Resenha de CD
Título: No osso - Ao vivo
Artista: Marina Lima
Gravadora: Universal Music
Cotação: * * *
♪ Solo da paixão de Marina Lima pela música, No osso é show mais sedutor do que sugere o disco lançado neste mês de dezembro de 2015 pela Universal Music - gravadora para a qual a cantora e compositora retorna após 15 anos. E não é pela questão da voz. Porque a voz nunca foi o centro das atenções em shows e discos desta sofisticada artesã do pop nacional. Questão já resolvida por Marina, a voz (que resta) está inteira neste solo que evidencia o violão de Marina. Único instrumento ouvido na maioria das músicas, o violão quase nunca fora associado no imaginário do público da cantora a essa artista que surgiu na década de 1970 empunhando guitarra - instrumento que até então era visto nas mãos de homens em machista comportamento social e musical, desafiado por algumas pioneiras como Lucia Turnbull e a própria Marina. Mas tal violão é a fonte da maior parte do cancioneiro de Marina, como a artista explica em texto reproduzido no encarte do CD. A questão é que o show No osso pedia registro audiovisual em DVD para que o ouvinte-espectador pudesse apreciar a ambiência íntima do cenário e pudesse ouvir-ver todo o roteiro encadeado por Marina com falas que acentuam o caráter de intimidade perdido no disco. Dos 20 e poucos números do roteiro original, o CD reproduz somente 12, aos quais foram acrescidos duas faixas-bônus formatadas em estúdio. Uma é o rock Partiu, uma das duas músicas autorais inéditas em disco na voz da compositora. Partiu abre o álbum no registro ao vivo de voz & violão do show. Mas volta para a encerrar o disco em potente gravação de estúdio turbinada com a pegada do grupo paraense Strobo. É quando Partiu - música que Marina já canta em shows desde 2013 - faz mais sentido e se revela com toda a força em disco, já que a gravação feita por Filipe Catto no álbum Tomada (Agência de Música / Radar Records, 2015) soou artificial na voz do cantor (mesmo contando com o violão de Marina). Outra novidade do repertório é o samba Da Gávea. Um bom samba simples, composto (por razões afetivas) e cantado na cadência tradicional do gênero, capaz de gerar empatia ao mesmo tempo em que pode também decepcionar quem se habituou com a sofisticação melódica e poética inerente à obra de uma compositora que já produziu pérolas como O solo da paixão (1996) - parceria com o irmão Antonio Cícero que cai bem no disco - e Na minha mão (Marina Lima e Alvin L, 1998), música ouvida com bases pré-gravadas que se fundem com o toque sagaz do violão da artista. A questão que redime No osso de perdas e de qualquer eventual fragilidade vocal - mais evidente nas falas (dispensáveis no CD) e nas composições mais conhecidas como Virgem (Marina Lima e Antonio Cícero, 1987) - é que Marina Lima continua esbanjando sofisticação. Criada sob a direção de arte de School / SS99 a partir de foto de Paulo Mancini, a capa chiquérrima do CD No osso - Ao vivo traduz o refinamento natural que pauta a trajetória e a obra de Marina Lima. Nesse sentido, No osso - disco captado ao vivo em apresentações do show no Sesc Belenzinho, em São Paulo (SP), em 2 e 3 de maio deste ano de 2015 - se impõe como digno título desta artista que não se contém com o formato acústico do show, reapresentando Não me venha mais com o amor - parceria de Marina com Adriana Calcanhotto lançada por Marina no último álbum de estúdio, o excelente, paulistano (e subestimado) Clímax (Libertá Records / Fullgás / Microservice, 2011) - com as programações eletrônicas concebidas para a gravação original e explicadas pela cantora em cena na fala mais didática do show. Além de diluir a versão em inglês de O chamado (Marina Lima e Giovanni Bizzotto, 1998), ouvida somente nos momentos finais da música em português, No osso - Ao vivo pode reacender a discussão sobre a voz de Marina Lima pela natureza desnudada de show corajoso. A voz de outrora já se partiu, e curiosamente tal percepção está mais nítida na faixa-bônus de estúdio Can't help falling in love (Hugo Peretti, Luigi Creatore e George David Weiss, 1961), calcada no violão. Marina não evidencia toda a beleza da balada propagada na voz do cantor norte-americano Elvis Presley (1935 - 1977) em gravação lançada na trilha sonora do filme Blue Hawaii (Estados Unidos, 1961). Mas, para quem entende que o canto de Marina transcende a capacidade de atingir notas na escala musical, tal questão se dissipa na maioria das valentes interpretações ao vivo do roteiro em que Marina celebra colegas de geração com Cazuza (1958 - 1990) e Lobão em Carente profissional (Roberto