Título: Lado D de Delcio Carvalho - Parcerias com Ivone Lara
Artista: Delcio Carvalho
Gravadora: Edição independente
Cotação: * * * 1/2
♪ Poucas parcerias da música brasileira foram tão felizes quanto a de Ivone Lara com Delcio Carvalho (8 de março de 1939 - 12 de novembro de 2013). A fina sintonia entre música (a de Ivone) e letra (a de Delcio) gerou sambas eternizados na memória popular. Alvorecer (1974), Acreditar (1976) e Sonho meu (1978) são os títulos mais conhecidos dessa obra construída no tempo da delicadeza, com doses bem calculadas de melancolia e esperança em seus versos poéticos. Mas há outros tão belos. É o caso de Em cada canto, uma esperança (1978), gravado de forma sublime por Beth Carvalho em seu álbum Nosso samba tá na rua (Andança / EMI Music, 2011). Em cada canto, uma esperança é o samba que fecha o disco Lado D de Delcio Carvalho, disco póstumo, finalizado pelo compositor fluminense oito meses antes de sair de cena, aos 74 anos, vítima de câncer. Sob a tradicionalista direção musical de Afonso Machado, produtor do disco gravado e mixado de janeiro a março de 2013 no Rio de Janeiro (RJ), Delcio dá voz a 12 títulos menos ouvidos de sua parceria com Ivone Lara. Por mais que não seja o melhor intérprete dessa obra já cantada por grandes vozes como a da cantora mineira Clara Nunes (1942 - 1983), intérprete original de Alvorecer, Delcio põe seu sentimento nato de compositor nesses registros com a vantagem de ser o maior conhecedor do significado de cada um dos versos que canta. Esse entendimento pleno das letras valoriza gravações como as de Nasci para sonhar e cantar (1982), grande samba cantado por Delcio com o ronco da cuíca de Paulino Dias. Nasci para sonhar e cantar é exemplo de perfeição na obra da dupla, cujo cancioneiro geralmente apresenta uma melodia delicada embalada por versos que creem em amanhã melhor que há de secar o pranto oriundo da desilusão amorosa. Basta ouvir Há música no ar - samba lançado pela cantora Nara Leão (1942 - 1989) no álbum Meu samba encabulado (Philips, 1983) - para identificar a ideologia típica da obra da dupla. Outra joia de delicadeza enraizada nesse poético universo melancólico é Canto do meu viver (1997), samba lançado por Teca Calazans no álbum Firoliu (Kuarup, 1997) e gravado com sensibilidade por Delcio. Em contrapartida, o compositor não dá conta de mostrar toda a beleza que há em Ainda baila no ar (2010), parceria da dupla com André Lara, lançada de forma mais sedutora por Dudu Nobre e Wilson das Neves no disco comemorativo dos 35 anos da parceria de Ivone com Delcio. Mesmo que um samba resulte ligeiramente menos inspirado, caso de Nunca mais (1994), samba raro na obra da dupla por não vislumbrar um raio de esperança no horizonte triste, o nível é sempre bom, às vezes alto. Delcio, aliás, foi muito feliz na pescaria de pérolas no baú da dupla. Harmonizado pelas flautas de Dirceu Leite, Doces recordações é de álbum feito por Ivone Lara na gravadora Som Livre em 1985. Desse disco de 1985, Lado D de Delcio Carvalho também revive em clima de gafieira, com metais e coro, Quem faz o mal não se cria, samba lançado por Ivone com o título de Meu samba é luz, é céu e mar. Enfim, o poeta se foi, mas deixou versos como os do samba O trovador (2004) e uma mensagem de amor que ainda baila no ar, na cadência suave das melodias líricas da parceira Ivone Lara. Em cada samba, uma esperança do finado poeta.
8 comentários:
Poucas parcerias da música brasileira foram tão felizes quanto a de Ivone Lara com Delcio Carvalho (9 de março de 1939 - 12 de novembro de 2013). A fina sintonia entre música (a de Ivone) e letra (a de Delcio) gerou sambas eternizados na memória popular. Alvorecer (1974), Acreditar (1976) e Sonho meu (1978) são os títulos mais conhecidos dessa obra construída no tempo da delicadeza, com doses bem calculadas de melancolia e esperança em seus versos poéticos. Mas há outros tão belos quanto - caso de Em canto, uma esperança (1978), gravado de forma sublime por Beth Carvalho em seu álbum Nosso samba tá na rua (Andança / EMI Music, 2011). Em canto, uma esperança é o samba que fecha o disco Lado D de Delcio Carvalho, disco póstumo, finalizado pelo compositor fluminense oito meses antes de sair de cena, aos 74 anos, vítima de câncer. Sob a tradicionalista direção musical de Afonso Machado, produtor do disco gravado e mixado de janeiro a março de 2013 no Rio de Janeiro (RJ), Delcio dá voz a 12 títulos menos ouvidos de sua parceria com Ivone Lara. Por mais que não seja o melhor intérprete dessa obra já cantada por grandes vozes como a da cantora mineira Clara Nunes (1942 - 1983), intérprete original de Alvorecer, Delcio põe seu sentimento de compositor nesses registros com a vantagem de ser o maior conhecedor do significado de cada um dos versos que canta. Esse entendimento pleno das letras valoriza gravações como as de Nasci para sonhar e cantar (1982), grande samba cantado por Delcio com o ronco da cuíca de Paulino Dias. Nasci para sonhar e cantar é exemplo de perfeição na obra da dupla, cujo cancioneiro geralmente apresenta uma melodia delicada embalada por versos que creem em amanhã melhor que há de secar o pranto oriundo da desilusão amorosa. Basta ouvir Há música no ar - samba lançado pela cantora Nara Leão (1942 - 1989) no álbum Meu samba encabulado (Philips, 1983) - para identificar a ideologia típica da obra da dupla. Outra joia de delicadeza enraizada nesse poético universo melancólico é Canto do meu viver (1997), samba lançado por Teca Calazans no álbum Firoliu (Kuarup, 1997) e gravado com sensibilidade por Delcio. Em contrapartida, o compositor não dá conta de mostrar toda a beleza que há em Ainda baila no ar (2010), parceria da dupla com André Lara, lançada de forma mais sedutora por Dudu Nobre e Wilson das Neves no disco comemorativo dos 35 anos da parceria de Ivone com Delcio. Mesmo que um samba resulte ligeiramente menos inspirado, caso de Nunca mais (1994), samba raro na obra da dupla por não vislumbrar um raio de esperança no horizonte triste, o nível é sempre bom, às vezes alto. Delcio, aliás, foi muito feliz na pescaria de pérolas no baú da dupla. Harmonizado pelas flautas de Dirceu Leite, Doces recordações é de álbum feito por Ivone Lara na gravadora Som Livre em 1985. Desse disco de 1985, Lado D de Delcio Carvalho também revive em clima de gafieira, com metais e coro, Quem faz o mal não se cria, samba lançado por Ivone com o título de Meu samba é luz, é céu e mar. Enfim, o poeta se foi, mas deixou versos como os do samba O trovador (2004) e uma mensagem de amor que ainda baila no ar, na cadência suave das melodias de Ivone. Em cada samba, uma esperança...
