sábado, 31 de janeiro de 2015

Disco em que Zélia aborda o cancioneiro de Itamar ganha edição em vinil

O mais sedutor disco brasileiro de 2012 - Zélia Duncan canta Itamar Assumpção - Tudo esclarecido, lançado pela gravadora Warner Music em novembro daquele ano - ganha edição em vinil programada para chegar ao mercado fonográfico em fevereiro deste ano de 2015. Fabricado pela Polysom, o vinil de Tudo esclarecido rebobina as 13 músicas do álbum original produzido por Kassin. Eis, na ordem do LP, as 13 músicas do disco em que a cantora fluminense abordou o cancioneiro inquieto do compositor paulista Itamar Assumpção (1949 - 2003) com pegada pop, apresentando seis músicas da lavra fina do Nego dito então inéditas em disco até aquele momento:

Lado A:
1. Tua boca (Itamar Assumpção, 1993)
2. Cabelo duro (Itamar Assumpção, 2004)
3. Isso não vai ficar assim (Itamar Assumpção, 1986) - com Ney Matogrosso
4. Mal menor (Itamar Assumpção, 1988)
5. A gruta da solidão (Itamar Assumpção, 2012)
6. Tudo esclarecido (Itamar Assumpção e Alice Ruiz, 2012)

Lado B:
1. Quem mandou (Itamar Assumpção e Alice Ruiz, 2012)
2. Noite torta (Itamar Assumpção, 1993)
3. Enquanto penso nela (Itamar Assumpção, 1993)
4. Vê se me esquece (Itamar Assumpção e Alice Ruiz, 1993)
5. Não é por aí (Itamar Assumpção, 2012)
6. É de estarrecer (Itamar Assumpção, 2012) - com Martinho da Vila
7. Zélia Mãe Joana (Itamar Assumpção, 2012)

'Um chopp e um sundae' põe pop eletrônico no cardápio de Rafael Castro

"Não vá ao show de Caetano / Venha ao nosso show / Todo mundo que gosta de Caetano é amigo nosso / E a gente te convidou / ... / O Caetano tá aí faz tempo / Cheio de história pra contar / A gente tá chegando agora / Cheio de conta pra pagar", argumenta com ironia Rafael Castro em versos de Caetano Veloso, uma das 11 músicas do nono título da discografia independente deste artista de Lençóis Paulista (SP), Um chopp e um sundae, lançado nas plataformas digitais nesta última semana de janeiro de 2015. Entre inéditas composições autorais, como Bicho solto e Ciúme, Castro recria músicas dos repertórios dos Raimundos (Aquela, música de Gabriel Thomaz gravada em 1999 pela banda brasiliense), da cantora paulistana Tulipa Ruiz (Víbora, de 2012) e do grupo paulista Joelho de Porco (Um trem passou por aqui, parceria de Tico Terpins e Zé Rodrix lançada em 1983). Viabilizado através de financiamento coletivo, o álbum Um chopp e um sundae adiciona fartas doses de pop e eletrônica ao cardápio musical do autodidata Rafael Castro.

Com Projeto Dragão, Nenung extrapola o rock no bom álbum 'Serenoato'

Resenha de CD
Título: Serenoato
Artista: Nenung & Projeto Dragão
Gravadora: Edição independente do artista
Cotação: * * * 1/2

A rigor, Serenoato (2014) - álbum originado do EP Serenoato de Ludicidez (2011), título inaugural da obra do cantor, compositor e poeta gaúcho Luís Nenung com seu Projeto Dragão - pode ser caracterizado como um disco de rock.  Afinal, é rock o que se ouve em músicas como Quem serve a quem - cujo refrão questionador e provocador se ajustaria bem ao repertório de qualquer banda punk - e Serenoato. No caso, o rock é produto da pegada de Gustavo Chaise (guitarra e violão), Maurício Chaise (guitarra), Rafael Bohrer (bateria) e Thiago Heinrich (baixo), naipe de músicos que formam o Projeto Dragão. Mas o fato é que, ao longo de suas 14 músicas (todas compostas solitariamente por Nenung), o álbum Serenato extrapola o universo musical do rock mais ortodoxo. Introduzida pelos sons de chuva herdados de A tempestade, tema instrumental que a antecede, a bela balada A cada novo adeus - pontuada pelo violoncelo tocado por Moreno Veloso - poderia figurar em álbum do grupo Os The Dárma Lovers, projeto principal de Nenung, no qual ele exercita sua filosofia zen-budista na forma de música serena. Há também O navegador, que se banha na praia do reggae com sedução pop e com a voz incidental de Carmen Corrêa. Esta cantautora de Porto Alegre (RS) também figura em Poeta, longa faixa que abre o disco com mix de sons e silêncios. Mas, sim, Serenoato é também e sobretudo um disco de rock. Até pela atitude. O Projeto Dragão põe pressão em Meu amor se mudou pra lua, joia de brilho tão pop que ganhou a voz de Paula Toller no melhor álbum solo da vocalista do Kid Abelha, SóNós (Warner Music, 2007). O traquejo pop do compositor é reiterado em Maque dia feliz, tema de pegada solar iluminada pelo coro infantil, mas diluída pelas sombras dos acontecimentos relatados nos versos da música, em contraponto que afia a ironia da letra. Melhor letrista do que cantor, Nenung tem o que dizer. E diz, com versos que sobressaem entre a guitarra que se insinua ao longo de Houve 1 tempo e as nuvens negras que pairam sobre o acalanto final Bebê baleia. Serenoato nem sempre sereniza a alma do poeta nestes tempos de (muita) guerra e (pouca) paz.

