Resenha de show
Título: Inusitado Fafá de Belém
Artista: Fafá de Belém (em foto de Rodrigo Goffredo)
Local: Teatro de Câmara da Cidade das Artes (Rio de Janeiro, RJ)
Data: 3 de novembro de 2015
Cotação: * *
♪ "Canto música romântica, mas sou mesmo é heavy metal", detonou Fafá de Belém, dando sua famosa gargalhada, após cantar Abandonada (Michael Sullivan e Paulo Sérgio Valle, 1996) na primeira das duas apresentações do show de rock criado pela cantora - sob a direção musical do guitarrista paulistano Edgard Scandurra, virtuose do grupo Ira! - para o encerramento da terceira edição do projeto Inusitado, criado pelo executivo franco-sírio André Midani para ser atração do Teatro de Câmara da Cidade das Artes. Até que nem tão heavy metal assim... As inflexões e as
entonações da interpretação passional do hit Abandonada indicaram já
no início do show que, como roqueira, Fafá continua sendo uma robusta cantora
de MPB. Robusta no sentido musical do canto, já que a voz quente e potente se
mostrou mais uma vez presente em cena, com todos seus tons originais. Só que
essa robustez vocal não fez de Fafá uma cantora de rock na estreia do show que
tem mais uma apresentação programada para a noite de hoje, 4 de novembro de 2015. Formado por
Scandurra com os irmãos Andria Busic (baixo) e Ivan Busic (bateria),
integrantes da banda paulistana de hard rock Dr. Sin, o power trio que dividia o palco do Teatro de Câmara da Cidade das
Artes envolveu em ambiência roqueira todo o repertório apresentado no curto
roteiro de 15 músicas. Contudo, rock é mais do que um trio de baixo, guitarra e
bateria. Para cantar e/ou tocar esse tal de rock'n'roll, é preciso ter uma chama na alma
e na garganta que pareceu estar apagada em Fafá, em que pesem o discurso, o figurino
rocker de Gilda Midani e um punhado de músicas associadas ao universo do gênero. A primeira decepção veio logo na abertura, quando Fafá somente recitou a letra de Robusta, (Arnaldo Antunes, Tony Bellotto, Marcelo Fromer e Nando Reis, 1985), o inédito rock composto há 30 anos para a cantora por quatro dos oito integrantes da formação clássica do grupo paulistano Titãs. Na imediata sequência, na única música realmente surpreendente do roteiro, Hocus pocus (Jan Akerman e Thijs Van Leer, 1971), Fafá levou nos vocalises este tema do Focus, grupo de Amsterdam criado em 1969 que embarcou na viagem progressiva da década de 1970 com hard rock geralmente instrumental. Como sempre, a voz estava toda lá, firme e acalorada, mas sem convencer de que a cantora podia ser uma roqueira de fato. Mas Fafá emulou sua persona roqueira, seguindo com fidelidade a pegada de Pitty em Me adora (2009) – a música mais pop desta baiana que, ela sim, é iluminada pela chama do rock até quando canta uma balada – e diluindo a pressão e a contundência de Dois animais na selva suja das ruas (1971), o rock que o compositor uruguaio-brasileiro Taiguara (1945 – 1996) fez para Erasmo Carlos e que Nasi – colega de Scandurra no Ira! acabou de gravar no tom apropriado em seu recém-lançado CD e DVD EGBE (Deck / Canal Brasil, 2015). Aparentemente insegura com o repertório, a ponto de ler no teleprompter as letras de músicas como Amor pra recomeçar (Roberto Frejat, Maurício Barros e Mauro Santa Cecília, 2001), Fafá revelou que, afinal, era a mesma Fafá de sempre quando cantou Escândalo (Caetano Veloso, 1981) com interpretação similar ao de seu recital de voz & piano. Talvez por isso mesmo, Escândalo tenha sido um dos números que resultou melhor em show que roçou o constrangimento quando Fafá abriu os braços sem fazer o país imaginado por Antonio Cícero na letra pop poética de Fullgás (Marina Lima e Antonio Cícero, 1984), composição que consolidou a obra autoral de Marina Lima. Música do antológico primeiro álbum do trio Secos & Molhados, Amor (João Apolinário e João Ricardo, 1973) se perdeu no show, inclusive pelos vocais sofríveis de Scandurra. O power trio reforçava a todo momento que, sim, a ideia e a intenção eram fazer um show de rock. Mas nem os riffs e solos matadores da guitarra de Scandurra mantiveram acesa a chama incandescente do rock'n'roll no palco do Teatro de Câmara da Cidade das Artes. Mas, justiça seja feita, houve um único número - fora do repertório de Fafá – que a combustão se fez. Foi em Você não serve pra mim, música que Roberto Carlos lançou em 1967, no reinado da Jovem Guarda. Ao cantar o tema de Renato Barros (e não de Renato Côrtes, como Fafá anunciou em cena, confundindo Barros com Getúlio Côrtes, compositor que também fornecia repertório para Roberto nos anos 1960), Fafá e trio se afinaram de fato, combinando interpretação e arranjo. Mas, logo na sequência, Para Lennon & McCartney (Lô Borges, Márcio Borges e Fernando Brant, 1970) e Naturalmente (Caetano Veloso e João Donato, 1975), devolveram a sensação de que quem estava ali, no palco, era uma cantora de música brasileira tentando entrar na pele da roqueira com a maquiagem dos arranjos de Scandurra. “Esta é a minha forma inusitada de ver o rock’n’roll”, disse Fafá ao fim do show, cujo bis incluiu música francesa da década de 1960 - La poupée qui fait non (Michel Polnareff e Franck Gérald, 1966), dissonância do roteiro justificada como homenagem a Midani, criado na França – e sucesso da banda punk brasiliense Plebe Rude, Até quando esperar? (Philippe Seabra, André X e Gutje, 1986). Sem rachar o concreto, Fafá deu voz à rude Plebe, a lado B da Legião Urbana – L'avventura (Dado Villa- Lobos, Marcelo Bonfá e Renato Russo, 1996), cantada com Dado Villa-Lobos na plateia – e a Pitty em show artificial em que o toque inusitado esteve mais na aparência (pelo tom hard dos arranjos do trio e pelo jovial figurino rocker) do que na essência.