Frejat e Cazuza, 1983) e Noite e dia (Lobão e Júlio Barroso, 1982), respectivamente. Ela pode falar por eles. Mesmo seguindo caminho paralelo, Marina sempre foi legítima representante daquela turma pop da geração roqueira de 1980 - o que torna natural a opção por cantar Cazuza, Lobão e Cia. E o fato é que, no fim do disco, há o registro eletrizante de Partiu com o Strobo para lembrar que Marina sempre foi mais do que uma voz. A eternidade de Marina Lima na música brasileira é resultado de mix de atitude, de inspiração para compor um pop sofisticado de postura rocker e da habilidade para soar sempre moderna, desafiando modismos, gerações e o próprio tempo que não para. Para quem percebe a dimensão da obra da artista, o destemido CD No osso - ao vivo pode ser ouvido e encarado como tradução fiel do atual momento Marina Lima. Aos 60 anos, festejados em setembro deste ano de 2015, Marina Lima continua musicalmente jovem, contemporânea e cheia de charme, sem medo nas paradas, sem culpa de já não ser o que foi (mas de certa forma ainda é). Cola nela!
♪ Solo da paixão de Marina Lima pela música, No osso é show mais sedutor do que sugere o disco lançado neste mês de dezembro de 2015 pela Universal Music - gravadora para a qual a cantora e compositora retorna após 15 anos. E não é pela questão da voz. Porque a voz nunca foi o centro das atenções em shows e discos desta sofisticada artesã do pop nacional. Questão já resolvida por Marina, a voz (que resta) está inteira neste solo que evidencia o violão de Marina. Único instrumento ouvido na maioria das músicas, o violão quase nunca fora associado no imaginário do público da cantora a essa artista que surgiu na década de 1970 empunhando guitarra - instrumento que até então era visto nas mãos de homens em machista comportamento social e musical, desafiado por algumas pioneiras como Lucia Turnbull e a própria Marina. Mas tal violão é a fonte da maior parte do cancioneiro de Marina, como a artista explica em texto reproduzido no encarte do CD. A questão é que o show No osso pedia registro audiovisual em DVD para que o ouvinte-espectador pudesse ver a ambiência íntima do cenário e pudesse ouvir-ver todo o roteiro encadeado por Marina com falas que acentuam o caráter de intimidade perdido no disco. Dos 20 e poucos números do roteiro original, o CD reproduz somente 12, aos quais foram acrescidos duas faixas-bônus formatadas em estúdio. Uma é o rock Partiu, uma das duas músicas autorais inéditas em disco na voz da compositora. Partiu abre o álbum no registro ao vivo de voz & violão do show. Mas volta para a encerrar o disco em potente gravação de estúdio turbinada com a pegada do grupo paraense Strobo. É quando Partiu - música que Marina já canta em shows desde 2013 - faz mais sentido e se revela com toda a força em disco, já que a gravação feita por Filipe Catto no álbum Tomada (Agência de Música / Radar Records, 2015) soou artificial na voz do cantor (mesmo contando com o violão de Marina). Outra novidade do repertório é o samba Da Gávea. Um bom samba simples, composto (por razões afetivas) e cantado na cadência tradicional do gênero, capaz de gerar empatia ao mesmo tempo em que pode também decepcionar quem se habituou com a sofisticação melódica e poética inerente à obra de uma compositora que já produziu pérolas como O solo da paixão (1966) - parceria com o irmão Antonio Cícero que cai bem no disco - e Na minha mão (Marina Lima e Alvin L, 1998), música ouvida com bases pré-gravadas que se fundem com o toque sagaz do violão da artista. A questão que redime No osso de perdas e de qualquer eventual fragilidade vocal - mais evidente nas falas (dispensáveis no CD) e nas composições mais conhecidas como Virgem (Marina Lima e Antonio Cícero, 1998) - é que Marina Lima continua esbanjando sofisticação. Criada sob a direção de arte de School / SS99 a partir de foto de Paulo Mancini, a capa chiquérrima do CD No osso - Ao vivo traduz o refinamento natural que pauta a trajetória e a obra de Marina Lima. Nesse sentido, No osso - disco captado ao vivo em apresentações do show no Sesc Belenzinho, em São Paulo (SP), em 2 e 3 de maio deste ano de 2015 - se impõe como digno título desta artista que não se contém com o formato acústico do show, reapresentando Não me venha mais com o amor - parceria de Marina com Adriana Calcanhotto lançada por Marina no último álbum de estúdio, o excelente, paulistano (e subestimado) Clímax (Libertá Records / Fullgás / Microservice, 2011) - com as programações eletrônicas concebidas para a gravação original e explicadas pela cantora em cena na fala mais didática do show.