Ivan chega aos 70 anos de idade - e 50 de música - como um gigante da MPB

 EDITORIAL - Para os ouvidos apurados dos jazzistas, sobretudo os dos Estados Unidos, Ivan Lins é um gigante da MPB. Um nobre descendente da linhagem soberana de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994). O fino acabamento harmônico do cancioneiro autoral do cantor, compositor e pianista carioca é fato incontestável que vai ser celebrado ao longo deste ano de 2015 em que Ivan completa 70 anos de vida - já que nasceu em 16 de junho de 1945 - e também 50 anos de música, já que, em 1965, o artista iniciante começou a tocar nas noites da Tijuca (bairro da Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro) com seu primeiro trio, o Alfa Trio. Com o Alfa Trio, Ivan começou a pôr em prática as lições que aprendeu ouvindo seu mestre Luiz Eça (1936 - 1992) tocar o piano do Tamba Trio, ícone do samba-jazz nascido nos anos 1960 a partir da Bossa Nova. Formado na escola jobiniana da Bossa Nova, aliás, Ivan despontou para o sucesso nacional em 1970, ano em que defendeu sua composição O amor é o meu país (feita em parceria com Ronaldo Monteiro de Souza) no V Festival Internacional da Canção e também o ano em que a sempre antenada Elis Regina (1945 - 1982) deu voz a Madalena (outra parceria com Ronaldo), samba cheio de soul que abriu alas para a música de Ivan Lins na MPB emergida e projetada na era dos festivais a partir de 1965. A propósito, o músico Ivan Lins entrou em cena quando nasceu a MPB. Talvez por isso seu nome seja indissociável dessa MPB que se solidificou ao longo dos anos 1970, década em que o cancioneiro de Ivan frutificou, sobretudo a partir de 1974, quando suas melodias refinadas, mas geralmente acessíveis ao grande público, entraram definitivamente no tom ao ganharem os versos conscientes do letrista e poeta paulista Vitor Martins, afastando do nome de Ivan o cálice ufanista que o compositor, a bem da verdade, nunca bebera. Após três álbuns iniciais - Ivan Lins, agora... (Forma / Philips, 1970), Deixa o trem seguir (Forma / Philips, 1971) e Quem sou eu? (Phonogram, 1972) - nos quais o artista ainda tateou à procura de sua identidade musical, Ivan Lins mostrou quem era, e a que veio, com o álbum Modo livre (RCA Victor, 1974), título que inaugurou sua parceria com Vitor Martins, desenvolvida no álbum seguinte, Chama acesa (RCA Victor, 1975), e consolidada na segunda metade dos anos 1970, período em que Ivan lançou discos históricos pela gravadora Odeon. Os quatro álbuns feitos nessa já desativada companhia - Somos todos iguais nessa noite (1977), Nos dias de hoje (1978), A noite (1979) e Novo tempo (1980) - estão entre os mais inspirados do artista. São discos que, a despeito de sua força musical, alcançaram importância social e política pelo recado de resistência dado através das músicas. Com olhos e ouvidos abertos, Ivan Lins não lavou as mãos diante da repressão imposta pelo regime militar que vigoraria até 1985. De todo modo, a força política de seu cancioneiro jamais abafou o romantismo dramático tão ao gosto das cantoras do Brasil da época. Sua canção Começar de novo (Ivan Lins e Vitor Martins) - pensada para Maria Bethânia, mas gravada por Simone em 1979 para a abertura da série Malu mulher, exibida pela TV Globo naquele ano - foi a trilha sonora preferencial da liberação feminina que deu o tom da MPB na época. Canção lançada em 1980, Bilhete (Ivan Lins e Vitor Martins) ajudou Fafá de Belém em 1982 a se livrar definitivamente do rótulo de cantora regional. Nos anos 1980, Ivan deixou de lançar álbuns anuais - em geral, demorou dois anos entre um e outro - enquanto viu sua música conquistar o universo jazzístico norte-americano. Sua obra ganhou a voz dos maiores cantores de jazz em celebração que, Jobim à parte, somente encontra paralelo na MPB na devoção dos jazzistas ao cancioneiro de Djavan. Mas Ivan nunca saiu do Brasil. Na década de 1990, o artista fundou - com Vitor Martins e com o produtor Paulinho Albuquerque - uma gravadora, a Velas, que desafiou as leis ditadas pelas multinacionais do disco numa época em que ainda não era moda e necessário ser independente. A partir daí, com a progressiva quebra da corrente que ligava a MPB ao povo brasileiro, os sucessos populares do cantor diminuíram, mas sua obra permaneceu sofisticada. Ivan Lins - visto em foto de Leo Aversa - lançou disco de Natal, explicitou a influência de Tom no álbum Jobiniando (Abril Music, 2001) e seguiu fazendo e levando, pelo Brasil e pelo mundo, uma música que agiganta o nome do compositor na cena musical do país, 50 anos após aqueles primeiros shows com o  Alfa Trio.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Banda Catavento lança disco ao vivo com três músicas inéditas e 'covers'

Quinteto de rock psicodélico de Caxias do Sul (RS), Catavento está lançando neste mês de janeiro de 2015 um disco ao vivo com o registro de vários números de sua apresentação na oitava edição do festival Manifestasol, feita em 2014 na cidade natal do grupo. Em Live bootleg (Honey Bomb Records), disco disponível na plataforma BandCamp, Catavento rebobina músicas de seu álbum de estreia Lost youth against the rush (Honey Bomb Records / Noia Records, 2014), apresenta três inéditas e faz covers de temas dos repertórios do grupo australiano Pond (Pond in the dark) e da banda norte-americana Unknown Mortal Orchestra (Swin and sleep - Like a shark).

'Arena pop 2015' compila hits recentes do acervo da gravadora Som Livre

Gravadora voltada atualmente para o comércio de discos de gêneros populistas, como o sertanejo pop e o pagode, a Som Livre compila hits recentes de seu acervo na coletânea Arena pop 2015, lançada neste mês de janeiro de 2015 em CD e em edição digital. Além de músicas do universo sertanejo, como Ressentimento (música do repertório da dupla Jads & Jadson), Calma (hit da dupla Jorge & Mateus), Tudo com você (sucesso de Victor & Leo) e Até você voltar (hit de Henrique & Juliano, a dupla-revelação de 2014), a seleção inclui sucessos dos grupos Malta (Diz pra mim), Suricato (Trem), Titãs (República dos bananas), Raimundos (Gordelícia) e Sorriso Maroto (Pra você escutar). MC Koringa representa o universo funk com seu sucesso Convocação.

Vanusa retoma gravação do álbum produzido por Baleiro para o selo Saravá

Embora suas gravações tenham sido iniciadas em 2013, o álbum de Vanusa produzido por Zeca Baleiro não foi lançado em 2014 como previsto inicialmente. Mas o projeto do álbum continua de pé e o disco pode - enfim - sair neste ano de 2015. Em sua página no Facebook, Baleiro anunciou a retomada das gravações do álbum idealizado para ser lançado pelo selo do artista maranhense, Saravá Discos. Pelo cronograma inicial, as gravações teriam sido retomadas em junho de 2014, após o lançamento do EP Vanusa Santos Flores, mas alegados problemas de agenda atrasaram a produção do CD. Se o repertório selecionado inicialmente for mantido, a cantora paulista - em foto de Helena Tassara - vai dar voz à música de sua própria autoria (Traição, lançada por Vanusa em disco de 1994), a uma inédita parceria com Baleiro (Tudo aurora) e a sucessos de Angela Ro Ro (Compasso, parceria com Ricardo McCord, de 2006) e de Vander Lee (Esperando aviões, canção de Vander lançada pelo autor em 2003).

Deeplick lança coletânea de remixes feitos para Ana, Jota Quest e Mallu

DJ, produtor musical e compositor paulista, nascido em São Bernardo do Campo há 37 anos, Fernando Deeplick cresceu e apareceu como autor de remixes que mantiveram nomes como Ana Carolina, Jota Quest e Vanessa da Mata nas pistas e nas FMs. Nove amostras da habilidade do artista para recriar uma música com recursos eletrônicos estão reunidas no álbum Deeplick remixes, lançado no iTunes via Sony Music neste mês de janeiro de 2015. Três dos nove remixes são de músicas do grupo mineiro Jota Quest (Até onde vai, La plata e So special). A cantora mineira Ana Carolina figura no disco com o remix de Entreolhares (The way you're looking at me), sucesso radiofônico de seu álbum N9ve (Armazém / Sony Music, 2009). Já a paulistana Mallu Magalhães aparece com o remix de Shine yellow, música de seu segundo álbum, lançado em 2009. Carlinhos Brown, que já fez álbuns produzidos por Deeplick, está na compilação com o remix de Tantinho. Há também remixes de músicas de Ana Cañas (Esconderijo), Danni Carlos (Coisas que eu sei) e grupo P9 (My favorite girl). Deeplick remixes sai somente em edição digital.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Iorc lança single 'Dia especial' em que revive hit da banda Cidadão Quem

Banda gaúcha desativada em novembro de 2014 por conta da morte de seu baixista Luciano Leindecker (1972 - 2014), irmão do líder do grupo Duca Leindecker, Cidadão Quem tem uma de suas músicas mais conhecidas, Dia especial, reavivada pelo cantor e compositor brasiliense Tiago Iorc. Na sequência do clipe da regravação da música, posto em rotação no YouTube em 22 de dezembro de 2014, Iorc lança neste mês de janeiro de 2015 o single Dia especial, já disponível em plataformas digitais. Canção de autoria de Duca Leindecker, Dia especial foi lançada pela banda Cidadão Quem no seu terceiro álbum de estúdio, Spermatozoom (Zoom Records, 1998), editado há 17 anos. A música foi um dos sucessos desse disco e se tornou um dos maiores hits do grupo.

