Mauro Ferreira no G1

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quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Convencional na forma, 'Cássia' arrebata ao reconstituir relicário de Eller

Resenha de documentário sobre Cássia Eller
Título: Cássia (Brasil, 2014)
Direção: Paulo Henrique Fontenelle
Roteiro: Paulo Henrique Fontenelle
Cotação: * * * * 1/2
Estreia nos cinemas do Brasil programada para 15 de janeiro de 2015


"Vocês se espantarão quando me ouvirem cantar". A frase imodesta pode até soar bem arrogante, mas toda possível pretensão se dilui quando se sabe que sua autora é Cássia Eller (1962 - 2001). Ouvida na voz da atriz Malu Mader ao fim de Cássia, documentário exibido esta semana no Festival do Rio, a frase faz todo o sentido porque arremata narrativa arrebatadora, comprovando tudo o que é visto e ouvido no filme, cuja estreia nos cinemas está programada para janeiro de 2015. Filmado sob a direção de Paulo Henrique Fontenelle, Cássia é documentário convencional na forma com que retrata a trajetória da cantora carioca. Segue a estrutura clássica do gênero ao entrelaçar imagens de arquivo - as mais raras são as que mostram a cantora em ação em Brasília (DF) - com depoimentos de pessoas que conviveram e/ou trabalharam com Cássia. Assinado pelo próprio Paulo Henrique Fontenelle, o roteiro segue inclusive ordem cronológica ao expor os principais fatos da vida e obra da artista. Mas é o que basta. Não é preciso reinventar a roda ou buscar formas menos óbvias porque a transgressão já está contida na própria trajetória de Cássia, cantora de postura rocker que derrubou rótulos ao amalgamar diversos gêneros musicais ao longo de carreira que ganhou progressiva projeção nacional ao longo dos anos 1990. Uma cantora de verdade, autêntica, que se fez ouvir não somente com seu vozeirão grave e expressivo, mas também pela postura libertária. Cássia Eller sempre foi assumida nos palcos e na vida. Tanto que os depoimentos colhidos para o filme - da companheira Maria Eugênia, de Zélia Duncan (cantora contemporânea de Cássia, colega e amiga dos tempos pré-fama vividos por ambas na Brasília da década de 1980), de Oswaldo Montenegro (responsável pela iniciação musical profissional de Cássia ao admiti-la no elenco de um de seus espetáculos) e de Nando Reis, entre outros nomes - reiteram a originalidade e a honestidade que pautaram a vida da artista cine-biografada, de temperamento arisco, mas uma fera indomada em cena. "Música, para mim, foi uma fuga da minha timidez", resumiu a própria Eller em frase-chave também ouvida em Cássia. Fugindo do didatismo, o diretor Paulo Henrique Fontenelle - que já retratara vida e obra do cantor, compositor e músico paulista Arnaldo Baptista em outro documentário arrebatador, Loki (Brasil, 2008) - salpica dados biográficos de Cássia, narrados no filme pela própria cantora. A propósito, o filme expande seu valor documental ao expor na tela fotos de Cássia na infância e na adolescência e, sobretudo, ao mostrar número do show feito pela cantora com o ator Marcelo Saback, Gigolôs, sucesso de público e crítica na Brasília de 1986. A visão de Cássia caracterizada de diva para interpretar standard da canção norte-americana vai surpreender somente quem desconhece o fato de que a cantora foi vocalista do primeiro trio elétrico de Brasília, o Massa Real. Nesse sentido, as imagens de Cássia na maternidade - no parto e no pós-parto de seu filho Francisco Eller - talvez sejam mais reveladoras da imensa sensibilidade contida naquela alma aparentemente selvagem, largada, displicente. Aliás, a fala de Chicão é o trunfo que Fontenelle guarda para o fim do filme (que emociona ao mostrar a luta de Maria Eugênia pela guarda do filho que, de fato e de direito, sempre foi seu). A alta expectativa pelo depoimento de Chicão nem se cumpre, mas isso pouco importa. Beneficiado pelo fato de a cantora ter pavimentado sua carreira na era da música audiovisual, o diretor apresenta documentário que enleva ao reconstituir com afeto o relicário de Cássia Rejane Eller.

6 comentários:

Mauro Ferreira disse...

