Título: Na sala com Zizi
Artista: Zizi Possi (em foto de Mauro Ferreira)
Local: Vivo Rio (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 31 de outubro de 2015
Cotação: * * * 1/2
♪ Numa das muitas falas em que Zizi Possi pontua o repertório do loquaz show Na sala com Zizi com informações sobre sua vida pré-fama, a cantora paulistana recorda com certo saudosismo da adolescência vivida na década de 1960. "As emoções eram intensas. As pessoas se orgulhavam de transbordar", ressaltou a artista, em crítica sutil à era cool que domina a música. Zizi falou da intensidade das emoções da aurora de sua vida após dar sua voz cristalina a Dio, come ti amo (Domenico Modugno, 1966), a canção italiana que venceu o Festival de San Remo em 1966 e que muitos ouviram na voz da cantora Gigliolla Cinquetti. Curiosamente, foi ao interpretar Dio, come ti amo que Zizi mostrou pela primeira vez, no palco da casa Vivo Rio, a grandeza de seu canto ainda límpido e cada vez mais maturado. Na estreia carioca da turnê derivada do projeto Sala de estar, do Sesc de São Paulo, Zizi se mostrou totalmente à vontade diante do público que compareceu ao Vivo Rio na noite do último sábado, 31 de outubro de 2015. Sem se intimidar com o tamanho da casa, demasiadamente grande para espetáculo de caráter íntimo que roça o formato de talk-show, Zizi contextualizou as composições que moldaram sua formação musical. Com naturalidade, a cantora transitou da sala para o bar sob a segura direção musical do guitarrista Webster Santos. Sim, houve um eventual clima de show de barzinho quando Zizi cantou You've got a friend (Carole King, 1971) com o coro do público. Mas, quanto soube evitar esse clima, Zizi se confirmou cantora de primeiro time, capaz de realçar toda a beleza sublime de Lígia (Antonio Carlos Jobim, 1974) - a canção que interpretou nos anos 1970 em especial da baiana TV Aratu, em Salvador (BA), e que ora revive com o toque do piano de Tiago Costa - e capaz também de mostrar toda a beleza melódica que pode haver numa popular canção sentimental como Tudo passará (1969), grande sucesso do cantor e compositor mineiro Nelson Ned (1947 - 2014). A cantora também se mostrou grande quando iluminou o lirismo formal de Noite cheia de estrelas (Cândido das Neves, 1954) - o sucesso do cantor carioca Vicente Celestino (1894 - 1968) que Zizi reaviva em clima seresteiro, fomentado pelo toque do bandolim do virtuoso Webster Santos - e quando, sagaz, emenda duas músicas do grupo inglês The Beatles, Blackbird (John Lennon e Paul McCartney, 1968) e Eleanor Rigby (John Lennon e Paul McCartney, 1966), em medley que faz sentido. Músico versátil, Webster Santos faz a temperatura ficar adequadamente caliente, no toque percussivo de seu violão, para Zizi aclimatar Gracias a la vida (Violeta Parra, 1966), a canção-hino do Chile que conheceu na voz combativa da cantora norte-americana de folk Joan Baez. Em contrapartida, a banda jamais cai no suingue tropicalista de A menina dança (Moraes Moreira e Luiz Galvão, 1972), música do grupo Novos Baianos associada a Baby do Brasil. Zizi surpreende mais quando faz caras, bocas e poses adequadas ao tom da hollywoodiana Sucesso, aqui vou eu (Build up) (Arnaldo Baptista e Rita Lee, 1970) - revivida com arranjo que fica entre o pop, o rock e o r&b - e quando pesca pérola inusitada do rico baú de Roberto Carlos, Traumas (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1971), composições que cantou no musical Marylin Miranda, encenado na Bahia em 1974 quando Zizi tinha 18 anos. Como a cantora conta em cena, a canção confessional do Roberto foi uma escolha da própria Zizi enquanto a música de Rita Lee foi escolhida pela produção do espetáculo dirigido por seu irmão, José Possi Neto, arquiteto do roteiro poliglota de Na sala com Zizi em que acomoda até um bolero mexicano, Sabor a mí (Álvaro Carrillo, 1959), número em que Zizi e banda caem no suingue latino. Roteiro, aliás, cheio de curiosidades e joias ainda modernas que Zizi nunca gravou em disco, caso de I started a joke (Barry Gibb, Maurice Gibb e Robin Gibb, 1968) - uma das mais pungentes baladas do repertório inicial do trio australiano Bee Gees. Zizi canta até jingles publicitários, sendo que um - composto por Walter Queiroz, Paulo Levita e João Donato para promover empreendimento imobiliário da Bahia - soa como música tão bem feita que merece uma gravação oficial em disco (o público ouve em off o áudio do jingle na voz de Zizi). Enfim, Na sala com Zizi é espetáculo repleto de curiosidades. No início, a cantora toca até piano para lembrar dois temas - Für Elise (Beethoven, 1810) e Santa Lucia (Teodoro Cottrau, 1849 / 1916) - presentes na memória afetiva da infância vivida no Brás, italianíssimo bairro da cidade de São Paulo (SP). Na sequência, aparecem no roteiro músicas que fizeram sucesso mundial na voz da cantora italiana Rita Pavone - a juvenil Datemi un martello (If I had a hammer) (Pete Seeger, 1958, em versão em italiano de Sergio Bardotti, 1964) e a romântica Fortissimo (Bruno Canfora e Lina Wertmüller, 1966) - e, mais tarde, sambas-canções de emoções intensas como Esses moços (Pobres moços) (Lupicínio Rodrigues, 1948) e Acontece (Cartola, 1972). São essas canções, cujas emoções são depuradas por Zizi sem sentimentalismo e sem perda da intensidade, que justificam show que merece virar disco gravado em estúdio para que Zizi Possi transite somente pela sala sem correr risco de ir para o bar.