Caixa com álbuns de Mautner nos anos 1980 traz inédita gravação ao vivo

Um CD com o inédito registro do show O poeta e o esfomeado - feito pelo cantor e compositor carioca Jorge Mautner em 1987 com Gilberto Gil e o percussionista Repolho - é a isca para fisgar compradores para a caixa Zona fantasma. Produzido pelo pesquisador musical Marcelo Fróes para seu selo Discobertas, o box embala reedições dos álbuns feitos por Mautner nos anos 1980. Bomba de estrelas (Warner Music, 1981), Antimaldito (Nova República / Polygram, 1985) e Árvore da vida (Geléia Geral / Warner Music, 1988) - disco assinado por Mautner com o parceiro Nelson Jacobina (1953 - 2012) - são os álbuns encaixotados com a gravação inédita do show de 1987. Textos do jornalista Renato Vieira contextualizam os discos na obra fonográfica de Mautner.

Musical longo sobre Simonal acerta o ponto do 'champignon' no segundo ato

Resenha de musical de teatro
Título: S'imbora o musical - A história de Wilson Simonal
Texto: Nelson Motta e Patrícia Andrade
Direção: Pedro Brício
Direção musical: Alexandre Elias
Produção musical: Max de Castro
Elenco: Ícaro Silva (como Simonal), Thelmo Fernandes (como Carlos Imperial) e Gabriela

              Carneiro da Cunha (como Tereza), entre outros
Foto: Leo Aversa
Cotação: * * *
Musical em cartaz no Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro (RJ), até 12 de abril de 2015

No dicionário particular do cantor carioca Wilson Simonal (23 de fevereiro de 1938 - 25 de junho de 2000), champignon é termo que significava suingue, balanço, o molho extra que ele pôs em interpretações cheias de charme e veneno que o elevaram na segunda metade dos anos 1960 à condição de primeiro popstar negro do Brasil. Recém-estreado no Rio de Janeiro (RJ), onde vai ficar em cartaz no Teatro Carlos Gomes de quinta-feira a domingo até 12 de abril de 2015, o musical sobre Simonal acerta o ponto do champignon em seu segundo ato. É quando os autores Nelson Motta e Patrícia Andrade - dupla que assinou o texto de Elis, a musical (2013), bem-sucedido espetáculo ainda em cartaz - esboçam uma dramaturgia inexistente no gorduroso primeiro ato. A rigor, S'imbora o musical - A história de Wilson Simonal segue à risca a receita rentável dos espetáculos biográficos sobre ídolos da música. A exposição dos fatos mais relevantes da vida e obra do biografado, em painel cronológico e superficial, parece ser mero pretexto para a apresentação de números musicais que mexem com a memória afetiva do público-alvo desse gênero de musical. Espetáculo que marca a entrada em cena da Planmusic (empresa que debuta no mercado teatral com a credibilidade obtida pelo empresário Luiz Oscar Niemeyer na área musical), S'imbora reitera vícios e virtudes do gênero com o mérito de retratar Simonal com nuances. Embora o texto tenda a absolvê-lo das acusações (nunca efetivamente comprovadas) de delação de colegas ao Dops (principal órgão repressor do regime ditatorial em vigor no Brasil de 1964 a 1985), promovendo ao fim a redenção do cantor, Simonal é posto em cena com todas suas contradições. Ao carisma inegável, contrapõe-se em cena uma arrogância que, na vida real, contribuiu para que o artista fosse enterrado vivo na primeira metade dos anos 1970. Todo o segundo ato é impregnado das sombras que nublaram a alma de Simonal após o controvertido episódio que destruiu sua carreira. E, nesse ato, o protagonista Ícaro Silva tem um de seus melhores momentos no espetáculo ao puxar Cordão (1971), a música de Chico Buarque gravada por Simonal em álbum melancólico dessa fase crepuscular, Ninguém proíbe o amor (RCA, 1975), como um manifesto de resistência. A propósito, Ícaro Silva está bem como Simonal e eventualmente brilha como ator e cantor, mas sem impactar. Não há na sua personificação de Simonal o traço de incorporação observado nas performances dos atores que arrebataram o público ao protagonizarem recentes musicais sobre Tim Maia (1942 - 1998), Cazuza (1958 - 1990) e Cássia Eller (1962 - 2001), por exemplo. De todo modo, Ícaro vai crescendo ao longo das três horas do espetáculo. Desenvolto, acerta o tom da intervenção na plateia ao espremer o suco de Meu limão, meu limoeiro - o tema folclórico de origem nordestina temperado por Simonal com champignon - e ao dar voz a músicas emblemáticas da discografia do cantor, casos de Nem vem que não tem (Carlos Imperial, 1967) e Tributo a Martin Luther King (Wilson Simonal e Ronaldo Bôscoli, 1966), esta uma prova da consciência social de Simonal, ídolo que jamais aceitou o papel submisso e grato imposto aos negros famosos. Ícaro é o protagonista, mas, no primeiro terço do primeiro ato, chega a ser eclipsado em cena por Thelmo Fernandes, ator que marca bela presença no musical ao personificar com carisma o compositor, produtor e apresentador capixaba Carlos Imperial (1935 - 1992), a quem o texto confia a função de narrador da história de Simonal (a quem Imperial deu as primeiras oportunidades na carreira). O problema é que toda a parte dedicada a Imperial no início roqueiro do primeiro ato resulta demasiadamente longa. Números musicais como Rock around the clock (Max Freedman e James Myers, 1954) são perfeitamente dispensáveis no roteiro porque, a rigor, em nada contribuem para avançar na história de Simonal. Até porque, em certos momentos da primeira metade do primeiro ato, fica a impressão de que a figura central do musical é Imperial, e não Simonal. Por falar no roteiro, um dos números mais criativos - veículo para a exposição da versatilidade e do suingue de Simonal - é Lobo bobo (música creditada no programa da peça somente a Carlos Lyra, com omissão do nome de Ronaldo Bôscoli, parceiro de Lyra no tema). Nesse número, Ícaro alterna o tom de sua interpretação, se dividindo em questão de segundos entre o canto cheio de bossa do programa de TV O fino da bossa e a abordagem mais envenenada e pop do programa rival Jovem Guarda. Simonal tinha bossa e tinha também soul. Como cantor, Ícaro Silva consegue evocar em cena o suingue do artista quando interpreta músicas como Balanço Zona Sul (1963), música de autoria de Tito Madi desatentamente creditada a Simonal no programa do espetáculo. Como diretor, Pedro Brício surpreende a plateia ao projetar em telão a imagem de um carro condizente com o Carango do título desta parceria de Imperial com Nonato Buzar (1932 - 2014), compositor maranhense associado à Pilantragem, o movimento arquitetado por Imperial para alavancar o sucesso de Simonal na segunda metade dos anos 1960. Como diretor musical, autor dos arranjos criados com Max de Castro (filho de Simonal), Alexandre Elias acerta porque não inventa moda. Dá para identificar em Sá Marina (Tibério Gaspar e Antonio Adolfo, 1968) - número que retrata no musical a passagem de Simonal pelo palco do Olympia de Paris em 1968 - a pulsação do imbatível arranjo original desse grande sucesso do cantor. No segundo ato, mais conciso, a dramaturgia entra em cena através de diálogos que retratam os desajustes de Simonal com a mulher Tereza (papel de Gabriela Carneiro da Cunha), com a polícia, com os todos-poderosos da TV Globo e com o mundo de forma geral. É a fase em que o artista se deixa anestesiar pela bebida. Mas, como manda a receita dos musicais do gênero, o final tem que ser para cima. Uma redenção além-túmulo - incoerente com o tom realista do texto - prepara o clima para o gran finale com medley de sucessos de Wilson Simonal, o cantor que fez o povo inteiro cantar. Mas que foi esquecido por esse mesmo povo ao dar o passo em falso - a prensa através de agentes Dops em contador do qual suspeitava de roubo em sua empresa - que lhe custou o sucesso e, de certa forma, a vida. S'imbora honra a memória do ótimo cantor ao recontar sua história, mesmo com gorduras no longo primeiro ato.

