 2014) - e, já no fim, reprocessa o mambo cubano Babalu (Margarita Lecuona, 1939) em tom eletrônico. No bis, Oração ao tempo (Caetano Veloso, 1979) reabre espaço para a suavidade, indicando que o canto resplandescente de Rita Benneditto se ilumina ainda mais na diversidade.

ADEMAR AMANCIO disse...

Seu arco de influência vai de Caetano Veloso às cantadeiras do Maranhão.Só faltou uma folia de reis e um frevo-quadrilha.