Título: Samba de Maria
Artista: Maria Rita (com Davi Moraes na foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Miranda (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 6 de outubro de 2015
Cotação: * * * * 1/2
♪ "Samba nasce em qualquer lugar / ... / Quando se tem ao lado um alguém / Com esse ritmo que é nosso também", sentenciam versos de Teleco-teco nº 2 (Nelsinho e Oldemar Magalhães, 1960), sambalanço lançado na voz de Elza Soares em disco editado há 55 anos. Ao abrir ontem a roda de seu projeto paralelo Samba de Maria, show em cartaz às terças-feiras na casa carioca Miranda até 20 de outubro de 2015, a cantora paulistana Maria Rita tinha ao seu lado um alguém - o guitarrista carioca Davi Moraes - que simulava com suingue, no toque percussivo de seu instrumento, a cadência bonita do ritmo que ditou o compasso do show do início ao fim. O balanço da guitarra serelepe de Davi Moraes foi o teleco-teco que deu o toque diferenciado de músicas como Alto lá (Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e Sombrinha, 2000), samba gravado por Rita no Sambabook de Zeca Pagodinho e incluído no roteiro flexível. A ponto de a própria cantora saudar o toque da guitarra de Davi em certo momento do show, feito por Maria Rita com os músicos André Siqueira (percussão), Fred Camacho (instrumentista polivalente que se vira bem no toque do cavaquinho, do violão e do bandolim, entre outros instrumentos) e Marcelinho Moreira (bamba das percussões). Os músicos brilharam e o suingue da guitarra de Davi saltou aos ouvidos. Mas a estrela absoluta do Samba de Maria foi a própria Rita, apresentada com justiça por Zé Ricardo (atual diretor artístico da casa Miranda) como "uma das grandes cantoras do Brasil" e saudada pelo público com adjetivos gritados ("Gostosa!", "Maravilhosa!") desde que apareceu no pequeno palco da Miranda, no qual se acomodou, sentada, com seu quarteto virtuoso. E o samba nasceu naquele lugar improvável com o som de uma voz que não nasceu no samba, mas no samba se criou e com ele tem seguido seu caminho como cantora. Aberto na estreia com um sucesso de Zeca Pagodinho, Quando a gira girou (Serginho Meriti e Claudinho Guimarães, 2006), Samba de Maria não é uma roda de samba à moda dos nobres quintais cariocas. O formato é o de um show convencional. Mas a animação foi típica de uma roda quando o público fez coro espontâneo, em alto e bom som, em sambas como Num corpo só (Arlindo Cruz e Picolé, 2007) e É (Gonzaguinha, 1988), número empolgante do fim do show. Para quem já vem caindo no samba com Maria Rita em shows anteriores, o ineditismo deste Samba de Maria reside nos momentos em que a cantora vai além dos repertórios de seus dois álbuns dedicados ao samba - sendo que, na estreia, as músicas do popular Samba meu (Warner Music, 2007) dominaram e esquentaram show em que o mais recente Coração a batucar (Universal Music, 2014) somente foi lembrado com Rumo ao infinito, samba composto pelo recorrente Arlindo Cruz em parceria com Fred Camacho e Marcelinho Moreira, e com Saco cheio (Dona Fia e Marcos Antônio, 1981), pérola do pagode pescada por Maria Rita na discografia de Almir Guineto. O que não chegou a ser uma surpresa, já que Coração a batucar - embora superior a Samba meu tanto pela coesão do repertório quanto pelo refinamento dos arranjos - soou menos pé no chão do que o disco de 2007. Mas o Samba de Maria põe novidades na roda. A maior delas - por ser uma música ainda inédita em disco - é Cutuca, samba composto por Davi Moraes com Fred Camacho e Marcelinho Moreira que não chegou a empolgar em sua primeira apresentação pública. Quem incendiou a plateia foi o já velho Cara valente (Marcelo Camelo, 2003), samba no qual a cantora - de comprovada valentia vocal - experimentou distintas entonações ao repetir o verso "Ele não é de nada". Novidade na voz de Maria, Beijo sem (2010) se confirmou o samba mais inspirado da lavra linear de Adriana Calcanhotto no gênero. Já Tradição (1993) - sucesso do compositor paulistano Geraldo Filme (1928 - 1995), notório bamba de Sampa - abriu bloco dedicado ao samba nascido na cidade de São Paulo (SP). Após cantar trecho de Simplesmente Elis - A fábula de uma voz na transversal do tempo (Zeca do Cavaco, Zé Carlinhos e Ronaldo FQD), samba-enredo com o qual a escola Vai Vai celebrou os 70 anos de sua mãe Elis Regina (1945-1982) no Carnaval de 2015, Maria Rita acertou o tom melancólico de Saudosa maloca, reproduzindo inclusive a prosódia gramaticalmente errada deste clássico do repertório do compositor Adoniran Barbosa (1910-1982), ícone do samba de Sampa. Número herdado do show Coração a batucar (2014 / 2015), ainda em turnê pelo Brasil, Do fundo do nosso quintal (Jorge Aragão e Alberto Souza, 1987) ratificou a naturalidade com que Maria Rita cai num samba que também é seu há oito anos. O Samba de Maria contagia pela voz da (grande) cantora, pela cozinha bem azeitada e pelo teleco-teco da guitarra de Davi Moraes. Caia nesse samba!