Voz de 'Mulher rendeira', a atriz e cantora Vanja Orico sai de cena no Rio

A carioca Evangelina Orico (15 de novembro de 1929 - 28 de janeiro de 2015) se destacou mais como atriz de cinema nos anos 1950, tendo chegado a atuar com o cineasta italiano Federico Fellini (1920 - 1993), em cujo filme Lucci del varietá (Itália, 1950) cantou o tema folclórico de raiz nordestina Meu limão, meu limoeiro. Mas Vanja Orico - como era conhecida a artista que saiu ontem de cena aos 85 anos, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), vítima de complicações decorrentes de câncer no instestino e de Mal de Alzheimer - foi também cantora, dona de discografia regular nos anos 1950 e 1960. Foi pela voz de Vanja que o xaxado Mulher rendeira - creditado oficialmente ao compositor paraibano Zé do Norte (1908 - 1979), mas em tese originado de versos escritos pelo cangaceiro pernambucano Virgulino Ferreira da Silva (1898 - 1938), o Lampião, entre 1921 e 1922 - ganhou projeção nacional em 1953 ao ser cantado por ela no filme O Cangaceiro (Brasil), do cineasta paulista Lima Barreto (1906 - 1982). Nesse mesmo ano de 1953, Vanja iniciou sua discografia, gravando um disco de 78 rotações por minuto pela gravadora RCA-Victor com outra música de Zé do Norte, Sodade, meu bem, sodade, que se tornaria seu maior sucesso como cantora. O primeiro álbum da artista, Viagem musical com Vanja Orico, saiu em 1954 pela Sinter com repertório de tom nordestino que incluía temas folclóricos. Nesta fase inicial de sua discografia, povoada por discos de 78 rotações, Vanja deu voz a muitas músicas do compositor Dorival Caymmi (1914 - 2008). Mas a cantora gravou também músicas de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) e, sem jamais abandonar o repertório nordestino, transitou pelas obras de outros compositores associados à Bossa Nova (como Carlos Lyra e Roberto Menescal) em seu álbum Vanja Orico (Chantecler, 1964), no qual cantou inclusive o então iniciante Jorge Ben Jor, de quem gravou Dandara. A fase mais produtiva da discografia da artista compreende período que vai de 1953 a 1967. Sem gravar nos anos 1970, a cantora voltou ao mercado fonográfico no início da década seguinte com a edição do LP Vanja Orico (Seta, 1981). A partir daí, Vanja lançou álbuns ocasionais, sendo que o último - Mexe com o corpo - foi editado de forma independente em 2007.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Samba sobre Candeia brilha na linear safra 2015 das escolas da 'Série A'

Resenha de CD
Título: Sambas de enredo 2015 Série A
Artista: Vários
Gravadora: Som Livre
Cotação: * * *

Amantes atentos do Carnaval carioca sabem que, não raro, as escolas da Série A - plataforma de acesso à elite do Grupo Especial - apresentam sambas de enredo mais inspirados do que os das agremiações do desfile principal. Desta vez, no entanto, não é bem assim. A safra da Série A para os desfiles do Carnaval de 2015 é regular, ficando no mesmo correto nível da safra do Grupo Especial. Ou seja, há pouco brilho. Escolas tradicionais como Estácio de Sá (cujo enredo celebra os 450 anos da cidade do Rio de Janeiro) e Império da Tijuca (que celebra as águas doces do orixá Oxum) apresentam sambas dignos, mas ambos aquéns da expectativa gerada pelos respectivos históricos das agremiações no quesito. Produzido por Leonardo Bessa, o CD com os 15 sambas de enredo da Série A soa regular. Entre enredos tradicionais (como a negritude africana exaltada pelo bom samba da escola niteroiense Acadêmicos do Cubango) e mais contemporâneos (como o genérico tema da energia que alimenta o samba da Unidos da Porto da Pedra, agremiação de São Gonçalo), o desfile dos 15 sambas jamais chega a empolgar no disco. O destaque é o belo samba da Renascer de Jacarepaguá - pequena escola da Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro (RJ) - que versa sobre o compositor carioca Candeia (1935 - 1978). O samba foi composto por Claudio Russo, Moacyr Luz e Teresa Cristina, cantora que abre o samba puxado por Evandro Malandro e Diego Nicolau. A letra alinha citações de sucessos do autor de O mar serenou (Candeia, 1975), Peixeiro grã-fino (Candeia e Bretas, 1978) e Zé Tambozeiro (Candeia e Vandinho, 1978), entre outros sambas. No mais, a safra soa linear. Se o Império Serrano exalta a fé em bom samba cuja letra cita uma das músicas mais conhecidas do cancioneiro de Gilberto Gil, Andar com fé (1982), a União do Parque Curicica se diferencia com enredo popular que celebra Arlindo Cruz, Martinho da Vila  e Monarco. Na mesma seara de homenagens, a Acadêmicos de Santa Cruz lembra o ator, cantor e compositor mineiro Grande Otelo (1915 - 1993) com samba menor do que o legado do grande Otelo. Já a Paraíso de Tuiuti segue trilha mais histórica ao falar sobre a expedição do aventureiro alemão Hans Staden (1525 - 1576) por terras indígenas do Brasil. Por sua vez, a Em Cima da Hora aposta em samba mediano sobre a influência árabe na cidade do Rio de Janeiro. Falta na letra a irreverência que pauta o samba da Alegria da Zona Sul, que exalta o orgulho de ser carioca com certa leveza. Enfim, por mais que uma escola acerte mais do que outra na escolha de seus sambas de enredo, a safra de 2015 da Série A do Carnaval carioca resulta esquecível. Ao menos no disco recém-lançado pela gravadora Som Livre. Mas é na avenida que um samba de enredo diz realmente a que veio, levantando a escola ou a jogando para baixo neste quesito crucial.