12 comentários:
♪ Numa das muitas falas em que Zizi Possi pontua o repertório do loquaz show Na sala com Zizi com informações sobre sua vida pré-fama, a cantora paulistana recorda com certo saudosismo da adolescência vivida na década de 1960. "As emoções eram intensas. As pessoas se orgulhavam de transbordar", ressaltou a artista, em crítica sutil à era cool que domina a música. Zizi falou da intensidade das emoções da aurora de sua vida após dar sua voz cristalina a Dio, come ti amo (Domenico Modugno, 1966), a canção italiana que venceu o Festival de San Remo em 1966 e que muitos ouviram na voz da cantora Gigliolla Cinquetti. Curiosamente, foi ao interpretar Dio, come ti amo que Zizi mostrou pela primeira vez, no palco da casa Vivo Rio, a grandeza de seu canto ainda límpido e cada vez mais maturado. Na estreia carioca da turnê derivada do projeto Sala de estar, do Sesc de São Paulo, Zizi se mostrou totalmente à vontade diante do público que compareceu ao Vivo Rio na noite do último sábado, 31 de outubro de 2015. Sem se intimidar com o tamanho da casa, demasiadamente grande para espetáculo de caráter íntimo que roça o formato de talk-show, Zizi contextualizou as composições que moldaram sua formação musical. Com naturalidade, a cantora transitou da sala para o bar sob a segura direção musical do guitarrista Webster Santos. Sim, houve um eventual clima de show de barzinho quando Zizi cantou You've got a friend (Carole King, 1971) com o coro do público. Mas, quanto soube evitar esse clima, Zizi se confirmou cantora de primeiro time, capaz de realçar toda a beleza sublime de Lígia (Antonio Carlos Jobim, 1974) - a canção que interpretou nos anos 1970 em especial da baiana TV Aratu, em Salvador (BA), e que ora revive com o toque do piano de Tiago Costa - e capaz também de mostrar toda a beleza melódica que pode haver numa popular canção sentimental como Tudo passará (1969), grande sucesso do cantor e compositor mineiro Nelson Ned (1947 - 2014). A cantora também se mostrou grande quando iluminou o lirismo formal de Noite cheia de estrelas (Cândido das Neves, 1954) - o sucesso do cantor carioca Vicente Celestino (1894 - 1964) que Zizi reaviva em clima seresteiro, fomentado pelo toque do bandolim do virtuoso Webster Santos - e quando, sagaz, emenda duas músicas do grupo inglês The Beatles, Blackbird (John Lennon e Paul McCartney, 1968) e Eleanor Rigby (John Lennon e Paul McCartney, 1966), em medley que faz sentido. Músico versátil, Webster Santos faz a temperatura ficar adequadamente caliente, no toque percussivo de seu violão, para Zizi aclimatar Gracias a la vida (Violeta Parra, 1966), a canção-hino do Chile que conheceu na voz combativa da cantora norte-americana de folk Joan Baez. Em contrapartida, a banda jamais cai no suingue tropicalista de A menina dança (Moraes Moreira e Luiz Galvão, 1972), música do grupo Novos Baianos associada a Baby do Brasil. Zizi surpreende mais quando faz caras, bocas e poses adequadas ao tom da hollywoodiana Sucesso, aqui vou eu (Build up) (Arnaldo Baptista e Rita Lee, 1970) - revivida com arranjo que fica entre o pop, o rock e o r&b - e quando pesca pérola inusitada do rico baú de Roberto Carlos, Traumas (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1971), composições que cantou no musical Marylin Miranda, encenado na Bahia em 1974 quando Zizi tinha 18 anos.
