quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Barca põe som do Brasil em movimento gracioso e vibrante na cena de 'Auê'

Resenha de musical
Título: Auê
Direção: Duda Maia
Direção musical e arranjos: Alfredo Del-Penho e Beto Lemos
Elenco: Barca dos Corações Partidos (Adrén Alves, Alfredo Del-Penho, Beto Lemos, Fábio
           Enriquez, Eduardo Rios, Renato Luciano e Ricca Barros)
Músico convidado: Rick De La Torre (bateria)
Cotação: * * * *

Autodefinida como uma Companhia Brasileira de Movimento e Som, a jovial Barca dos Corações Partidos põe o som do Brasil em movimento no sedutor musical Auê, em cartaz na Arena do Sesc Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), até o fim deste mês de janeiro de 2016. Trata-se mais de show teatralizado do que de musical propriamente dito, até porque o texto vem das letras das 25 músicas apresentadas em sequência pelos sete atores que formam a companhia teatral originária de Gonzação - A lenda (2012), espetáculo idealizado por Andréa Alves, produtora da Sarau, empresa que põe Auê em cena sem patrocínio, mas com o habitual padrão de qualidade. Auê ecoa a vivacidade rítmica e cênica do musical anterior criado a partir da obra de Luiz Gonzaga (1912 - 1989), mas é espetáculo mais corajoso por não se escorar no cancioneiro famoso de um grande compositor. A trilha sonora é original, tendo sido composta pelos integrantes da Barca. Com exceção de A barca dos corações partidos (Moyseis Marques e Bena Lobo), misto de ijexá e baião já gravado por Moyseis Marques no recém-lançado EP Made in Brasil (Sarau, 2015), as músicas são inéditas e vão ser registradas em disco pelo afinado elenco ao fim da temporada do espetáculo. Como Gonzação - A lenda, Auê bebe da rica fonte da música brasileira. Cantadas e tocadas ao vivo pelos sete atores, com o toque vigoroso da bateria de Rick De La Torre (único musico convidado, alocado na plateia da arena do Sesc Copacabana, fora do espaço cênico), as 25 músicas formam painel vivaz de sons do Brasil, mosaico plenamente valorizado pela direção musical de Alfredo Del-Penho e Beto Lemos. Mesmo que uma guitarra evoque (muito) eventualmente a pegada desse tal de rock'n'roll, é o Brasil que está em cena no toque da sanfona de Eduardo Rios, da rabeca de Beto Lemos e do pandeiro de Ricca Barros, para citar somente alguns instrumentos manejados pelos atores no palco. Esses sons do Brasil são postos em movimento pela teatralidade exposta em cena pela diretora Duda Maia. É essa teatralidade - ora graciosa, como no número em que o elenco simula bater de asas coerente com o tom de Voa borboleta (Eduardo Rios), ora vibrante como o ritmo de Vida doida (Renato Luciano e Laila Garin) - que impulsiona a Barca dos Corações Partidos no curso fluente de Auê. A trilha sonora serve bem à cena, ecoando a radiante energia da música da nação nordestina em Coco (Alfredo Del-Penho) - número em que Del-Penho se vale da voz e da percussão corporal - e no cordel Doideira de amor (Eduardo Rios). Mas as músicas também ecoam - e muito - os doídos sentimentos de amor das serenatas, serestas e modinhas que fazem bater o coração musical do Brasil desde antes do samba ser samba. Versim de amor (Renato Luciano) e Saudade (Beto Lemos), por exemplo, têm versos que reverberam a melancolia amorosa que pauta a música do Brasil e do mundo. "Meu coração é moço / Pra tanta dor de amor", reclama Renato Luciano em versos da autoral composição Remédio. Em que pesem tantas canções de corações partidos, a Barca segue curso paradoxalmente alegre em Auê e eventualmente faz graça até das próprias limitações musicais como em Dom de um amor só (Eduardo Rios), solo irônico do ator-cantor Fábio Enriquez. A graça está também na ágil movimentação dos atores pela cena. Mesmo que o teatralizado show dê a sensação de estar se alongando quando se aproxima do fim, Auê jamais deixa de capturar a atenção do espectador. Há harmonia entre as músicas e o toque envolvente da direção de Duda Maia. Sem seguir a receita de musicais já testados nos palcos, Auê cria a própria cena e tem tudo para fazer barulho na temporada teatral nacional ao longo de 2016.