Jam da Silva constrói um Nordeste nórdico em seu segundo disco, 'Nord'

É através da mistura entre o frio da Islândia e o clima quente e seco do Nordeste do Brasil que o compositor e percussionista pernambucano Jam da Silva encontra a temperatura de seu ótimo segundo álbum, Nord (Jamueiro Records, 2014), cujo título evoca tanto um quanto outro clima. A viagem do artista à Islândia inspirou temas como Diamante das águas (Jam da Silva), música que encerra o disco com mix de vozes, sons da natureza e o toque noise da guitarra de Zé Nóbrega. Das 10 músicas que compõem o repertório inteiramente autoral do sucessor de Dia santo (Independente, 2009), uma já é conhecida dos admiradores de Elba Ramalho. Trata-se de Gaiola da saudade, ciranda composta por Jam em parceria com Maciel Salu e lançada pela cantora paraibana em um de seus melhores álbuns, Qual o assunto que mais lhe interessa? (Ramax / Brazilmúsica!, 2007). Ao arquitetar o cancioneiro de Nord, Jam refez sua conexão com Fábio Trummer (do grupo Eddie) - parceiro de Preto mulato branco, música gravada com veia mais pop, aberta pela guitarra e a voz de Lucas Santtana - e abriu parcerias com a paulistana Luísa Maita (em Vagueia, faixa formatada com a participação da própria artista) e com a norte-americana Lisa Papineau, coautora e convidada de Burn the night. Ao longo das dez faixas, o músico - mais guiado pelo ritmo do que pela melodia de suas músicas - constrói no disco um Nordeste de clima nórdico.

Jobim entra com naturalidade no tom do sertão de Chitãozinho & Xororó

Resenha de CD
Título: Tom do sertão
Artista: Chitãozinho & Xororó
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * * 1/2

Emblemático samba que demarcou em 1958 o território da Bossa Nova, na voz de João Gilberto, Chega de saudade (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958) pega - em determinado momento da gravação de Chitãozinho & Xororó - uma estrada que vai dar na música country norte-americana, evocada pelo banjo de Marcelo Modesto. A ousadia estilística pode ser conferida na oitava das 12 faixas de Tom do sertão, CD no qual a dupla paranaense traz o cancioneiro de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) para seu universo sertanejo. Um dos melhores títulos da discografia dos irmãos, em cena desde 1970, o álbum peca somente pelo excesso da produção capitaneada por Ney Marques, Edgard Poças e Cláudio Paladini sob a direção artística dos próprios Chitãozinho & Xororó. Gravações como as de Se é por falta de adeus (Antonio Carlos Jobim e Dolores Duran, 1955) sinalizam exagero no uso de cordas nos arranjos geralmente opulentos. Utilizadas de forma excessiva, as cordas diluem a leveza que faz Chovendo na roseira (Antonio Carlos Jobim, 1971) florescer em registros mais econômicos, por exemplo. Contudo, esse é o único defeito de Tom do sertão. Sem se afastar de seu estilo de canto anasalado, Chitãozinho & Xororó acertam ao enfatizar no disco a face mais bucólica e ruralista do cancioneiro de Jobim. "Velho caminho / Por onde passou / Carro de boi / Boiadeiro gritando, ô, ô...", canta a dupla, expondo a pegada sertaneja dos versos de Caminho de pedra (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958). Sim, de forma geral, o soberano cancioneiro de Jobim entra com naturalidade no tom do sertão de Chitãozinho & Xororó pela própria natureza das letras de músicas como A chuva caiu (1956) e Correnteza (1973), ambas escritas pelo compositor carioca Luiz Bonfá (1922 - 2001), parceiro de Tom nos dois temas de ambiência rural. Arranjada com viola e violões, como se fosse uma toada, Estrada branca (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958) é outro bom exemplo de como Tom se ambienta bem no sertão de Chitãozinho & Xororó. Por falar em violas, a de dez cordas tocada por Xororó em Modinha (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958) dá tom camerístico e caipira à faixa, um dos pontos altos do disco. Aliada à viola clássica tocada pelo convidado Lucas Lima, a mesma viola de dez cordas de Xororó dá a mesma pulsação caipira ao standard romântico Eu sei que vou te amar (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1959) no fecho surpreendente do álbum. A propósito, a dupla não terça vozes somente em músicas de tom originalmente ruralista. Há também canções românticas na seleção que surpreende ao incluir o belíssimo - e pouco gravado - samba-canção Solidão (Antonio Carlos Jobim e Alcides Fernandes, 1954), joia da fase inicial de Jobim, lançada pela cantora carioca Nora Ney (1922 - 2003) e anos depois tirada do baú por Caetano Veloso (em 1986) e Gal Costa (em 1991). Nas vozes da dupla, Eu não existo sem você (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958) vira balada triste, trilha seguida também por Caminhos cruzados (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1958). Já Se todos fossem iguais a você (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1956) é envolto pela dupla em clima apoteótico, em andamento que oscila entre o samba e a marcha-rancho. E por falar em samba, tudo começa com ele, já que Águas de março (Antonio Carlos Jobim, 1972) abre o disco em registro genérico que jamais consegue se dissociar do definitivo arranjo original do tema. Mas Águas de março é apenas um detalhe em disco interessante que eleva o nível (raso) da música sertaneja atual e que significa, não o fim do caminho, mas um outro passo firme na (longa) estrada da vida sertaneja de Chitãozinho & Xororó.

Dupla Victor & Leo grava CD/DVD 'Irmãos' com 12 inéditas e seis convidados

Com as 12 músicas inéditas que vão registrar hoje e amanhã na quarta gravação ao vivo de sua discografia, a dupla mineira Victor & Leo poderia gravar seu sétimo álbum de inéditas. Mas os cantores e compositores optaram por seguir a moda sertaneja e fazem em 28 e 29 de janeiro de 2015 mais um registro ao vivo de show para gerar CD e DVD que vão chegar ao mercado fonográfico via Som Livre. No caso, a gravação de duas apresentações do inédito show intitulado Irmãos, a ser feito no estúdio Quanta, em São Paulo (SP), com público formado por convidados dos artistas e da produção do espetáculo. Os nomes dos seis convidados da gravação ao vivo - a banda de rock Malta, a cantora Lucyane, o cantor Wesley Safadão e as duplas sertanejas Henrique & Juliano, Milionário & Zé Rico e Victor Freitas & Felipe - reiteram a decisão de Victor & Leo de seguir as tendências do mercado de música pop sertaneja. As doze músicas inéditas - quase todas assinadas pelos irmãos e / ou por Paulinha Gonçalves - são 10 minutos longe de você, 15º andar, Noite fria, Estrada vermelha (canção de tom ruralista que lembra a fase inicial da dupla), Nossa trilha, Escuridão iluminada, Sabor dos ventos, Vai me perdoando, Momentos, Tempo de amor, Simples assim e Anjo ou fera. A maioria segue a toada pop a julgar pela prévia dos ensaios. A dupla recria o reggae Vamos fugir (Gilberto Gil e Liminha, 1984).

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Segundo álbum solo de João Cavalcanti tem música feita com Jorge Drexler

O segundo álbum solo do cantor e compositor carioca João Cavalcanti já está em fase de pré-produção, entre Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Inteiramente autoral, o repertório do sucessor de Placebo (Warner Music, 2012) vai apresentar a primeira parceria de Cavalcanti com o compositor uruguaio Jorge Drexler, intitulada Consumido. Previsto para ser lançado neste ano de 2015, o disco vai ter produção assinada por Tó Brandileone (do grupo paulistano 5 a Seco) e Bruno Giorgi. Cavalcanti - visto em foto de Alice Venturi - também abriu parceria com a cantora e compositora carioca Joyce Moreno, com quem compôs Dia lindo, mas esta música, em princípio, fica fora do repertório do disco. Com o compositor carioca Claudio Jorge (outro novo parceiro de Cavalcanti), o artista assina Pêndulo.