3 comentários:
♪ "Samba nasce em qualquer lugar / ... / Quando se tem ao lado um alguém / Com esse ritmo que é nosso também", sentenciam versos de Teleco-teco nº 2 (Nelsinho e Oldemar Magalhães, 1960), sambalanço lançado na voz de Elza Soares em disco editado há 55 anos. Ao abrir ontem a roda de seu projeto paralelo Samba de Maria, show em cartaz às terças-feiras na casa carioca Miranda até 20 de outubro de 2015, a cantora paulistana Maria Rita tinha ao seu lado um alguém - o guitarrista carioca Davi Moraes - que simulava com suingue, no toque percussivo de seu instrumento, a cadência bonita do ritmo que ditou o compasso do show do início ao fim. O balanço da guitarra serelepe de Davi Moraes foi o teleco-teco que deu o toque diferenciado de músicas como Alto lá (Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e Sombrinha, 2000), samba gravado por Rita no Sambabook de Zeca Pagodinho e incluído no roteiro flexível. A ponto de a própria cantora saudar o toque da guitarra de Davi em certo momento do show, feito por Maria Rita com os músicos André Siqueira (percussão), Fred Camacho (instrumentista polivalente que se vira bem no toque do cavaquinho, do violão e do bandolim, entre outros instrumentos) e Marcelinho Moreira (bamba das percussões). Os músicos brilharam e o suingue da guitarra de Davi saltou aos ouvidos. Mas a estrela absoluta do Samba de Maria foi a própria Rita, apresentada com justiça por Zé Ricardo (atual diretor artístico da casa Miranda) como "uma das grandes cantoras do Brasil" e saudada pelo público com adjetivos gritados ("Gostosa!", "Maravilhosa!") desde que apareceu no pequeno palco da Miranda, no qual se acomodou, sentada, com seu quarteto virtuoso. E o samba nasceu naquele lugar improvável com o som de uma voz que não nasceu no samba, mas no samba se criou e com ele tem seguido seu caminho como cantora. Aberto na estreia com um sucesso de Zeca Pagodinho, Quando a gira girou (Serginho Meriti e Claudinho Guimarães, 2006), Samba de Maria não é uma roda de samba à moda dos nobres quintais cariocas. O formato é o de um show convencional. Mas a animação foi típica de uma roda quando o público fez coro espontâneo, em alto e bom som, em sambas como Num corpo só (Arlindo Cruz e Picolé, 2007) e É (Gonzaguinha, 1988), número empolgante do fim do show.
Para quem já vem caindo no samba com Maria Rita em shows anteriores, o ineditismo deste Samba de Maria reside nos momentos em que a cantora vai além dos repertórios de seus dois álbuns dedicados ao samba - sendo que, na estreia, as músicas do popular Samba meu (Warner Music, 2007) dominaram e esquentaram show em que o mais recente Coração a batucar (Universal Music, 2014) somente foi lembrado com Rumo ao infinito, samba composto pelo recorrente Arlindo Cruz em parceria com Fred Camacho e Marcelinho Moreira, e com Saco cheio (Dona Fia e Marcos Antônio, 1981), pérola do pagode pescada por Maria Rita na discografia de Almir Guineto. O que não chegou a ser uma surpresa, já que Coração a batucar - embora superior a Samba meu tanto pela coesão do repertório quanto pelo refinamento dos arranjos - soou menos pé no chão do que o disco de 2007. Mas o Samba de Maria põe novidades na roda. A maior delas - por ser uma música ainda inédita em disco - é Cutuca, samba composto por Davi Moraes com Fred Camacho e Marcelinho Moreira que não chegou a empolgar em sua primeira apresentação pública. Quem incendiou a plateia foi o já velho Cara valente (Marcelo Camelo, 2003), samba no qual a cantora - de comprovada valentia vocal - experimentou distintas entonações ao repetir o verso "Ele não é de nada". Novidade na voz de Maria, Beijo sem (2010) se confirmou o samba mais inspirado da lavra linear de Adriana Calcanhotto no gênero. Já Tradição (1993) - sucesso do compositor paulistano Geraldo Filme (1928 - 1995), notório bamba de Sampa - abriu bloco dedicado ao samba nascido na cidade de São Paulo (SP). Após cantar trecho de Simplesmente Elis - A fábula de uma voz na transversal do tempo (Zeca do Cavaco, Zé Carlinhos e Ronaldo FQD), samba-enredo com o qual a escola Vai Vai celebrou os 70 anos de sua mãe Elis Regina (1945-1982) no Carnaval de 2015, Maria Rita acertou o tom melancólico de Saudosa maloca, reproduzindo inclusive a prosódia gramaticalmente errada deste clássico do repertório do compositor Adoniran Barbosa (1910-1982), ícone do samba de Sampa. Número herdado do show Coração a batucar (2014 / 2015), ainda em turnê pelo Brasil, Do fundo do nosso quintal (Jorge Aragão e Alberto Souza, 1987) ratificou a naturalidade com que Maria Rita cai num samba que também é seu. O Samba de Maria contagia pela voz da (grande) cantora, pela cozinha azeitada e pelo teleco-teco da guitarra de Davi Moraes.
Se esse show vier para São Paulo, estarei lá!
Valeu pela resenha Mauro, como sempre...
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