Como a cantora conta em cena, a canção confessional do Roberto foi uma escolha da própria Zizi enquanto a música de Rita Lee foi escolhida pela produção do espetáculo dirigido por seu irmão, José Possi Neto, arquiteto do roteiro poliglota de Na sala com Zizi em que acomoda até um bolero mexicano, Sabor a mí (Álvaro Carrillo, 1959), número em que Zizi e banda caem no suingue latino. Roteiro, aliás, cheio de curiosidades e joias ainda modernas que Zizi nunca gravou em disco, caso de I started a joke (Barry Gibb, Maurice Gibb e Robin Gibb, 1968) - uma das mais pungentes baladas do repertório inicial do trio australiano Bee Gees. Zizi canta até jingles publicitários, sendo que um - composto por Walter Queiroz, Paulo Levita e João Donato para promover empreendimento imobiliário da Bahia - soa como música tão bem feita que merece uma gravação oficial em disco (o público ouve em off o áudio do jingle na voz de Zizi). Enfim, Na sala com Zizi é espetáculo repleto de curiosidades. No início, a cantora toca até piano para lembrar dois temas - Für Elise (Beethoven, 1810) e Santa Lucia (Teodoro Cottrau, 1849 / 1916) - presentes na memória afetiva da infância vivida no Brás, italianíssimo bairro da cidade de São Paulo (SP). Na sequência, aparecem no roteiro músicas que fizeram sucesso mundial na voz da cantora italiana Rita Pavone - a juvenil Datemi un martello (If I had a hammer) (Pete Seeger, 1958, em versão em italiano de Sergio Bardotti, 1964) e a romântica Fortissimo (Bruno Canfora e Lina Wertmüller, 1966) - e, mais tarde, sambas-canções de emoções intensas como Esses moços (Pobres moços) (Lupicínio Rodrigues, 1948) e Acontece (Cartola, 1972). São essas canções, cujas emoções são depuradas por Zizi sem sentimentalismo e sem perda da intensidade, que justificam show que merece virar disco gravado em estúdio para que Zizi Possi transite somente pela sala sem correr risco de ir para o bar.
Espero realmente que essa análise chegue a Zizi e ela grave esse repertório em estúdio.
Tomara que saia em disco mesmo!
Senti falta de "Vida noturna" e "Nunca" no roteiro, mas até prefiro canções que sejam inéditas na voz de Zizi. Espero que o show seja registrado em cd e dvd!
Só uma correção: Vicente Celestino faleceu em 1968, aos 74 anos incompletos, e não em 1964. ;)
Tem razão, Luis Guto. Pensei 1968 e escrevi 1964. Abs, grato pelo toque, MauroF.
Augusto Flávio (Petrolina-Pe/Juazeiro-Ba)
Mauro, e Joia de Caetano, do seu ponto de vista já que você viu o show, como ficou?
O show em Salvador foi lindo! Show inusitado e com repertório inédito. Merece virar DVD. Interessante que a viagem musical de Zizi encerra justamente quando ela começa a carreira fonográfica.
Quando ouvi pela primeira vez a voz de Zizi Possi, em 1978, eu ainda era uma criança. Já sabia de seu futuro brilhante e a que ponto da galaxia chegaria. Zizi, pra mim, hoje, é a Maior Voz do Brasil. Sem desmerecer Maria Bethânia que considero a Rainha da Música Popular Brasileira e Gal Costa que, para mim, é a Maior Cantora Brasileira de todos os tempos. Além de Elis regina que é uma Estrela que brilha no Céu do cancioneiro do Brasil, mas que ninguém conseguirá alcançar.
Assisti ao show "Na Sala com Zizi" e mais uma vez, fiquei surpreso, encantado e emocionado com a versatilidade, competência, profissionalismo e voz, atributos conhecidos há tempos. Falta uma "coisa" a Zizi Possi: Ela própria ter consciência de seu lugar como Grande Cantora da Música Brasileira de todos os tempos. A única qualidade de Zizi que eu "não gosto:" a humildade. Zizi Possi você é a Maior Voz do Brasil!!!
Quando ouvi pela primeira vez a voz de Zizi Possi, em 1978, eu ainda era uma criança. Já sabia de seu futuro brilhante e a que ponto da galaxia chegaria. Zizi, pra mim, hoje, é a Maior Voz do Brasil. Sem desmerecer Maria Bethânia que considero a Rainha da Música Popular Brasileira e Gal Costa que, para mim, é a Maior Cantora Brasileira de todos os tempos. Além de Elis regina que é uma Estrela que brilha no Céu do cancioneiro do Brasil, mas que ninguém conseguirá alcançar.
Assisti ao show "Na Sala com Zizi" e mais uma vez, fiquei surpreso, encantado e emocionado com a versatilidade, competência, profissionalismo e voz, atributos conhecidos há tempos. Falta uma "coisa" a Zizi Possi: Ela própria ter consciência de seu lugar como Grande Cantora da Música Brasileira de todos os tempos. A única qualidade de Zizi que eu "não gosto" é a humildade. Zizi Possi você é a Maior Voz do Brasil!!!
Também concordo com o Jornalista Mauro Ferreira que o show se transforme em CD gravado em estúdio. Dessa forma, nós que gostamos da voz e da arte de Zizi Possi não ficaremos com essa emoção imensa somente na memória. E, se virar um DVD também, a emoção e o prazer serão dobrados. Zizi, lança tudo!!! Nós agradecemos imensamente. Abraços a todos.
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