Hábil produtor, Strausz progride na diversidade do disco 'Spectrum vol. 1'

Resenha de CD
Título: Diogo Strausz apresenta Spectrum vol. 1
Artista: Diogo Strausz
Gravadora: Edição independente do artista
Cotação: * * * *
Disco disponível para download gratuito no site oficial do artista

 Ágil e sagaz, Diogo Strausz apresenta seu primeiro álbum solo no rastro da exposição obtida como produtor de um dos discos mais (justamente) incensados de 2014, Rainha dos raios (Joia Moderna), o impactante segundo álbum da cantora carioca Alice Caymmi. Com capa vintage, Diogo Strausz apresenta Spectrum vol. 1 tem a elasticidade típica de discos de produtores. Cada uma das 12 músicas habita um universo musical todo próprio, sem elo aparente. A liga é o trabalho deste produtor e músico polivalente que se revela compositor promissor. Sim, o carioca Strausz cresce e aparece como compositor neste disco autoral lançado hoje, 27 de janeiro de 2015, em edição digital já disponível para download gratuito e legalizado no site oficial do artista. Strausz assina 11 das 12 músicas de Spectrum vol. 1. A única música de lavra alheia, Se renda, canção pop romântica composta e cantada no disco por Leno (pai de Strausz, a propósito), é sintomaticamente a faixa mais esmaecida do álbum gravado e mixado pelo próprio Strausz no seu estúdio caseiro. Já detectada no arrasador álbum de Alice, a habilidade do homem-orquestra é reiterada neste disco em que todos os violões, guitarras e baixos são tocados por Strausz. Mas as vozes são as dos convidados que povoam o disco de um músico e produtor consciente de sua inabilidade para o canto. Versátil, Strausz surfa na guitarrada que dá o tom de Chibom (Diogo Strausz) - faixa que escapa de ser inteiramente instrumental porque as cantoras Ledjane Motta e Maria Pia gritam a palavra-refrão-título do tema - e se ambienta no clima de western spaghetti evocado pelo toque de sua guitarra em Ítalo (Diogo Strauz), faixa quase vinheta que se afina com o tom de Vendetta (Diogo Strausz), possível trilha de filme de ação sobre a máfia. Primeiro single do álbum, Não deixe de alimentar ostenta groove que remete ao funk dos anos 1970 em clima black Rio. As solistas da faixa são as cantoras Ledjane Motta e Maria Pia, cujas vozes são recorrentes nos coros femininos de Spectrum vol. 1. Elas, as vozes, se fazem ouvir também em FCK, exuberante conexão de Strausz com Apollo, seu parceiro no tema eletrônico que joga no mesmo caldeirão fervente ingredientes de dance music, Kraftwerk, disco music, Giorgio Moroder e do tecnopop dos anos 1980. Também com pegada dançante, porém com toques de soul e rap, Narcissus junta o anfitrião com Keops & Raony, os gêmeos do grupo carioca Medulla. Tema de arquitetura mais sintética, Me ama (Diogo Strausz) expõe Kassin -como Strausz, um produtor de musicalidade polivalente - em faixa pautada pela batida do drum'n'bass e humanizada pela súplica feminina por amor. Em outra galáxia musical, mas também falando de amor, o baladão Right hand of love é parceria de Strausz com Brent Arnold - cujo violoncelo é ouvido na faixa - e com Jacob Perlmutter, cantor britânico de voz grave que aprofunda os versos do tema, cuja orquestração ganha tons progressivamente épicos. Introduzida por poesia dita por Valmir Araújo, Vovô (Diogo Strausz) é envolvida por aura de espiritualidade que adquire tom afro-brasileiro quando o arranjo enfatiza as percussões da faixa. Mas os bons conselhos típicos de autoajuda ("Peça luz para o pior dos inimigos") embutidos na letra bem-intencionada, mas pueril, impedem que Vovô alcance dimensão maior no disco. Com acabamento mais polido, Assombração (Diogo Strausz e Rosa Amanda Strausz) é introduzida por violões que remetem às tradições da música brasileira pré-Bossa Nova, mas cai no samba com toques de choro e com a voz de Danilo Caymmi, evocativa das profundezas do canto do patriarca Dorival Caymmi (1914 - 2008). E por falar na família de origem baiana, é a voz da princesa gauche da dinastia - Alice Caymmi, nome já indissociável da trajetória artística de Diogo Strausz - que encerra Spectrum vol. 1, cantando Diamante (Diogo Strausz), valsa de alto quilate que termina em clima de fanfarra. Enfim, são múltiplas as boas referências do primeiro álbum solo de Strausz. E o fato é que o produtor consegue reiterar seu talento ao alinhavar um cancioneiro díspar que expõe a rica musicalidade latente no trabalho do artista. Mesmo sem unidade, o álbum escancara a força de Diogo Strausz como arquiteto de sons contemporâneos que evocam o passado sem saudosismo e projetam (belo) futuro para o produtor.

Tulipa anuncia em rede social que já começa a gravar seu terceiro álbum

A IMAGEM DO SOM - A foto acima foi postada pela cantora e compositora paulista Tulipa Ruiz em sua página oficial no Facebook, em 23 de janeiro de 2015, com os dizeres "Começou! #disco3daTulipa". Em bom português, a artista anunciou que começou a gravar, em São Paulo (SP), seu terceiro álbum, o sucessor de Tudo tanto (Independente, 2012). Embora Tulipa não tenha entrado em detalhes, é provável que a produção do álbum tenha sido confiada - mais uma vez - a Gustavo Ruiz, irmão da cantora e produtor de Efêmera (YB Music, 2010) e de Tudo tanto.

Rudimentar, Capucho explora tempo de sua cabeça em 'Poema maldito'

Resenha de CD
Título: Poema maldito
Artista: Luís Capucho
Gravadora: Edição independente do artista
Cotação: * * 1/2

Em seu quarto álbum, Poema maldito, Luís Capucho parece explorar o tempo de sua cabeça - como diz nos versos (escritos na primeira pessoa do singular) de Meu bem (Luís Capucho), uma das onze músicas autorais de um disco cru, rústico em excesso, calcado no violão rudimentar do artista e, sobretudo, na poesia que carrega aura de maldição por falar sem papas na língua de amor e sexo sob prisma marginal. Produto de campanha de financiamento coletivo realizada em 2014 na plataforma Variável 5, Poema maldito vai soar familiar para quem já ouviu Lua singela (2003), Cinema Íris (2012) e Antigo - Luís Capucho 95 (2013). A escassez de melodia contrasta com a abundância de sentimentos embutidos numa poesia direta, feita sem rigores formais, eventualmente autorreferente como exposto nos versos da música-título Poema maldito (Luís Capucho e Tive). Uma poesia crua como a música deste cantor e compositor capixaba radicado em Niterói (RJ) desde a adolescência. Produzido por Felipe Castro, o disco jamais maquia as imperfeições. Tanto que fragmentos de falas do artista durante a gravação são ouvidos ao fim das músicas La nave va (Luís Capucho e Manoel Gomes) - faixa que tem guitarra e baixo tocados pelo produtor Felipe Castro - e Velha (Luís Capucho), cujos versos enxergam beleza e nobreza na senhora de "vestidinho de chita com florezinhas" perfilada no tema. O violão de Capucho conduz o disco do início ao fim, mas instrumentos eventuais são adicionados ao repertório - como o piano posto por Paulo Baiano em Cavalos (Luís Capucho) - sem alterar a pulsação de Poema maldito. Parceria de Capucho com Marcelo Diniz, Soneto sobressai no cancioneiro autoral que inclui tema mais antigo, Formigueiro, composto antes de Capucho sofrer fortes sequelas motoras e vocais por conta de neurotoxoplasmose contraída em decorrência de infecção pelo vírus HIV. Por conta da doença, a voz mudou, ficando mais grave. O que permaneceu inalterada é a habilidade do poeta para retratar belezas e feiúras do cotidiano banal, como faz em Mais uma canção do sábado (Luís Capucho e Alexandre M. Jardim Pimenta), música feita com versos doídos e corroídos de saudade do ser amado. A poesia maldita é, em última instância, o sopro de vida que ainda anima a música rudimentar de Luís Capucho neste álbum em que o artista se aventura pelo tempo de sua cabeça.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

