terça-feira, 23 de junho de 2015

Livro 'Som & pausa' reflete, na superfície, sobre a atual cena musical carioca

Resenha de livro
Título: Som & pausa
Autor: vários (sob curadoria de Fabiane Pereira)
Editora: Guarda-chuva
Cotação: * * 1/2

É curioso que se chame Guarda-chuva a editora que publica Som & Pausa, livro em que 50 nomes discorrem - em tons ora lúcidos, ora vagos - sobre a cena musical contemporânea da cidade do Rio de Janeiro (RJ). A curiosidade reside no fato de, afinal, essa cena - de importância fundamental para a renovação da música brasileira nos anos 2000, mas suplantada em relevância pela cena paulistana a partir dos anos 2010 - parecer sobreviver dentro de uma rede de proteção formada por cantores, músicos, produtores, assessores e jornalistas amigos. Essa rede alimenta a cena com a troca de elogios e favores mútuos entre seus integrantes (todos são bons, até os ruins), sendo que o público - elemento indispensável para legitimar a carreira de um artista ou grupo - nem sempre faz parte dessa cadeia alimentar, já que muitos shows são feitos basicamente para amigos e conhecidos com patrocínio obtido em editais ("Nós somos a lista amiga, embora às vezes inimiga", conceita o cantor e compositor carioca Daniel Lopes em frase lapidar de seu ótimo texto). Esses aspectos - em si relevantes para discutir a longevidade da cena abordada em Som & Pausa - jamais são abordados com profundidade pelos 50 eleitos. A quase totalidade dos textos ignora tais questões, aliás. Mas isso não tira (de todo) o mérito do livro organizado sob curadoria de Fabiane Pereira, jornalista que tem aberto espaço para a nova geração como programadora do Faro MPB, atração da rádio MPB FM. A ideia do livro é propor uma diversidade de olhares sobre a cena carioca e, por extensão, sobre a relação do artista com a música produzida na cidade do Rio de Janeiro. Dentro do material apresentado, há textos que roçam em questões interessantes. Editor de um blog que virou compositor e produtor musical, Márcio Bulk é corajoso ao caracterizar - com orgulho! - a geração como amadora ("Sem grandes gravadoras, sem grande mídia, sem nada ou quase nada que nos resguarde, e por conta disso, meio marginais à la Sganzerla, meio malditos à la Macao, estamos fazendo um trabalho do caralho"). Integrante do grupo Tono, Rafael Rocha preferiu historiar seus caminhos na música carioca. Já Letícia Novaes recorda um momento determinante, seminal, na sua vida musical: um show do duo Letuce em agosto de 2009, ironicamente feito na cidade de São Paulo (SP). Talvez pela ausência de uma diretriz mais nítida que os pautasse, os textos oscilam e soam desiguais. Se Ava Rocha divaga sobre a natureza indecifrável da música, o produtor cultural Léo Feijó ressalta a importância real de uma de suas casas, a extinta Cinemathèque, que abrigou nomes e uma produção musical relevante entre 2007 e 2010. Enfim, o assunto - já em si amplo, vago, sem um foco mais estreito - dá margem a muitas interpretações, sob diversos prismas. Som & pausa somente reproduz o material que foi enviado à curadora. Mas, até pelo reduzido tamanho do livro (de gracioso projeto gráfico) e dos textos, a pauta é discutida na superfície. Ótimo, o tema rende outro livro, escrito fora da rede de proteção.

Um comentário:

  1. ♪ É curioso que se chame Guarda-chuva a editora que publica Som & Pausa, livro em que 50 nomes discorrem - em tons ora lúcidos, ora vagos - sobre a cena musical contemporânea da cidade do Rio de Janeiro (RJ). A curiosidade reside no fato de, afinal, essa cena - de importância fundamental para a renovação da música brasileira nos anos 2000, mas suplantada em relevância pela cena paulistana a partir dos anos 2010 - parecer sobreviver dentro de uma rede de proteção formada por cantores, músicos, produtores, assessores e jornalistas amigos. Essa rede alimenta a cena com a troca de elogios e favores mútuos entre seus integrantes (todos são bons, até os ruins), sendo que o público - elemento indispensável para legitimar a carreira de um artista ou grupo - nem sempre faz parte dessa cadeia alimentar, já que muitos shows são feitos basicamente para amigos e conhecidos com patrocínio obtido em editais ("Nós somos a lista amiga, embora às vezes inimiga", conceita o cantor e compositor carioca Daniel Lopes em frase lapidar de seu ótimo texto). Esses aspectos - em si relevantes para discutir a longevidade da cena abordada em Som & Pausa - jamais são abordados com profundidade pelos 50 eleitos. A quase totalidade dos textos ignora tais questões, aliás. Mas isso não tira (de todo) o mérito do livro organizado sob curadoria de Fabiane Pereira, jornalista que tem aberto espaço para a nova geração como programadora do Faro MPB, atração da rádio MPB FM. A ideia do livro é propor uma diversidade de olhares sobre a cena carioca e, por extensão, sobre a relação do artista com a música produzida na cidade do Rio de Janeiro. Dentro do material apresentado, há textos que roçam em questões interessantes. Editor de um blog que virou compositor e produtor musical, Márcio Bulk é corajoso ao caracterizar - com orgulho! - a geração como amadora ("Sem grandes gravadoras, sem grande mídia, sem nada ou quase nada que nos resguarde, e por conta disso, meio marginais à la Sganzerla, meio malditos à la Macao, estamos fazendo um trabalho do caralho"). Integrante do grupo Tono, Rafael Rocha preferiu historiar seus caminhos na música carioca. Já Letícia Novaes recorda um momento determinante, seminal, na sua vida musical: um show do duo Letuce em agosto de 2009, ironicamente feito na cidade de São Paulo (SP). Talvez pela ausência de uma diretriz mais nítida que os pautasse, os textos oscilam e soam desiguais. Se Ava Rocha divaga sobre a natureza indecifrável da música, o produtor cultural Léo Feijó ressalta a importância real de uma de suas casas, a extinta Cinemathèque, que abrigou nomes e uma produção musical relevante entre 2007 e 2010. Enfim, o assunto - já em si amplo, vago, sem um foco mais estreito - dá margem a muitas interpretações, sob diversos prismas. Som & pausa somente reproduz o material que foi enviado à curadora. Mas, até pelo reduzido tamanho do livro (de gracioso projeto gráfico) e dos textos, a pauta é discutida na superfície. Ótimo, o tema rende outro livro, escrito fora da rede de proteção.

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