♪ "Vocês se espantarão quando me ouvirem cantar". A frase imodesta pode até soar arrogante, mas toda possível pretensão se dilui quando se sabe que sua autora é Cássia Eller (1962 - 2001). Ouvida na voz da atriz Malu Mader ao fim de Cássia, documentário exibido esta semana no Festival do Rio, a frase faz todo o sentido porque arremata narrativa arrebatadora, comprovando tudo o que é visto e ouvido no filme, cuja estreia nos cinemas está programada para janeiro de 2015. Filmado sob a direção de Paulo Henrique Fontenelle, Cássia é documentário convencional na forma com que retrata a trajetória da cantora carioca. Segue a estrutura clássica do gênero ao entrelaçar imagens de arquivo - especialmente raras quando mostra a cantora em ação em Brasília (DF) - com depoimentos de pessoas que conviveram e/ou trabalharam com Cássia. Assinado pelo próprio Paulo Henrique Fontenelle, o roteiro segue inclusive ordem cronológica ao expor os principais fatos da vida e obra da artista. Mas é o que basta. Não é preciso reinventar a roda ou buscar formas menos óbvias porque a transgressão já está contida na própria trajetória de Cássia, cantora de postura rocker que derrubou rótulos ao amalgamar diversos gêneros musicais ao longo de carreira que ganhou progressiva projeção nacional ao longo dos anos 1990. Uma cantora de verdade, autêntica, que se fez ouvir não somente com seu vozeirão grave e expressivo, mas também pela postura libertária. Cássia Eller sempre foi assumida nos palcos e na vida. Tanto que os depoimentos colhidos para o filme - da companheira Maria Eugênia, de Zélia Duncan (cantora contemporânea de Cássia, colega e amiga dos tempos pré-fama vividos por ambas na Brasília da década de 1980), de Oswaldo Montenegro (responsável pela iniciação musical profissional de Cássia ao admiti-la no elenco de um de seus espetáculos) e de Nando Reis, entre outros nomes - reiteram a originalidade e a honestidade que pautaram a vida da artista cine-biografada, de temperamento arisco, mas uma fera indomada em cena. "Música, para mim, foi uma fuga da minha timidez", resumiu a própria Eller em frase-chave também ouvida em Cássia. Fugindo do didatismo, o diretor Paulo Henrique Fontenelle - que já retratara vida e obra do cantor, compositor e músico paulista Arnaldo Baptista em outro documentário arrebatador, Loki (Brasil, 2008) - salpica dados biográficos de Cássia, narrados no filme pela própria cantora. A propósito, o filme expande seu valor documental ao expor na tela fotos de Cássia na infância e na adolescência e, sobretudo, ao mostrar número do show feito pela cantora com o ator Marcelo Saback, Gigolôs, sucesso de público e crítica na Brasília de 1986. A visão de Cássia caracterizada de diva para interpretar standard da canção norte-americana vai surpreender somente quem desconhece o fato de que a cantora foi vocalista do primeiro trio elétrico de Brasília, o Massa Real. Nesse sentido, as imagens de Cássia na maternidade - no parto e no pós-parto de seu filho Francisco Eller - talvez sejam mais reveladoras da imensa sensibilidade contida naquela alma aparentemente selvagem, largada, displicente. Aliás, a fala de Chicão é o trunfo que Fontenelle guarda para o fim do filme (que emociona ao mostrar a luta de Maria Eugênia pela guarda do filho que, de fato e de direito, sempre foi seu). A alta expectativa pelo depoimento de Chicão nem se cumpre, mas isso pouco importa. Beneficiado pelo fato de a cantora ter pavimentado sua carreira na era da música audiovisual, o diretor apresenta documentário que enleva ao reconstituir com afeto o relicário de Cássia Rejane Eller.

Denilson Santos disse...

Já preparei meu pacote de lenços de papel para assistir esse filme.
Até hoje não consigo aceitar que ela não esteja mais entre nós.
Felizes aqueles, como eu, que puderam assistir a um dos seus shows.
Saudades eternas...
Abração
Denilson

Unknown disse...

É impressionante que, apesar de trajetória errática, tenha construído uma sólida carreira, de modo quase displicente, em sua curta trajetória.
Personalidade musical, belíssimo timbre de voz, violão muito bem tocado.
Cássia Eller teve o raro talento de transformar tudo o que cantou em algo memorável.

Nina Lovise disse...

Caros leitores, realmente fiquei emocionada
ao ler o post e os comentários. De maneira "quase displicente" Cassia ler apareceu em minha imaginação:
linda, forte e envolvente.
Infelizmente não tive a grata satisfação de ouvir Cassia
ao vivo, lembro que comprei um ingresso acho que
para um show em Florianópolis
e ela partiu alguns dias antes. Fiquei muito triste
e até hoje sinto um imenso vazio!

LEONARDO RIVERA disse...

Com ela... o mundo de muita gente era mais completo! Saudações! :)

LEONARDO RIVERA disse...

Com ela... o mundo de muita gente era mais completo! Saudações! :)