Título: Do tamanho certo para o meu sorriso
Artista: Fafá de Belém (em foto de Caio Gallucci)
Local: Teatro Itália (São Paulo, SP)
Data: 25 de agosto de 2015
Cotação: * * * * *
♪ O coração assumidamente brega de Fafá de Belém bate mais forte na cena chique armada pelo diretor Paulo Borges para a cantora paraense apresentar as músicas do recém-lançado álbum com que a artista comemora 40 anos de carreira fonográfica que andou adormecida na última década. Fafá voltou. E retornou com força com o disco Do tamanho certo para o meu sorriso, desde 20 de agosto no mercado fonográfico em edição da gravadora Joia Moderna. A retomada é solidificada pelo primoroso show que estreou ontem, 25 de agosto de 2015, no Teatro Itália, em São Paulo (SP), sob a direção de Paulo Borges. Além de consolidar a marca hi-tech de Borges (o todo-poderoso da São Paulo fashion week para quem é estranho no ninho da moda) como diretor de espetáculos musicais calcados em projeções de imagens em vídeo-cenário de Richard Luiz (a mesma estética do show de Alice Caymmi), o show Do tamanho certo para o meu sorriso engrandece o que no disco soou menor do que o canto farto de Fafá. Todas as músicas do disco de tom tecnobrega - produzido por Manoel Cordeiro com Felipe Cordeiro - crescem e ganham sentido adicional no show. De tom popular, esse repertório - rechaçado por quem espera que Fafá somente dê ouvidos e voz às músicas de compositores associados à MPB dos anos 1960 e 1970 - se amalgama em cena, sem choques, com os maiores sucessos da cantora em seus 40 anos de carreira. Os sucessos antigos reaparecem com arranjos novos, criados e tocados somente com as guitarras de Manoel Cordeiro e Felipe Cordeiro, únicos músicos em cena (tal como no disco). Símbolos de diferentes gerações e fases da cena musical do Pará, as guitarras de pai e filho choram em Bilhete (Ivan Lins e Vitor Martins, 1980), a doída canção de separação que Fafá tomou para si em gravação de 1982, feita dois anos após os registros quase simultâneos de Ivan Lins e do grupo MPB-4. O canto de Fafá é alegre, mas também sabe expor os dramas afetivos de canções como Volta (Johnny Hooker, 2013), música que abre o show com Fafá de costas para a plateia. A virada estratégica, no meio da música, surte forte efeito cênico, sinalizando o domínio que a cantora tem do gestual teatral. Só que, sem deixar de ser Fafá, a cantora vista em cena no show Do tamanho certo para o meu sorriso soa mais refinada sem perda da intensidade de suas interpretações. Fafá fala menos - e, quando fala, diz somente o essencial - e canta mais. Canta muito, aliás, com a voz que conserva a potência e atinge os tons de outrora com naturalidade e uma energia que parece concentrada no palco. Por isso, no show, Pedra sem valor - inédita fornecida pela compositora paraense Dona Onete para o disco - brilha muito mais do que no registro do álbum. É como se Pedra sem valor retratasse, no roteiro, a volta por cima da personagem que rompe laços conjugais em Bilhete. Um dos pontos altos do show, Cavalgada (1977) - canção sensual de Roberto Carlos e Erasmo Carlos que volta e meia reaparece no repertório de Fafá - é interpretada com a cantora deitada em praticável que simula a cama de um motel. A intérprete se contorce entre almofadas para explicitar no canto e no corpo o gozo poeticamente retratado pelos autores na letra. No clímax, o praticável gira a partir do verso "Estrelas mudam de lugar" em efeito cênico valorizado pela projeção de um céu no telão. É arrepiante! Com linguagem mais simples e direta, Quem não te quer sou eu (Firmo Cardoso e Nivaldo Fiúza, 2002) - sucesso local da banda paraense Sayonara - e o bolero Usei você (Silvio César, 1971) são músicas que reverberam a exteriorizada trilha sonora dos cabarés, boates e inferninhos de um interiorano Brasil de dentro que também pulsa nas ruas de Belém. Alocado no início do show, Asfalto amarelo (Manoel Cordeiro, Felipe Cordeiro e Zeca Baleiro, 2015) é o convite de Fafá para que o público adentre o interior de seu Pará. Com três estilosos figurinos assinados pelo estilista Luis Claudio (da APTO 03), Fafá celebra o Pará e, em especial, sua Belém do Pará, retratada em Os passa vida (Osmar Jr. e Rambolde Campos, 2004), outro sucesso local da banda Sayonara que faz mais sentido no show Do tamanho certo para o meu sorriso, provocando o choro incontido da cantora. E por falar em figurinos, o vestido vermelho