ResponderExcluirAlém de diluir a versão em inglês de O chamado (Marina Lima e Giovanni Bizzotto, 1998), ouvida somente nos momentos finais da música em português, No osso - Ao vivo pode reacender a discussão sobre a voz de Marina Lima pela natureza desnudada de show corajoso. A voz de outrora já se partiu, e curiosamente tal percepção está mais nítida na faixa-bônus de estúdio Can't help falling in love (Hugo Peretti, Luigi Creatore e George David Weiss, 1961), calcada no violão. Marina não evidencia toda a beleza da balada propagada na voz do cantor norte-americano Elvis Presley (1935 - 1977) em gravação lançada na trilha sonora do filme Blue Hawaii (Estados Unidos, 1961). Mas, para quem entende que o canto de Marina transcende a capacidade de atingir notas na escala musical, tal questão se dissipa na maioria das valentes interpretações ao vivo do roteiro em que Marina celebra colegas de geração com Cazuza (1958 - 1990) e Lobão em Carente profissional (Roberto Frejat e Cazuza, 1983) e Noite e dia (Lobão e Júlio Barroso, 1982), respectivamente. Ela pode falar por eles. Mesmo seguindo caminho paralelo, Marina sempre foi legítima representante daquela turma pop da geração roqueira de 1980 - o que torna natural a opção por cantar Cazuza, Lobão e Cia. E o fato é que, no fim do disco, há o registro eletrizante de Partiu com o Strobo para lembrar que Marina sempre foi mais do que uma voz. A eternidade de Marina Lima na música brasileira é resultado de mix de atitude, de inspiração para compor um pop sofisticado de postura rocker e da habilidade para soar sempre moderna, desafiando modismos, gerações e o próprio tempo que não para. Para quem percebe a dimensão da obra da artista, o destemido CD No osso - ao vivo pode ser ouvido e encarado como tradução fiel do atual momento Marina Lima. Aos 60 anos, festejados em setembro deste ano de 2015, Marina Lima continua musicalmente jovem, contemporânea e cheia de charme, sem medo nas paradas, sem culpa de já não ser o que foi (mas de certa forma ainda é). Cola nela!
ResponderExcluirSabe o que seria sensacional nesse show/disco? Uma gravação de Alma Caiada.
ResponderExcluirMarina nunca sequer cantou essa música em lugar nenhum. E por ter sido sua primeira composição, viria bem a calhar nesse momento.
Tive esse pensamento desde que o show estreou e fiquei com a sensação que deveria ter acontecido.
O disco está realmente belo e Marina consegue reinventar bem as suas canções, até mesmo daptando-as à fragilidade de sua voz, assim como o GIlberto Gil tem feito. Tenho uma dúvida: o Solo da Paixão é mesmo de 1966 ou foi erro de digitação? Se não me engano, era do álbum Registros à meia voz, de 1996, o primeiro disco em que esse problema de voz apareceu.
ResponderExcluirAinda espero o DVD!