EP de frevos de Fafá ganha edição digital com adição de faixa feita com Alceu

Gravado por Fafá de Belém para o Carnaval de 2013, com direção ao mercado de Pernambuco, o EP Fafá, frevo e folia - Coração pernambucano ganha edição digital neste mês de janeiro de 2015 no momento em que a cantora paraense prepara seu primeiro álbum de estúdio em dez anos sob a produção de Felipe Cordeiro. Até então com circulação restrita ao Recife (PE), cidade onde foi gravado em dezembro de 2012 com produção de Zé da Flauta e direção musical de Bráulio Araújo, o EP ganha distribuição nacional via iTunes com faixa adicional. Além das cinco músicas da edição original, o EP inclui na edição digital Beija-flor apaixonado, frevo-canção de autoria de Alceu Valença, gravado por Fafá em dueto com o cantor e compositor pernambucano em janeiro de 2014. A gravação de Beija-flor apaixonado circulou na web há um ano, mas nunca tinha sido lançada em disco. Clique aqui para ler ou reler a resenha do EP Fafá, frevo e folia postada pelo blog Notas musicais em 9 de fevereiro de 2013.

'Prece atendida' anuncia 'Trovões a me atingir', segundo álbum de Naves

Cantor e compositor que conseguiu certa projeção na cena indie paulistana há três anos com a edição de seu primeiro álbum, E você se sente numa cela escura, planejando a sua fuga, cavando o chão com as próprias unhas (Travolta Discos / Popfuzz Records, 2012), Jair Naves está prestes a lançar seu segundo álbum. Quarto título de discografia aberta com o EP Araguari (2010) e com o single Um passo por vez (2011), o álbum Trovões a me atingir tem lançamento agendado para 3 de fevereiro de 2015. O primeiro (bom) single, Prece atendida, já está em rotação no SoundCloud, pondo em evidência a ligeira semelhança do timbre da voz grave e quente de Naves com a voz do cantor e compositor Belchior. As cantoras Bárbara Eugênia e Camila Zamith fazem vocais em Prece atendida, música gravada com arranjo no qual sobressai o violoncelo de Raphael Evangelista. Com repertório essencialmente autoral, o álbum Trovões a me atingir foi formatado, entre agosto e outubro de 2014, nos estúdios El Rocha e Kalundu, em São Paulo (SP).

Bethânia planeja gravar, no Rio, o show com que celebra 50 anos de carreira

Foi na cidade do Rio de Janeiro (RJ) que, em 13 de fevereiro de 1965, Maria Bethânia deu o primeiro passo decisivo na sua carreira de cantora. Por isso mesmo, o desejo da intérprete baiana é gravar ao vivo na cidade que a abriga há 50 anos o belo show comemorativo de suas cinco décadas de palco, Abraçar e agradecer, para a edição de DVD e CD a serem lançados no mercado no fim deste ano de 2015. Se depender do cronograma da turnê nacional, que será retomada em Brasília (DF) em março de 2015, o registro do show dirigido por Bia Lessa vai ser feito na volta de Abraçar e agradecer ao Rio de Janeiro (RJ), em setembro. Pelo menos esta é a intenção de Bethânia (em foto de Rodrigo Goffredo).

Livro sobre 'Tábua de esmeralda' é mais sobre Ben do que sobre o disco

Resenha de livro
Título: O livro do disco A tábua de esmeralda Jorge Ben Jor
Autor: Paulo da Costa e Silva
Editora: Cobogó
Cotação: * * * 

Dos três inéditos títulos brasileiros da primeira fornada da série O livro do disco, na qual álbuns marcantes da música brasileira são analisados a fundo, o volume sobre A tábua de esmeralda é o que mais trai o conceito da oportuna coleção publicada pela editora carioca Cobogó com inspiração na série 33 e 1/3, da editora norte-americana Bloomsbury. Autor do livro, o crítico e pesquisador musical Paulo da Costa e Silva parte deste álbum antológico lançado por Jorge Ben Jor em 1974 - quando o cantor e compositor carioca ainda era tão somente Jorge Ben - para fazer ensaio sobre a revolução estética e as particularidades da obra deste artista que quebrou paradigmas ao surgir na música brasileira em 1963 com seu samba de esquema realmente novo. A rigor, o livro é mais sobre Ben do que sobre o disco em si. De todo modo, quando fala de A tábua de esmeralda ou do artista, Paulo da Costa e Silva é sempre preciso na sua análise musical ou social. Nesse sentido, o livro é recomendado para quem quer ter noção da dimensão alcançada pelo cancioneiro autoral de Ben - o (compositor) que nunca teve censura nem nunca terá no exercício de sua livre criação musical - na cena brasileira pós-Bossa Nova. Paulo da Costa e Silva mostra, ao longo das 136 páginas do livro, como a obra de Ben Jor foi ficando cada vez mais épica e impregnada de negritude, esta enfocada sob prisma positivo, guerreiro, com autoestima elevada que jamais se deixou contaminar pela raiva e a mágoa provocadas por séculos de injustiças sociais praticadas contra os negros. É uma obra que partiu do samba, alimentada pela revolução estética promovida por João Gilberto em 1958, para incorporar o rock, o soul, o funk e elementos associados ao universo medieval. O autor sustenta a tese de que A tábua de esmeralda simbolizou "a pequena renascença" de Ben. Para tal, gasta páginas (em excesso) para explicar o conceito de livro em que o historiador norte-americano Stephen Toulmin defende a teoria de ter havido, nos anos 1960, uma revalorização de valores renascentistas. Mais para o fim do livro, Costa e Silva também dedica generoso espaço aos Racionais MC's para explicar a conexão do grupo paulistano de rap com a música negra de Ben. Embora por vezes o livro perca o foco principal (o disco e o artista), o autor consegue explicar para o leitor a singularidade do cancioneiro de Jorge Ben, criador de música associada a certo primitivismo, inclusive por ter rejeitado a riqueza de acordes proposta pela Bossa Nova. Ao construir obra que parece intuitiva e simples, mas que oculta engenhosidade nessa aparente simplicidade, Ben Jor se deslocou de qualquer movimento musical, embora tenha transitado pela Jovem Guarda e tenha feito conexões com os Tropicalistas. Costa e Silva, aliás, ressalta que um dos arquitetos do movimento, Gilberto Gil, ficou impactado ao conhecer a obra de Ben (com quem, aliás, dividiria álbum em 1975). É uma obra enigmática que o oportuno livro ajuda a decifrar, servindo como homenagem aos 70 anos que Jorge Duílio Lima Meneses vai completar em 22 de março de 2015 - em tese, já que a verdadeira idade do Zé Pretinho parece ser tão enigmática quanto sua obra, uma vez que há fontes que sustentam que Ben veio ao mundo em 1942. Seja como for, este pequeno livro sobre A tábua de esmeralda - disco emblemático em obra marcada pela alquimia musical - dá sua contribuição ao jogar luz sobre o artista, o alquimista que chegou em 1963 para fazer História na música brasileira.