da segunda parte cai bem na personagem voluptuosa de Sedução (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1977). Este número é o que apresenta o melhor efeito do vídeo-cenário de Richard Luiz. Tal efeito cria no espectador a ilusão de que Fafá está cantando Sedução na porta de uma das casas de Belém projetadas no telão. Outro efeito é o peixe que se delineia com nitidez, ao fim de Sereia (Lulu Santos e Nelson Motta, 1983), na imagem inicialmente difusa projetada ao longo do número. São marcas da direção de Paulo Borges em show que flui sem erros, sinalizando que Meu coração é brega (Veloso Dias, 2015) pode vir a se tornar hit popular, consolidando a trajetória de seu compositor, autor de Ex mai love (2012), sucesso na voz da paraense Gaby Amarantos. Meu coração é brega é outra música do disco que bate mais forte no show, pela força cênica e vocal de Fafá, intérprete moldada para músicas passionais como Abandonada (Michael Sullivan e Paulo Sérgio Valle, 1996), cantada com dramaticidade - no toque das guitarras de Manoel e Felipe Cordeiro - mas sem os exageros de shows anteriores. Sob medida (Chico Buarque, 1979) também ressurge sem tantas firulas. Já Vem que é bom (Manoel Cordeiro e Ronery, 1979) é convite à dança que tem vocais do mesmo Manoel Cordeiro que, no toque de sua icônica guitarra, cria introdução agalopada para o bolero Foi assim (Paulo André Barata e Ruy Barata, 1977). No fim, O gosto da vida (Péricles Cavalcanti, 1982) - espécie de carta de intenções do canto da artista - faz o Carnaval continuado no bis com o samba Filho da Bahia (Walter Queiroz, 1975), marco inicial da trajetória fonográfica de Fafá, e com Este rio é minha rua (Paulo André Barata e Ruy Barata, 1976). A conexão Bahia-Pará é feita com naturalidade pelas guitarras e pelo canto emotivo e solar da artista. Enfim, sob a direção chique de Paulo Borges, Fafá refina sua postura em cena sem deixar de ser a Fafá de sempre. Para quem vinha fazendo shows irregulares de conceito mais fluido e de menor apuro visual, o espetáculo Do tamanho certo para o meu sorriso supera o disco homônimo que o gerou e reforça a feliz sensação de que Fafá de Belém volta enfim a ocupar lugar que sempre foi dela.
♪♪♪♪ O blog Notas Musicais viajou à cidade de São Paulo (SP) a convite da gravadora Joia Moderna
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18 comentários:
♪ O coração assumidamente brega de Fafá de Belém bate mais forte na cena chique armada pelo diretor Paulo Borges para a cantora paraense apresentar as músicas do recém-lançado álbum com que a artista comemora 40 anos de carreira fonográfica que andou adormecida na última década. Fafá voltou. E retornou com força com o disco Do tamanho certo para o meu sorriso, desde 20 de agosto no mercado fonográfico em edição da gravadora Joia Moderna. A retomada é solidificada pelo primoroso show que estreou ontem, 25 de agosto de 2015, no Teatro Itália, em São Paulo (SP), sob a direção de Paulo Borges. Além de consolidar a marca hi-tech de Borges (o todo-poderoso da São Paulo fashion week para quem é estranho no ninho da moda) como diretor de espetáculos musicais calcados em projeções de imagens em vídeo-cenário de Richard Luiz (a mesma estética do show de Alice Caymmi), o show Do tamanho certo para o meu sorriso engrandece o que no disco soou menor do que o canto farto de Fafá. Todas as músicas do disco de tom tecnobrega - produzido por Manoel Cordeiro com Felipe Cordeiro - crescem e ganham sentido adicional no show. De tom popular, esse repertório - rechaçado por quem espera que Fafá somente dê ouvidos e voz às músicas de compositores associados à MPB dos anos 1960 e 1970 - se amalgama em cena, sem choques, com os maiores sucessos da cantora em seus 40 anos de carreira. Os sucessos antigos reaparecem com arranjos novos, criados e tocados somente com as guitarras de Manoel Cordeiro e Felipe Cordeiro, únicos músicos em cena (tal como no disco). Símbolos de diferentes gerações e fases da cena musical do Pará, as guitarras de pai e filho choram em Bilhete (Ivan Lins e Vitor Martins, 1980), a doída canção de separação que Fafá tomou para si em gravação de 1982, feita dois anos após os registros quase simultâneos de Ivan Lins e do grupo MPB-4. O canto de Fafá é alegre, mas também sabe expor os dramas afetivos de canções como Volta (Johnny Hooker, 2013), música que abre o show com Fafá de costas para a plateia. A virada