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ResponderExcluirAparentemente insegura com o repertório, a ponto de ler no teleprompter as letras de músicas como Amor pra recomeçar (Roberto Frejat, Maurício Barros e Mauro Santa Cecília, 2001), Fafá revelou que, afinal, era a mesma Fafá de sempre quando cantou Escândalo (Caetano Veloso, 1981) com interpretação similar ao de seu recital de voz & piano. Talvez por isso mesmo, Escândalo tenha sido um dos números que resultou melhor em show que roçou o constrangimento quando Fafá abriu os braços sem fazer o país imaginado por Antonio Cícero na letra pop poética de Fullgás (Marina Lima e Antonio Cícero, 1984), composição que consolidou a obra autoral de Marina Lima. Música do antológico primeiro álbum do trio Secos & Molhados, Amor (João Apolinário e João Ricardo, 1973) se perdeu no show, inclusive pelos vocais sofríveis de Scandurra. O power trio reforçava a todo momento que, sim, a ideia e a intenção eram fazer um show de rock. Mas nem os riffs e solos matadores da guitarra de Scandurra mantiveram acesa a chama incandescente do rock'n'roll no palco do Teatro de Câmara da Cidade das Artes. Mas, justiça seja feita, houve um único número - fora do repertório de Fafá – que a combustão se fez. Foi em Você não serve pra mim, música que Roberto Carlos lançou em 1967, no reinado da Jovem Guarda. Ao cantar o tema de Renato Barros (e não de Renato Côrtes, como Fafá anunciou equivocadamente em cena, confundindo Barros com Getúlio Côrtes, outro compositor que fornecia repertório para o Rei da juventude nos anos 1960), Fafá e trio se afinaram de fato, combinando interpretação e arranjo. Mas, logo na sequência, Para Lennon & McCartney (Lô Borges, Márcio Borges e Fernando Brant, 1970) e Naturalmente (Caetano Veloso e João Donato, 1975), devolveram a sensação que quem estava ali, no palco, era uma cantora de música brasileira tentando entrar na pele da roqueira com a maquiagem dos arranjos de Scandurra. “Esta é a minha forma inusitada de ver o rock’n’roll”, disse Fafá ao fim do show, cujo bis incluiu música francesa da década de 1960 - La poupée qui fait non (Michel Polnareff e Franck Gérald, 1966), dissonância do roteiro justificada como homenagem a Midani, executivo criado na França – e o maior sucesso da banda punk brasiliense Plebe Rude, Até quando esperar? (Philippe Seabra, André X e Gutje, 1986). Sem rachar o concreto, Fafá deu voz à rude Plebe, a um lado B da Legião Urbana – L'avventura (Dado Villa- Lobos, Marcelo Bonfá e Renato Russo, 1996), cantada com Dado Villa-Lobos presente na plateia – e a Pitty em show irregular em que o toque inusitado esteve mais na aparência (pelo tom hard dos arranjos) do que na essência...
ResponderExcluirMauro, e 4 de novembro, certo? Abs, Leandro
ResponderExcluirClaro, Leandro, hoje é 4 de novembro. Grato pelo toque. Abs, MauroF
ResponderExcluirArrasou com o show!
ResponderExcluirNossa ? Será que vimos o mesmo concerto ? Fafá durante o show foi sincera e arrebatou o público da 4a feira pela simplicidade, cumplicidade e despretensão. Nada mais Fafá. E desculpe. Teve uma pegada boa de rock sim. Mas enfim, é a visão de cada um.
ResponderExcluirPois é, Marcus. Cada um tem uma visão. E a sua visão do show vale tanto quanto a minha. De toda forma, vimos apresentações distintas. Uma estreia pode ser tensa e, no segundo dia, o show pode ser outro, mais relaxado. De todo modo, viva a diversidade de opiniões. Seja bem-vindo nesse espaço, abs, MauroF
ResponderExcluirNão estou querendo puxar saco, mas confio nas resenhas do Mauro....e acho ótimo quando ele fala a verdade, mesmo não agradando a todos e mesmo quando são artistas que eu gosto....
ResponderExcluirAcho que esse é o trabalho do critico, e nós fãs somos meio cegos as vezes
Ruim é ler umas resenhas de show com 5 estrelas, você estava lá e foi um desastre cheio de erros, e o critico elogia porque é amigo da cantora, isso é triste(vemos muito isso em sp)
Adoro o blog, ele é imparcial o que é importante...excelente trabalho Mauro