domingo, 25 de janeiro de 2015

'Bilac vê estrelas' se ilumina com música de Nei Lopes e verve do elenco

Resenha de musical de teatro
Título: Bilac vê estrelas - Uma comédia musical
Texto: Heloísa Seixas e Julia Romeu com base no livro de Ruy Castro
Direção: João Fonseca
Música e letra: Nei Lopes
Direção musical e arranjos: Luís Filipe de Lima
Elenco: André Dias, Izabella Bicalho, Tadeu Aguiar, Sérgio Menezes, Alice Borges, Reiner
              Tenente, Gustavo Klein, Jefferson Almeida e Saulo Segreto (em foto de Leo Aversa)
Cotação: * * *
Espetáculo em cartaz no Sesc Ginástico, no Rio de Janeiro (RJ), até 22 de fevereiro de 2015

Exímio letrista, dono de obra musical associada ao universo do samba e à afirmação da negritude, o compositor carioca Nei Lopes abre o leque estilístico de seu cancioneiro com a criação da trilha sonora original do musical Bilac vê estrelas, espetáculo em cartaz no Sesc Ginástico, no Rio de Janeiro (RJ), até 22 de fevereiro. Base do texto de Heloísa Seixas e Julia Romeu, o primeiro livro de ficção do escritor Ruy Castro - Bilac vê estrelas (Companhia das Letras, 2000) - está ambientado no Rio de Janeiro de 1903, o que fez Lopes se aventurar (com êxito) na composição de trilha sonora condizente com os sons de época anterior ao samba, gênero que germinaria na música brasileira nos anos 1910, nascendo oficialmente em novembro de 1916. No universo musical da belle époque carioca, ritmos como valsas e lundus se adequam ao roteiro de espetáculo dirigido por João Fonseca com o tom burlesco e um clima de chanchada já sugeridos pela narrativa original do livro. Lopes compôs 15 músicas, assinando sozinho melodias e letras que jamais traem sua função de ajudar a contar a história, impulsionando a ação de dramaturgia que se revela frágil ao longo dos 100 minutos do espetáculo. A música de Lopes confere vivacidade à encenação, valorizada também por elenco hábil na manutenção do tom burlesco do musical. Habilmente orquestrada pelo diretor musical Luis Filipe de Lima, a trilha sonora original do compositor combina humor e empostação, esta condizente com o estilo parnasiano dos versos do poeta carioca Olavo Bilac (1895 - 1968), interpretado com maestria em trabalho de composição feito por André Dias, talentoso ator já conhecido dos frequentadores de musicais do teatro carioca (O poeta e a palavra é um dos 15 temas do musical que ilustram a capacidade de  Lopes de extrapolar o universo do samba). Estrábico na figura composta por Dias, Bilac é o protagonista de delirante  trama de ficção construída com personagens reais. Entre eles, há o escritor José do Patrocínio (1854 - 1905), personagem do ator Sérgio Menezes. Dona da voz mais bela e potente do elenco, Izabella Bicalho - intérprete da farsante Eduarda Bandeira - tem seu grande momento musical em cena ao dar voz ao Solilóquio de Eduarda com sotaque português afinado com o disfarce português da personagem. Já Alice Borges imprime impagável vivacidade e humor à personagem Madame Labiche, usando sua imediata empatia com a plateia quando sola a Canção cigana, cujo refrão chegar a ser cantado em coro pelo público por conta da expressiva comunicabilidade da atriz. Experiente ator de musicais, Tadeu Aguiar mostra excelente trabalho de corpo, capaz de arrancar risos do público somente com o gestual imponente usado na composição do padre Maximiliano. Entrosado e cheio de verve, o elenco ilumina Bilac vê estrelas, deixando na sombra os pontos fracos do musical - como a dramaturgia e o cenário feio de Nello Marrese - e valorizando os pontos altos, como a trilha sonora de Nei Lopes, cuja maestria na escritura de letras é reiterada por versos como os de Tout le Riô, tema que brinca com o francesismo reinante no Rio dos anos 1900. Musical distante do suntuoso padrão Broadway que se estabeleceu na cena carioca ao longo dos anos 2000, Bilac vê estrelas tem o mérito de buscar linguagem brasileira para gênero tão valorizado atualmente pelos frequentadores do teatro carioca.

Recital 'Bethânia e as palavras' ganha edição em DVD neste ano de 2015

Recital de poesia em que a música entra em cena mais para sublinhar o sentido dos versos, o espetáculo Bethânia e as palavras - originado do ciclo de conferências Sentimentos do mundo, apresentado em 2009 pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) - ganha edição em livro-DVD a ser distribuído pela gravadora Biscoito Fino neste ano de 2015. A gravação ao vivo do recital foi feita na temporada apresentada por Bethânia - em foto de Rodrigo Goffredo - na Sala 1 do Teatro Fashion Mall, no Rio de Janeiro (RJ), em setembro de 2010. O recital ainda está em cartaz.

Regina dá voz a 'Inversões' em disco produzido com leveza por Campello

Produtor da maioria do discos de Roberta Sá, Rodrigo Campello conduz a cantora mineira Regina Souza com leveza contemporânea por viagem musical pelo universo de standards da música norte-americana dos anos 1930, 1940 e 1950. Só que tais standards estão vertidos para o português, como sugerido no título, Inversões (2014), do terceiro disco solo da artista, gravado sob a direção artística de Pedrinho Alves Madeira. Recém-lançado pela gravadora Biscoito Fino, o disco nasceu da participação de Regina no projeto Aqui jazz, orquestrado por Madeira em Belo Horizonte (MG) em 2011. Na ocasião, Regina cantou Blue moon (Richard Rodgers e Lorenz Hart, 1934) na versão em português feita por Rita Lee. O número gerou a ideia de um show da cantora com versões e também com o que Madeira chama de inversões, que são as versões de músicas brasileiras em línguas estrangeiras - caso de Rome, a versão em italiano (assinada por Eddy Marnay) de Chovendo na roseira (Antonio Carlos Jobim, 1971) que fecha o disco. Produzido e arranjado por Rodrigo Campello, o álbum Inversões é o registro de estúdio do show que estreou em Belo Horizonte (MG) em 18 de março de 2012 dentro do projeto Sesc MPB. O disco tomou forma entre 2013 e 2014. Em Inversões, Regina canta em tom suave músicas como Louca me chamam - versão de Augusto de Campos de Crazy he calls me (Carl Sigman e Bob Russell, 1949), gravada originalmente por Gal Costa no álbum Caras e bocas (Philips, 1977) - e Como um rio, a versão de Nelson Motta para Cry me a river (Arthur Hamilton, 1953) lançada na voz de Sandra de Sá em 1990. Embrião do CD, Blue moon figura obviamente no repertório de Inversões.