estratégica, no meio da música, surte forte efeito cênico, sinalizando o domínio que a cantora tem do gestual teatral. Só que, sem deixar de ser Fafá, a cantora vista em cena no show Do tamanho certo para o meu sorriso soa mais refinada sem perda da intensidade de suas interpretações. Fafá fala menos - e, quando fala, diz somente o essencial - e canta mais. Canta muito, aliás, com a voz que conserva a potência e atinge os tons de outrora com naturalidade e uma energia que parece concentrada no palco. Por isso, no show, Pedra sem valor - inédita fornecida pela compositora paraense Dona Onete para o disco - brilha muito mais do que no registro do álbum. É como se Pedra sem valor retratasse, no roteiro, a volta por cima da personagem que rompe laços conjugais em Bilhete. Um dos pontos altos do show, Cavalgada (1977) - canção sensual de Roberto Carlos e Erasmo Carlos que volta e meia reaparece no repertório de Fafá - é interpretada com a cantora deitada em praticável que simula a cama de um motel. A intérprete se contorce entre almofadas para explicitar no canto e no corpo o gozo poeticamente retratado pelos autores na letra. No clímax, o praticável gira a partir do verso "Estrelas mudam de lugar" em efeito cênico valorizado pela projeção de um céu no telão. É arrepiante! Com linguagem mais simples e direta, Quem não te quer sou eu (Firmo Cardoso e Nivaldo Fiúza, 2002) - sucesso local da banda paraense Sayonara - e o bolero Usei você (Silvio César, 1971) são músicas que reverberam a exteriorizada trilha sonora dos cabarés, boates e inferninhos de um interiorano Brasil de dentro que também pulsa nas ruas de Belém. Alocado no início do show, Asfalto amarelo (Manoel Cordeiro, Felipe Cordeiro e Zeca Baleiro, 2015) é o convite de Fafá para que o público adentre o interior de seu Pará.
Com três estilosos figurinos assinados pelo estilista Luis Claudio (da APTO 03), Fafá celebra o Pará e, em especial, sua Belém do Pará, retratada em Os passa vida (Osmar Jr. e Rambolde Campos, 2004), outro sucesso local da banda Sayonara que faz mais sentido no show Do tamanho certo para o meu sorriso, provocando o choro incontido da cantora. E por falar em figurinos, o vestido vermelho da segunda parte cai bem na personagem voluptuosa de Sedução (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1977). Este número é o que apresenta o melhor efeito do vídeo-cenário de Richard Luiz. Tal efeito cria no espectador a ilusão de que Fafá está cantando Sedução na porta de uma das casas de Belém projetadas no telão. Outro efeito é o peixe que se delineia com nitidez, ao fim de Sereia (Lulu Santos e Nelson Motta, 1983), na imagem inicialmente difusa projetada ao longo do número. São marcas da direção de Paulo Borges em show que flui sem erros, sinalizando que Meu coração é brega (Veloso Dias, 2015) pode vir a se tornar hit popular, consolidando a trajetória de seu compositor, autor de Ex mai love (2012), sucesso na voz da paraense Gaby Amarantos. Meu coração é brega é outra música do disco que bate mais forte no show, pela força cênica e vocal de Fafá, intérprete moldada para músicas passionais como Abandonada (Michael Sullivan e Paulo Sérgio Valle, 1996), cantada com dramaticidade - no toque das guitarras de Manoel e Felipe Cordeiro - mas sem os exageros de shows anteriores. Sob medida (Chico Buarque, 1979) também ressurge sem tantas firulas. Já Vem que é bom (Manoel Cordeiro e Ronery, 1979) é convite à dança que tem vocais do mesmo Manoel Cordeiro que, no toque de sua icônica guitarra, cria introdução agalopada para o bolero Foi assim (Paulo André Barata e Ruy Barata, 1977). No fim, O gosto da vida (Péricles Cavalcanti, 1982) - espécie de carta de intenções do canto da artista - faz o Carnaval continuado no bis com o samba Filho da Bahia (Walter Queiroz, 1975), marco inicial da trajetória fonográfica de Fafá, e com Este rio é minha rua (Paulo André Barata e Ruy Barata, 1976). A conexão Bahia-Pará é feita com naturalidade pelas guitarras e pelo canto emotivo e solar da artista. Enfim, sob a direção chique de Paulo Borges, Fafá refina sua postura em cena sem deixar de ser a Fafá de sempre. Para quem vinha fazendo shows irregulares de conceito mais fluido e de menor apuro visual, o espetáculo Do tamanho certo para o meu sorriso supera o disco homônimo que o gerou e reforça a feliz sensação de que Fafá de Belém volta, enfim, a ocupar um lugar que sempre foi seu.