Olá Mauro Ferreira, sou Bertha Nutels, companheira de 37 anos de Delcio Carvalho, além de ser a produtora executiva dos cds dele e também sua produtora pessoal. Estou escrevendo este comentário para que, futuramente, o seu texto não contenha nenhum erro, pois Delcio nasceu em 8 de março de 1939 e o título da música correto é "Em cada canto uma esperança". Você sempre foi um crítico mais do que correto e é por isso que me atrevi a consertar para que no futuro, quando você escrever outra vez sobre Delcio o seu texto esteja absolutamente certo. Um abraço carinhoso Bertha Nutels
Grato pelos toques, Bertha. Abs, MauroF
Espero que o cd do grande e saudoso Délcio Carvalho tenha distribuição nacional! Caso contrário, gostaria de saber da Dona Bertha, como faço para adquiri-lo?
E parabéns pelo sublime, meu caro crítico! Elisabeth fez uma das gravações mais lindas de Em cada canto uma esperança! Aliás, é a cantora dos compositores de samba e o resto é resto!
Meu caro Mauro, sempre demonstrando muito conhecimento do que acontece na música brasileira! Obrigado pela crítica do CD Lado D de Delcio Carvalho, que tive a honra de produzir. Só uma frase me deixou intrigado: a "tradicionalista direção musical de Afonso Machado". Este rótulo me soou como algo depreciativo. Respeito demais os "tradicionais" do samba e do choro, mas sempre, em minha carreira, tentei exatamente não ser tradicionalista. Você deve saber que, em 1978, no 2º disco do Galo Preto, propus uma ruptura com o universo tradicional do choro, trazendo Hermeto, Sivuca, Hélio Delmiro, Cristóvão Bastos, e outros grandes para este mundo. O Hermeto costuma declarar: "Salve o Galo, o mais moderno regional do Brasil!" Isto tem norteado tudo o que faço em minha trajetória musical e é só um pequeno exemplo. Portanto, gostaria que você me dissesse o que considera "moderno" ou "não tradicionalista" atualmente dentro do choro e do samba, pois tenho certeza de que o rótulo de tradicionalista não representa a minha história. Grande abraço, Afonso Machado
Meu caro Mauro, sempre demonstrando muito conhecimento do que acontece na música brasileira! Obrigado pela crítica do CD Lado D de Delcio Carvalho, que tive a honra de produzir. Só uma frase me deixou intrigado: a "tradicionalista direção musical de Afonso Machado". Este rótulo me soou como algo depreciativo. Respeito demais os "tradicionais" do samba e do choro, mas sempre, em minha carreira, tentei exatamente não ser tradicionalista. Você deve saber que, em 1978, no 2º disco do Galo Preto, propus uma ruptura com o universo tradicional do choro, trazendo Hermeto, Sivuca, Hélio Delmiro, Cristóvão Bastos, e outros grandes para este mundo. O Hermeto costuma declarar: "Salve o Galo, o mais moderno regional do Brasil!" Isto tem norteado tudo o que faço em minha trajetória musical e é só um pequeno exemplo. Portanto, gostaria que você me dissesse o que considera "moderno" ou "não tradicionalista" atualmente dentro do choro e do samba, pois tenho certeza de que o rótulo de tradicionalista não representa a minha história. Grande abraço, Afonso Machado
Afonso, bem-vindo a esse espaço virtual. Tradicionalista, no meu entender, não tem conotação negativa e tampouco representa seu trabalho com o grupo Galo Preto. Mas o foco do texto foi tão somente o álbum póstumo do Delcio. Posso estar equivocado, mas não identifico nos arranjos de 'Lado D' uma ruptura com o universo tradicional da obra de Ivone e Delcio. Mas isso, repito, não é um defeito. Ao contrário: entendo como uma reverência a esse cancioneiro de valor atemporal. Abs, MauroF
Já li, obrigado pela resposta, Mauro. Claro que eu não pretendia ruptura nenhuma com o universo do Delcio. E sim, demonstrar o respeito e a emoção profundos pela sua obra. Grande abraço, Afonso
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