Título: Por onde eu for
Artista: Leila Pinheiro (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Theatro Net Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 8 de julho de 2015
Cotação: * * *
♪ Leila Pinheiro já está com o pé na estrada da música há 35 anos. Já percorreu caminhos diversos ao longo de trajetória que já soma três décadas de exposição nacional, contada a partir da defesa do samba Verde (Eduardo Gudin e J. C. Costa Netto) no Festival dos festivais exibido pela TV Globo em 1985. Por vezes, a cantora paraense arriscou trilhas mais ousadas, como as seguidas nos álbuns Outras caras (Polygram, 1991), Catavento e girassol (EMI-Odeon, 1996) e Na ponta da língua (EMI-Odeon, 1998). Em outros momentos, foi levada pela indústria fonográfica a percorrer caminhos extremamente fáceis, como os trilhados no álbum Coisas do Brasil (Polygram, 1993). E o fato é que Leila chega em 2015 com voz e cacife para arriscar. Feito sob a direção musical de André Vasconcellos, seu show Por onde eu for - que chegou ao Rio de Janeiro (RJ) na noite de ontem, 8 de julho de 2015, após passar por São Paulo (SP) e Belo Horizonte (MG) - é melhor do que o EP homônimo lançado este mês em edição física em CD, na sequência de sua exposição na web. Mas Por onde eu for jamais aponta um caminho de ruptura com o pré-estabelecido. Ao longo das 28 músicas do roteiro, Leila transita por trilhas seguras, já pisadas e repisadas em sua digna caminhada. Por ser cantora igualmente segura, de técnica firme, Leila valoriza canções e momentos como Clube da esquina nº 2 (Milton Nascimento e Lô Borges, 1972). Em contrapartida, destrói um tema como Alagados (Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro, 1986), diluindo a pegada, a brasilidade e o tom político da música do trio carioca Paralamas do Sucesso. As interpretações de Leila surtem maior efeito nas canções de amor. Cantar Eu te amo tanto (Roberto Carlos, 2001) - uma das músicas recentes mais bonitas e menos batidas do rei das canções românticas - é ótima sacação. Inédita do compositor paulista Tim Bernardes, Não também brilha na voz de Leila e aponta que o caminho da renovação pode estar (também) na mistura com a nova geração. Aliás, chega a ser irônico que, na estreia carioca de um show movido a teclados (os de Rodrigo Tavares e o piano Hammond tocado por Leila em vários números), os caminhos harmônicos mais inusitados tenham vindo das cordas dos violões dos convidados Thiago Amud e Jean Charnaux, dois herdeiros das revoluções do genial Guinga. O samba inédito de Amud cantado por Leila com o compositor, Desamanhecido, é a prova que pode haver renovação no cultivo das tradições. Com Amud, Leila também ratificou a beleza de seu canto ao juntar duas canções praieiras do compositor Dorival Caymmi (1914 - 2008) - É doce morrer no mar (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1941) e Quem vem pra beira do mar (Dorival Caymmi, 1954) - em número que mergulhou nas profundezas das belas canções com direito a um contracanto arrepiante de Amud. Com Jean Charnaux (carioca, apesar do nome francês), outro violonista de mão cheia, Leila cantou Todo o sentimento (Cristóvão Bastos e Chico Buarque, 1987) e Sabe você (Carlos Lyra e Vinicius de Moraes, 1964) talvez sem a plena consciência de que a ruptura pode estar nos caminhos seguidos por tais cordas. Mas Por onde eu for é um show de teclados e efeitos - e estes soam abusivos na inédita de Marina Lima e Márcio Tinoco, Chega pra mim, gravada no EP da mesma forma e tom equivocados. De todo modo, verdade seja dita, as outras três músicas do disco crescem no show. O samba-título Por onde eu for (Adriana Calcanhotto, 2015), a balada apaixonada Você em mim (Guilherme Arantes, 2013) e Todas as coisas valem - primeira parceria de Leila com Zélia Duncan, cantada com a coautora na estreia carioca do show - ganham vida e cor em cena. Porque Leila é uma cantora de amplos recursos vocais. Ela precisa somente escolher o que canta. Músicas como Tomara (Alceu Valença e Rubem Valença Filho, 1990) parecem se desintegrar na sua voz. Rock da fase mais pop da obra fonográfica de Gilberto Gil (de quem Leila também canta a pouco ouvida Cada tempo em seu lugar, de 1989), Pessoa nefasta (Gilberto Gil, 1984) - cantado por Leila com efeitos eletrônicos e uma pose rocker que soa artificial - reitera a sensação de que a intérprete se afina mais com sons orgânicos como o tirado por Mestrinho de seu acordeom de mestre. Com Mestrinho, Leila celebra a origem paraense com músicas como Ventos do Norte (1976), boa lembrança da obra inicial de Djavan. Enfim, tal como o disco homônimo, o show Por onde eu for conduz Leila Pinheiro por caminhos seguros nem sempre afinados com a importância e o histórico de uma cantora que já ousou mais. Contudo, o saldo é positivo. O show supera o mediano disco que o inspirou. Talvez porque - parafraseando verso da última música antes do bis com hits, Nada será como antes (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1972) - ainda resista na boca de Leila um gosto de sol, uma vontade de seguir numa direção mais imprevisível. Resta somente correr o risco.