Realmente Mauro. Eu fui um dos que torci o nariz a primeira vez que ouvi o CD. E hoje, após o estupefato show de ontem, não consigo parar de ouvi-lo. Cresceu...se transformou...está muito além do tamanho certo.
Fafa está divina.Este show é de encher os olhos e explodir o coração de emoção.
Mauro, existe a possibilidade de este show vir a ser lançado em DVD? Tomara que sim. Vi alguns vídeos no youtube. Sublime.
Vai ficar na cabeça por muito tempo. Tudo perfeito, Fafá cantando e interpretando muito. Quero assistir novamente muitas vezes e torço por um dvd. Abraço...
Fafá calando o coro dos descontentes! Eu respeito todas as opiniões, mas acho chato que sempre as mesmas pessoas repitam em vários posts as mesmas reclamações porque Fafá gravou brega, Nana gravou bolero ou Bethânia cantou ribeirinho. Esses fãs deveriam conhecer melhor as cantoras que admiram e saber que elas vão continuar gravando o que tiverem vontade!
Adorei o novo cd e gostei desde o inicio. Está lindo do inicio ao fim. Ela precisava dessa guinada.
O figurino do show é bonito, mas o repertório desse seu novo disco é de fazer dó, de tão ruim que está... Fafá merecia algo melhor do que isso para comemorar seus 40 anos de carreira.
Estranho é todo mundo agora achar maravilhoso porque Mauro elogiou o show.O que eu critico em Fafá e/ou em outras faz parte de uma simples lógica:a cantora de quem me tornei fã (e continuo gostando,menos este trabalho)cantava outro tipo de repertório.Não comento nada a respeito de quem nunca curti.Percebo que há perseguição a algumas cantoras,como exemplo,Simone que por ter gravado canções mais populares na década de 80,mesmo gravando bons discos atualmente,preferem falar dela sempre com referência à década já citada anteriormente.Também acho que não dá para comparar Nana com arranjos do maestro Gilson Peranzzeta com o tecnobrega do Pará.
Tem pessoas que não sabem interpretar o que lêem. Não houve comparação entre os estilos de música e sim entre o comportamento dos fãs!
Eu também não tinha entendido a comparação entre a Fafá e Nana,e até Bethânia.A Fafá abraçou escancaradamente os dois pólos de nossa música desde os anos 1980.Quanto ao figurino,pra quem aderiu ao brega,o vermelho,vermelhaço,vermelhusco,vermelhante e vermelhão veio bem a calhar.
Interpretar o que se lê é sempre mais difícil do que simplesmente ler... Entendi perfeitamente o comentário da Marisa. Fafá, sempre gigante na sua arte ! "
Assisti a Cavalgada no YouTube. Gente, vergonha alheia!!!!!!!!!! Mas a voz é demais.
Ficou bem claro o comentário da marisa e concordo com ela . Afinal, ninguém, nem de brincadeira, colocaria Fafá no mesmo patamar de Nana e Bethânia. Não há parâmetro de comparação. Intenções totalmente diferentes.
Luis Cláudio, que comentário desnecessário! Cada uma tem o valor!
Peço desculpas por ter me equivocado.De fato,Marisa não fez comentários entre cantoras.Jamais tive ou tenho intenção em ofender pessoas,por isso,peço mil desculpas.Obrigado.
Há tempos eu não via Fafá assim tão feliz em cima de um palco!
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