2 comentários:

  1. ♪ Autodefinida como uma Companhia Brasileira de Movimento e Som, a jovial Barca dos Corações Partidos põe o som do Brasil em movimento no sedutor musical Auê, em cartaz na Arena do Sesc Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), até o fim deste mês de janeiro de 2016. Trata-se mais de show teatralizado do que de musical propriamente dito, até porque o texto vem das letras das 21 músicas apresentadas em sequência pelos sete atores que formam a companhia teatral originária de Gonzação - A lenda (2012), espetáculo idealizado por Andréa Alves, produtora da Sarau, empresa que põe Auê em cena sem patrocínio, mas com o habitual padrão de qualidade. Auê ecoa a vivacidade rítmica e cênica do musical anterior criado a partir da obra de Luiz Gonzaga (1912 - 1989), mas é espetáculo mais corajoso por não se escorar no cancioneiro famoso de um grande compositor. A trilha sonora é original, tendo sido composta pelos integrantes da Barca. Com exceção de A barca dos corações partidos (Moyseis Marques e Bena Lobo), misto de ijexá e baião já gravado por Moyseis Marques no recém-lançado EP Made in Brasil (Sarau, 2015), as músicas são inéditas e vão ser registradas em disco pelo afinado elenco ao fim da temporada do espetáculo. Como Gonzação - A lenda, Auê bebe da rica fonte da música brasileira. Cantadas e tocadas ao vivo pelos sete atores, com o toque vigoroso da bateria de Rick De La Torre (único musico convidado, alocado na plateia da arena do Sesc Copacabana, fora do espaço cênico), as 21 músicas formam painel vivaz de sons do Brasil, mosaico plenamente valorizado pela direção musical de Alfredo Del-Penho e Beto Lemos. Mesmo que uma guitarra evoque (muito) eventualmente a pegada desse tal de rock'n'roll, é o Brasil que está em cena no toque da sanfona de Eduardo Rios, da rabeca de Beto Lemos e do pandeiro de Ricca Barros, para citar somente alguns instrumentos manejados pelos atores no palco. Esses sons do Brasil são postos em movimento pela teatralidade exposta em cena pela diretora Duda Maia. É essa teatralidade - ora graciosa, como no número em que o elenco simula bater de asas coerente com o tom de Voa borboleta (Eduardo Rios), ora vibrante como o ritmo de Vida doida (Renato Luciano e Laila Garin) - que impulsiona a Barca dos Corações Partidos no curso fluente de Auê. A trilha sonora serve bem à cena, ecoando a radiante energia da música da nação nordestina em Coco (Alfredo Del-Penho) - número em que Del-Penho se vale da voz e da percussão corporal - e no cordel Doideira de amor (Eduardo Rios). Mas as músicas também ecoam - e muito - os doídos sentimentos de amor das serenatas, serestas e modinhas que fazem bater o coração musical do Brasil desde antes do samba ser samba. Versim de amor (Renato Luciano) e Saudade (Beto Lemos), por exemplo, têm versos que reverberam a melancolia amorosa que pauta a música do Brasil e do mundo. "Meu coração é moço / Pra tanta dor de amor", reclama Renato Luciano em versos da autoral composição Remédio. Em que pesem tantas canções de corações partidos, a Barca segue curso paradoxalmente alegre em Auê e eventualmente faz graça até das próprias limitações musicais como em Dom de um amor só (Eduardo Rios), solo irônico do ator-cantor Fábio Enriquez. A graça está também na ágil movimentação dos atores pela cena. Mesmo que o teatralizado show dê a sensação de estar se alongando quando se aproxima do fim, Auê jamais deixa de capturar a atenção do espectador. Há harmonia entre as músicas e o toque envolvente da direção de Duda Maia. Sem seguir a receita de musicais já testados nos palcos, Auê cria a própria cena e tem tudo para fazer barulho na temporada teatral nacional ao longo de 2016.

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