ResponderExcluirMauro, concordo que Marina sempre foi mais associada à guitarra. Tanto é que, quando fez o disco ao vivo no Maracanã, Ivete Sangalo afirmou que só tocou guitarra em "Deixo" porque a imagem de Marina fazendo isso nos anos 1980 a marcara profundamente.
ResponderExcluirMas em termos. Afinal de contas, o violão sempre esteve presente - desde "Todas ao vivo" a irmã de Cícero o toca ao vivo. E eu diria que o instrumento virou parte fundamental da obra dela muito antes deste novo lançamento de agora. Acho que desde "O chamado", a obra de Marina está calcada no violão - não por acaso, desde que ela caiu mais profundamente nas aulas com o parceiro Giovanni Bizzotto.
É isso: de 1993 para cá (e isso foi aprofundado em "Pierrot do Brasil"), obra de Marina é um cruzamento entre o violão/o piano acústicos e a linguagem eletrônica em que ela se aprofundou desde a aproximação com SP, a convivência com Suba (enquanto a vida permitiu) e Edu Martins.
Só para constar o erro de digitação: Mauro, "O solo da paixão" é de 1996.
Felipe dos Santos Souza
Caros, grato pelo toque do erro de digitação. Vou consertar assim que chegar em casa.
ResponderExcluirAlexandre, concordo que um registro de "alma caiada" valorizaria o show e o disco. Abs, Mauro F
ResponderExcluirOla Mauro ocorreu um erro virgem é de 1987 e o chamado é de 1993
ResponderExcluirAcho que "Virgem" também está com erro de digitação. A música não é de 1998.
ResponderExcluirPois o que mais me chamou a atenção qdo Marina apareceu foi exatamente sua voz. Diferente de todas...quente e sensual. Era especial! Hoje é uma sombra. Mas Marina continua ser uma artista incrível no palco. Sofisticada e elegante!
ResponderExcluirÍtalo e Vitor, grato pelo toque do erro de digitação em 'Virgem'. Felipe, por mais que o violão tenha estado sempre ao lado de Marina, a imagem da cantora está associada à guitarra. Tanto que a capa do álbum 'Clímax' reitera tal imagem, mesmo que Marina apareça na foto com uma guitarra eletroacústica. Abs, MauroF
ResponderExcluirA combinação da voz (quente, rouca e sensual), a interpretação e a qualidade das músicas era imbatível! Hoje, que a voz sumiu, e a interpretação não supre a que resta, é que se percebe como a voz fazia a diferença.
ResponderExcluirO disco é bom, mas a voz dela anda bem detonada... O que é uma pena...
ResponderExcluirMarina é mara!
ResponderExcluirSó senti falta de um comentário sobre TRANSAS DE AMOR, música do primeiro álbum de carreira da Marina. Até a temporada de NO OSSO, há muito ela não cantava nada de lá.
ResponderExcluirMarina ganha na elegância e coerência dentro de uma carreira com músicas e atitudes do K.
ResponderExcluirQue sirva de exemplo a muitas canários da MPB.
Ricardo Sérgio
Esperava muito que tivesse o formato em DVD. Mauro sabe se existe esta possibilidade?
ResponderExcluir"A questão é que o show No osso pedia registro audiovisual em DVD para que o ouvinte-espectador pudesse apreciar a ambiência íntima do cenário e pudesse ouvir-ver todo o roteiro encadeado por Marina com falas que acentuam o caráter de intimidade perdido no disco."
ResponderExcluirMuito contemplado por essa fala Mauro! Falou e disse!
Espero que um dia ela lance, nem que seja no YouTube.
Oi, Mauro. Ainda não me adaptei aos comentários do novo blog. Faço por aqui, sei que vc ainda acompanha.
ResponderExcluir"Marina Lima", o álbum completa 25 anos este ano. Foi lançado em agosto/1991.
O show estreou em 14/11/1991, no Imperator, com resenha sua no GLOBO 4 dias depois.
Acho um trabalho histórico na carreira dela, pra mim o melhor até hoje.
Vale uma reavaliação pelos 25 anos.
(Por sinal, ouvi CRIANÇA outro dia na novela A LEI DO AMOR.)
Abraços!