5 comentários:
♪ Leila Pinheiro já está com o pé na estrada da música há 35 anos. Já percorreu caminhos diversos ao longo de trajetória que já soma três décadas de exposição nacional, contada a partir da defesa do samba Verde (Eduardo Gudin e J. C. Costa Netto) no Festival dos festivais exibido pela TV Globo em 1985. Por vezes, a cantora paraense arriscou trilhas mais ousadas, como as seguidas nos álbuns Outras caras (Polygram, 1991), Catavento e girassol (EMI-Odeon, 1996) e Na ponta da língua (EMI-Odeon, 1998). Em outros momentos, foi levada pela indústria fonográfica a percorrer caminhos extremamente fáceis, como os trilhados no álbum Coisas do Brasil (Polygram, 1993). E o fato é que Leila chega em 2015 com voz e cacife para arriscar. Feito sob a direção musical de André Vasconcellos, seu show Por onde eu for - que chegou ao Rio de Janeiro (RJ) na noite de ontem, 8 de julho de 2015, após passar por São Paulo (SP) e Belo Horizonte (MG) - é melhor do que o EP homônimo lançado este mês em edição física em CD, na sequência de sua exposição na web. Mas Por onde eu for jamais aponta um caminho de ruptura com o pré-estabelecido. Ao longo das 28 músicas do roteiro, Leila transita por trilhas seguras, já pisadas e repisadas em sua digna caminhada. Por ser cantora igualmente segura, de técnica firme, Leila valoriza canções e momentos como Clube da esquina nº 2 (Milton Nascimento e Lô Borges, 1972). Em contrapartida, destrói um tema como Alagados (Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro, 1986), diluindo a pegada, a brasilidade e o tom político da música do trio carioca Paralamas do Sucesso. As interpretações de Leila surtem maior efeito nas canções de amor. Cantar Eu te amo tanto (Roberto Carlos, 2001) - uma das músicas recentes mais bonitas e menos batidas do rei das canções românticas - é ótima sacação. Inédita do compositor paulista Tim Bernardes, Não também brilha na voz de Leila e aponta que o caminho da renovação pode estar (também) na mistura com a nova geração.
Aliás, chega a ser irônico que, na estreia carioca de um show movido a teclados (os de Rodrigo Tavares e o piano Hammond tocado por Leila em vários números), os caminhos harmônicos mais inusitados tenham vindo das cordas dos violões dos convidados Thiago Amud e Jean Charnaux, dois herdeiros das revoluções do genial Guinga. O samba inédito de Amud cantado por Leila com o compositor, Desamanhecido, é a prova que pode haver renovação no cultivo das tradições. Com Amud, Leila também ratificou a beleza de seu canto ao juntar duas canções praieiras do compositor Dorival Caymmi (1914 - 2008) - É doce morrer no mar (Dorival Caymmi e Jorge Amado, 1941) e Quem vem pra beira do mar (Dorival Caymmi, 1954) - em número que mergulhou nas profundezas das belas canções com direito a um contracanto arrepiante de Amud. Com Jean Charnaux (carioca, apesar do nome francês), outro violonista de mão cheia, Leila cantou Todo o sentimento (Cristóvão Bastos e Chico Buarque, 1987) e Sabe você (Carlos Lyra e Vinicius de Moraes, 1964) talvez sem a plena consciência de que a ruptura pode estar nos caminhos seguidos por tais cordas. Mas Por onde eu for é um show de teclados e efeitos - e estes soam abusivos na inédita de Marina Lima e Márcio Tinoco, Chega pra mim, gravada no EP da mesma forma equivocada. De todo modo, verdade seja dita, as outras três músicas do disco crescem no show. O samba-título Por onde eu for (Adriana Calcanhotto, 2015), a balada apaixonada Você em mim (Guilherme Arantes, 2013) e Todas as coisas valem - primeira parceria de Leila com Zélia Duncan, cantada com a coautora na estreia carioca do show - ganham vida e cor em cena. Porque Leila é uma cantora de amplos recursos vocais. Ela precisa somente escolher o que canta. Músicas como Tomara (Alceu Valença e Rubem Valença Filho, 1990) parecem se desintegrar na sua voz. Rock da fase mais pop da obra fonográfica de Gilberto Gil (de quem Leila também canta a pouco ouvida Cada tempo em seu lugar, de 1989), Pessoa nefasta (Gilberto Gil, 1984) - cantado por Leila com efeitos eletrônicos e uma pose rocker que soa artiticial - reitera a sensação de que a intérprete se afina mais com sons orgânicos como o tirado por Mestrinho de seu acordeom de mestre. Com Mestrinho, Leila celebra a origem paraense com músicas como Ventos do Norte (1976), boa lembrança da obra inicial de Djavan. Enfim, tal como o disco homônimo, o show Por onde eu for conduz Leila Pinheiro por caminhos seguros nem sempre afinados com a importância e o histórico de uma cantora que já ousou mais. Contudo, o saldo é positivo. O show supera o mediano disco que o inspirou. Talvez porque - parafraseando verso da última música antes do bis com hits, Nada será como antes (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1972) - ainda resista na boca de Leila um gosto de sol, uma vontade de seguir numa direção mais imprevisível. Resta somente correr o risco.
Adoro a Leila. Esse EP vai sair em edição física também, Mauro?
Sim, Unknown, como dito no texto, o EP está sendo lançado este mês em edição física. abs, MauroF
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